Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem pelo centenário de nascimento do escritor mineiro Pedro Nava. Preocupação com a extinção do incentivo à cultura, proposta preconizada na reforma tributária.

Autor
Eduardo Azeredo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
Nome completo: Eduardo Brandão de Azeredo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL. REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Homenagem pelo centenário de nascimento do escritor mineiro Pedro Nava. Preocupação com a extinção do incentivo à cultura, proposta preconizada na reforma tributária.
Publicação
Publicação no DSF de 08/07/2003 - Página 17266
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL. REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, PEDRO NAVA, ESCRITOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, LITERATURA, BRASIL.
  • ANALISE, LEGISLAÇÃO ESTADUAL, INCENTIVO, CULTURA, UTILIZAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), REITERAÇÃO, APREENSÃO, PREJUIZO, REFORMA TRIBUTARIA.

O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta rápida comunicação desejo fazer um registro que cala especialmente na alma de Minas, terra que aqui represento, mas, igualmente, fala ao espírito de todos os brasileiros que cultivam nossa literatura.

É com grande alegria que tomo conhecimento de que entidades literárias de todo o Brasil deram início, agora em junho, às comemorações do centenário de nascimento do notável escritor Pedro Nava.

No Rio, em São Paulo e em Belo Horizonte, principalmente, estão programados diversos eventos destinados a esmiuçar a impressionante obra literária de Pedro Nava e a divulgar a rica biografia desse autor singular da língua portuguesa.

Pedro Nava, Sr. Presidente, nasceu em Juiz de Fora, Minas Gerais, em 5 de junho de 1903. Formou-se em Medicina e, por mais de cinco décadas, dedicou-se, com visão de cientista, à sua clínica de reumatologia no Rio de Janeiro.

Foi, na sua especialidade, um médico exponencial, como afirmam os estudiosos desta faceta do homem Pedro Nava.

No entanto, a literatura tornou-se o seu grande amor. É através dela que o nome de Pedro Nava resplandecerá para sempre em nosso País.

Dissemos que Nava é um autor singular. Com efeito, Srs. Senadores, Pedro Nava, embora desde sempre ligado à cultura, tendo como companheiros de mocidade os poetas Carlos Drummond de Andrade e Abgar Renault, só publicou o primeiro de seus livros aos 70 anos de idade!

O Brasil inteiro saudou o aparecimento de Baú de Ossos, livro que revolucionou a maneira de como fazer literatura memorialística. De como contar o que se passou com uma pessoa. Daquilo que chamamos autobiografia.

Depois do sucesso estrondoso de Baú de Ossos, Pedro Nava lapidou mais cinco jóias da literatura: Balão Cativo, Chão de Ferro, Beira Mar, Galo das Trevas e O Círio Perfeito. Todos esses livros eram avidamente aguardados por milhares de leitores que se encantaram com a narrativa do autor.

Nava foi comparado a Proust. Ele não só contou a sua fecunda vida, desde a infância, como recompôs a de seus pais, avós, bisavós, tetravós. Nas páginas de seus livros, fazemos uma viagem de magia e encantamento, do Rio de Janeiro para Minas, e de lá para o Maranhão e o Ceará de seus avoengos.

Ao compor essas páginas de memórias, Nava ergueu um precioso mural da sociedade brasileira desde o Primeiro Império. Um colorido mural em que entram sociologia, psicologia, política, cultura, antropologia, folclore, enfim, todas as formas do pensamento e da ação humanas. Em sua busca do tempo perdido, na verdade, Pedro Nava encontrou a alma do povo brasileiro.

Não há, Sr. Presidente, no idioma português, obra memorialística mais notável do que a deixada pelo escritor mineiro Pedro Nava.

Ao lado da atividade literária propriamente dita, o médico Pedro Nava, formado pela Faculdade de Medicina de Minas Gerais, em 1927, publicou cerca de trezentos estudos médicos. Cultor do idioma, escrevia com tanta naturalidade que esses trabalhos científicos tornam-se amena leitura para os leigos.

Pedro da Silva Nava morreu no dia 13 de maio de 1984, no Rio de Janeiro, aos 81 anos de idade, deixando incompleto o sétimo volume de sua monumental obra literária, intitulado Cera das Almas.

            Morreu de modo trágico, pondo ele mesmo um ponto final em sua luminosa existência. O que, de certo modo, contraria a grande felicidade que emana de seus escritos, como notou um amigo de Nava, o escritor mineiro Vivaldi Moreira, Presidente perpétuo da Academia Mineira de Letras.

Seja como for, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que permanece para a eternidade, sem qualquer ato que possa contrariar, é a grandiosidade da obra memorialística desse escritor. Ele cumpriu o famoso enunciado russo, segundo o qual quem escreve sobre sua aldeia escreve sobre o mundo. Por isso, o que mais orgulha aos mineiros que admiram a obra de Pedro Nava é reconhecê-lo escritor universal.

O Senado Federal, vigilante da memória de nossos grandes homens de espírito, associa-se às entidades culturais divulgadoras do centenário de Pedro Nava. Entre elas destaco as do meu Estado, como a Biblioteca Pública de Minas Gerais, a Academia Mineira de Letras e o Centro de História da Faculdade de Medicina da Universidade Federal.

Ao relembrar no Senado o nome de Pedro Nava, evoco também grandes companheiros dele. Neste Plenário, assentaram-se alguns dos melhores amigos de Nava. Eram seus contemporâneos naquela Belo Horizonte dos anos de 1920. Refiro-me aos Senadores Milton Campos, Afonso Arinos, Gustavo Capanema e Juscelino Kubitschek, este seu colega na Faculdade de Medicina.

São excelsas figuras que enobreceram a atividade política em uma geração, que, na literatura, nos deu o grande escritor Pedro Nava.

Lembrando-o, nesta tarde aqui no Senado, nestas breves palavras, o faço com saudade e, sobretudo, como homenagem à cultura de meu Estado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Pedro Nava é um dos principais nomes da cultura brasileira, e antes de concluir esta homenagem pelo seu centenário, sou impelido a voltar ao tema das leis estaduais de cultura, assunto que já abordei desta tribuna.

Volto agora com a preocupação redobrada. As leis estaduais de incentivo à cultura baseiam-se no ICMS e existem hoje em treze Estados e estão em fase de implantação em outros três. Por meio delas, milhões de reais já foram captados da iniciativa privada para produção e exibições culturais. São livros, filmes, shows, espetáculos teatrais, pesquisas históricas, projetos de restauração e preservação da memória, e tantos outros eventos de valorização de nossas raízes. Apenas no meu Estado, Minas Gerais, onde tive a iniciativa de criar esse importante incentivo durante o meu período de Governo, foram aplicados, até 2002, R$61 milhões.

Ora, o percentual máximo de arrecadação anual de ICMS passível de compensação pela Lei da Cultura é de apenas 0,3%. Não é possível que 0,3% não possa ser preservado.

Na proposta de reforma tributária, o Governo Federal propõe o fim dos incentivos, acabando com as leis estaduais de cultura. A princípio, julguei ser apenas uma omissão, na ânsia de o Governo de apresentar uma proposta que extingue os incentivos gerais para enfrentar a guerra fiscal entre os Estados. Entretanto, pelas últimas informações, inclusive de reunião realizada na última semana no Ministério da Cultura, verifica-se que o fim das leis estaduais de incentivo à cultura é intencional. O Governo Federal, dirigido pelo Presidente Lula, quer acabar com este importante apoio à cultura brasileira.

Conclamo aqui os artistas, muitos dos quais emprestaram suas imagens públicas para ajudar a buscar votos para o PT, que se unam a todos aqueles que valorizam a cultura brasileira, para resistirmos.

São milhares de empregos ameaçados!

A cultura brasileira não pode abrir mão dessa conquista, voltando a depender de Fundos Orçamentários que ficarão à mercê da boa vontade de governantes do momento.

Se encerrarmos as leis estaduais de incentivo à cultura, teremos os produtores culturais à porta dos gabinetes, pedindo favores políticos para que possam ter a aprovação dos seus projetos.

A Lei Rouanet é uma lei importante, mas ela se complementou com as leis estaduais de incentivo.

As leis de incentivo à cultura são democráticas e não podem ser extintas. Precisam, ao contrário, ser expandidas e aprimoradas!

Trago aqui, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, portanto, esse alerta, essa denúncia, de que a proposta de reforma tributária apresentada pelo Governo Federal acaba com as leis de incentivo à cultura. Não podemos aceitar que isso vá acontecer, sob pena de estarmos deixando de lado a memória brasileira.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/07/2003 - Página 17266