Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Aumento de competitividade do Brasil na produção de grãos. Preocupação com as ações do MST. (como Lider)

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. REFORMA AGRARIA.:
  • Aumento de competitividade do Brasil na produção de grãos. Preocupação com as ações do MST. (como Lider)
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/2003 - Página 17628
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ANALISE, CRESCIMENTO, AGRICULTURA, BRASIL, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), CONTRIBUIÇÃO, ESTABILIDADE, ECONOMIA, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • COMENTARIO, APREENSÃO, MERCADO INTERNACIONAL, CRESCIMENTO, PARTICIPAÇÃO, AGRICULTURA, BRASIL, MOTIVO, INSUFICIENCIA, CAPACIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, CONCORRENCIA, QUALIDADE, PRODUTO NACIONAL.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, PREPARAÇÃO, AGRICULTURA, BRASIL, RESPOSTA, MERCADO INTERNACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, AUMENTO, SUBSIDIOS, AGRICULTOR, PAIS ESTRANGEIRO, REGISTRO, URGENCIA, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA.
  • COMENTARIO, VANTAGENS, REFORMA AGRARIA, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, CRIAÇÃO, EMPREGO, CUSTO, MÃO DE OBRA.
  • COMENTARIO, PESQUISA, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, PARTICIPAÇÃO, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E AGRICULTURA (FAO), CONHECIMENTO, SITUAÇÃO, FAMILIA, ASSENTAMENTO RURAL, RESPONSABILIDADE, GOVERNO FEDERAL, CONCLUSÃO, PRECARIEDADE, QUALIDADE DE VIDA, INSUFICIENCIA, PRODUÇÃO AGRICOLA, FALTA, CUMPRIMENTO, COMPROMISSO, GOVERNO.
  • REGISTRO, NECESSIDADE, REESTRUTURAÇÃO, POLITICA, VIABILIDADE, REFORMA AGRARIA.
  • APREENSÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, REIVINDICAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, NECESSIDADE, IDENTIFICAÇÃO, INTERESSE, PARTICIPANTE, MANIFESTAÇÃO.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “A gente sabe mais de um homem é o que ele esconde”, Guimarães Rosa.

O agronegócio projeta para este ano o resultado mais espetacular de todos os tempos. Nunca o Brasil foi tão competitivo em um segmento econômico a ponto de atrair a atenção e a fúria protecionista dos parceiros comerciais. Para 2003, o setor projeta crescimento de 5,35%, o suficiente para assegurar que o País não se afunde na recessão. A agricultura e a pecuária representam cerca de 7,3% do Produto Interno Bruto e acumularam, nos últimos dez anos, um saldo líquido próximo dos U$170 bilhões. O superávit, nos cinco primeiros meses deste ano, alcançou US$9,3 bilhões, e não é preciso entender de economia para inferir que se trata do grande garantidor da moeda e da estabilidade política do Brasil.

Ainda que o País tenha um parque industrial respeitável, a soberania nacional está sendo mensurada nas negociações da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) a partir da estatura do agronegócio. Os Estados Unidos têm motivo para tanta preocupação. De acordo com relatório do Departamento Americano para Agricultura, a soja brasileira não é hoje somente mais competitiva do que a americana, mas apresenta capacidade de expansão de 200% nos próximos 50 anos se mantido o nível atual de tecnologia. Para concorrer com o agricultor brasileiro, no ano passado, a União Européia e os Estados Unidos concederam aos seus produtores subsídios que somaram US$202 bilhões. Mesmo assim, em patamar desnivelado de competição, com rodovias em estado lastimável, carga fiscal exorbitante, custo portuário elevado e insegurança jurídica quanto ao futuro próximo, o segmento continua a dar alegria aos brasileiros.

O produtor, que superou o atraso tecnológico e tornou economicamente viável o setor primário depois do interregno que se seguiu à Crise do Café da década de 1930, agora parece que está sendo penalizado por ter feito tão bem ao Brasil. Eu não gostaria de crer, mas percebo que há algo tramando contra o sucesso do agronegócio nacional e esta Casa não pode se omitir. A reforma agrária precisa ser realizada, os avanços quantitativos foram importantes na distribuição de terras nos últimos oito anos, mas me parece temerário simular a solução de um problema social por intermédio da desestabilização do setor primário.

O Brasil foi um dos últimos países do Planeta a formular política de reforma agrária, mas aprendeu muito pouco com as nações que ousaram superar o conflito fundiário em diversos momentos históricos e seguir rumo à civilização. Os europeus, por exemplo, há mais de 200 anos souberam fazer a transição do arcaísmo feudal para novo modelo de aproveitamento da terra e chegaram ao topo do mundo. Após a Segunda Guerra Mundial, no leste asiático, Japão, Coréia do Sul e Taiwan redesenharam a distribuição da pouca terra disponível e despontaram no cenário internacional. O Chile, na década de 1970, fez reforma agrária profunda, sepultou os traços do latifúndio e se tornou a única nação latino-americana preparada para ingressar no Primeiro Mundo.

Já este País, obliterado pela tradição colonial-escravagista, postergou o problema agrário até a beira do insuportável e o lema tacanho do “quanto pior, pior” se confirmou. Hoje, há notória incapacidade de o Estado brasileiro formular política fundiária sustentável, enquanto as lideranças do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, impacientes, não querem mais ter o chão e lançar a semente, mas alimentar de material carburante o conflito rural.

A reforma agrária representa o esforço estatal de redistribuição do domínio da terra com a finalidade de promover o desenvolvimento, imprimir o crescimento econômico, elevar os indicadores sociais e apaziguar as tensões políticas, com reflexo em toda a sociedade. São inúmeras as vantagens da providência. Um programa sustentável de reforma agrária, no caso do Brasil, corrigiria injustiça histórica e promoveria espetacular ajuste de contas com o passado. Do ponto de vista econômico, significaria criação de emprego a baixo custo. A unidade produtiva de um assentado é capaz de gerar três postos de trabalho a um valor individual médio de R$6 mil. Se se considerar que o Movimento dos Sem-Terra quer assentar um milhão de pessoas nos próximos quatro anos, estamos falando na amortização de 40% do estoque de 10 milhões de empregos que o Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, prometeu criar em seu mandato.

O módulo da pequena propriedade advinda de programa de reforma agrária propicia ainda a produção do alimento ao consumo interno, talvez até com nível de excelência visando ao comércio exterior, com a obtenção de divisas, o incremento da atividade macroeconômica e a elevação da receita tributária. No aspecto social, reforma agrária faz o que o Presidente Lula proclama “ensinar a pescar”, pois torna o homem produtivo, orgulhoso da sua raiz cultural e longe dos ciclos migratórios que deterioram a qualidade de vida nas cidades. Politicamente, confere estabilidade às relações institucionais, elemento essencial para que cada um possa executar o próprio projeto de vida e vislumbrar a grandeza do Brasil.

Apesar de os equívocos do modelo fundiário remontarem aos primeiros dias da colonização portuguesa no Brasil, só no ano de 1964 foi “outorgada” a primeira autorização constitucional à União para promover desapropriação por interesse social, o que ensejou o Estatuto da Terra. Daquele ano até o Governo Fernando Henrique Cardoso, criaram-se órgãos gestores da política agrária em profusão, houve desastrosa substituição de siglas governamentais, planos romanescos foram encetados, mas os resultados não vieram porque não se pretendia fazer reforma agrária de verdade. Srªs e Srs. Senadores, recordem que durante a Constituinte o temário foi um dos mais contraditórios, mas as discussões resultaram estéreis, deram azo ao acirramento do conflito enquanto prosperava a desigualdade na distribuição da posse da terra.

Sr. Presidente, no Governo FHC, sem dúvida, foi empreendido o maior esforço de reforma agrária do Brasil. Os resultados são positivos quando observada a expressão matemática das políticas desenvolvidas de parcelamento do latifúndio improdutivo. Entre os anos de 1995 e 2002, foram repartidos 20 milhões de hectares e quase dois milhões de sem-terra instalados em assentamentos. O indicador é cheio de superlativos e representa número superior ao dobro do que foi realizado nos 30 anos anteriores. Caso sejam somados os custos de desapropriação, instalação, concessão de crédito para assentamentos e fomento à agricultura familiar, o valor convertido se aproxima dos R$30 bilhões em oito anos. Infelizmente, em que pese aos vultosos recursos despendidos e à numerosa massa de trabalhadores assentados, foi bastante tímido o desconto no passivo agrário brasileiro. Veja o caso de Goiás: foram assentadas aproximadamente 8 mil famílias em uma área de 442 mil hectares. O Incra tem um planejamento de imitir na posse outras três mil famílias em 2003. Mas a lógica do movimento é perversa e opera em escala exponencial. Em dezembro de 2002, havia quatro mil famílias acampadas, hoje superam sete mil. Se assentar três mil, vão continuar sobrando os mesmos quatro mil. De janeiro para cá, surgiram novos 26 acampamentos no Estado. Decididamente, assim, a equação não será decomposta nunca.

A razão deve ser endereçada à irresponsável capacidade do Movimento dos Sem-Terra de repor o exército de maltrapilhos nos acampamentos, mas não pode deixar de se considerar que o modelo executado produziu números expressivos, mas de baixa densidade quando é examinado o conteúdo da política executada pelos governos anteriores.

Srªs e Srs. Senadores, no ano passado, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, a Universidade de São Paulo e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, com apoio da FAO, órgão das Nações Unidas para a agricultura, realizaram um estudo para aferir a qualidade dos assentamentos criados entre 1985 e 2001. Foram pesquisados 4.340 projetos de reforma agrária, representando um universo que ultrapassa as 450 mil famílias, e realizadas quase 14.500 entrevistas. Seis indicadores de qualidade dos projetos de assentamento e outros oito parâmetros de inserção do modelo de reforma fundiária realizado no País foram medidos. Os resultados, grosso modo, não são nada bons, exceto no que se refere à intervenção do Governo na alteração da estrutura fundiária. Em 26 anos de política de reforma agrária, a iniciativa só foi aprovada no quesito que avaliou a ocupação efetiva dos projetos de assentamento. Como se verá, o Governo e as organizações de trabalhadores sem terra vão bem quando se trata de ocupar a terra, mas não sabem o que fazer para semear a sustentabilidade.

De acordo com a pesquisa, quando é avaliado o índice de qualidade de vida, tendo como requisitos a moradia, a água potável, o esgoto, a rede de eletricidade, a educação e a saúde, os resultados gerais apontam que os valores médios foram baixos, sendo o período de 1985 a 1994 um pouco superior aos assentamentos da era Fernando Henrique. Mesmo assim, apenas “alguma coisa a mais do que a metade dos fatores foi satisfeita”. Contribuiu decisivamente para mandar o índice à lona o acesso à saúde, à água e ao esgoto doméstico. Os indicadores de eletrificação dos projetos de reforma agrária cresceram, por exemplo, caso comparados os dois períodos, mas continuam na faixa de metade da demanda total. Já o índice de articulação de organização social, utilizado para medir a reivindicação dos assentados por benefícios sociais e arregimentação ao incremento do sistema produtivo, demonstrou que, após realizado o assentamento, as famílias optam por individualizar a produção, mas permanecem relativamente unidas para cobrar providências. Apenas em 9% dos casos houve parcerias para produzir e comercializar e, em 57% dos casos busca de benefícios coletivos. O índice de parceria com agroindústria e de formação de cooperativas foi respectivamente de 33% e 50%.

Se o dado anterior indica que o MST - antes um movimento social - é bom para promover o badernaço pela terra, mas nada eficiente para fazê-la dar frutos, o indicador de ação operacional do Estado demonstra que, no intervalo de 1995 a 2001, menos da metade dos compromissos de levar infra-estrutura, liberar crédito e titular as propriedades foi cumprido.

Há torpeza bilateral nas relações dos agentes da reforma agrária, assim entendidos Governo e sem-terra, e seria muito oportuno que se aclarassem as intenções maldosas e as omissões claudicantes para que o País pudesse eleger um modelo eficiente de repartição da terra. Esta Casa poderia investigar como foram despendidos os recursos destinados ao financiamento da iniciativa, bem como o grau de eficiência dos assentamentos realizados.

Observem, Sr.ªs e Srs. Senadores, que a pesquisa, ao avaliar a renda das famílias, demonstra que os projetos estão distantes de conferir a sustentação propugnada nos projetos de reforma agrária. A média familiar nos assentamentos do período de 1985 a 1994 é de R$232,00, caindo para R$198,00 por família nos realizados durante o Governo FHC. Em outros indicativos, o estudo deixou claros alguns pontos que demonstram que já não existe no Brasil estoque incomensurável de latifúndios improdutivos a repartir, principalmente nas regiões do Centro-Sul. Em decorrência do fato, há uma tendência de localizar os projetos de assentamento em área de baixa densidade populacional, onde a agricultura familiar é menos representativa.

Sr. Presidente, conforme vários Senadores manifestaram desta tribuna, vejo com extrema preocupação a série de chantagens ideológicas que as lideranças do MST estão patrocinando com a finalidade de criar impasse institucional e assim impor a sua fantasia marxista. O Governo do Presidente Lula definitivamente não pode tratar com biscoitinho na boca quem se vale da aglutinação oportunista de miseráveis para intentar ações delirantes em direção à ditadura do campesinato. Esse tempo passou. Cabe ao Poder Executivo definir um projeto de reforma agrária consistente para o País em vez de ficar compartilhando com os josés rainhas da vida as milongas do materialismo dialético. Acredito, sim, que precisamos redefinir esse novo modelo de reforma agrária, contribuir para selar a paz no campo e, realmente, assentar na terra quem tem vocação para debulhar o trigo e fazer o pão. Muito pão.

Muito obrigado, Sr.ªs Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/2003 - Página 17628