Discurso durante a 85ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação da PEC 40/99, que trata de terrenos de Marinha.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS.:
  • Defesa da aprovação da PEC 40/99, que trata de terrenos de Marinha.
Aparteantes
Alberto Silva, Almeida Lima.
Publicação
Publicação no DSF de 27/06/2003 - Página 16460
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, EXTINÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, TERRENO DE MARINHA, CRITICA, SOLICITAÇÃO, ADIAMENTO, MATERIA, ALOIZIO MERCADANTE, SENADOR, REEXAME, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, REGISTRO, URGENCIA, VOTAÇÃO, MOTIVO, OBSOLESCENCIA, LEGISLAÇÃO, NECESSIDADE, SOLUÇÃO, PROBLEMA, ESTADOS, ESPECIFICAÇÃO, LITORAL.
  • LEITURA, TRECHO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ESCLARECIMENTOS, DESTINAÇÃO, TERRENO DE MARINHA, ORGÃOS, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, RESULTADO, ALIENAÇÃO, PROPRIEDADE, BENEFICIO, PROGRAMA, POLITICA SOCIAL.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em meio a tantos temas importantes sobre os quais o Congresso Nacional, sobretudo a Câmara dos Deputados, tem se debruçado ultimamente, um deles está na pauta do Senado e tem passado praticamente despercebido. É por isso que venho hoje à tribuna fazer este alerta aos colegas que, talvez por desinformação, não lhe estejam dando a devida importância.

Trata-se da Proposta de Emenda à Constituição nº40, de 1999, de autoria do ex-Senador Paulo Hartung, hoje Governador do Espírito Santo, que extingue os chamados terrenos de marinha e seus acrescidos. É assunto da maior relevância e que diz respeito mais diretamente - mas não apenas - aos Estados litorâneos.

A PEC já estava na pauta, mas, a pedido do Líder do Governo, Senador Aloizio Mercadante, foi retirada para reexame da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. A meu ver, e espero estar equivocado, a atitude do Líder demonstra intenção de procrastinar uma decisão a respeito de um tema que - pasmem Srªs e Srs. Senadores - foi regulamentado há quase dois séculos e, desde então, vem clamando por um tratamento que reflita as mudanças dos tempos. Seguidamente, ele volta à discussão. Algumas medidas paliativas chegaram a ser tomadas, mas sempre os Governos retardam uma solução definitiva para o problema.

A partir daí, outros instrumentos legais trataram da questão, começando, inclusive, a determinar a cobrança de taxas de ocupação e aforamento, com o viés fiscalista que predomina até hoje. Chegamos, enfim, ao Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, que dispõe sobre os bens imóveis da União e dá a definição de terreno de marinha, que é adotada até os nossos dias.

Diz o texto:

São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 metros medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha da preamar-média de 1831:

a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés;

b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.

E ainda estabelece que “são terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar, dos rios e de lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha”.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é difícil concluir, pela simples leitura do texto legal, que ele está absolutamente desatualizado. Chegou-se à profundidade de 33 metros levando em conta o tiro de um canhão! Falar em terrenos até onde faça sentir a influência das marés é, no norte do País, por exemplo, com o fluxo e refluxo das marés, os encontros das águas de rios e mares, condenar quilômetros e quilômetros à inatividade econômica.

A indeterminação do ponto de “preamar-média” é tamanha que se chegou a situações até bizarras, como as aqui recém-relatadas pelo nobre Senador João Batista Motta. Segundo ele, a Prefeitura de Vitória está inscrita no Cadastro de Inadimplentes da União (Cadin), por não pagar taxas referentes a três praças que, embora sejam consideradas terrenos de marinha, situam-se no centro da cidade. O Prefeito de Vitória, Luiz Paulo Velloso Lucas, ironicamente, chegou a oferecê-las ao Governo Federal para que ele as administrasse. Imaginem, então, Srªs e Srs. Senadores, a repetição de situações assim nas capitais-ilhas, como a própria Vitória, Florianópolis e São Luís!

Parece-me de cristalina obviedade a necessidade de alternar essa situação, que atinge, além dos Governos municipais, milhares e milhares de pessoas que agiram de boa-fé, adquiriram seus imóveis, pagam foros anuais à União e não têm direito a uma escritura definitiva.

No caso das administrações municipais, multiplicam-se os casos em que elas têm de arcar com as despesas de infra-estrutura, enquanto a União só arrecada, nada lhes devolve, apenas lhes cobra uma dívida eterna.

O objetivo do ex-Senador Paulo Hartung, ao fazer a sua proposta, foi dos mais meritórios. Chegamos a conversar a respeito, já que eu, ainda como Deputado, ao lado da Deputada Rita Camata, do Espírito Santo, e do Deputado Edson Andrino, de Santa Catarina, também tinha iniciativas semelhantes, apesar de restritas ao meu Estado.

O Sr. Almeida Lima (PDT - SE) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Em seguida lhe concederei o aparte, Senador Almeida Lima.

A proposta de Paulo Hartung, diferentemente, prevê solução ampla, nacional para um problema que atinge a União, os Estados, os Municípios e milhares de pessoas.

Com muito prazer, concedo o aparte a V. Exª, Senador Almeida Lima.

O Sr. Almeida Lima (PDT - SE) - Senador Heráclito Fortes, parabenizo V. Exª pelo pronunciamento. Esse projeto de emenda à Constituição chamou-me a atenção, porque se trata de problema que envolve não apenas interesses do Estado do Espírito Santo, mas basicamente de toda a costa leste do País, sobretudo da cidade de Aracaju, que tive a oportunidade de administrar. Tomo conhecimento, agora, pelo pronunciamento de V. Exª, de que houve um pedido para reapreciação desse projeto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Nele, já existe um substitutivo. Tive a oportunidade de estudá-lo e verifiquei que, tanto na forma original da Proposta de Emenda à Constituição como no substitutivo, existe uma inadequação, um equívoco. Embora essa proposta seja de grande mérito, de grande alcance social, em nada repara o pronunciamento de V. Exª. Quero somar-me a V. Exª, no entanto, acrescento que, como apresentado no substitutivo, entendo que a emenda que apresentei, salvo melhor juízo deste Plenário, virá para correção, pois a proposta era no sentido de que todos os imóveis cujo domínio útil se encontra nas mãos dos particulares seriam doados, transferidos para os Municípios e esses fariam hasta pública, leilão, assegurando ao proprietário do domínio útil a preferência, o direito de compra. Entendo que isso é um equívoco, tendo em vista que, por exemplo, basicamente 30% dos mais de 250 mil imóveis na cidade de Aracaju, assim como em todo o País, estão nessa situação. Muitos apartamentos foram adquiridos pelo preço de mercado, valor cheio, real, e o proprietário teria, nessa hipótese, que arrematar o imóvel pagando idêntico valor ao que já havia pago anteriormente. Isso vale não apenas para quem tem um apartamento, mas uma casa, um comércio ou até mesmo um lote desocupado.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Senador Almeida Lima, a Presidência lembra que o tempo de aparte é de dois minutos para não comprometer o tempo destinado, de acordo com o Regimento, ao Senador Heráclito Fortes.

O SR. HERÁCLIO FORTES (PFL - PI) - Sr. Presidente, nesta segunda fase, o tempo destinado ao orador é de 50 minutos, não é? (Pausa.)

            O aparte do Senador Almeida Lima é longo, mas esclarecedor. S. Exª tem experiência como Prefeito de Aracaju e acompanha, com cuidado, a questão. Trata-se de um problema que afeta a todos nós, principalmente os que moram em cidades de praia e que sofrem a influência das marés. Recebo, com muita alegria, o aparte de V. Exª, desde que não haja impedimento regimental algum, porque é enriquecedor. Com a ajuda dos Líderes aqui presentes -- o Líder Renan Calheiros é de uma cidade que tem o mesmo problema --, para o qual, tenho certeza, haveremos de encontrar uma rápida solução.

            O Sr. Almeida Lima (PDT - SE) - Agradeço, portanto, a compreensão de V. Exª. Já dava basicamente por concluído o aparte, que reconheço longo. Trata-se de uma matéria que discutiremos em outras oportunidades, até mesmo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e neste plenário, quando a matéria para aqui vier, sobretudo por se tratar de uma proposta de emenda à Constituição, que estará em pauta por mais de uma sessão para discussão e, posteriormente, deliberação. Era exatamente nesse aspecto que queria tocar, dando o valor que o projeto possui, evidentemente, estabelecendo-se as correções necessárias para que não haja um prejuízo enorme para milhares e milhares de pessoas em todo o País. Muito obrigado.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Tem razão V. Exª. O projeto do Senador Paulo Hartung prevê, inclusive, soluções para questões como as que V. Exª acabou de anunciar. É evidente que vários projetos tramitaram pela Câmara dos Deputados e vêm tramitando pelo Senado. Por exemplo, há um projeto do Deputado Edison Andrino, que, com muita competência e vivendo todo o problema de Florianópolis, aborda com bastante segurança o tema. Na legislatura passada, achamos por bem juntar todos os projetos até então em tramitação e fazer uma fusão com este do Senador Paulo Hartung. Na Comissão, temos como Relator nosso companheiro Demóstenes Torres.

Meu caro Senador, peço a V. Exª, pela sua experiência, que façamos um mutirão para solucionar, de uma vez por todas, essa questão.

Concedo também um aparte, com muita alegria, ao Senador Alberto Silva, ex-Governador do meu Estado e ex-Prefeito, por duas vezes, de Parnaíba, uma das cidades que mais padece desse problema.

O Sr. Alberto Silva (PMDB - PI) - Meu caro Senador Heráclito Fortes, é oportuníssimo o problema que V. Exª levanta hoje neste plenário. Conhecemos de perto não só o aspecto legal, mas o aspecto abusivo com que se trata esse problema, por exemplo, na nossa cidade, Parnaíba. Porque está à margem de um rio a metade da cidade, qualquer que seja a construção que tenha que ser feita - nosso Senador Mão Santa foi prefeito de Parnaíba, como eu também - necessita de autorização especial da União. É um despropósito. Como é que o Prefeito dirige a metade da cidade e a outra metade não pode dirigir? Ele não tem nenhuma ação, pode até cobrar algum imposto, mas a construção depende de autorização do patrimônio da União. Então, lembro o seguinte, como uma sugestão: por que as construções, na proposta que está em jogo, teriam que passar e depois ser arrematadas? Não é muito mais simples? Se o terreno é considerado patrimônio da União e se o imóvel tem autorização da União para construir - vamos admitir, por exemplo, a orla de Copacabana, Aracaju, Maceió, Fortaleza e de outras cidades. Imaginemos que aqueles edifícios teriam que ser vendidos outra vez. Então, por que o terreno sai da União e passa para o Município? Os impostos é que interessam à União, porque ela não tomará terreno de ninguém. O que importa - pelo que soube do Líder Mercadante - é que a União perderá muito com a diminuição das taxas. Mas há uma solução salomônica, muito de acordo com o Senador Mão Santa, que de vez em quando cita Salomão: racha-se no meio, metade dos impostos fica para os Municípios e a outra metade para a União, mas não se deve vender nada. O edifício está pronto, os apartamentos foram vendidos e não se deve arrematar novamente. Isso é esdrúxulo e inadequado ao que estamos tratando. Espero que o bom-senso prevaleça e encontremos uma solução. Sugiro que, se o terreno hoje está sob o domínio da União, tudo bem, passa-se para o domínio do Município, como é claro, ou do Estado. Em algumas circunstâncias, as taxas devem ser divididas no meio. Mas quem gerirá o terreno daí para frente? Senador Heráclito Forte, V. Exª está sabendo que, nas nossas praias de Luís Correia, não se pode consertar uma casa, sequer um reboco? Se o cidadão que estiver lá disser que não pode, então não pode. Prende-se a sociedade? Quem tem uma casa cujas paredes estão caindo, querendo consertá-la, não pode, tem que deixá-la cair? Que história é essa? Isso não bate com a necessidade de desenvolvimento das cidades deste País, principalmente as litorâneas. Parabenizo V. Exª pela oportunidade. Espero que o nosso Partido, o PMDB, apóie essa proposta, para que seja aprovado rapidamente.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Agradeço o pronunciamento de V. Exª. Nós vivemos essa situação. Mais adiante, irei discorrer sobre o tema. Somos de um Estado com apenas 166 quilômetros de praia, mas temos problemas na mesma dimensão dos da Bahia ou de Estados com uma área litorânea bem maior.

Aliás, no nosso Piauí, em determinado momento da vida brasileira, andou-se confundindo terreno de marinha com terreno da marinha. Havia constrangimentos como os que V. Exª acaba de relatar.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, durante a tramitação o projeto recebeu emendas que aperfeiçoaram o texto, consubstanciadas em substitutivo do nobre Senador Osmar Dias.

Ainda assim, entendo que devemos aprofundar o debate. Eu mesmo estou apresentando uma emenda com o objetivo de vincular o uso dos recursos que virão da venda das propriedades à elaboração, pelas Prefeituras, de um plano diretor, para que a ocupação não seja feita desordenadamente.

Sugiro ainda que o texto garanta algum tipo de preferência aos moradores mais pobres desses terrenos, muitos dos quais ocupados por colônias de pescadores, que não têm recursos ou alternativas de sobrevivência.

Também defendo, Srªs e Srs. Senadores, que pelo menos parte desses recursos recebidos sejam destinados a programas habitacionais para a população de baixa renda. Acredito, que com esses cuidados, estaremos protegendo os posseiros mais humildes e não aqueles que eventualmente possam estar interessados em especular com esses terrenos. Ressalte-se que a mesma preocupação teve o Relator, ao acatar emenda do nobre Senador Romero Jucá, que destina parte dos recursos ao Fundo de Combate à Pobreza.

            Estaremos, igualmente, instando os Executivos municipais a se debruçarem sobre os problemas gerados por essa legislação arcaica, procurando tratamento definitivo para a questão.

Agora vejamos quais motivos que o nobre Líder do Governo nesta Casa alegou para, de maneira no mínimo açodada, já que a PEC estava no primeiro dia de discussão, levar a proposta para o reexame da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Citando a Secretaria de Patrimônio da União, ele sustenta que a estimativa de arrecadação com a administração e fiscalização dos terrenos de marinha e seus acrescidos esteja na ordem de R$150 milhões, quantia irrisória diante de cerca de R$600 bilhões que o País precisa e pretende arrecadar este ano.

Está claro que a SPU não tem estrutura nem para arrecadar nem para fiscalizar a ocupação dessas terras, o que é demonstrado não apenas pelo pouco arrecadado, como pelas cobranças cumulativas que surpreendem muitos dos ocupantes desses terrenos, que chegam a receber contas retroativas estratosféricas. O que custa para o contribuinte, em estrutura e pessoal, manter e gerir esse patrimônio?Por que tamanha resistência em mudar?

O próprio Líder Mercadante afirma, ao justificar o seu requerimento, que há créditos patrimoniais da União, inadimplidos na ordem de R$1 bilhão e 600 milhões, que poderiam correr riscos ainda maiores, caso a emenda seja aprovada. Trata-se de confirmação da falta de condições do Poder Público de gerir esse patrimônio.

É bom que se frise que a PEC extingue os terrenos de marinha e propõe que os imóveis que perderão essa condição tenham a sua propriedade assim definida:

1 - continuam no domínio da União aquelas em que estão edificados prédios públicos que abriguem órgãos ou entidades da administração federal;

2 - passam à titularidade dos Estados onde se situam aquelas em que edificados prédios públicos que abriguem órgãos ou entidades da administração estadual;

3 - permaneçam sob o domínio dos respectivos donatários aquelas doadas mediante prévia autorização em lei federal;

4 - passam à propriedade dos Municípios onde estejam situadas aquelas não enquadráveis nas hipóteses anteriores e as áreas atualmente cedidas, locadas, arrendadas ou aforadas a terceiros pela União.

A proposta também assegura a observância de todos os procedimentos legais, incluindo a necessidade de licitação, além de prever prazo para que a União especifique as áreas em que deve ficar mantido o seu domínio para preservar atividades de vigilância e segurança da costa.

Acredito serem insustentáveis, na situação em que lamentavelmente se encontram as nossas Forças Armadas, as alegadas razões de proteção da nossa ampla costa, até porque elas também foram contempladas.

Ou seja, todos os cuidados foram observados na tentativa de se chegar a uma fórmula que satisfaça a União, mas que contemple as demais partes envolvidas. Se ela ainda não é satisfatória, que se apresentem argumentos e propostas, mas não com o objetivo de protelar mais uma vez uma solução para o problema.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, V. Exªs hão de pensar que tamanho interesse pode ter um representante de Estado com apenas 66 Km de litoral! É fato: o Piauí tem a menor faixa de todos os Estados brasileiros banhados pelo mar. Mas a questão mexe de tal maneira com as populações e as prefeituras que não há como ignorá-la.

Embora o Piauí tenha uma faixa de litoral tão pequena, são grandes os interesses envolvidos. Hoje, somente a cidade de Parnaíba tem 4 mil imóveis cadastrados como terreno de marinha que abrangem três bairros pobres do município. E isto porque, recentemente, foi feita uma revisão da linha demarcatória, pois, caso contrário, a área seria bem maior. A situação, porém, é ainda precária pois está dependendo de definição legal definitiva.

Parcerias e acordos entre o Serviço de Patrimônio e a prefeitura permitiram urbanizar parte desse total. O Governo do Estado, no entanto, está em atraso com as taxas de ocupação, que também pode levá-los ao Cadin. Há ainda centenas de casos (em torno aproximadamente de 700) com direito à isenção das taxas, bastando para isso provar que a renda familiar é inferior a três salários mínimos.

Além de Parnaíba, uma cidade que é pólo regional, temos Luís Correia, Cajueiro da Praia e Ilha Grande, cidades que dependem basicamente do turismo e estão perdendo investimentos para os Estados vizinhos em decorrência das indefinições da legislação.

Quero lembrar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que recentemente perdemos um grande investimento em hotelaria para um vizinho, o Estado do Ceará, exatamente por não termos áreas definidas para que os investidores, no caso estrangeiros, colocassem ali o seu investimento.

Como podem ver, Srªs e Srs. Senadores, o exemplo, num universo bastante reduzido, dá bem a dimensão que o problema pode atingir em Estados onde os terrenos são mais valorizados, a costa é maior, a ocupação ainda mais desordenada, favorecendo a especulação e grupos com maior poder econômico.

E não há nada que nos leve a crer que, num horizonte mediano, algo mude tão drasticamente neste panorama, que venha a fazer com que a União de repente passe a ter estrutura, pessoal e recursos para regularizar a situação, não apenas passada, mas também daqui para frente.

Até aqui, somente as administrações municipais têm arcado com as despesas de iluminação, calçamento, enfim, todas as benfeitorias necessárias. Não é justo que esta situação persista, ainda que a União não queira abrir mão de sua arrecadação.

A solução que a PEC nos traz, no entanto, como já foi dito, é a de repartir as receitas provenientes das alienações dos terrenos igualitariamente entre os municípios em cujas áreas se situem os imóveis alienados e a União - como bem solicitou o Senador Alberto Silva -, passando a parcela desta última a constituir recurso vinculado ao Fundo de Combate à Pobreza, atendendo ao projeto do Senador Romero Jucá.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acredito que, depois deste alerta, meus colegas, sobretudo dos Estados litorâneos - e ainda mais aqueles cujas capitais situam-se em ilhas, como Vitória, São Luís e Florianópolis - se darão conta do alcance desse importante projeto do ex-Senador Paulo Hartung e nos debruçaremos todos sobre o seu texto para encontrarmos a solução mais justa e satisfatória para todas as partes envolvidas, com a maior rapidez possível.

Um passo importante já foi dado com a escolha do Senador Demóstenes Torres, meu colega de Bancada, para relator o projeto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Homem equilibrado, de fartos conhecimentos jurídicos e de um Estado sem envolvimento direto com o problema, o Senador Demóstenes Torres terá certamente a serenidade e o empenho necessários para conduzir este debate. Aguardemos que o Governo também demonstre os mesmos propósitos para que, então, possamos finalmente e construir um consenso que nos leve, como disse, a uma solução justa e definitiva.

Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/06/2003 - Página 16460