Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Retenção pelo Tesouro Nacional das verbas destinadas à Rede Básica Hidrometeorológica Nacional.

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Retenção pelo Tesouro Nacional das verbas destinadas à Rede Básica Hidrometeorológica Nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 09/07/2003 - Página 17391
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, RETENÇÃO, TESOURO NACIONAL, RECURSOS FINANCEIROS, DESTINAÇÃO, FUNCIONAMENTO, HIDROMETRIA, TERRITORIO NACIONAL, IMPORTANCIA, TRABALHO, ESTAÇÃO HIDROLOGICA, ADMINISTRAÇÃO, DADOS, ACOMPANHAMENTO, PREVISÃO, GESTÃO, AGUA, BRASIL.
  • IMPORTANCIA, UTILIZAÇÃO, INFORMAÇÕES, DADOS, HIDROMETRIA, PLANEJAMENTO, MATRIZ ENERGETICA, ABASTECIMENTO DE AGUA, CIDADE, RESIDENCIA, INDUSTRIA, CONTROLE, RECURSOS HIDRICOS, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, VALORIZAÇÃO, ATIVIDADE ESSENCIAL, ORÇAMENTO, UNIÃO FEDERAL.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, freqüentemente esquecemos, em nosso País, a importância das pequenas coisas. Como os problemas nacionais parecem ser proporcionais ao nosso território, temos a tendência de só enxergar os grandes números, as grandes despesas, as grandes ações, jogando para segundo plano as ações de menor porte.

Isso tem sido um problema para nossos governantes. O Governo Federal tem um porte considerável, com atuação fundamental em praticamente todas as áreas da vida nacional. E é esse gigantismo que muitas vezes não é apreendido e compreendido em sua totalidade, especialmente quando temos um grupo novo administrando o País.

O resultado disso é um velho conhecido nosso: o primeiro ano de governo é um ano de enganos, de desacertos, de esquecimentos e de tropeços. As grandes questões nacionais são abordadas como se pudessem ser resolvidas logo, enquanto os pequenos problemas são ignorados até o momento em que se compreende que existem funções, aparentemente banais, que não podem ser interrompidas, sob pena de paralisar a máquina estatal.

Estou ocupando hoje esta tribuna para alertar o Governo Federal sobre mais um desses “esquecimentos”, ou dizendo melhor, um grave equívoco que pode custar caro ao País.

O Governo Federal reteve no Tesouro Nacional as verbas destinadas a manter o funcionamento da Rede Básica Hidrometeorológica Nacional, mais conhecida como “Rede Hidrométrica”.

Explicando de maneira simples, trata-se de um conjunto de 4.841 estações de monitoramento de dados relacionados com o acompanhamento e gestão das águas do nosso País. Essas estações produzem relatórios diários sobre chuvas, níveis d’água, medições de descarga líquida, medições de descarga sólidas, qualidade das águas, perdas por evaporação, clima e alerta de previsão de cheias.

Já escutamos vários colegas Senadores, nos últimos anos, trazerem para esta Casa o aviso de que a água tornou-se um bem muito valioso, que deve ser gerido de forma estratégica, com visão de longo prazo. Não é mais possível considerá-la, como em outros tempos, um bem farto e inesgotável. E mesmo tendo as amplas reservas desse líquido, a cautela manda que as providências para evitar a escassez futura sejam tomadas de imediato.

Nunca é demais lembrar que a importância da água ultrapassa a questão da agricultura e da disponibilidade de água potável. No Brasil, a gestão da água está intimamente ligada à gestão energética, uma vez que a maior parte das atividades nacionais depende da geração feita nas usinas hidrelétricas.

Dessa forma, as atividades de monitoramento permitidas pela existência da Rede Hidrométrica são fundamentais para o planejamento de nossa matriz energética, de nossa agricultura, do abastecimento de água das cidades, residências e indústrias, assim como o controle de atividades potencialmente danosas aos mananciais nacionais, chegando até à questão da segurança das populações ribeirinhas.

Todo o esforço que tem sido feito para controlar esse bem precioso pode ser posto a perder porque o Governo atual ainda não entendeu a importância de manter a atividade de monitoramento. As transferências do Tesouro estão suspensas desde dezembro de 2002 e a Agência Nacional de Águas (ANA) não conseguiu ressarcir os custos das várias entidades executoras de serviços, que paralisaram as atividades desde o dia 1º de maio.

Durante o ano de 2002, segundo a Agência, foram realizadas mais de doze mil e setecentas visitas de inspeção, seis mil e seiscentas medições de descarga líquida, quase mil e setecentas medições de descarga sólida e mil e setecentas coletas de amostra de qualidade da água, com levantamento de oito mil e quatrocentas informações.

E quanto custa o serviço, afinal? De quanto dinheiro estamos falando? O custo anual programado para o quadriênio 2002-2005 é da ordem de 16 milhões de reais, pouco mais de três mil e trezentos reais por ano, em média, para cada estação do sistema. Aliás, essa quantia, segundo especialistas da Agência Nacional de Águas, deveria ser três vezes maior.

Só para efeito de comparação, os Estados Unidos têm uma rede semelhante, composta de 7 mil estações, para as quais existe um orçamento anual de cerca de 90 milhões de dólares, 85% dos quais aportados por agências governamentais. Aliás, essa é uma das áreas nas quais a atividade privada é tradicionalmente reduzida, dependendo, em nível mundial, da ação pública.

E o que é que essa economia - os 16 milhões de reais previstos para 2003 - vai trazer de bom para o país? Absolutamente nada.

Trata-se praticamente de verba carimbada, oriunda do Fundo de Compensação Financeira do Setor Elétrico, que distribui os royalties pagos pelas empresas que operam as hidrelétricas nacionais. De acordo com a Lei 8.001, de 1990, que deu forma final à compensação financeira, o pagamento deveria ser efetuado, mensalmente, até o último dia útil do mês subseqüente ao fato gerador, estando vedada a aplicação dos recursos em pagamento de dívidas e no quadro permanente de pessoal.

As oito instituições que operam o sistema não têm condições de retomar as atividades se não for regularizado o fluxo financeiro que, a essa altura do ano, já deveria ter alcançado 50% do recurso programado. Trata-se de um conjunto de entidades públicas, lideradas pela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), empresa federal, responsável pela operação de mais de 80% da Rede.

Todas as unidades da Federação estão sendo afetadas pela paralisação dos serviços, pois a Rede está presente em todos os Estados e no Distrito Federal, monitorando as oito grandes bacias hidrográficas definidas no território nacional.

Em vez de contingenciar os recursos, o Governo deveria estar preocupado em permitir o aperfeiçoamento das atividades da Rede.

A Rede Hidrometeorológica tem uma história um pouco confusa do ponto de vista de sua constituição. A atividade de coleta desse tipo de dados, depois de assumida pelo setor público, no início do século XX, já esteve sob a responsabilidade do antigo Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio da década de 1920; do Ministério da Agricultura desde Vargas até o início dos anos 1960; e do Ministério de Minas e Energia, sob as mais variadas denominações - comissões, diretorias, departamentos ou serviços - e subordinações administrativas, até a criação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em 1996, que ficou provisoriamente com a responsabilidade de manter funcionando o sistema.

A partir desse momento, a situação ficou complicada, pois os decretos que regulamentaram a Aneel - a chamada Lei das Águas e mesmo a Lei criadora da Agência Nacional de Águas (ANA) - foram omissos quanto à responsabilidade de gestão e manutenção da Rede.

Atualmente o sistema está sob gestão da ANA, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, por meio de convênio assinado em finais de 2001, mas continua pertencendo, legalmente, ao Ministério de Minas e Energia.

É necessário que sejam resolvidos esses cruzamentos de atribuições, para evitar tanto o duplo comando quanto, o pior dos males, a dupla omissão, que pode ter facilitado essa situação crítica e a parada das atividades.

É necessário liberar os recursos retidos e retomar o fluxo financeiro normal antes que a quebra das séries históricas de dados produza efeitos irreversíveis para as outras atividades de planejamento que dependem delas.

É necessário estudar modificações na legislação para evitar o efeito deletério de novos contingenciamentos nessa e em outras atividades essenciais colocadas sob a responsabilidade do poder público.

Mais do que isso, é necessário prover recursos que permitam o crescimento das atividades, a modernização do sistema e a normalização dos processos operacionais da Rede. Precisamos consolidar o Sistema Nacional de Informações em Recursos Hídricos, colocado sob a responsabilidade da ANA pela própria lei que a instituiu. É esse sistema que permite a transformação dos dados brutos recolhidos pelas estações em informação útil para a gestão estratégica das águas.

Enfim, Srªs e Srs. Senadores, é necessário conhecer a existência e a valorizar o papel desse e de outros pequenos serviços públicos essenciais, cuja presença no orçamento da União muitas vezes sequer é notada, mas cuja ausência ou mau funcionamento são capazes de inviabilizar a consecução dos maiores objetivos nacionais.

É o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/07/2003 - Página 17391