Pronunciamento de Arthur Virgílio em 15/07/2003
Discurso durante a 11ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Observações sobre o comportamento do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sua viagem a países europeus.
- Autor
- Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
- Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
- Observações sobre o comportamento do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sua viagem a países europeus.
- Publicação
- Publicação no DSF de 16/07/2003 - Página 18168
- Assunto
- Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
- Indexação
-
- LEITURA, PUBLICAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, CONDUTA, DECLARAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VIAGEM, EXTERIOR, OFENSA, POLITICA EXTERNA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).
O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fiz ontem, como líder do PSDB, algumas observações sobre o comportamento do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva nessa sua viagem a três países da Europa. Na vetusta Inglaterra, o Presidente recorreu mais uma vez à informalidade que, aqui, o tem caracterizado. Esqueceu-se de normas primárias e foi um desastre.
Primeiro, a admoestação do Presidente da Polônia. Agora, a repercussão negativa mundial e a condenação expressa em editoriais, como o de hoje do jornal O Estado de S.Paulo, que passa a fazer parte deste pronunciamento.
O jornal londrino The Times também faz o registro do incidente:
Europeus trocam encanto por sarcasmo
'The Times' critica 'abraço' de Lula e define sua fala como 'um animado resmungo'
LONDRES - O entusiasmo da imprensa européia com a ascensão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à presidência do Brasil começa a conviver, nas páginas dos principais jornais, com as primeiras pitadas de ironia. Um exemplo vem do jornal britânico The Times que, na edição de ontem, mostrou-se sarcástico com o discurso de Lula no encontro da Governança Progressista, no domingo. "(Lula) apresentou a sua solução para o problema de desigualdade no mundo: um abraço", escreveu o analista parlamentar do tradicional diário, descrevendo a forma de falar do presidente como um "animado resmungo".
Segundo o Times, que grafa o nome Lula entre aspas e prefere chamar o presidente brasileiro de "senhor Da Silva", o discurso fez uma "análise populista" da distância entre os ricos e os pobres.
Na sessão de ontem, tive ocasião de opor reparos à fala de Sua Excelência, alertando-o de que, "com esses improvisos", o Brasil pode ter problemas de relacionamento com os organismos internacionais, "que são dirigidos muito em função daquele país".
Hoje, quase todos os jornais trazem a reação do governo norte-americano à “brincadeira” de Lula. Eis o que publica o Estadão:
Terça-feira, 15 de julho de 2003
Ironias de Lula decepcionam governo dos EUA
Embaixadora Donna Hrinak diz que elas não traduzem a relação do presidente com Bush
PAULO SOTERO e ROLDÃO ARRUDA
Os comentários feitos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a respeito do governo dos Estados Unidos, durante o seminário sobre Governança Progressista, em Londres, decepcionaram as autoridades americanas. "A declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não reflete o tipo de relação de colaboração que ele e o presidente Bush estabeleceram durante sua bem-sucedida visita a Washington, no mês passado", disse ao Estado a embaixadora daquele país no Brasil, Donna Hrinak. Apontada como responsável pela aproximação entre Lula e o presidente George W. Bush e uma defensora de primeira hora do presidente brasileiro, a embaixadora parecia surpresa. Há menos de um mês, Lula mostrou-se tão entusiasmado após seu encontro com o presidente George W. Bush e com as possibilidades de estreitar as relações entre os dois países que disse: "Sem nenhuma dúvida, eu acredito que nós podemos surpreender o mundo em termos do relacionamento entre o Brasil e os Estados Unidos."
Em Londres, no domingo, Lula acabou mudando de tom. "Se tem uma coisa que admiro nos Estados Unidos é que primeiro eles pensam neles, em segundo neles e em terceiro neles também. Se sobrar tempo, pensam um pouco neles outra vez." - uma avaliação recebida com risos pela platéia. Depois, o presidente acrescentou: "Como têm hegemonia militar, tecnológica e econômica, se afastam mesmo, com medo de que todo mundo que se aproxime venha pedir dinheiro."
Sinceridade - Na reunião com Bush, a 20 de junho, em Washington, depois de duas horas de conversas e um almoço, os dois presidentes haviam divulgado um comunicado oficial afirmando ser "hora de definir um novo e decidido rumo em nosso relacionamento, guiado por uma visão comum de liberdade, democracia, paz, prosperidade e bem-estar para os nossos povos, com vistas à promoção da cooperação hemisférica e global".
Aquele foi o terceiro encontro entre os dois presidentes - o primeiro ocorreu em dezembro, logo após a eleição, e o segundo em maio, durante uma reunião do G-8, na Europa. Na época, Donna Hrinak disse ter ficado impressionada com a compreensão dos dois presidentes sobre quanto poderiam fazer juntos. Lula também disse, naquele dia, que desejava aprimorar ainda mais "a antiga e forte relação" e que isso deve se basear "na sinceridade das pessoas e na confiabilidade que os líderes precisam ter e não em jogo de cena para a imprensa e para o mundo". Afirmou que "o Brasil é e pode continuar a ser um grande parceiro dos Estados Unidos".
Em editorial, O Estado de S.Paulo analisa o assunto da seguinte forma:
Terça-feira, 15 de julho de 2003
Melhorar a informação histórica
As nações que já exerceram papel hegemônico no mundo, desde a Antiguidade, não se caracterizaram pelo excesso de generosidade em relação aos povos estrangeiros. E, mesmo deixando de lado as dominações extremadas - do tipo Gêngis Khan, para não falar das tentativas igualmente sanguinárias de Adolph Hitler e Joseph Stalin -, o domínio de impérios como o romano ou o britânico, assentados em fundamentos não desprovidos de alguma racionalidade, foram marcados pela imposição bélica e não pela espontânea cooperação em torno apenas de afinidades ou objetivos pacíficos comuns.
Dentro dessa perspectiva histórica é preciso reconhecer - desde que não tenhamos parti pris ideológico que nos impeça de fazê-lo - a importância que a nação norte-americana tem tido na ajuda ao desenvolvimento das democracias no mundo, em que pesem os erros, por vezes graves, que tenham cometido ou cometam seus governantes. Não dá para desconsiderar, por exemplo, a participação decisiva dos Estados Unidos da América nas duas grandes guerras do século 20, especialmente na 2.ª Guerra Mundial, quando, depois de comandar a invasão dos Aliados, nas praias da Normandia, para salvar a Europa dos nazistas, responsabilizaram-se pela formidável recuperação econômica, tanto européia quanto japonesa - fazendo o Plano Marshall para a Europa e promovendo a reestruturação político-administrativa do Japão, inclusive por meio de uma nova Constituição.
Eis por que faltou cabimento às observações críticas, contra os norte-americanos, feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por ocasião do Seminário Progressista (nome do que se chamava Terceira Via) realizado em Londres. Ao responder - talvez de maneira mais descontraída do que o desejável - a perguntas da platéia assistente, o presidente Lula sustentou que era preciso "exigir" que os EUA cumprissem um papel importante na democratização do mundo. O presidente da Polônia - certamente um dos países que mais puderam avaliar o exercício desse "papel", por parte da nação norte-americana, em sua libertação tanto do jugo nazista quanto do soviético - incumbiu-se de dar pronta resposta ao presidente brasileiro e pediu respeito aos EUA, pelo que se criou um clima de constrangimento e mal-estar, no evento.
Em sua tentativa de descontrair o ambiente, o presidente Lula exagerou quando disse: "Se tem uma coisa que admiro nos Estados Unidos é que primeiro eles pensam neles, em segundo neles e em terceiro neles também. Se sobrar tempo, pensam um pouco neles outra vez." É claro que a ironia haveria de arrancar alguns risos do auditório - mas ao custo de um desnecessário constrangimento, provocado pela reação do governante polonês, que assim se manifestou: "É muito fácil fazer piadas sobre americanos, mas isso é uma política errada", acrescentando: "Não é verdade que os Estados Unidos nunca pensaram nos outros países. Nosso caminho para a democracia só aconteceu porque os EUA trabalharam com nossas forças democráticas contra o comunismo.
Temos de ter inteligência para saber que nosso papel é trabalhar juntos para manter o diálogo e respeitar os EUA. Respeitar os Estados Unidos é bom conselho para todos nós."
Ao replicar, Lula também não se saiu muito bem, quando disse: "O que eu falei claramente é que os EUA pensam como Estado e têm projeto de Estado.
Por isso, ajudaram na divisão do mundo entre comunistas e não comunistas, a derrubar o regime comunista, ajudaram a que houvesse golpe na América do Sul. Tudo isso porque pensam estrategicamente, enquanto nação." Ora, como um Estado soberano pode "pensar" a não ser como Estado? Que "projeto" haverá de ter - que não seja este, de Estado - e como deixar de pensar "estrategicamente", enquanto nação? Também os EUA não ajudaram a divisão do mundo entre comunistas e não comunistas - já que o próprio presidente Lula admite que o Muro de Berlim teria caído mesmo sem a influência da nação norte-americana -, embora seja inegável a influência norte-americana, na História contemporânea, no capítulo da resistência dos povos aos totalitarismos.
Há que se concluir que o presidente da República tanto precisa evitar excessivas descontrações - especialmente em missões no Exterior - quanto melhorar seu cabedal de informações históricas.
Por último, reproduzo também, para constar dos Anais do Senado, trechos da coluna de hoje da conceituada jornalista Dora Kramer, que assim se referiu ao episódio de Londres:
“Hora e lugar
Errada, a avaliação a respeito do modo de ser americano feita pelo presidente brasileiro, não estava. Muito provavelmente é por pensarem "primeiro neles, depois neles e, em terceiro lugar, neles mesmos" que os Estados Unidos são o que são, goste-se do que sejam ou não.
Inadequadas, porém, foram a oportunidade e o tom escolhidos por Luiz Inácio da Silva. O recurso a piadas e ironias em reuniões formais pode até render um certo sucesso de público.
Mas, de crítica, que é o que interessa nas relações internacionais, o resultado a médio e longo prazos certamente será prejudicial a Lula como interlocutor qualificado.
Ao presidente, que tanto preza a contingência de não falar inglês, seria de sobremaneira útil também guardar um certo apreço ao que diz em português. “