Discurso durante a 12ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação do substitutivo do Senador César Borges aos projetos que tramitam na Subcomissão de Segurança Pública, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que tratam sobre a proibição da venda e porte de armas de fogo. (Como Líder)

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Defesa da aprovação do substitutivo do Senador César Borges aos projetos que tramitam na Subcomissão de Segurança Pública, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que tratam sobre a proibição da venda e porte de armas de fogo. (Como Líder)
Aparteantes
Ana Júlia Carepa, Antonio Carlos Valadares, Hélio Costa.
Publicação
Publicação no DSF de 17/07/2003 - Página 18427
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, APROVAÇÃO, SUBCOMISSÃO, SEGURANÇA PUBLICA, SENADO, SUBSTITUTIVO, PROJETO DE LEI, PROIBIÇÃO, PORTE DE ARMA, VENDA, ARMA, UTILIZAÇÃO, REFERENDO, CONSULTA, POPULAÇÃO, REGISTRO, ASSINATURA, LIDER, REQUERIMENTO, REGIME DE URGENCIA, VOTAÇÃO, PLENARIO, AGRADECIMENTO, ATUAÇÃO, SENADOR.
  • DEFESA, COMBATE, IMPUNIDADE, CRIME, ALTERAÇÃO, CODIGO PENAL, CODIGO DE PROCESSO PENAL, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, CONTRABANDO, ARMA, UNIFICAÇÃO, SISTEMA, POLICIA, EXPECTATIVA, REGULAMENTAÇÃO, EXECUTIVO, LEGISLAÇÃO, DERRUBADA, AERONAVE.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, Srªs e Srs. Senadores, ontem e também hoje, avançamos como nunca neste Congresso Nacional em relação à necessidade de restringirmos o uso e a venda de armas no Brasil.

Ontem, avançamos ao votar, na Subcomissão de Segurança Pública da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, o substitutivo do Senador César Borges ao meu projeto e a outros que tramitam simultaneamente, proibindo o porte e a venda de armas no Brasil, submetendo essa proibição ao referendo popular, prática que devemos adotar no País, pois fortalece a democracia, a representatividade. O referendo é uma consulta direta. Atualmente, com o voto eletrônico, podemos fazer essa consulta sem gastar absolutamente nada.

Aprovamos hoje um requerimento, assinado por todos os Líderes partidários desta Casa do Congresso Nacional, determinando que esses projetos tramitem em caráter de urgência urgentíssima e possamos votá-los no próximo dia 23, quarta-feira.

Sobre o trabalho da Subcomissão de Segurança Pública, destaco o papel fantástico exercido por seu Presidente, Senador Tasso Jereissati, no sentido de chamar a atenção do País para essa discussão fundamental e inadiável.

Sr. Presidente, estou muito otimista. O País não pode continuar indulgente para com essa epidemia. O Brasil tem 2,78% da população do mundo, ou seja, menos de 3%, e registra, anualmente, de 9% a 13% dos crimes que acontecem no Planeta. Na década de 90, morreram assassinados por arma de fogo no mundo três milhões de pessoas, dentre elas, 270 mil no Brasil. No ano que passou, morreram 49 mil pessoas assassinadas por arma de fogo no País.

Sr. Presidente, estamos falando de uma epidemia que, como epidemia, tem de ser enfrentada.

Este Congresso, ao votar o requerimento, dá uma sobeja demonstração de que isso, sem dúvida nenhuma, acontecerá. Daí meu sincero otimismo.

De cada dez crimes que acontecem no Brasil, nove são por motivos fúteis. Dizem as estatísticas que 82% dos crimes em nosso País acontecem por motivos fúteis. Por quê, Sr. Presidente? Porque numa discussão, acalorada ou não, em que alguém está armado - a banalização da arma de fogo no Brasil é indiscutível e evidente - e saca aquela arma, atira, mata, morre, aumentando nossos índices de criminalidade e envergonhando nosso País na comparação com os outros países do mundo.

É importante que avancemos. O substitutivo do Senador César Borges é fundamental para consagrar, na prática, esse avanço. Por isso, precisamos aprová-lo e, na Câmara dos Deputados, fazer o que estamos fazendo aqui, ou seja, conseguir as assinaturas de todos os Líderes partidários, para que lá, como aqui, a proibição da comercialização e do uso de armas no Brasil tramite em caráter de urgência.

Quanto ao referendo, Sr. Presidente, é uma concessão que se faz. Como o assunto é polêmico e divide opiniões, para aprová-lo temos que ceder ao referendo, a essa consulta popular. Significa, na prática, dizer que tornaremos obrigatório esse assunto; ou na eleição municipal ou na eleição nacional, será parte obrigatória do debate, que é, da mesma forma, é insubstituível.

Quero, nessas poucas palavras, como Líder do PMDB, agradecer o empenho dos Líderes e destacar o papel do Líder do Governo nesta Casa, Senador Aloizio Mercadante, que tem sido firme na condução de uma política que nos leve a um clima de paz em nosso País.

Nós sabemos, é claro - e não podemos criar nenhuma expectativa diferente -, que não resolveremos o problema da criminalidade no Brasil com uma lei apenas, mas com certeza resolveremos os chamados crimes imotivados, que acontecem exatamente porque têm na sua raiz a arma de fogo. É fundamental que haja o engajamento de todos.

Queria agradecer também a participação do Presidente do Senado Federal, Senador José Sarney, que estabeleceu prioridade para este assunto na convocação do Senado Federal durante este recesso.

O País cobra que o Senado dê uma resposta, e tenho absoluta convicção de que ela será dada no dia 23. É importante continuarmos com esse processo de mobilização, de conscientização; é importante aprofundarmos o debate e multiplicarmos essa discussão, para que o País se engaje cada vez mais e crie condições para que possamos não só votar, mas aprovar essa matéria, a fim de que consigamos dar o primeiro passo no rumo da diminuição da criminalidade no Brasil.

É claro que a violência tem muitas causas, que passam pelas desigualdades sociais, pela urbanização crescente e pela impunidade. A impunidade no Brasil é algo gritante. Em São Paulo, por exemplo, só 1,7% dos crimes - cujos autores não se conhecem na hora dos fatos - são esclarecidos. Essa situação de impunidade, que arma o braço da violência, não pode continuar.

Precisamos atualizar o nosso Código Penal, que é da década de 40 e que não comina muitos dos crimes com os quais a sociedade convive atualmente. Precisamos também mudar o Código de Processo Penal, a investigação criminal e o inquérito policial. No Brasil, investiga-se na Polícia e, depois, repete-se na Justiça toda a investigação em favor do criminoso, que utiliza essa delonga em benefício da sua impunidade. Muitas vezes, ele mata porque conta com a impunidade.

Esses fatos não podem continuar a acontecer; portanto, o Congresso Nacional tem que fazer a sua parte. Tenho a absoluta convicção - o meu otimismo é cada vez maior - de que isso acontecerá no próximo dia 23.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Com muito prazer, concedo o aparte à Senadora Ana Júlia Carepa.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Senador Renan Calheiros, gostaria de parabenizá-lo pela abordagem do tema e de expor para a sociedade - que muitas vezes questiona o papel do Parlamentar e cobra como se eles nada fizessem - exatamente a responsabilidade que assumimos quando colocamos esse assunto na convocação extraordinária, pois ele é um problema que, sem dúvida nenhuma, atinge a todos, independentemente de classe social, cor, raça, opção sexual ou religião. Portanto, gostaria de parabenizá-lo e dizer que essa é uma demonstração para a sociedade da necessidade de estarmos aqui trabalhando neste mês de julho.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Agradeço o aparte da Senadora Ana Júlia Carepa, que honra o meu pronunciamento. É importante que esse engajamento aconteça, para que possamos fazer no Brasil o que faz o mundo todo: caminhar no rumo da restrição do uso e da venda da arma de fogo.

Concedo o aparte ao nobre Senador Hélio Costa.

O Sr. Hélio Costa (PMDB - MG) - Senador Renan Calheiros, Líder do nosso Partido, o PMDB, quero cumprimentá-lo pela sua posição firme no assunto, que é de interesse da família brasileira. Afinal de contas, são os jovens as primeiras vítimas da violência em todo o Brasil. Recentemente, acompanhando o ilustre Senador Renan Calheiros, tive oportunidade de participar de manifestação defronte ao Congresso Nacional, onde foram colocados os sapatos das vítimas da violência. Aquela cena me deixou profundamente chocado, porque aqueles calçados, que representavam a lembrança das vítimas da violência, mostravam que realmente as principais vítimas têm no máximo 27 ou 28 anos; são todos jovens. Por isso, Senador, fico tão feliz de ver V. Exª, com a sua liderança, assumir essa batalha, essa luta, por tudo que citou em seu discurso: um país que tem menos de 3% da população do mundo e 10% dos crimes cometidos. V. Exª citou que quase 50 mil pessoas são assassinadas por ano, o que representa - e gosto muito de fazer essas comparações - dez anos de guerra no Vietnã para as mortes registradas pelos americanos. Então, durante dez anos morreram 50 mil soldados americanos no Vietnã e, em um ano, morreram 50 mil pessoas no Brasil. Parabéns a V. Exª!

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Agradeço, Senador Hélio Costa, o aparte. V. Exª tem absoluta razão. Precisamos fazer algo para que a situação não se agrave. Na última sexta-feira, o Jornal Nacional divulgou ampla matéria, citando inclusive dados de um hospital de Belo Horizonte, dizendo que, em comparação com o ano anterior, houve um aumento, nos primeiros meses do ano, de 15% de pessoas atingidas por arma de fogo em Minas Gerais, apenas naquele hospital, o que significa dizer que a situação está se agravando e o problema precisa ser irreversivelmente enfrentado.

Ouço com satisfação o aparte do Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB - SE) - Senador Renan Calheiros, sou vizinho de V. Exª e tenho a honra de dizer que, apesar de no passado o Estado de Alagoas ser marcado pela violência, pela criminalidade sem justificativa, V. Exª é um dos exemplos de homem de paz e de trabalho. E tem revelado essa propriedade que é típica do homem de bem ao longo da carreira política, seja como Líder do PMDB, seja como Ministro da Justiça, sempre trabalhando pelas boas causas. Prova disso é que, nesta convocação extraordinária feita pelo Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a apreciação das Reformas Previdenciária e Tributária, chamou a atenção não só da Casa, mas de todo o Brasil, o projeto que V. Exª retomou sobre a questão do desarmamento do povo brasileiro. Não se trata apenas do desarmamento de espírito, mas de dar instrumentos à população e conscientizá-la de que a violência leva à violência e que a arma, em vez de proteger, muitas vezes é a causa da morte. Temos visto na televisão e nos jornais casos de pessoas que puxam a arma para um bandido. Mas ele já está prevenido, treinado, disposto a matar, e consegue seu intento, principalmente em se tratando de uma pessoa despreparada para prevenir o crime, para enfrentar o criminoso. V. Exª tem razão nesta luta e, por esse motivo, tem o apoio e o beneplácito de todos os Senadores, indiferentemente de partido político. V. Exª dá um exemplo nesta Casa de como um Parlamentar do Nordeste, uma região tão sacrificada não apenas pela violência do crime, mas também pela pobreza, deve se comportar no exercício de sua função de Senador.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Agradeço feliz e honrado o aparte de V. Exª, Senador Antonio Carlos Valadares. V. Exª tem absoluta convicção de que, muitas vezes, as pessoas armadas entendem que estão protegidas, porque o Estado não faz sua parte. Mas há um pouco do desenvolvimento da chamada cultura do medo. Como o Estado não faz sua parte, as pessoas procuram se armar para se defender. Porém, as pessoas que agem assim, na maioria das vezes - V. Exª o disse muito bem -, não sabem manejar armas, nunca atiraram. Além do mais, o bandido sempre surpreende a vítima. Se o bandido pressentir que o cidadão de bem, que a vítima está armada, ele não lhe dará as costas jamais, porque teme ser alvejado. Ele prefere atirar. Seria mais um na triste e fria estatística criminosa dele. Ele surpreende, sabe manejar armas; já a pessoa de bem não sabe manejá-las e é surpreendida. Então, se as armas não servem para proteger o cidadão, armas para quê? Para continuar envergonhando o Brasil, pela banalização dos crimes?

Fizemos uma lei aqui, a Lei do Sinarm, com a melhor das intenções. Foi uma lei criteriosa, que permitiu avanços, Porém, lamentavelmente, ela aperta criteriosamente, mas burocratiza o acesso às armas, pois, para que a pessoa compre uma arma e tenha o seu registro, exige-se um teste psicotécnico e uma demonstração de que sabe atirar. Assim, os interessados em obter armas preferem ficar na ilegalidade.

Hoje não se tem mais no Brasil um estabelecimento que venda somente armas. Vende-se conjuntamente outros tipos de produtos, porque as pessoas preferem comprar armas clandestinamente. Em qualquer lugar que se chegue, diante das dificuldades estabelecidas pela lei - e muito bem estabelecidas -, as pessoas preferem comprar uma arma sem dificuldades, sem burocracia. O Jornal Nacional apresentou, há dias, uma matéria com enorme repercussão sobre armas vendidas no Paraguai e entregues no Brasil, sem que houvesse absolutamente nenhuma ação para impedir tal operação.

O sistema de segurança precisa ser modificado como um todo. Precisamos unificá-lo, redefinir o papel das polícias, as atribuições da guarda municipal. Concordo com o Senador Romeu Tuma: esse é um assunto inadiável, que precisa ser discutido. É necessário garantir mais recursos para a segurança pública, precisamos regulamentar a Lei de Abate, para guardar melhor nossas fronteiras. Esse também foi um avanço que se permitiu no Congresso Nacional, mas que não teve a correspondente regulamentação do Poder Executivo.

Quando fui Ministro da Justiça, negociei com os ministérios militares a regulamentação dessa lei e mandei para o Palácio do Planalto. Infelizmente, essa regulamentação não se concretizou, não evoluiu, em detrimento do interesse nacional. Na oportunidade, disseram que houve reação dos Estados Unidos. Isso não pode ocorrer, porque só teremos condições de guardar nossas fronteiras se houver a Lei do Abate, para que as pessoas temam ocupar nosso espaço aéreo, como temem ocupar o de outros países. Da forma como está, é impossível. Temos que proibir a comercialização de armas, mas, primeiramente, é mister combater o tráfico, a venda ilegal, a importação clandestina de armas para o nosso País.

Esse esforço tem que ser feito ao mesmo tempo, para que possamos, como disse o Senador Aloizio Mercadante, Líder do Governo - que tem ajudado demais no andamento e na tramitação dessa matéria -, construir no Brasil uma cultura de paz.

Quero agradecer a V. Exª, Senador Romeu Tuma, que tem ajudado muito na condução de assuntos de segurança aqui no Senado Federal, bem como, mais uma vez, ao Presidente do Senado Federal, Senador José Sarney, ao Presidente da Subcomissão de Segurança Pública, Senador Tasso Jereissati, e principalmente ao Senador César Borges, autor do mais conseqüente relatório já feito aqui no Senado Federal. O relatório proíbe o porte de armas desde já, a comercialização de armas - mas com consulta à população para que isso se concretize - e cria as maiores restrições que se podem criar para a venda de armas no País.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma) - Senador Renan Calheiros, não sei se V. Exª permitiria que eu fizesse um apelo. Sei que a Mesa não pode interferir, mas V. Exª poderia compor o seu discurso com um apelo ao Ministério das Relações Exteriores para que faça cumprir os acordos internacionais, principalmente com o Paraguai, a fim de que a autoridade diplomática do lado de lá comunique, quando da venda das armas, quem as compra e para onde vão. Penso que isso tem importância nesse quadro incontrolável de contrabando e tráfico de armas.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - V. Exª tem absoluta razão. É importante que isso ocorra. Quando Ministro da Justiça, não conseguimos acesso ao cadastro de venda de armas dos Estados Unidos, informação importantíssima para que tivéssemos conhecimento sobre quem comprava, importava armas, sobretudo armas pesadas, no Brasil. E isso ocorre - como menciona V. Exª também - com países limítrofes nossos, para onde, muitas vezes, é vendida a nossa exportação, a nossa produção legal. A venda é feita legalmente, mas seu produto retorna ilegalmente para circular no nosso mercado, armar a nossa população e aumentar a violência.

Muito obrigado, Senador Romeu Tuma.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/07/2003 - Página 18427