Discurso durante a 95ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre estudo da ONU que aponta a manutenção das desigualdades regionais no país. (Como Líder)

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Considerações sobre estudo da ONU que aponta a manutenção das desigualdades regionais no país. (Como Líder)
Aparteantes
Augusto Botelho, Demóstenes Torres, João Capiberibe, Sergio Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/2003 - Página 23275
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), ANALISE, INDICE, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, PAIS, MUNDO, MELHORIA, POSIÇÃO, BRASIL, RESULTADO, ALTERAÇÃO, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.
  • REGISTRO, DADOS, ESTUDO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), CONFIRMAÇÃO, MANUTENÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, BRASIL, AGRAVAÇÃO, POBREZA, REGIÃO NORTE.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AGILIZAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, POLITICA, PROMOÇÃO, REGIÃO NORTE, CONTRIBUIÇÃO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mês passado, jornais de grande circulação nacional, como Folha de S.Paulo e Zero Hora, deram intenso destaque a um relatório da ONU sobre o IDH no mundo. A Folha de S.Paulo ressaltou que a vida no mundo piorou na década de 90, principalmente nos países em desenvolvimento e desenvolvidos. O que mais nos chama a atenção é que, segundo o relatório da ONU, o Brasil é o país que mais cresce em qualidade de vida. É muito alvissareiro para nós, brasileiros, constatar que, apesar do dia-a-dia que sentimos na pele, a avaliação desses índices mostra que o Brasil foi o País que melhor cresceu na qualidade de vida, segundo relatório da ONU.

Se isso, por um lado, para nós brasileiros a notícia no alegra, Sr. Presidente, para nós da Região Norte ela tem uma nota muito triste, pois diz que no Brasil a pobreza só cresceu no Norte do País. Então, é lamentável que um País que já é desigual por natureza continue crescendo desigualmente. Isto é, o Norte só cresceu em pobreza, enquanto que o Sul de novo cresce em riqueza e qualidade de vida. Aliás, não é uma crítica ao Sul. Ao contrário, admiramos os padrões de vida do Sul e do Sudeste. Agora, aqui, cabe realmente uma análise muito séria para que o Governo Federal, o Governo do Presidente Lula, que está preocupado com a pobreza, com a qualidade de vida, faça efetivamente um programa que possa corrigir tamanha distorção em pleno século XXI. A propósito, participei de uma reunião, no Estado do Acre, presidida pelo Presidente Lula, com a presença do Ministro Ciro Gomes, da Integração Nacional; com a Ministra Marina Silva, do Meio Ambiente; e vários outros Ministros. O Presidente deu ali, vamos dizer, o start para a elaboração de um plano de desenvolvimento, incluindo a Amazônia, onde estão todos os Estados da Região Norte e mais o Estado do Mato Grosso e o Estado do Maranhão. Ocorre que precisamos com urgência de um plano para desenvolver a Região Norte do Brasil.

Não é possível! Eu tenho lido - desde quando comecei como Deputado em 1982 -, ouvido e presenciado, permanentemente, Parlamentares e Governadores da Região clamarem por soluções que eliminem as desigualdades regionais. No entanto, sai Governo, entra Governo e aquela população de vinte e poucos milhões de brasileiros não vê, na verdade, essa diferença, essa distância em todos os aspectos da Região Norte diminuir sequer em relação aos padrões da Região e Nordeste.

Aliás, pelo Novo Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, do Ipea, os Estados que mais subiram nesse ranking foram o Ceará, que passou da vigésima terceira posição para a décima nona, e o Mato Grosso, que passou da décima segunda para a nona posição. Os Estados de Rondônia, Tocantins, Bahia e Goiás ganharam duas posições cada um e os que mais caíram foram o meu Estado, Roraima, o Amazonas e o Acre, três Estados da Região Norte.

Então, Sr. Presidente, faço este registro para pedir ao Governo Lula providências rápidas, que encarem a Região Norte não como uma única Amazônia, pois somos vários ecossistemas. O Amapá não é o mesmo que Roraima, assim como o Acre também não é. Há que se ter um planejamento que leve em conta a peculiaridade de cada Estado, o que o Presidente Lula tem enfatizado, ao falar de um planejamento de desenvolvimento setorizado para a Amazônia, levando em conta cada área e cada vocação.

Concedo um aparte ao Senador Augusto Botelho, com muito prazer.

O Sr. Augusto Botelho (PDT - RR) - Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª fala dos diferentes tratamentos que os Estados do Norte e do Nordeste recebem do Governo Federal e das injustiças que são cometidas. Logo, logo teremos mais uma, pois sempre houve isenção fiscal nos Estados do Sul e do Sudeste, que a concederam quando quiseram e pelo tempo que consideraram necessário. Quando o Norte e o Nordeste estão se estruturando em relação à energia elétrica e vão começar a ter direito a conceder isenção fiscal, vem uma proposta querendo acabar com a isenção fiscal, com a guerra fiscal. Mais uma vez, nós, dos Estados do Norte e do Nordeste, vamos ser prejudicados pelas medidas que são tomadas sem considerar as nossas condições. Isenção fiscal é algo que estimula uma indústria a ir para a Bahia, para Roraima, para o Amazonas. Como vamos ficar se acabarmos com isso na reforma que vamos fazer? Mudam as regras do jogo agora que vamos ter condições de nos desenvolver? Penso que nós, os nortistas e os nordestinos, devemos nos bater contra a extinção do poder do Estado de dar isenção fiscal. Era isso o que eu gostaria de dizer ao Exmº. Colega.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Agradeço o aparte de V. Exª.

Concedo um aparte ao Senador Demóstenes Torres.

O Sr. Demóstenes Torres (PFL - GO) - Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª está abordando com muita propriedade um tema que vem sendo mascarado pela sociedade brasileira: o desenvolvimento de regiões como as Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Brasil. Fala-se muito em se estabelecerem sistemas de cotas para resolver os problemas das mulheres, dos afrodescendentes e dos portadores de necessidades especiais. E é bom que isso aconteça. Realmente, temos que ter ações afirmativas nesse sentido, não sei se estabelecendo cotas definitivamente; mas temos que ter ações afirmativas nesse sentido. E o Governo brasileiro precisa de ações afirmativas para desenvolver as nossas regiões mais carentes. Não podemos pensar que o grande número de brasileiros que existem nessas regiões deve estar sempre numa posição de desigualdade em relação a seus irmãos do Sul e do Sudeste do Brasil. Senador Mozarildo Cavalcanti, quero me congratular com V. Exª e também dizer que concordo com seu ponto de vista. A reforma tributária que está sendo encetada no Brasil é discriminatória. E nem reforma tributária é, mas um arremedo, algo realizado apenas para encher o caixa do Governo Federal e que, mais uma vez, fará com que percamos receita. Imagine a Região Norte na situação calamitosa como a que V. Exª descreve e ainda perdendo recursos! Isso é absolutamente impensável. Devemos nos unir em plenário para mostrar essa realidade absolutamente diferente daquela que muitos imaginam por não morarem em nossas regiões. Isso seria muito importante. O Brasil não merece ter apenas uma ou duas regiões desenvolvidas. É fundamental que todos, efetivamente, tratemos bem cada brasileiro, dando melhores condições de educação, saúde etc. Fazendo isso, claro que teremos um Brasil melhor. Precisamos acabar com o pensamento do brasileiro de que, um dia, seremos o País do futuro. Devemos ser o país do presente. As nossas necessidades devem ser sanadas hoje. E V. Exª mete o dedo na ferida.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Senador Demóstenes Torres, agradeço o aparte de V. Exª.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Senador Mozarildo Cavalcanti, concede-me V. Exª um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Concedo, com muito prazer, um aparte ao Senador João Capiberibe.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Senador Mozarildo Cavalcanti, tenho acompanhado os pronunciamentos de V. Exª proferidos na tribuna do Senado, demonstrando suas preocupações em relação ao desenvolvimento da Amazônia e, em particular, do seu Estado, Roraima. Estamos num momento muito importante na vida política e econômica para a Região Amazônica. Há dois grandes programas em discussão: o Programa de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia, em cujo lançamento, no dia 09 de maio, em Rio Branco, estivemos presentes e que tem suas bases nas teses do desenvolvimento sustentável, e o Programa Plurianual 2003/2007. Pergunto: quem balizará os rumos do desenvolvimento para a Amazônia? O Programa de Desenvolvimento Sustentável ou o PPA? Quem tem prioridade? Penso que o PPA deve ser o sustentáculo de um dos pontos do Programa de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia, que são os investimentos para o desenvolvimento, pois ele já está delineando vários investimentos para a região. Pergunto a V. Exª: esses delineamentos de novos investimentos para a Amazônia, seja em energia ou em estradas, correspondem às diretrizes do Programa de Desenvolvimento Sustentável lançado pelo Presidente Lula ou são à parte? Preocupo-me com essa questão, porque tive a oportunidade de conversar com os Senadores de Rondônia e concluímos que o linhão que coloca Porto Velho no sistema integrado nacional está perdendo espaço para o investimento na construção de novas hidrelétricas. Enquanto a construção de novas hidrelétricas tem custos financeiros e ambientais elevados, o linhão tem custos financeiros ambientais muito menores. Então, precisamos estar um pouco mais atentos para fazer a intersecção entre o Programa de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia, lançado pelo Presidente Lula, e o PPA, porque, se não a fizermos, serão feitos investimentos que contrariam completamente a linha do programa.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Senador João Capiberibe, pelo que entendemos, pelo menos o que entendi, daquela reunião no Acre, a intenção do Presidente Lula, ao designar o Ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, e a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é justamente coordenar as ações de todos os Ministérios do Governo para fazer um plano que não apresente duplicidade ou até mesmo contradições em relação às propostas para a Amazônia.

O que penso, Senador João Capiberibe, Senador Demóstenes Torres e Senador Augusto Botelho, é que, na verdade, o Norte, a Amazônia, assim como o Nordeste e o Centro-Oeste não podem continuar sendo problemas apenas dos Parlamentares dessas regiões. Não podem continuar sendo olhados, digamos assim, pela elite que pensa, ou pela elite que planeja, ou pela elite que executa, apenas como regiões subdesenvolvidas que apresentam problemas. O Brasil tem que pensar essas regiões como problemas do Brasil e, assim, encarar e buscar soluções que digam respeito ao Brasil como um todo. A Amazônia não pode ser, portanto, encarada isoladamente, bem como o Nordeste. Não podemos ficar aqui, as Bancadas dessas regiões, brigando por soluções às vezes pontuais, enquanto o Brasil não tem um planejamento estratégico que ataque a questão da desigualdade, como estabelece a própria Constituição, que vê como um dos objetivos da República a eliminação das desigualdades regionais. Para não ser letra morta, é, portanto, necessário que também o Sul e o Sudeste encarem esse problema não apenas como específico dessas regiões. O que acontecerá se assim continuar? A população das regiões mais pobres vai continuar migrando para as mais ricas, agravando os problemas sociais das grandes cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte entre outras.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Concedo, com muito prazer, um aparte ao Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senador, ouço o discurso de V. Exª, homem de uma região de imensas necessidades e grandes potencialidades, e gostaria apenas de fazer duas ponderações. V. Exª afirmou que é prova de sensibilidade do Governo atual a indicação de dois Ministros que têm a ver com a Amazônia e com o Brasil - no geral até concordo - para cuidar, num sentido mais amplo, do problema da integração econômica que estaria contemplado nas estratégias do chamado Plano Plurianual. Primeiro, os chamados PPA são projetos grandiloqüentes, cheios de intenções, mas pobres de instrumento, que se transformam em metas referenciais e, como tal, inconsistentes. Na verdade, o grande desequilíbrio da política atual, como o das políticas anteriores, é que as idéias de integração econômica e social, as idéias de prioridade para regiões que precisam ser incorporadas, têm apoio desses Ministérios, mas não atravessam as portas do Ministério da Fazenda. Então, tantas e tantas programações, projetos e intenções esbarram em orçamentos ridículos. Não tenho certeza, mas, aparentemente, o próximo Orçamento da União virá na contramão dessas intenções. O que parece e o que tudo indica é que políticas compensatórias, que não servem para nada, é que terão algum apoio, pois são eleitorais, atendem uma massa que precisa de algo. Mas solução mesmo depende de prioridade, e prioridade depende da Fazenda, do Planejamento, que têm o controle dos recursos. A atual política, como a que vem de muito tempo, jamais estabeleceu prioridades para Regiões Norte e Nordeste.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Senador Sérgio Guerra, em parte concordo com V. Exª, mas as mazelas que estão refletidas nesses números não são evidentemente deste Governo e nem são exatamente do Governo Fernando Henrique. Elas vêm de uma sucessão de governos que não se preocuparam efetivamente em fazer o planejamento geoestratégico para o País e não conseguiram colocar nos postos-chave o Planejamento e a Fazenda, a idéia de que é preciso desenvolver as regiões menos desenvolvidas para o bem das regiões mais desenvolvidas. Portanto, o País continua aprofundando as diferenças regionais.

Quando se toma qualquer iniciativa, como, por exemplo, a emenda constitucional, de minha autoria, que iria destinar recursos para as universidades federais da Amazônia, agora estendida para o Centro-Oeste e Nordeste, ou como o projeto que pretende que o BNDES aplique recursos nas regiões menos desenvolvidas, há sempre uma reação do próprio Governo - entenda-se Planejamento e Fazenda - contra a idéia de se destinar recursos para regiões menos desenvolvidas. Não entendo como é que pode um banco de desenvolvimento econômico e social investir mais em regiões mais desenvolvidas.

Sr. Presidente, encerro o meu pronunciamento, agradecendo os apartes, mas chamando a atenção da Casa, que representa os Estados, para este triste dado: a Região Norte foi a única que cresceu em pobreza no País, enquanto o Brasil foi o único País que cresceu em desenvolvimento humano no mundo.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/2003 - Página 23275