Discurso durante a 95ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Projeto de construção da ferrovia Transnordestina. (Como Líder)

Autor
Sergio Guerra (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PE)
Nome completo: Severino Sérgio Estelita Guerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Projeto de construção da ferrovia Transnordestina. (Como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/2003 - Página 23284
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, PROJETO, CONSTRUÇÃO, FERROVIA, REGIÃO NORDESTE, TENTATIVA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO, INTERIOR, REDUÇÃO, POBREZA, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, SUBCOMISSÃO, DESTINAÇÃO, INTEGRAÇÃO, REGIÃO, REABERTURA, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DA AMAZONIA (SUDAM), REFORMULAÇÃO, BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A (BNB), BANCO DA AMAZONIA S/A (BASA), NECESSIDADE, BUSCA, ALTERNATIVA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.

O SR. SÉRGIO GUERRA (PSDB - PE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou falar hoje sobre um tema que necessita de crescente esclarecimento. Trata-se de um projeto sobre o qual muitos já ouviram falar, mas que rigorosamente só veio tomar consistência nos últimos dois anos. O Presidente da República já o anunciou. O Ministro Ciro Gomes coordena um programa e um grupo interministerial com o objetivo de fazê-lo acontecer. O Congresso, porém, pouco o tem discutido. Esse projeto é vital para o Nordeste, é essencial para a economia nordestina ser competitiva, ter condições de auto-sustentação para curto, médio e longo prazos.

Falo da construção da ferrovia transnordestina, ou melhor, do início de um programa com vistas a dotar o nordeste brasileiro de uma ferrovia viável para o padrão brasileiro.

O projeto precisa ser inicialmente compreendido na sua essência para depois ser analisado o seu lado político e o técnico.

Toda a ferrovia do Nordeste foi construída como foi a sua economia, a partir das cidades litorâneas, dos portos. A economia do meu Estado, Pernambuco, foi estruturada a partir do Porto do Recife, de um grande porto atlântico para as épocas em que era prioritário. As economias do Nordeste, todas, tiveram uma base exportadora e se fundaram, à exceção de Estados não litorâneos, na perspectiva dos portos atlânticos ou do sistema portuário de maneira geral.

Na geografia do Nordeste, desenhou-se a sua ferrovia sinuosa, litorânea, como é sinuoso o seu litoral. Uma economia para o Nordeste deve ser tudo, menos apenas litorânea. Se não tiver alcance e capacidade de ter consistência na região do semi-árido, essa economia não terá alcance social. Ela se transformará, como ocorreu no passado, na multiplicação de centros urbanos litorâneos empobrecidos, imensamente empobrecidos pelo êxodo rural, quando este, incapaz de ser absorvido pelos centros urbanos metropolitanos nordestinos, tomou a direção de economias centralizadoras como a de São de Paulo.

É indispensável que para o projeto de um novo Nordeste sejam estabelecidos novo padrão de logística e nova infra-estrutura. Imaginar - vai aí a primeira tese - a construção de infra-estrutura relevante no Nordeste com recursos privados é completa alienação. O Nordeste tem e terá crescente necessidade de unidade política, para exigir recursos federais a fundo perdido, visando à construção de rodovias e ferrovias.

Somos imensamente discriminados quando se trata da destinação de recursos federais para projetos rodoviários e ferroviários. Aliás, esquecida foi a ferrovia no Brasil, de maneira geral. De forma particular, tendo em vista suas características -- economia pobre com baixo grau de integração e sem produção econômica para transporte relevante -, o Nordeste, mais do que qualquer outra região, produziu um sistema de transporte ferroviário completamente inviável.

O Governo Fernando Henrique promoveu a privatização do sistema ferroviário, na minha opinião, absolutamente malsucedida. A regra foi: grupos relevantes importantes que investiram, que lograram participação em programas de privatização verdadeiramente rentáveis, foram compulsoriamente instados a assumir projetos de ferrovias, para os quais, muitas vezes, sequer tinham vocação.

Foram leiloadas ferrovias brasileiras a preço irrelevante, considerando uma realidade dramática de incompetência econômica. Essa privatização, como não poderia deixar de ser, não produziu resultados, senão em condições muito especiais, em áreas muito especiais. A regra é: a ferrovia privatizada não deu certo. No Nordeste isso também aconteceu.

É preciso compreender o projeto da transnordestina. Na verdade, essa ferrovia vai alterar as condições estruturais da incompetência econômica, da inviabilidade econômica, à medida que estabelecer, ou começar a estabelecer, ligações sobre o solo seco do sertão do semi-árido, sobre uma topografia normalmente facilitadora, ligações diretas que produzam uma economia relevante, seja para a instalação de nova rede ferroviária, seja para a utilização da mesma rede. Evidentemente, não haverá solução para a construção de um sistema ferroviário novo se não houver alguma modernização do sistema ferroviário antigo, sem que a privatização, de alguma forma, dê resultados.

No entanto, não podemos, a pretexto de justificada reclamação sobre o padrão de uso da atual ferrovia do Nordeste, cometer o erro de impedir o crescimento de nova base que será capaz não apenas de recompor a economia de parcela do Nordeste, mas também de criar condições de viabilidade para a velha ferrovia. Há um equívoco político sustentado por alguns nordestinos desinformados que reclamam da Companhia Ferroviária do Nordeste, a qual ganhou a licitação para o uso da ferrovia do Nordeste, da antiga Refesa. Reclamam corretamente, mas devem entender que a construção de novos trechos ferroviários nada tem a ver com a ineficiência do sistema atual. Ela, ao contrário, é indispensável para facilitar qualquer tentativa de solução consistente. Precisávamos no Nordeste, sob pena de permanecermos apenas litorâneos, de integração ferroviária, já que sem essa integração não teremos competitividade alguma na produção irrigada, na avicultura e em alguns minerais como, por exemplo, o gesso do Araripe e em outros produtos essenciais para o estabelecimento de um novo padrão de desenvolvimento mais integrado.

Nesse instante, o Governo do Presidente Lula começa a desenvolver, com base em novos instrumentos, o financiamento de um novo projeto de construção de trechos ferroviários essencialmente na região do Ceará, ligando-o a Pernambuco e também essencial na integração deste Estado.

Para Pernambuco, a construção de uma ferrovia que liga o São Francisco ao litoral é vital, sob pena de a irrigação desse rio não se incorporar de fato e concretamente à realidade socioeconômica de sua população. Nesse aspecto o Governo age corretamente, quando indica para coordenar o projeto o Ministro Ciro Gomes, que é do Nordeste, tem prestígio, e demonstra seguramente, como aconteceu no Governo Fernando Henrique com o Vice-Presidente Marco Maciel, interesse no fortalecimento desse projeto de difícil consolidação.

Nesse instante o grupo que ganhou a licitação para uso da antiga rede ferroviária do Nordeste resolveu o seu problema acionário essencial. Falo da Companhia Siderúrgica Nacional e da Vale do Rio Doce. Sabemos que houve um grande problema de entendimento entre esses grupos, nas empresas centrais, cujo processo de descruzamento foi concluído há pouco mais de um ano.

Nesse sentido foi simplificada a condição básica de encontrar de fato um proprietário para aquela concessão, alguém que se responsabilizasse por ela. O BNDES e o Governo atuam juntos com o Ministério dos Transportes para que esses grupos cumpram regulamentos que não estão cumprindo, contratos que não estão sendo honrados.

Mas isso é um dado do problema. Do outro lado do problema está a necessidade de arrancarmos recursos federais para a construção de ferrovia no Nordeste. Se tivermos recursos federais para construir ferrovia no Nordeste, se alcançarmos recursos federais do tamanho adequado para a construção e duplicação de algumas estradas essenciais, como a BR-101, nós criaremos a condição para um Nordeste consistente, com possibilidades de se desenvolver e de ser competitivo. Se não fizermos isso, permaneceremos pedintes de políticas compensatórias, que nos remetem alimentos, mas não remetem soluções.

Defendo com toda clareza o projeto da ferrovia transnordestina. Sugerirei na Comissão de Serviços de Infra-Estrutura, do Senado Federal, assim como na Comissão de Assuntos Econômicos, a discussão desse projeto. Ele deve ser compreendido como a primeira fase de um amplo projeto de integração econômica que envolva o Nordeste inteiro, pelo menos esse Nordeste depois da Bahia e depois de Sergipe, que avance até o Piauí, esse consistente núcleo de pobreza brasileiro.

Esse Nordeste precisa dessa integração sob pena de não ter futuro. Não adianta anotá-lo nos Planos Plurianuais, como já vem sendo feito há muitos anos; não adianta anunciá-lo como projeto prioritário se não há financiamento. Temos que arrancar financiamento para os dois, para a ferrovia transnordestina, para a BR-101 ou para alguns outros projetos de infra-estrutura que sejam considerados, no conjunto, relevantes.

Apresentei proposta na Comissão de Assuntos Econômicos para a organização de uma subcomissão que cuidasse da integração econômica, da integração nacional, da recuperação e da abertura de instituições regionais de desenvolvimento, como a Sudene, a Sudam e outras instituições, da reforma do Banco do Nordeste - que tem que ser recuperado, modernizado e alterado -, assim como do Banco da Amazônia, enfim, de várias instituições envelhecidas, como, por exemplo, a Codevasf e o Denocs. Precisamos de uma ampla recuperação e reforma desses instrumentos, da mesma forma e com a mesma prioridade que temos de retirar do papel projetos que são intenções apenas gráficas e não se transformam em viabilidade consistente se não nos unirmos, se não formos pragmáticos, se nos perdermos em discussões estéreis sobre o valor ou a falta de valor de projetos de privatizações que se deram no passado. Não devemos discutir o passado, mas construir alternativas para o futuro.

Acredito ser indispensável que essa discussão se dê no Senado.

Sr. Presidente, era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/2003 - Página 23284