Discurso durante a 95ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Participação dos Estados na Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE). Crítica a regras do FMI que restringem os investimentos dos estados brasileiros e das empresas estatais. (Como Líder)

Autor
Hélio Costa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MG)
Nome completo: Hélio Calixto da Costa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. DIVIDA PUBLICA.:
  • Participação dos Estados na Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE). Crítica a regras do FMI que restringem os investimentos dos estados brasileiros e das empresas estatais. (Como Líder)
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/2003 - Página 23281
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • CONGRATULAÇÕES, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DECISÃO, DESTINAÇÃO, ESTADOS, PARTE, RECURSOS FINANCEIROS, CONTRIBUIÇÃO, INTERVENÇÃO, DOMINIO ECONOMICO, EXPECTATIVA, ORADOR, ESTABELECIMENTO, CRITERIOS, REMESSA, GOVERNADOR, COTA, MUNICIPIOS, SITUAÇÃO, CRISE, FINANÇAS.
  • CRITICA, ACORDO, GOVERNO, ANTERIORIDADE, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), IMPOSIÇÃO, ABRANGENCIA, DEFICIT, GASTOS PUBLICOS, INVESTIMENTO, SANEAMENTO BASICO, MELHORIA, INFRAESTRUTURA, CIDADE, IMPEDIMENTO, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, ESTADOS.
  • SOLICITAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), PRESIDENTE DA REPUBLICA, RENEGOCIAÇÃO, ACORDO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), OFERECIMENTO, POSSIBILIDADE, BRASIL, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, VIABILIDADE, CRESCIMENTO ECONOMICO.

O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de tratar do tema principal do meu discurso, gostaria de cumprimentar o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porque, sexta-feira da semana passada, os Governadores receberam de Sua Excelência a notícia que estavam aguardando há muitos meses, desde o início do Governo; na verdade, desde o Governo anterior: a participação dos Estados na chamada Cide, a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - que também ninguém sabe direito do que se trata, mas, traduzindo em miúdos, é o imposto sobre o combustível.

Acordado que os Estados recebam 25% da Cide, agora é importante que se estabeleça o critério por meio do qual os Governos estaduais também possam demonstrar boa vontade, a exemplo do Governo Federal ao redistribuir os recursos aos Estados, concedendo parte desses 25% da Cide às cidades, aos Municípios, que estão em dificuldades seriíssimas em todo o País.

Existem critérios para atender às cidades neste momento, basta seguir, na distribuição dos 25% da Cide para os Estados, a orientação do Fundo de Participação dos Municípios.

Exemplo típico é o meu Estado, Minas Gerais, que tem 20 mil km de estradas federais. Lá, certamente os recursos da Cide serão muito bem aplicados em centenas de Municípios - Minas Gerais tem 850 Municípios. São centenas as pequenas cidades que se encontram às margens das rodovias federais, que são servidas por elas; rodovias que cruzam o Estado, da divisa da Bahia até a divisa de São Paulo; também aquelas que vão do pontal do Triângulo, na fronteira com Mato Grosso, até o Espírito Santo ou o Rio de Janeiro. As cidades incluídas nesses roteiros das estradas federais podem, sim, receber parte desses recursos da Cide. Esse seria um caminho democrático, um modo mais objetivo e mais criterioso de auxílio imediato às cidades que estão passando por dificuldades seriíssimas.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Nobre Senador Hélio Costa, perdoe-me. Quero apenas convidá-lo para o evento de amanhã. A instalação da Frente já ocorreu, mas, amanhã, receberemos milhares de Prefeitos. Convido não somente V. Exª, mas todos os membros do Senado Federal, para o evento, amanhã, às 14 horas, no Auditório Petrônio Portella.

O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG) - Muito obrigado, Senador Ney Suassuna.

Sr. Presidente, considero importantíssima a questão, pois, se o Governo, por meio do Presidente da República, do Ministro Antônio Palocci e do Ministro José Dirceu, aceitou a participação dos Estados nos recursos desse imposto de combustíveis, é fundamental que as cidades também tenham, dentro da participação que os Estados recebem, um quinhão, mínimo que seja, mas que ajudará - e muito - cada um deles, principalmente os do meu Estado, porque todas as cidades de Minas Gerais, do Rio de Janeiro, da Paraíba, de São Paulo e de todos os Estados estão passando por dificuldades.

Hoje, quero dirigir-me aos ilustres Senadores e Senadoras, nós, que temos obrigação constitucional de defender os interesses de nossos Estados.

Semana passada, um seminário internacional sobre Integração Latino-Americana, organizado pelo BNDES, no Rio de Janeiro, deixou claro que o acordo que fixa metas para o superávit primário estabelecido pelo Governo anterior com o Fundo Monetário Internacional, o chamado FMI, criou uma insuportável e inaceitável camisa-de-força, que literalmente impede o Brasil de voltar a crescer.

Trata-se de uma regra imposta pelo FMI que obriga Estados e Municípios a considerar como déficit público, em apenas um ano fiscal, o valor total de um investimento social que demanda anos para ser concluído, como é o caso das áreas de saneamento e habitação.

Vejam, Srªs e Srs Senadores, toda vez que uma cidade investe em saneamento e habitação, esse investimento é considerado déficit público. Todo investimento estadual em saneamento e em habitação é tido como déficit público; e, portanto, está amarrado ao acordo feito com o FMI - Fundo Monetário Internacional. Dessa forma, o Governo terá de indicar a não concretização desses investimentos, porque, infelizmente, uma vez feitos, ou seja, criado o déficit público, o Brasil terá suas relações com o Fundo Monetário Internacional prejudicadas.

Ora, Sr. Presidente, isso é um absurdo, porque, se Minas Gerais ou uma cidade importante do meu Estado pedir hoje ao BNDES R$6 milhões para fazer uma obra de saneamento, esse empréstimo será considerado déficit público durante todo o período de sua previsão. Se por dez anos, esse déficit existiria - e no mesmo valor - durante esse mesmo período. Como está, Sr. Presidente, esses seis milhões são considerados déficit público a partir do primeiro ano.

Isso não se faz; seria o mesmo que dizer aos Prefeitos, aos Governadores que não podem investir em saneamento. Agindo assim, o próprio Governo Federal ficará amarrado, porque, pelo menos dois mil Municípios brasileiros, perfeitamente enquadrados na Lei de Responsabilidade Fiscal, estarão proibidos, em razão dessa regra do Fundo Monetário, de contratar financiamentos para melhorar a sua infra-estrutura. São inúmeras as cidades brasileiras que podem e deveriam, sim, fazer investimentos na área de infra-estrutura, mas, lamentavelmente, não poderão.

Da mesma forma, essa regrinha criada pelo Fundo Monetário Internacional está impedindo a renegociação das dívidas de várias cidades brasileiras do Estado de São Paulo, de Belo Horizonte e de várias outras cidades brasileiras. Essa mesma regrinha está impedindo a renegociação das dívidas dos Estados que, desde 1998, estão praticamente trabalhando para pagar juros da dívida com o Governo Federal.

Vejam V. Exªs o que ocorre hoje com o Estado de Minas Gerais: todos os repasses mensais ao nosso Estado somam valor em torno de R$150 milhões. Ora, todos os meses, o Governo de Minas Gerais paga juros de amortização da sua dívida com o Governo Federal no valor de R$130 milhões. Do que recebemos para a saúde, para a educação e para investimentos em saneamento, dos R$150 milhões mensais recebidos, temos de devolver, todos os meses, R$130 milhões.

E não se pode mudar essa regra porque o Fundo Monetário Internacional, mais uma vez, impede a renegociação da dívida das cidades, atrapalha o investimento do Governo em saneamento e em habitação, impede o Estado de renegociar sua dívida. Mesmo Estados que poderiam, sim, e estão em condições de renegociar, lamentavelmente, esbarram nessa situação criada pelo Fundo Monetário Internacional; mais precisamente no art. 35 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que engessou as negociações e impede qualquer renegociação da dívida dos Estados.

Mas a restrição baixada pelo FMI não atinge apenas Estados e Municípios; ela também não poupa as estatais, essenciais para a retomada do crescimento econômico, como é o caso de Furnas

Sr. Presidente, Furnas está impedida de buscar financiamentos para criar uma nova distribuidora de energia que atenda ao crescimento da demanda do Estado de Minas Gerais e certamente de vários outros Estados, porque, hoje, em Minas Gerais, produzimos 43% de toda a energia gerada no País. E os investimentos nas estatais também caem nessa regra imposta pelo Fundo Monetário Internacional. O investimento que a estatal fizer será considerado déficit público e, portanto, atrapalhará o ajuste de contas do Governo Federal, do Governo dos Estados, das estatais e dos Municípios.

Precisamos fazer um apelo dramático ao Ministro Palocci e ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para encontrarmos uma maneira de renegociar com o Fundo Monetário Internacional e sair desse engessamento. Do contrário, não teremos condições de recomeçar.

O Governo está fazendo um esforço enorme. Atualmente, há um superávit de R$13 bilhões na balança comercial. Além disso, o Governo reduziu o risco-país de 2.400 pontos para 800 pontos. As reformas estão sendo implementadas, e o mundo inteiro percebe que o País está no caminho certo. Ao fazermos as reformas, infelizmente esbarramos nessa estrutura do Fundo Monetário Internacional.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Hélio Costa, concede-me V. Exª um aparte?

O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG) - Concedo um aparte ao ilustre Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Hélio Costa, V. Exª salienta as limitações que nos têm imposto os diversos acordos com o Fundo Monetário Internacional. O Governo brasileiro decidirá, em setembro próximo, se renovará ou não o acordo com o FMI e, se o fizer, quais serão os termos. Considero muito importante ouvir uma exposição, no Senado, do Ministro da Fazenda, Antônio Palocci, e do Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, sobre a política econômica, que medidas estão sendo tomadas para acelerar o crescimento da economia, melhorar o nível de emprego e a distribuição da renda e se haverá modificação nos termos do acordo. Saliento que o Presidente Henrique Meirelles, há poucos dias, mencionou numa entrevista que deseja vir regularmente ao Senado expor seu ponto de vista. Foi publicada hoje uma entrevista do Prof. Joseph Stiglitz no jornal Valor Econômico, em que faz uma avaliação crítica da situação daquelas nações que têm atendido de maneira rigorosa as diretrizes impostas pelo FMI. O professor afirma que isso está levando as economias desses países a passar por dificuldades muitas vezes crescentes e a inviabilizar um crescimento de acordo com sua potencialidade. Senador Hélio Costa, convido V. Exª a assinar o requerimento que sugere sejam convidados para comparecer a Comissão de Assuntos Econômicos o Ministro Palocci e o Presidente Henrique Meirelles, para exporem em que termos será feita a renovação do acordo com o FMI - se houver tal renovação. Em tal ocasião, as preocupações de V. Exª poderiam ser objeto de diálogo. O Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos, Senador Ramez Tebet, informou-nos, ainda hoje, na reunião da Comissão, que colocará em votação o requerimento no início da próxima reunião. Agradeço a oportunidade.

O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG) - Muito obrigado, Senador Eduardo Suplicy. Com imenso prazer e muita honra, assino com V. Exª esse requerimento, porque entendo perfeitamente o esforço do Governo para ajustar as finanças do País até o momento em que vamos partir para - aí sim - o espetáculo do desenvolvimento. Mas existem alguns pontos que precisam imediatamente ser tratados pela equipe econômica. Um deles é rigorosamente o engessamento provocado pelo acordo com o FMI, que impede o Governo de fazer investimentos em setores fundamentais: saneamento e habitação. Hoje dados estatísticos do IBGE informam que 40% das residências no Brasil não têm saneamento; uma criança morre a cada 15 minutos ainda por falta de saneamento.

Pagamos, no ano passado, R$70 bilhões de juros e amortizações da dívida externa. Precisamos entrar em entendimento com o Fundo Monetário Internacional para acabar com esse engessamento. Precisamos, sim, reiniciar essas negociações, Senador Eduardo Suplicy. Temos um caminho a traçar. Somos os maiores devedores do Fundo Monetário Internacional. De tudo o que o Fundo Monetário Internacional empresta para o mundo inteiro, 40% são jogados no Brasil. Somos os maiores credores deles, na realidade. Eles colocam aqui 40% de tudo o que têm. Então, é evidente que não podem amarrar o País de tal forma que ele não cresça. O Brasil precisa crescer. O Presidente está fazendo um esforço e o Congresso está fazendo a sua parte. Todos estamos trabalhando nesse sentido, mas essas situações criadas no Governo anterior precisam ser sanadas.

É o mesmo caso - ouvi aqui, durante a tarde toda - dos Senadores que fazem objeções à reforma da Previdência e à reforma tributária, mas se esquecem que, nos últimos oito anos, criaram contribuições em vez de impostos. E, ao criar contribuições, é evidente que deixaram as cidades de fora. A lei é muito clara e diz que só se reparte com as cidades, com os Estados, imposto. Então, cria-se a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) e a CPMF, que também é contribuição. Dessa forma, o Governo Federal não fica obrigado, como não ficou no passado, a redistribuir essa riqueza, esse imposto, que fica escondido atrás de uma contribuição. Então, precisamos, sem dúvida nenhuma, tratar desses assuntos.

Faço absoluta questão de dizer às autoridades governamentais que precisamos tratar com o Fundo Monetário Internacional das regras que regem os acordos que fizemos, de tal modo a permitir ao Brasil a retomada do desenvolvimento.

Ainda hoje à tarde, em uma audiência que tive com o ilustre Ministro das Cidades, Olívio Dutra, discutia com S. Exª a situação que estamos vivendo. Se necessário, entendo que uma equipe de Senadores deveria se dirigir até Washington para conversar com os dirigentes do Fundo Monetário Internacional ou, então, em uma de suas viagens ao Brasil, tendo em vista que representantes do Fundo têm vindo aqui com freqüência porque no Brasil atualmente estão 40% dos recursos do FMI. Na medida em que vêm aqui, que sejam convidados a participar conosco, como propôs o Senador Eduardo Suplicy, a convite do Ministério das Relações Exteriores ou do Ministério da Fazenda, da discussão com os representantes do povo de como foi feita a negociação no passado e o que pode ser feito neste momento para alterar esses caminhos, a fim de que possamos retomar o desenvolvimento econômico.

Tenho a maior preocupação nesse sentido porque o meu Estado, Minas Gerais, está pagando duramente pelos termos desse acordo. Tínhamos, em 1998, uma dívida em torno de R$15 bilhões. O acordo feito em 1998 foi imposto pelo Governo passado aos Estados, não lhes cabendo aceitar ou não. Fizemos um acordo em relação à uma dívida de R$15 bilhões e, cinco anos depois, estamos devendo R$33 bilhões. Esse é o dinheiro da educação, da saúde, da segurança e das estradas que os Estados não têm e que devem pagar sempre por essa dívida contraída no passado.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/2003 - Página 23281