Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Desmistificação da relação entre o aumento da compra de armas de fogo e o aumento da criminalidade.

Autor
Juvêncio da Fonseca (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Juvêncio Cesar da Fonseca
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Desmistificação da relação entre o aumento da compra de armas de fogo e o aumento da criminalidade.
Aparteantes
Augusto Botelho.
Publicação
Publicação no DSF de 04/07/2003 - Página 17035
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • DEBATE, MATERIA, TRAMITAÇÃO, SENADO, REFERENCIA, REGISTRO, PORTE DE ARMA, CRITICA, PROPOSTA, DESARMAMENTO, FAMILIA, AUSENCIA, PROTEÇÃO, CIDADÃO.
  • COMENTARIO, DADOS, REDUÇÃO, REGISTRO, PORTE DE ARMA, AUMENTO, HOMICIDIO, AUSENCIA, CORRELAÇÃO, QUANTIDADE, ARMA, OCORRENCIA, CRIME.
  • DEFESA, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, CONTRABANDO, ARMA DE FOGO, ESPECIFICAÇÃO, FRONTEIRA, REGIÃO CENTRO OESTE, DESARMAMENTO, CRIMINOSO.
  • DEFESA, CENTRALIZAÇÃO, POLICIA FEDERAL, SISTEMA NACIONAL, CADASTRO, REGISTRO, ARMA DE FOGO, UNIFICAÇÃO, DADOS, TERRITORIO NACIONAL.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, REDUÇÃO, NUMERO, ARMA, REGISTRO, CIDADÃO, SELO, ARMA DE FOGO, COLECIONADOR.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Senadores, V. Ex.ªs perceberam que hoje eu estava ansioso por usar da palavra desta tribuna do Senado Federal, para tratar de um assunto momentoso e importante que aflige muitas famílias, a família brasileira.

Refiro-me aos projetos em andamento nesta Casa que versam sobre armas, principalmente armas de fogo, e que tratam do porte, do registro e da condução da arma no meio da sociedade. Eu estava ansioso para fazer esse pronunciamento, porque a sociedade sul-mato-grossense está a exigir a nossa atitude diante desses projetos que tramitam no Senado Federal. A população exige uma postura dos Parlamentares, pois o assunto é importantíssimo para a segurança da família brasileira.

Muitos me disseram que, se eu defender a posse de arma para a família, para o homem de bem, alguns dirão que faço parte do lobby da indústria das armas no País.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, realmente faço parte de um lobby importantíssimo, que tem ressonância em todo o território nacional: estou atendendo ao grande lobby da família brasileira, que se sente insegura diante da ausência do Estado na repressão do crime.

Sr. Presidente, é evidente que o crime está crescendo assustadoramente e que a impunidade grassa no País. Já existe no Brasil território que é do bandido e não do Estado; e armas controladas pelos bandidos e não pelo Estado.

Nesta Casa, há projeto visando desarmar a família, o homem de bem, o homem honesto que tem uma arma em casa para a proteção da sua vida e do seu patrimônio.

Um dos grandes equívocos das propostas expostas publicamente, de maneira errônea, e alardeada pela imprensa, é a afirmação de que o aumento da venda de armas é diretamente proporcional ao aumento da criminalidade no território nacional. Isso não é verdade. A venda legal de armas no Brasil está declinando faz tempo, e o crime cresce a cada dia. A cada dia a família brasileira tem maior desassossego; a cada dia parece que a impunidade cresce, principalmente para aqueles que praticam os crimes mais hediondos.

Eu gostaria de desmistificar a questão da relação criminalidade crescente com a crescente venda de armas. Tenho em mão um quadro feito pela polícia do Estado de São Paulo com referência à emissão de portes de arma naquela capital. Em 1994, foram expedidos 69.136 portes de arma. Em 2002, 3.900. Veja, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que a relação é completamente inversa. Registro de arma é diferente de porte; em 1994 foram 42.090, já em 2002, 10.066. Temos números completamente declinantes. Inverso ao crescimento do crime no País. E quando falo em registro de arma, falo do número de armas vendidas legalmente no País, porque uma arma é vendida legalmente junto com seu registro. E vejam V. Exªs os dados relativos às armas de fogo apreendidas no Estado de São Paulo - e quando se apreende a arma por ser ela ilegal está-se tirando tal arma de circulação. Se entraram, em 1994, 42.000 armas registradas, em 1996 foram apreendidas 29.366; em 2002, se foram registradas, compradas, 10.000 armas, foram apreendidas 37.900, ou seja, foram tiradas de circulação no Estado de São Paulo milhares de armas.

Outro dado importantíssimo da correlação equivocada entre arma e crime é que o Rio Grande do Sul tem três vezes mais armas que o Rio de Janeiro e quatro vezes menos homicídios. O Rio Grande do Sul tem dez milhões de habitantes, mais ou menos, e tem 937 mil armas legais em estoque, enquanto o Rio de Janeiro tem quatorze. São Paulo tem 36 milhões de habitantes e só tem 495 mil armas em estoque.

Vejam que essa relação entre criminalidade e venda legal de armas no País não é verdadeira. A justificativas dos projetos nesse sentido são fora da realidade, é utopia estatística, são estatísticas que não existem.

Eu daria ainda mais alguns dados. Em 1980, houve 10 mil homicídios no Brasil, enquanto foram vendidas 51 mil e 945 armas. Em 2001 os homicídios, de dez mil, foram para 41.176, enquanto as armas vendidas baixaram para 36 mil.

Vejam V. Exªs, mais uma vez, como as informações públicas que estão ao conhecimento do brasileiro, principalmente através da imprensa escrita, falada e televisada, não correspondem à realidade do Brasil. E querem de qualquer maneira desarmar o homem honesto, a família brasileira, o homem de bem, como se ele estivesse praticando o crime na rua, como se ele fosse o autor de todos esses homicídios que grassam neste País. Homicídios que, na sua maioria, são produtos do crime que está na rua, do crime que grassa no território nacional com a ausência efetiva, eficiente do Estado.

Ficamos apreensivos, na nossa casa, tentando, de qualquer maneira, proteger a nossa família, o nosso patrimônio e até a nossa vida. Enquanto isso, estão querendo tomar da nossa mão a arma, como se ela fosse um produto ilícito, muito embora a Constituição dê a cada brasileiro o direito à legítima defesa, com o uso dos instrumentos necessários para essa legítima defesa que quase sempre é a arma de fogo.

Tenho mais dados, Srs. Senadores. No Brasil, 62,7% dos homicídios que ocorrem são com arma de fogo, o que é um índice altíssimo. E é por ser esse índice muito alto que tínhamos que coibir, de uma vez por todas, efetivamente, o contrabando das armas que entram, principalmente, pelas fronteiras do Centro-Oeste, sem qualquer controle.

A eficiente Polícia Federal, a competente Polícia Federal, está procurando agora se preparar para um grande trabalho de contenção desse contrabando nas fronteiras, mas nem isso existe atualmente. Mas a culpa dos homicídios, do uso da arma de fogo, é da família, é do homem honesto; não é do contrabando, do narcotráfico ou das quadrilhas, mas sim do homem honesto. Com isso não podemos concordar!

Mas observem V. Exªs que, nessa estatística do Brasil, 62,7% dos homicídios são por arma de fogo. Vamos comparar com o Japão. No Japão, apenas 3,1% são com arma de fogo. Mas, com objeto cortante ou penetrante, no Brasil, é 11,8%; no Japão são 37,3%. Então, temos que tomar as facas também. Breve ficaremos apenas com a borduna indígena como a grande ferramenta de defesa. Vamos voltar à selva!

Veja, no Japão também: enforcamento e estrangulamento, 24%; no Brasil, 0,9%, não dá 1% por estrangulamento e enforcamento.

Força corporal, no Japão, 14,2%; no Brasil, 0,4%.

E, se compararmos com a Alemanha, com a Holanda, com a Austrália e com outros países, veremos que a situação é quase a mesma. Aqui há uma preferência para arma de fogo. Temos que coibir isso! Mas não significa que a família tem que ser desarmada.

Existe uma legislação muito importante a que gostaria de me referir, uma legislação que, por si só, pode coibir a prática. Se for realmente cumprida, se o seu cumprimento for objeto do trabalho da Polícia e se houver a ação fiscalizadora do Poder Público, é certo que se trata de uma das legislações mais perfeitas do País.

É possível para o homem comum possuir registro e porte de arma - são duas coisas distintas. No ato da compra, a pessoa recebe o certificado de registro de arma, fornecido pela Polícia Civil dos Estados, com autorização do Sinarm - Sistema Nacional de Armas e Munição, de gestão da Polícia Federal. O porte de arma é concedido pela Polícia Federal.

Ora, são duas fontes. Antes de registrar a arma, de acordo com a legislação, deverá ser averiguado se há contra o interessado ocorrência policial ou antecedentes criminais que o descredenciem a possuir arma de fogo. Se houver, será indeferido o registro. Obrigação do proprietário da arma: guardar a arma de fogo com a devida cautela, evitando que fique ao alcance de terceiros, principalmente menores. Já o porte de arma conta com várias outras exigências: capacidade técnica no manuseio da arma, capacidade psicológica, exercício de atividade produtiva, condições pessoais. E essas mesmas condições já estão sendo exigidas pelas Polícias estaduais para o registro da arma. Quando é concedido o registro da arma, o cidadão pode tê-la em casa - não pode sair com ela - ou empresa, desde que seja o seu titular.

Ora, por que, então, vamos tirar o porte de arma da família brasileira? Para coibir o crescimento da criminalidade? Para evitar que o crime aconteça? Para fazer com que haja um freio nas mortes ocorridas no País?

Mas não temos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, segurança para sair à noite. Já se fala, na minha cidade, em Lei Seca, e que todo e qualquer estabelecimento deve ser fechado às 10 horas, ou às 11 horas, ou à meia-noite, para evitar que aconteçam os crimes. Mas as famílias devem fechar as portas de suas casas talvez mais cedo, para evitar arrombamento, invasão, crime que podem acontecer contra suas famílias.

Neste momento em que estamos trabalhando a legislação em tramitação sobre porte de arma, já que algumas das propostas falam em proibição de porte e outras, mais radicais e absurdas, proíbem a fabricação e venda de armas de fogo neste País - essa é a mais absurda delas -, eu diria que a proposta de bom senso é a que faz prevalecer o registro da arma e o porte de arma, desde que analisado com cuidado. Portar uma arma em lugares públicos talvez não seja adequado a qualquer hora, mas ter o registro da arma e poder tê-la em casa para defesa de sua família, ou na empresa, para defesa própria e proteção da empresa. Isso eu creio que seja imprescindível para o exercício da cidadania.

Concedo o aparte ao Senador Augusto Botelho.

O Sr. Augusto Botelho (PDT - RR) - Senador Juvêncio da Fonseca, gostaria de fazer uma pergunta: hoje, o crime invade a nossa casa, invade o condomínio, invade tudo, sabendo que pode haver uma arma dentro. O que farão os criminosos quando tiverem certeza de que não haverá nenhuma arma dentro de nossa casa? Como ficará?

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PMDB - MS) - A pergunta de V. Exª foi o que ouvi de mais inspirado hoje, nesta Casa, Senador Augusto Botelho. Tem uma significação importante. É como se dissesse: “Senador Juvêncio, V. Exª se esqueceu de dizer isso”. É fundamental, porque, tirando a arma da mão da família, tira-se dela a proteção. Se o bandido está lá fora, agora será encorajado a invadir a residência. Se for aprovada a lei que desejam para este País, de desarmamento dos homens honestos, será tirado das mãos da família justamente o instrumento de defesa legitimamente previsto na Constituição Federal. Pode-se, sim, usar uma arma, qualquer instrumento, para repelir uma injusta agressão, seja à sua casa, seja ao seu patrimônio, seja à sua vida.

Obrigado, Senador Augusto Botelho, seu aparte foi providencial.

Desejo agora complementar um pouco mais a minha explanação, aproveitando meus últimos dois minutos. Parece-me que se está se formando uma Comissão para analisar todos os três ou quatro projetos que estão sendo trazidos a esta Casa, a fim de se fazer uma emenda substitutiva única e submetê-la, ainda neste recesso, à apreciação desta Casa e da Câmara Federal. Eu diria que o Sistema Nacional das Armas e Munição, juntamente com a questão do registro e do porte, deveriam ser centralizados na Polícia Federal. A Polícia Federal tem credibilidade - não digo que tenha estrutura hoje, mas poderá ter em breve - para cadastrar, fazer o registro e acompanhar o destino dessas armas, expedir os certificados de registro de armas, fazendo, assim, um trabalho nacional unificado, diferente do trabalho realizado hoje pela própria Polícia Federal e por todas as Polícias Civis do País.

Talvez a falta de centralização esteja acarretando hoje as dificuldades de disciplinar o porte e o registro de armas, porque o Estado, Srªs e Srs. Senadores, precisa ter esse controle e saber quantas foram vendidas, quantos registros e quantos portes existem. E isso tem que ser feito por um órgão único. E vou tentar propor, no substitutivo, justamente isso.

A segunda parte do assunto que gostaria de abordar é que cada cidadão, pela legislação atual, pode ter até seis armas de fogo - o que acho muito: duas curtas, duas longas com raia, e duas de alma lisa (cano liso). Penso que podemos restringi-las, passando para: uma curta, uma longa com raia, outra de cano liso. É importante restringir o número de armas registrado.

Em relação aos colecionadores, é importante que exista coleção de armas em qualquer País, pois resguarda a história das armas. Entretanto, essas armas precisam ser muito fiscalizadas, já que há colecionadores com verdadeiros arsenais em casa.

Proporei um dispositivo de lacre para armas de coleção, para que não possam ser detonadas. Serão manuseadas por quem quer que seja, estarão expostas na coleção, mas não poderão ser utilizadas mecanicamente para disparo.

Penso que são de grande importância essas três observações. Lutemos por isso agora, na Comissão que fará o substitutivo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cumpro minha tarefa de expor o meu ponto de vista para o País, principalmente para o meu Estado, o querido Mato Grosso do Sul, onde há uma preocupação muito grande, na cidade e no campo, de proteção da família, em especial na fronteira Brasil/Paraguai, na fronteira Brasil/Bolívia, na fronteira do Centro-Oeste, onde o contrabando de arma não é, de forma nenhuma, identificado, controlado ou fiscalizado por qualquer Polícia. Todos estão armados: os homens de bem e os bandidos.

Vamos propor à Nação, então, desarmar os bandidos e armar o homem sério e honesto na sua casa, para defesa do seu patrimônio, da sua vida e de seus filhos.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/07/2003 - Página 17035