Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre o Projeto de Lei do Senado 172, de 2003, que trata do registro digital do voto, aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal. (como Lider)

Autor
Almeida Lima (PDT - Partido Democrático Trabalhista/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Comentários sobre o Projeto de Lei do Senado 172, de 2003, que trata do registro digital do voto, aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal. (como Lider)
Aparteantes
Eduardo Azeredo, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 23/07/2003 - Página 19448
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • MANIFESTAÇÃO, PROTESTO, RETIRADA, ASSINATURA, SENADOR, REQUERIMENTO, APRECIAÇÃO, PLENARIO, PROJETO DE LEI, APROVAÇÃO, DECISÃO TERMINATIVA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, ENCAMINHAMENTO, CAMARA DOS DEPUTADOS, SUJEIÇÃO, SENADO, JUSTIÇA ELEITORAL, ALTERAÇÃO, SISTEMA, VOTAÇÃO, AUSENCIA, EXIGENCIA, IMPRESSÃO, VOTO, OBJETIVO, CONFIRMAÇÃO, ELEITOR.
  • DECLARAÇÃO, VOTO CONTRARIO, ORADOR, PROJETO DE LEI, PREJUIZO, GARANTIA, SEGURANÇA, LEGITIMIDADE, ELEIÇÕES.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), PREJUIZO, FISCALIZAÇÃO, PROCESSO ELEITORAL, APARELHO ELETRONICO, REPUDIO, INTERVENÇÃO, JUDICIARIO, LEGISLATIVO.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, agradeço a V. Exª pela compreensão. Procurarei ser o mais breve possível.

Srªs e Srs. Senadores, há aproximadamente 20 dias, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania apreciou projeto de lei, em caráter terminativo, que objetiva a mudança do sistema eletrônico de votação vigente. Naquela oportunidade, manifestei-me contrário à matéria e fui voto vencido.

Imediatamente, apresentei recurso à Mesa, com assinaturas de aproximadamente 12 Senadores, já que há exigência regimental de, no mínimo, nove Senadores.

Para minha surpresa, embora seja um direito legítimo dos Srs. Senadores, no último dia, no derradeiro instante de encerramento do prazo, quatro Senadores retiraram suas assinaturas, e o recurso ficou impossibilitado de ter o seu seguimento, com a apreciação da matéria pelo Plenário desta Casa. Em princípio, a apreciação da Comissão de Constituição e Justiça tinha caráter terminativo, mas, com o recurso, a matéria seria reapreciada pelo Plenário desta Casa.

Lamentei o fato. Embora matéria vencida, já encaminhada à Câmara dos Deputados, venho à Tribuna desta Casa para estabelecer o meu protesto, por entender que o Poder Legislativo, que o Senado Federal assume uma posição de submissão diante da Justiça Eleitoral deste País. Temos as informações necessárias para esta conclusão, diante das injunções do TSE para a mudança do sistema de votação, que, pela legislação atual, exige que o voto seja impresso, visto pelo eleitor, sem que ele possa tocá-lo. Ao final, ele confirma e o voto vai para a urna, podendo se estabelecer a conveniência da recontagem de votos pela prova material que lá fica depositada. Muitas justificativas foram estabelecidas e procurei aprofundar, exatamente em cima de todas elas, um estudo e cheguei à conclusão de que nenhuma delas se justifica. Na verdade, o que estamos vendo é a fragilização do sistema de votação neste País, caso seja aprovado pela Câmara dos Deputados e sancionado pelo Presidente da República, enfraquecendo a democracia, pois esta pressupõe a legitimidade do processo eleitoral e, como se propõe, não se assegurará a legitimidade, pois não garante a segurança e a honestidade dos pleitos.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Concedo o aparte ao nobre Senador Eduardo Azeredo, que foi o Relator da matéria na Comissão a que me reportei.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Sim, Senador Almeida Lima. Eu quero dizer que, na verdade, eu não fui Relator. Eu fui o autor do projeto, projeto esse que procura exatamente o oposto do que V. Exª diz. Ele procura garantir mais ainda a honestidade do processo, a integridade do voto - é um avanço. Veja bem que nós não estamos mudando nada do sistema de votação. A votação continuará eletrônica como foi nos dois últimos pleitos ou nos três últimos pleitos. Será eletrônica do mesmo jeito. Nós vamos continuar digitando os números; vai aparecer o retrato do mesmo jeito; vamos ter que confirmar do mesmo jeito. A única alteração é que não há impressão em papel. Em vez da impressão em papel, haverá a digitalização, a gravação no meio magnético. A possibilidade de recontagem continua existindo, só que, em vez da recontagem ser a partir do papel, ela será a partir do meio magnético. Como expliquei na Comissão, o voto continua eletrônico, que é um grande avanço que o Brasil conseguiu e que é muito melhor que a votação manual de anos atrás. O que muda é apenas a cópia que, em vez de ser em papel, ficará num meio magnético, o que possibilitará a recontagem da mesma maneira. O programa que gravará esses votos no meio magnético estará à disposição dos partidos 6 meses antes das eleições. Então, trata-se, na verdade, de confiarmos na tecnologia, que não nos tem deixado nenhuma margem para desconfiança nesse caso. Discordo de V. Exª, pois o projeto pode até interessar ao TSE, mas ele é de minha autoria, que sou da área de computação. Formei-me em Análise de Sistemas em 1970 e acompanho o voto no Brasil há muito tempo. Em 1985, fiz uma viagem a vários países para poder buscar alternativas para o voto no Brasil. Fui fiscal durante muitos anos da totalização eletrônica nas eleições brasileiras. E a origem do projeto foi minha. Reconheço que o TSE concorda com essa modificação, porque ela simplifica e diminui o custo. Entretanto, o mais importante é o que estou querendo deixar claro: não há nenhuma modificação do ponto de vista do voto do eleitor. O eleitor vota do mesmo jeito. Também pode haver a recontagem da mesma maneira; apenas, em vez de ser feita a partir do papel, ela é uma recontagem a partir de meio magnético.

O SR. ALMEIRA LIMA (PDT - SE) - Agradeço o aparte de V. Exª e respeito sua posição, mas permita-me continuar discordando e prestar um esclarecimento: não somos contra. O meu Partido não é contra o voto eletrônico; somos a favor. Não se pretende voltar ao sistema antigo, não! Mas a tecnologia permite que avancemos, sem que haja prejuízo à legitimidade. Estamos vendo historicamente no quadro comparativo que tenho em mão o projeto do então Senador Roberto Requião e o Substitutivo do Senador Romeu Tuma em comparação ao apresentado pelo TSE, quando era Presidente o ex-Deputado, hoje Ministro, Nelson Jobim. E nós percebemos por esse quadro comparativo e pela história deste Parlamento a tendência permanente do Tribunal Superior Eleitoral de criar dificuldades para que os partidos possam estabelecer a fiscalização.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é isto que precisa ser dito: não podemos ver de forma subalterna o Poder Legislativo diante do Poder Judiciário. E digo mais: este projeto que foi aprovado na Comissão não assegura legitimidade, não! Enquanto o cidadão marca o número, digita o número 1, por exemplo, e sai a foto, não se sabe e não se pode garantir se lá internamente fica registrado o número 1 ou outro número que transferiria o voto para outro candidato.

Existe a proposta da assinatura eletrônica. Mas há uma diferença! Estudei o assunto com técnicos. Percebi que a assinatura é colhida ao final de todo o processo de votação e não de forma permanente. Não sou contra a assinatura eletrônica ao final, mas é preciso que ela venha paralelamente com a prova material. É tão verdadeira essa necessidade que um Deputado americano propôs, ao discutir a sistemática eleitoral - e tenho em mão o seu pronunciamento -, o processo eletrônico com o comprovante material escrito, porque ninguém garante que, ao final, sem a prova material, a assinatura eletrônica não seja outra.

O nosso Partido, o PDT, é gato escaldado nessa manobra. Quem não se recorda do caso, no Rio de Janeiro, da PRÓ - Consult, que derrotou o nosso Presidente Nacional, Leonel Brizola? Após repetidas denúncias e o conhecimento internacional, aqueles que começaram a praticar as injunções e as ilegalidades se recolheram e o processo foi revertido, com a participação de técnicos, de pessoas ligadas ao Serviço Nacional de Informações - SNI. Não podemos aceitar esse tipo de mazela. Não podemos aceitar a prova material.

No Estado de Sergipe, na última eleição, não houve nenhum reclamo, nenhum problema com a urna eletrônica. Onde foi implantada, não houve dúvida a respeito do resultado da votação, nem pedido de recontagem de votos, porque nenhuma fraude houve.

O SR. PRESIDENTE (Leonel Pavan) - Senador Almeida Lima, para evitar que a reunião se encerre às 18 horas e 30 minutos e para que V. Exª possa terminar seu brilhante pronunciamento, prorrogo a reunião por 5 minutos.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Agradeço a V. Exª e, com muito prazer, concedo um aparte ao Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Nobre Senador Almeida Lima, a preocupação de V. Exª é perfeitamente cabível, mas quero citar outros problemas. Por exemplo, no Tribunal Eleitoral da Paraíba, tramita uma representação pelo fato de que mais de mil máquinas foram manipuladas na madrugada. A prova dessa manipulação é que a memória gravou a hora da intervenção: 3 ou 4 horas da madrugada, quando, há muito, a eleição havia encerrado. Porém a má-fé, melhor dizendo, a má-vontade de todos os que elogiam as máquinas é tanta, que, quando se fala a respeito, ouve-se: “Homem, isso era melhor deixar. Os modelos novos deverão ter algumas outras travas que não permitam a intervenção”. Mas a verdade é que está em tramitação e o ex-Governador e o Senador José Maranhão entraram na Justiça, e há, como S. Exªs mostram no relatório, centenas de máquinas que tiveram, na madrugada, seus relatórios modificados.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Agradeço-lhe o aparte e digo mais: esta é a tendência que vem esboçando o Tribunal Superior Eleitoral. Nesse quadro comparativo, pelo projeto inicial do Senador Roberto Requião e pelo substitutivo do Senador Romeu Tuma, estabelecia-se, por exemplo, que 3% das urnas seriam sorteadas, ao final da eleição, para uma verificação. E a proposta que ficou prevalecendo, vinda do Tribunal Superior Eleitoral, vem expressa na Lei Jobim, de nº 10.408/2002, que estabeleceu que esse sorteio deveria ser prévio à eleição. É como, numa partida de futebol, fazer-se o sorteio antidoping antes do jogo, não após.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador Almeida Lima, V. Exª me permite mais um aparte?

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Concederei. Tenho certeza de que V. Exªs conhecem, todos conhecemos a obra “O Espírito das Leis”, de Montesquieu, que, entre tantos ensinamentos, nos deixou um legado que foi o da tripartição dos Poderes no Estado em Executivo, Legislativo e Judiciário.

Aprendi nos bancos escolares que cabe ao Poder Legislativo, com a participação do Executivo, a elaboração das leis e ao Judiciário cumpri-las. Mas parece-me que neste País é o Poder Judiciário que deseja elaborar as leis e é o Tribunal Superior Eleitoral que intervém, freqüentemente, na elaboração de leis, através de resoluções ou na injunção direta junto ao Parlamento, quando entendemos que eles podem, legitimamente, ter participação nas discussões, mas devem aguardar a edição das leis para fazê-las cumprir, função do Poder Judiciário, não se intrometendo na elaboração das leis, que é o que estamos presenciando no estudo aprofundado que se faz sobre a matéria.

Concedo, mais uma vez, o aparte ao Senador Eduardo Azeredo.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Perdoe-me retornar ao assunto. Eu gostaria somente de lembrar que o voto, como está vigorando, porque o projeto ainda tem que ser aprovado na Câmara, não permite ao eleitor ver a impressão no papel. Ela é interna, dentro da máquina. O que foi aprovado, pelo projeto do Senador Roberto Requião, é que, depois de digitado o número, de aparecer a fotografia, de confirmado o voto, há uma impressão interna na máquina, que joga um pedacinho de papel dentro da máquina. E o eleitor não vê o papel.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Senador Eduardo Azeredo, por amor ao debate... A impressão é vista pelo eleitor, que confirma o voto final. Foi assim no meu Estado, Senador!

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Não, V. Exª está enganado! Ele confirma na tela, não confirma no papel, até porque isso quebraria a confidencialidade do voto. Ele não vê no papel, mas na tela. A impressão em papel é para registro no caso de haver necessidade de recontagem.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Há impressão no papel, que passa por um duto que conduz à urna, sem que ele possa tocar.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Ele não vê o voto no papel, só na tela. Quero dizer isto: ele não vê no papel!

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Ele confirma exatamente o voto no papel.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Confirma o voto eletrônico, como fazemos aqui.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Por amor ao debate... Devolverei a palavra a V. Exª.

O art. 59, §4º, da Lei, porque é a essa que me reporto, diz textualmente:

A urna eletrônica disporá de mecanismo que permita a impressão do voto, sua conferência visual e depósito automático, sem contato manual, em local previamente lacrado, após conferência pelo eleitor.

O duto é transparente. Ele confere, mas não pega, não mantém contato manual com a cédula. Mas, conferida, vai para a urna, que é um outro depósito.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador, a conferência é na tela eletrônica, onde se confirma. Isso vai continuar existindo, e o voto continuará a ser impresso no disquete. Agora, como V. Exª disse aqui, quem garante que, quando se digita o número um, é este que será computado? Portanto, V. Exª não pode votar aqui no Senado Federal, pois aqui também votamos dessa maneira. V. Exª deve desconfiar das máquinas daqui também.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Pois foi o que aconteceu. V. Exª e o Brasil todo têm conhecimento.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Não, não foi isso que aconteceu.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Acredito nas máquinas. O que é preciso, Senador Eduardo Azeredo,...

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Não foi isso que aconteceu.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - O que é preciso que se diga, e eu disse na Comissão, permita-me V. Exª,...

O SR. PRESIDENTE (Leonel Pavan) - Senador Almeida Lima, a Presidência avisa que V. Exª ultrapassou o tempo e pede que conclua o pronunciamento.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Por amor ao debate, tenha certeza V. Exª, Senador Eduardo Azeredo, que poderemos voltar ao tema. Concluo dizendo exatamente o que disse na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania: confio nas máquinas e no avanço tecnológico. Mas quem leu O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, sabe perfeitamente que não dá para confiar nos homens, sobretudo quando o poder está em jogo. Neste País e no mundo faz-se de tudo por um mandato de vereador, prefeito, governador, deputado, senador e presidente da República, inclusive fraudar eleições. A história tem registrado isso. Lamento não poder confiar nos homens. Nas máquinas, na sua tecnologia, confio. Afinal de contas, foi o que disse na Comissão.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Mas as máquinas são comandadas pelos homens, Senador.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Ao concluir, uma homenagem a Santos Dumont: o cidadão sobe em um avião, que é todo computadorizado. Portanto, confio na máquina, mas não dá para confiar sempre nos homens.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Leonel Pavan) - Sabemos que o debate ocorrerá por diversas vezes nesta Casa. Porém, fomos obrigados, nobre Senador, a pedir que V. Exª encerrasse o seu pronunciamento.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/07/2003 - Página 19448