Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários à reforma da previdência.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Comentários à reforma da previdência.
Aparteantes
Serys Slhessarenko.
Publicação
Publicação no DSF de 12/07/2003 - Página 17881
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, POLEMICA, ABERTURA, GOVERNO FEDERAL, NEGOCIAÇÃO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, ATENDIMENTO, PEDIDO, OPOSIÇÃO.
  • REGISTRO, INCOERENCIA, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO, CRITICA, DISPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, NEGOCIAÇÃO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, NEGOCIAÇÃO, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, IMPEDIMENTO, PREJUIZO, POPULAÇÃO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, PROJETO, ESPECIFICAÇÃO, BASE DE CALCULO, PENSÃO PREVIDENCIARIA, PROVENTOS.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Exmº. Sr. Presidente desta sessão, Senador Mão Santa, Srªs. Senadoras e Srs. Senadores, volto hoje à tribuna para falar sobre a reforma da Previdência.

Em primeiro lugar, mais uma vez, cumprimento o colégio de Líderes do Senado e a Mesa Diretora desta Casa, da qual, com muito orgulho, faço parte como Vice-Presidente, pela decisão tomada no dia de ontem, de, na próxima terça-feira, já começarmos a trabalhar numa comissão especial composta de 11 Srs. Senadores e 11 Srs. Deputados, para discutir, buscar alternativas e construir uma saída negociada sobre assunto tão polêmico como a reforma da Previdência.

Os meus cumprimentos ao Sr. Presidente João Paulo, ao Presidente desta Casa, Sr. Senador José Sarney, e ao Executivo, que, enfim, abriu as portas para que se estabeleça um processo de negociação sobre matéria tão importante.

Sr. Presidente, em todos os países do mundo em que a reforma da Previdência tenha acontecido, ela foi e é um tema explosivo, dinâmico, que sensibiliza a todos, porque mexe na vida do cidadão e na expectativa da sua aposentadoria e da sua velhice. Por isso, surpreendem-me alguns comentários que entendem que o processo de discussão e negociação da reforma não deveria receber a abertura que o Governo está dando. O Governo está certo. Errou no início, quando apresentou uma proposta e disse que ela era intocável - tolerância zero - e que não iria negociar com ninguém. Surpreende-me agora que aqueles que criticavam o Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, porque não negociava, agora o critiquem por negociar.

Aí não dá para entender, Senador Mão Santa. Não é algo sério, ficando no campo da brincadeira e da irresponsabilidade. Como alguém que, até ontem, criticava o Governo - e eu fazia o mesmo, sim, por não haver negociação -, no momento em que o Governo abre a negociação, concordando em discutir e buscar propostas alternativas, continue fazendo críticas? Senador Mão Santa, isso parece vir de pessoas que não têm proposta, não têm conteúdo, não têm conhecimento da proposta da reforma da Previdência, não sabem o que consta no mérito e não sabem o que fazer. Só dizer que é contra ou a favor é fácil. O engraçado é que vi pessoas, que eram contrárias à reforma, reclamarem nessa semana porque o Governo abriu o processo de negociação! Ora, se sou contra, e o outro lado pede que eu apresente a minha proposta, mostrando-se disposto a negociar, a construir alternativas, e eu não quero negociar, é porque não tenho proposta.

Estou falando com muita tranqüilidade porque critiquei, sim, a reforma, de forma pontual, e o Senador Mão Santa é testemunha disso. Apresentei por escrito uma proposta alternativa, que encaminhei a todos os ministérios, ao Presidente Lula, ao Relator, à comissão correspondente na Câmara, e é claro que estou a cavaleiro, muito tranqüilo, para fazer o debate aqui, na Comissão Especial, em cima da proposta alternativa que entreguei no início do mês de junho. Está aqui a data, 3 de junho de 2003. A proposta está circulando há cerca de 45 dias.

Alguns dizem que o Governo Lula só cedeu à pressão do Judiciário. É um pouco de irresponsabilidade, é desconhecer o movimento dos servidores públicos. Eles, sim, estão se mobilizando no País todo; 50% da categoria, que já é um grande número, está neste momento paralisada no País - são as universidades, os companheiros da Previdência, da Receita, enfim, dezenas de categorias poderiam ser citadas. Ora, dizer que o Governo só cedeu por causa de pressões do Judiciário, que discorda da proposta apresentada, é desconhecer a nossa capacidade de mobilização: quando digo nossa, refiro-me aos trabalhadores.

Essa minha tranqüilidade decorre também do fato de eu aqui coordenar a Frente Parlamentar em Defesa da Previdência Pública, que tem discutido propostas. Foram apresentadas em torno de quinhentas emendas à reforma; somente a Bancada do PT apresentou 152 emendas.

Quando, na Bancada, foi submetido à votação o apoio à reforma nos moldes anteriores, de 91 parlamentares, 32 se posicionaram a favor. Pouco mais de 30 parlamentares não se fizeram presentes e vinte votaram contra, mostrando que queriam negociar a proposta do Governo. Até mesmo entre os integrantes da Bancada aqui no Senado o tema é polêmico, delicado.

Não dá para entender essa crítica. Estou vendo nos jornais, Senador Mão Santa, que até o presidente eleito da Argentina se achou no direito de criticar o Governo brasileiro por estar negociando a reforma. Que moral tem a Argentina para estar se metendo numa questão interna do Brasil? Eles não fazem nem o dever de casa! Aquele país vem de uma situação de caos absoluto. Até torço para que a Argentina dê certo, mas, por favor, cuidem da Argentina que do Brasil cuidamos nós. O que cabe discutir conjuntamente é o Mercosul, uma política de importação e exportação sem tarifaço, enfim, uma política que ajude os países que compõem o Mercosul.

Neste momento, Sr. Presidente, a minha fala na tribuna é a fala de quem tem propostas, de quem quer discutir, de quem quer alterar, de quem quer negociar, de quem quer construir uma previdência pública responsável, com teto. Porque tem que ter teto, todo mundo sabe. Há muito tempo venho cobrando que a cúpula dos Três Poderes se reúna e defina de uma vez por todas esse teto para acabar com essa história de marajás. Por que não aprofundamos o debate com tranqüilidade?

Quem conhece a minha proposta sabe que defendo o fim do fator previdenciário, que sou a favor de que a contribuição dos inativos seja de responsabilidade dos governadores. A propósito, alguns governadores - e não quero citar nomes, porque não se trata de crítica pessoal - agora estão decepcionados porque o Governo Lula abriu espaço para negociações. Ora, teriam que ficar decepcionados se isso não tivesse sido feito! De mais a mais, aqui no Congresso quem vai deliberar são os deputados e senadores, e não os governadores. Nós vamos deliberar, ninguém aqui vai votar com cabresto de governador nenhum. Também já disse que nós não vamos simplesmente carimbar uma proposta que venha do Executivo, do Judiciário ou de onde quer que seja; não vamos abrir mão do processo de negociação, de discussão e de elaboração.

Senadora Serys Slhessarenko, eu estava cumprimentando o nosso Governo por ter aberto espaço para a negociação. Dirijo-me a V. Exª, porque sei que V. Exª é daquelas pessoas que também exigiram espaço para debates, negociação.

Causa-me estranheza o fato de agora começarem a criticar o nosso Governo por ter aberto espaço para negociar. Ora, essa é uma obrigação de qualquer governo. Não me lembro, nesses meus dezessete anos de Congresso, de uma única vez em que uma emenda tenha vindo para cá, principalmente uma emenda constitucional, e o governo não tenha tido que negociar. Eu estranhava o fato de o nosso Governo não ter aceitado a negociação, mas, no momento em que o faz, ele tem que ser elogiado. Nós mesmos, que fomos contra de forma pontual - sei que V. Exª também foi até criticada em certos momentos -, temos que dar a mão à palmatória de forma positiva. Fico feliz que o Governo tenha nos ouvido. Se o nosso Governo não nos ouve, reclamamos; quando o Governo nos ouve e abre a possibilidade de uma ampla negociação da reforma, é claro que não podemos ser contra.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Senador, um aparte. Senador Paulo Paim, V. Exª está coberto de razão, endosso as suas palavras e elogio o Governo. Precisamos discutir, sim, era o que nós queríamos. Se assim não tivesse agido, seria um governo autoritário, um governo que está impondo, um governo que traz a coisa pronta. As oposições, em qualquer situação, costumam criticar: criticam as propostas prontas que vêm para ser impostas e, quando são abertas para a negociação, também criticam; criticam de qualquer jeito. Saudamos, com euforia, eu diria, a posição do Governo. Precisamos aprofundar a discussão das reformas - nós, do Senado e da Câmara, a população, a sociedade organizada - e ajudar a elaborar uma reforma que atenda os interesses, as necessidades e as aspirações da maioria do povo brasileiro. Aqueles que criticam as negociações estão tendo uma postura autoritária com certeza. Parabéns. Comungo de todas as suas idéias.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Muito obrigado, Senadora Serys Slhessarenko. Eu tinha certeza de que era esse o pensamento de V. Exª, por isso já citava que a posição de V.Exª não seria diferente, como não foi, desde o primeiro momento em que começamos a discutir esta proposta. Aliás, tivemos a felicidade de estar juntos em alguns momentos com as entidades, dialogando e buscando abertura para negociar.

Percebo, ao fazer uma síntese das notícias publicadas, que são principalmente os grandes bancos que estão muitos bravos com o Governo por ter aberto espaço para a negociação. Eu disse outro dia e repito agora: quando os grandes banqueiros fazem críticas a alguma iniciativa do governo ou do Parlamento, significa que nós estamos no caminho certo, que estamos acertando. Os grandes bancos estão de olho no filão representado pela previdência privada, todos sabem disso. A previdência privada representa bilhões e bilhões de dólares, por isso os grandes bancos reclamam quando percebem que o governo, a partir da negociação com a sociedade e com o Parlamento, começa a fortalecer a previdência pública.

Se tiver que haver previdência complementar, que ela seja pública. Se depender deste parlamentar, faremos uma grande poupança interna administrada pelo governo e investida principalmente no social.

Todo mundo sabe - eu apresentei aqui um exemplo outro dia - que a aplicação na poupança é, de fato, uma grande poupança interna. Só que os bancos pagam 1% para o poupador e aplicam esse dinheiro no mercado de forma especulativa, fazendo o papel de agiotas. Alternativamente, aplicam em papéis do governo, que paga 26% - só aí já dobram o dinheiro investido -, ou, pior ainda, emprestam por meio do famoso cheque expresso, o que chega a lhes render 10%, 12% ao mês - ao mês! É claro que eles não querem que essa poupança fique nas mãos do governo, que seja investida no social e dê um retorno equilibrado para o aplicador.

Eu dizia e repito agora: está na Casa o nosso projeto que quer que o dinheiro da poupança de todos os bancos seja usado para a construção de casas próprias, principalmente para os trabalhadores de baixa renda, evitando que esse dinheiro fique somente na especulação financeira.

Por isso, Sr. Presidente, eu diria que, ao contrário do que pensam alguns pessimistas, hoje é um dia de otimismo. Alguém já disse isso - talvez tenha sido V. Exª, Senador Mão Santa -, mas vou fazer questão de repetir: o pessimista, que acha que tudo está mal, que tudo está errado, que tudo está uma porcaria, já sai perdendo, já sai derrotado.O otimista, que acredita que podemos avançar, que podemos crescer, que tem muita esperança apesar das dificuldades, por mal que vá, ganha, porque alguma coisa vai acontecer. O pessimista já é um derrotado: tudo aquilo que acontecer fora do seu pessimismo, o pessimista sai perdendo; um avanço a mais, de um milímetro, já é uma derrota para ele. E aquele que apostou num futuro melhor, diante do pouco que avançar, dirá: “Bom, não foi tudo o que eu sonhava, mas se avançou”. Fico na linha do otimismo.

Numa outra oportunidade, quando estive com o Presidente Lula, ele me disse: “Paim, as mudanças virão, mas virão no tempo certo”. Tive a esperança de que o Governo abrisse o processo de negociação. E foi o que ocorreu, com a participação de todos os Ministros. Confesso que não gostei quando o Presidente disse que iria submeter a reforma à opinião dos Governadores. Acho que eles devem governar seus Estados, com responsabilidade, e deixar que nós, no Congresso, tenhamos o direito de deliberar, discutir e ouvir, sim; mas a cabresto, não. Podemos ouvir todos, mas não tem cabimento a frase que ouvi: “Só vamos negociar o que os Governadores permitirem”. Não é esse o caminho. É preciso negociar com o Congresso e com a sociedade. Também se deve negociar com os Governadores, mas não a cabresto. Caso contrário, futuramente, quem mandará no País, quem deliberará e fará as leis será o colégio de vinte e sete Governadores e não mais o Parlamento.

Sigo a linha do otimismo, porque venho do movimento sindical e gosto da negociação. Por isso, pedi ao Bloco de apoio ao Governo para fazer parte da comissão. Não vou me omitir. Vou estar na comissão, mesmo que não tenha direito a voto, pois terei direito a voz. Quero debater e apresentar propostas alternativas para a reforma da Previdência.

Ao contrário do que publicam alguns jornais - a opinião é livre, mas faço questão de aproveitar o espaço que tenho na tribuna para expor o meu ponto de vista -, o Governo está correto, tem que negociar, dialogar, sentar à mesa e buscar propostas alternativas, que atendam ao interesse dos trabalhadores das áreas pública e privada, com o intuito de construir o que chamo de previdência universal, igual para todos.

No entanto, é necessário que haja uma transição, que construamos uma proposta boa e equilibrada, e que ninguém seja o dono da verdade. E que o mérito seja dado ao povo brasileiro, à sociedade, à democracia. Que seja uma posição flexível positiva - não aquela de flexibilizar o direito dos trabalhadores -, que utilize argumentos que tenham conteúdo no mérito do que deve ser a reforma da Previdência.

Sr. Presidente, encerro dizendo que no documento que apresentei no dia 3 de junho e que teve o aval de inúmeros Deputados e Senadores, referi-me à necessidade de mudar os seguintes pontos: o cálculo dos proventos, o período de base de cálculo, as pensões, a paridade, a idade mínima e o redutor, para tirarmos o fator previdenciário. Quanto aos critérios para contribuição do inativo, transferi a responsabilidade para os Estados e Municípios. Propus a Previdência pública complementar para determinados casos e dei sugestões para aumentar o caixa da Previdência, como a gestão quadripartite e a centralização dos recursos da Previdência na própria Pasta.

Dessa forma, não permitiríamos, Senadora Serys Slhessarenko, que ocorressem fatos como o divulgado por V. Exª - e usei aqueles dados em alguns debates -, dos R$6 bilhões que saíram do cofre da Previdência, no mês de novembro, para o de outro Ministério. Se o sistema estava falido, como é que se retiram R$6 bilhões? V. Exª foi muito feliz ao denunciar o fato naquela oportunidade. Eu, inclusive, citei os dados que V. Exª nos trouxe sobre a inclusão social de quarenta milhões de pessoas que estão na informalidade, não estão contribuindo para a Previdência. Tenho propostas concretas para incluí-las. Em uma delas, sugiro que paguem a metade do que o autônomo paga hoje e que tenham um aporte, um percentual dos fundos de pensão privados, um percentual mínimo que seja. Portanto, essas pessoas teriam o aporte do faturamento e, naturalmente, a contribuição do Governo.

Enfim, a nossa proposta segue a linha do combate à sonegação. Não se trata de uma caça às bruxas, mas de se fazer uma auditoria. Por que não se faz uma auditoria nas contas da Previdência para se constatar se ela é superavitária ou não, já que alguns continuam insistindo que ela é superavitária? Eu acredito nisso. Por que o Tribunal de Contas não faz essa auditoria?

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Senador Paulo Paim, lamento ter que interrompê-lo, mas V. Exª já ultrapassou o seu tempo em 10% do previsto pelo Regimento Interno. Com o pronunciamento que fez, V. Exª está inscrito nesta Casa no nível de José Bonifácio, de Rui Barbosa e de Paulo Brossard.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, com essas considerações V. Exª praticamente concluiu o meu pronunciamento com um brilho que nem eu conseguiria dar a ele.

Agradeço a V. Exª pela tolerância com relação ao tempo.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Com esse final, V. Exª iguala-se a Joaquim Nabuco.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/07/2003 - Página 17881