Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Repúdio às manifestações do Presidente da República contra o Governador Joaquim Roriz e sua vice, Sra. Maria de Lourdes Abadia.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Repúdio às manifestações do Presidente da República contra o Governador Joaquim Roriz e sua vice, Sra. Maria de Lourdes Abadia.
Publicação
Publicação no DSF de 02/07/2003 - Página 16817
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, GOVERNO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AUSENCIA, CUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL, FALTA, CONTROLE, ATUAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, TRABALHADOR RURAL, APREENSÃO, PREJUIZO, AGRICULTURA, BALANÇA COMERCIAL.
  • REPUDIO, CONDUTA, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MANIFESTAÇÃO COLETIVA, OPOSIÇÃO, MARIA DE LOURDES ABADIA, VICE-GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), REPRESENTANTE, GOVERNADOR, ENCONTRO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • PROTESTO, MANIFESTAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APOIO, PERDA, MANDATO, GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • CRITICA, AUTORITARISMO, GOVERNO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AMEAÇA, EXPULSÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), OPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Líder José Agripino Maia foi sintético, preciso e abrangente, ao mesmo tempo, ao falar das dúvidas e equívocos de um Governo, que, aos seis meses, já mostrou o seu perfil, mesmo quando - eu me refiro ao administrativo - não demonstrou perfil algum, até porque não começou a operar, não começou a trabalhar, não começou a fazer, não começou a produzir.

Mas é inquietante que já tenha surgido a primeira dúvida ética. Quero aqui, reforçando o discurso dos Senadores Jefferson Péres e Osmar Dias, dizer que ontem eu já havia tomado a providência de requerer os convites para que as autoridades implicadas nessa denúncia venham ao Senado Federal e aqui possam, de maneira muito expressiva, dirimir quaisquer dúvidas que possam pairar sobre as cabeças dos brasileiros.

O MST é um descalabro, uma ameaça, a médio prazo, à balança comercial brasileira. Uma ameaça, portanto, aos resultados que não têm sido fracassados, mas também não lograram êxito, da política macroeconômica do Governo Lula.

Amanhã, discutirei economia, depois de amanhã novamente economia, mas hoje quero usar o tempo que me resta desta comunicação de Liderança para, aos seis meses do Governo Lula, revelar a minha inquietação e a minha tristeza diante dos rumos autoritários que começam a ser manifestados pelo Governo.

Primeiro, essa forma inquisitorial, até cruel, com que o Partido dos Trabalhadores trata os seus dissidentes, cobrando deles fidelidade a uma postura assumida pelos maiorais do Governo há menos de um ano. Não se trata de uma decisão de Congresso, não se trata de nada antigo, trata-se da leviandade seguinte: “eu mudei, você trata de mudar o meu lado, senão é expulso do meu convívio”. Isso se espalha para outros segmentos da vida nacional, a partir de algo que defino como sendo o caráter autoritário de um Governo que é autoritário.

Ontem, a Governadora do Distrito Federal em exercício, Vice-Governadora que é, Maria de Lourdes Abadia, comparece, em lugar do Governador Joaquim Roriz à reunião dos Governadores. Depois, ao Palácio do Planalto, para uma solenidade presidida pelo Presidente Lula.

Lá havia, pelo o que as fotos mostram, dezenas de pessoas literalmente fantasiadas de estrelas, com roupas partidárias. E, até aí, a Constituição garante que cada um se vista, desde que se vista, pior seria a nudez. Desde que se vista, a Constituição garante que cada um ande com a roupa que melhor lhe convier.

Mas vaiaram a Governadora Maria de Lourdes Abadia ontem! Atitude covarde, porque ela não podia reagir. Algo antidemocrático, porque ela estava ali como representante oriunda das urnas, representante de um povo. Atitude que revela a vontade enorme que certas figuras desse governo teriam de sentir que não poderia haver quem a eles fizesses oposição. Vaiaram a Vice-Governadora, criando um constrangimento enorme!

É preciso que o Presidente Lula faça uma reflexão e parta para uma inflexão, para uma mudança de atitude. Porque não podemos viver submetidos, ao que me parece, a uma certa ética religiosa exacerbada, aquela do tipo: “Eu sou o bem; o meu adversário é o mal!”. Fundamentalista, do tipo: “Eu faço tudo o que precisar ser feito!” E tudo aquilo que fizer haverá de encontrar justificativa ética, porque, supostamente, “eu, do Governo, eu, do PT, estou acima do bem e do mal, sou melhor do que as demais pessoas!” E o resultado é que estamos vendo essa crise a ponto de, hoje, dizermos que eles, que falam de maneira tão apressada e, às vezes tão doidivanas, sobre essa tal herança maldita que teriam recebido do governo passado, receberam foi uma herança bendita: oito anos de consolidação da democracia neste País! A fase mais conseqüente de liberdade democrática que já se viu neste País e mais duradoura começa a ser ameaçada seja pelo MST, que desafia a autoridade presidencial e a ordem em que está estabelecida e assentada a economia brasileira, a começar pela agricultura, a parte mais dinâmica da economia, passando pelas manifestações que demonstram intolerância e desrespeito.

O próprio Presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem dado mau exemplo, ao se dirigir ao candidato derrotado no Distrito Federal, Geraldo Magela, e dizer-lhe que será governador brevemente. Mas há uma decisão da Justiça que poderá cassar ou manter o mandato do Governador Joaquim Roriz. A Justiça agirá soberanamente, e o Presidente precisa aprender isso de uma vez por todas. Se a Justiça entender que deve cassar o mandato do Governador Joaquim Roriz, cassará. Se entender que deve manter, manterá. O Presidente da República não tem nada a ver com isso, não tem direito algum de meter a colher no episódio, não tem a menor possibilidade de imaginar que é - segundo a Presidente do Instituto Teotônio Vilela, a Deputada Yeda Crusius - uma versão neomoderna da Santíssima Trindade. Ao invés de Pai, Filho e Espírito Santo, Sua Excelência sendo o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário ao mesmo tempo. Manifestação autoritária devemos matar no nascedouro. Não podemos nos calar diante de manifestações autoritárias. Manifestação autoritária é para ser derrotada, como fizemos com a ditadura militar, com a cooperação de Luiz Inácio Lula da Silva, inclusive.

Há uma frase de Bertolt Brecht que diz que quando os cidadãos se transformam em cordeiros, os governantes, necessariamente, se transformam em lobos. Conheci o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva quando era um cidadão que não admitia que o fizessem de cordeiro. Bravo líder sindical, bravo resistente contra o regime de força, democrata que se afirmava na luta e no sofrimento. Não posso, de maneira alguma admitir, até por homenagem a Lula e ao seu passado, se ele não permitiu que a ditadura militar fizesse dele um cordeiro, não permitirei que ele sofra a outra parte da deformação, que ele, imaginando que somos uma nação de cordeiros, se transforme em lobo da opressão, da tirania, do pensamento único, da ditadura, do desrespeito à liberdade democrática que construímos com tanto afinco, com tanto risco neste País.

Discordar é mais que normal; combater um governo é o fato mais necessário para termos uma democracia sólida. O que não é possível é alguém imaginar que seu Governo paira acima do bem e do mal, principalmente quando sabemos que o Brasil vivencia um dos governos mais inoperantes da sua história, um governo que vive de bons resultados macroeconômicos que meramente repuseram o Brasil no terreno da normalidade que a candidatura de Lula e seu favoritismo haviam abalado a partir de maio, junho do ano de 2002.

De resto, estamos vendo os equívocos na forma de lidar com as agências. Iniciei meu mandato dizendo que, lidando mal do jeito que estão com as agências, iriam afugentar capitais do País. Pois estão mesmo afugentando capitais do País. Empresas estão fechando, empresas estão indo embora, o desemprego está ocorrendo também por isso. E o Brasil este ano talvez não receba R$10 bilhões de investimentos estrangeiros diretos.

O MST desafia a autoridade do Presidente, e o Presidente permite que militantes seus afirmem sua vocação autoritária para cima da vice-Governadora do Distrito Federal, Maria Abadia, mulher sensível, desarmada, delicada.

Gostaria de mais energia em relação ao desafio à construção que o MST faz e gostaria de mais compreensão para com o pensamento dos outros. Digo isso como alguém que não admitiu que sua voz fosse calada em nenhum momento, seja na política regional, seja na política nacional, seja quando enfrentei a ditadura militar. Portando, não preciso de autorização de ninguém para fazer oposição no âmbito que eu quiser; quando eu quiser que ela seja quente, será quente, quando eu quiser que ela seja morna, será morna, quando eu quiser que ela seja gelada, será gelada; o dia que eu não quiser fazer, não faço, o dia que eu quiser, faço duas vezes. Simplesmente, essa escalada autoritária, essa vaia ao adversário no Palácio do Planalto, além de ser falta de educação, significa, sem dúvida alguma, a idéia de que no coração de alguns pulsa a vontade de sufocar liberdades, pulsa a vontade de impor o pensamento e pulsa a vontade de transformar em cordeiros uma nação que passaria a ser governada por lobos. Esta Nação já mostrou, até pela coragem do Presidente Lula num passado recente que não é uma nação de cordeiros e, portanto, ela vai proibir S. Exª e seus acordes, de tentarem, eles próprios, fazerem o papel do lobo a ameaçar as liberdades fundamentais do cidadão, a começar por esta de a governadora ser respeitada, de podermos fazer, de maneira bem livre e sem constrangimentos físicos ou psicológicos impostos de maneira ilegal, a Oposição que temos que fazer a um governo que abre, nos próximos meses, tendo cumprido seis meses de inércia, de mediocridade, de inoperância, seis meses de quase não fazer.

Até diria, encerrando, que discutir o macroeconômico não custa muito à honestidade intelectual que haverei de preservar, e o governo é aprovado aí. Discutir o microeconômico diria que é fácil também porque os erros são tão graves em relação à política para as agências, à política para julgar o instrumento regulador que por aí se começa a desenhar um certo desastre para a economia brasileira. Discutir o governo em si é difícil porque não tem governo para se discutir. É preciso que o Governo comece a governar, para que possamos até fazer críticas mais sólidas.

Por agora, digo que o Governo não opera o social, não opera o Programa Fome Zero; o Governo viaja, o Presidente sorri, abraça, beija, e seus militantes vaiam e ameaçam as pessoas que são contra o Governo. Essa dicotomia um dia será esclarecida, e que seja esclarecida pelo passado do Presidente Lula, não pelo futuro obscuro de uma nação de cordeiros governada por lobos. Sua Excelência precisa voltar a ser o amante da liberdade que sempre foi. Afirmaremos o tempo inteiro que não somos uma nação de cordeiros e, portanto, ai do lobo que imaginar que poderá fazer mal ao reinado da liberdade neste País. Muito obrigado, Sr. Presidente.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/07/2003 - Página 16817