Discurso durante a 80ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de reformulação das vantagens concedidas aos bancos no contexto da reforma tributária.

Autor
Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Valdir Raupp de Matos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS. REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Necessidade de reformulação das vantagens concedidas aos bancos no contexto da reforma tributária.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2003 - Página 15900
Assunto
Outros > BANCOS. REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • ANALISE, ESTRUTURAÇÃO, SISTEMA TRIBUTARIO, BRASIL, CRITICA, PRIVILEGIO, PESSOA FISICA, PESSOA JURIDICA, EXECUÇÃO, SONEGAÇÃO FISCAL, ESPECIFICAÇÃO, EXCESSO, VANTAGENS, BANCOS, INSUFICIENCIA, VALOR, IMPOSTO DE RENDA, COMPARAÇÃO, RENDIMENTO, LUCRO, MERCADO FINANCEIRO.
  • ESCLARECIMENTOS, OBTENÇÃO, DINHEIRO, BANCOS, COBRANÇA, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, REALIZAÇÃO, OPERAÇÃO FINANCEIRA, CIRCULAÇÃO, TITULO.
  • ANALISE, AUMENTO, RIQUEZAS, BANCOS, MOTIVO, ORIENTAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, TAXAS, JUROS, FAVORECIMENTO, LEGISLAÇÃO TRIBUTARIA, REDUÇÃO, CARGA, TRIBUTOS.
  • EXPECTATIVA, TRAMITAÇÃO, SENADO, PROPOSTA, REFORMA TRIBUTARIA, GOVERNO FEDERAL, DEFESA, CORREÇÃO, INJUSTIÇA, COMBATE, SONEGAÇÃO FISCAL.

O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Sem registro taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a reforma tributária está na pauta do Congresso. Talvez não seja a reforma ideal, ampla e abrangente que gostaríamos. Possivelmente, ainda não é desta vez que chegaremos a uma situação em que todos possam pagar menos tributos porque todos, sem exceção, serão taxados por regras justas, ao mesmo tempo em que o Poder Público terá os recursos de que necessita para promover o bem comum e a justiça social.

Mas a reforma proposta pelo Governo ensejará uma boa oportunidade para que sejam examinadas questões relevantes, para que se possam aferir as dificuldades, as injustiças, as distorções - que são muitas, principalmente no âmbito das pessoas jurídicas e das empresas. Entre esses desequilíbrios, destaca-se, Sr. Presidente, o fato espantoso de que o setor financeiro, os bancos, é não só um dos mais lucrativos, se não o mais lucrativo, mas também, simultaneamente, um dos setores dos que menos paga imposto, se não o que menos paga imposto.

É essa uma deformação cada vez mais notada, comentada, estudada. É preciso, em nome do bom senso, da lógica, da justiça, que ela seja urgentemente sanada.

Há cerca de quatro anos, o Secretário da Receita Federal de então, Everardo Maciel, eficientíssimo arrecadador de impostos, reconheceu publicamente as falhas e as desigualdades da presente estrutura tributária federal, principalmente a questão da excessivamente estreita base de incidência tributária. Isto é: há muitos deixando de pagar impostos, e os poucos que pagam têm de pagar muito.

Naquela ocasião, foi revelado que há rendimentos de pessoas físicas e jurídicas, no total de 825 bilhões de reais, que escapam à tributação. Essa estimativa baseou-se no movimento das contas correntes bancárias sujeito à CPMF. É muito dinheiro escapando do fisco pelos ralos da sonegação e da elisão - sonegação ilegal; elisão, aproveitando brechas legais.

Assim, no ano-base de 1998, dos 100 maiores pagadores de CPMF, 40 jamais haviam sequer feito declaração de Imposto de Renda. E, pasmem, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dos 66 maiores bancos, 28 não tiveram de pagar Imposto de Renda!

Claro, além do Imposto de Renda, há outros tributos, como a Cofins e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Mas vários estudos apontam para o fato de que também em outros tributos, que não o Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, gozam os bancos de vantagem especial, em total contradição com os lucros excepcionais que eles vêm auferindo nos anos recentes.

Os ganhos do setor financeiro são gigantescos. Os juros básicos da economia, a muito falada taxa SELIC, têm sido muito altos, nos últimos anos, e continuam altos. Mas, no valor de 26,5%, a taxa SELIC é até pequena se comparada com os juros escorchantes para o consumidor no crediário da loja ou para o empresário, na agência bancária. E isso sem falar no cheque especial ou no cartão de crédito. Entre a taxa SELIC e os juros absurdamente altos da economia real do dia-a-dia, está o spread dos bancos, o naco que com eles ficam, a parte do leão, uma caixa preta difícil de visualizar e de controlar.

Só como exemplo temos o seguinte: os juros para empréstimo bancário pessoal, bem mais baixo que os do cheque especial, foram, em média, em base anual, de 102%, no mês de abril. Nos juros cobrados das empresas, a situação não difere, o spread ocupa um espaço abusivo: os juros médios anuais, no mês de abril, foram de 39%, com 15,3% de spread! E os bancos não fazem tanta questão de emprestar. Eles vivem muito bem do que ganham com os títulos do Governo, com a dívida pública. Cerca de 50% de seus lucros vêm dos títulos da dívida pública. E o montante de créditos disponibilizados pelos bancos no Brasil totalizam apenas 23,3% do PIB, um dos menores, mais pífios índices em todo o mundo.

Agora, adicione-se a isso o fato de os bancos pagarem menos impostos que outros setores, e tem-se o tamanho da injustiça, da distorção.

A origem da atual vantagem tributária de que vêm gozando os bancos está na Lei 9.249, de 1995, que extinguiu a correção monetária das demonstrações contábeis das empresas, introduzindo o conceito dos juros sobre o capital próprio. Foi uma mudança importante, que refletia o fim da inflação galopante, mas uma alteração que acabou provocando efeitos muito diferentes nos diversos setores da economia. Alguns setores foram prejudicados; outros, beneficiados.

A publicação Tributação em Revista, em seu número de abril/junho de 2002, contém a respeito um artigo muito esclarecedor, de autoria do auditor-fiscal da Receita Federal Rodolfo Castro Souza Filho. Tomando o perfil médio do grande banco brasileiro, e com base em cálculos para o período de 1996 a 2000, aplicados ao Imposto de Renda e à CSLL, ele demonstrou que, nos anos recentes, os bancos passaram a dever a metade dos tributos que deveriam, obedecidas as regras anteriores a 1996.

Isto é, a política econômica dos últimos anos, de juros altos, favorece o inchaço dos lucros dos bancos, e a atual legislação tributária lhes garante que paguem menos impostos que outros setores da economia.

Há três formas básicas de um banco ganhar dinheiro: primeira, via taxas cobradas pelos serviços prestados; segunda, pelas operações de crédito, função precípua dos bancos; terceira, por meio das operações de tesouraria, como compra e rolagem de títulos públicos. Durante o ciclo da inflação galopante, do início da década de oitenta até 1995, os bancos acumularam resultados fabulosos. Com a inflação baixando a níveis civilizados, os bancos continuaram a exibir resultados invejáveis.

No período inflacionário, nem eram cobradas taxas de serviço, pois a inflação era fonte generosa de ganhos para os bancos. Baixada a inflação, vieram a cobrança de taxas de serviço, a benesse dos juros pagos pelos títulos públicos e os escandalosos spreads impostos pelos bancos a seus clientes. Coroando esse festival de bonança para o setor financeiro, a legislação lhes permite recolher menos tributos.

Sr. Presidente, os privilégios de que gozam os bancos terão de ser examinados em qualquer reforma tributária que se dê ao respeito. O setor produtivo da economia não pode continuar a sustentar essas verdadeiras sanguessugas que estão a tolher e a debilitar a vitalidade da economia brasileira.

Esta Casa, brevemente, precisará enfrentar esse tema com um decidido ânimo reformista. Espero que o Senado possa contribuir para que seja corrigida essa intolerável injustiça.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2003 - Página 15900