Discurso durante a 97ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao ex-Senador Dinarte Mariz pelo transcurso dos cem anos de seu nascimento.

Autor
Garibaldi Alves Filho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RN)
Nome completo: Garibaldi Alves Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao ex-Senador Dinarte Mariz pelo transcurso dos cem anos de seu nascimento.
Publicação
Publicação no DSF de 15/08/2003 - Página 23520
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, DINARTE MARIZ, EX SENADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ELOGIO, VIDA PUBLICA.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente do Senado Federal, Senador José Sarney; Senador Romeu Tuma; Senador Eduardo Siqueira Campos, componentes da Mesa; Srªs e Srs. Senadores; familiares do Senador Dinarte Mariz.

O nosso Presidente José Sarney parece haver retratado com perfeita nitidez a estatura política do homenageado do Senado nesta sessão em palavras assim registradas pelo escritor potiguar Diógenes da Cunha Lima. Diz o Presidente José Sarney:

Conseguiu acumular um dos maiores acervos de experiência humana da vida pública brasileira.

Dinarte Mariz foi o mais lúcido sobrevivente desta geração que já não existe, dos políticos fortes, chefes de bandos do bem comum.

Ninguém mais lúcido, mais manhoso, mais sagaz, mais inteligente numa manobra, dessas sem pecado a que a política obriga todo deão ou chefe de tribo.

Com esses conceitos do Presidente Sarney, e ao lado dos Senadores José Agripino, Efraim Morais e Marco Maciel, associo-me pessoalmente à reverência que o Senado presta ao Senador Dinarte Mariz no centenário de seu nascimento - e associo também a esta homenagem todo o grupo político que integro no Rio Grande do Norte.

Nunca fui seu correligionário, pois quando me dei conta da política, embora ainda na adolescência, já estávamos em campos opostos, e assim permanecemos até sua morte.

Não apenas a distância do tempo, pois morreu há quase 20 anos, em junho de 1984, mas especialmente a distância marcante das lutas travadas, às vezes ferozes embates eleitorais e políticos, tudo isso me decantou no espírito serenidade para o julgamento dessa figura de enorme importância para a política do Rio Grande do Norte e do Brasil, credenciando-me, por convicção de consciência, a render também minhas homenagens a Dinarte de Medeiros Mariz.

Sr. Presidente, recolhi, ao longo da minha vida pública, um sem-número de testemunhos acerca da dimensão humana e política de Dinarte Mariz, que, se vivo fosse, estaria completando 100 anos, nascido aos 23 de agosto de 1903, na Fazenda Solidão, terra de Serra Negra do Norte, nas ribeiras de Caicó, no Seridó potiguar.

De tantos testemunhos colhidos, e do julgamento isento que já posso fazer depois de acumular experiência política e administrativa no exercício de quatro mandatos de Deputado estadual, Prefeito de Natal, dois de Governador, e agora exercendo o segundo mandato de Senador, de tudo, fixou-se em minha consciência a imagem de um homem solidário e de um político servidor, como assinalava já aqui o Senador José Agripino que me antecedeu.

Embora plena de significado político e histórico, esta sessão não comportaria amplos traços biográficos de nosso homenageado, nem mesmo o registro, sumário embora, dos marcantes episódios de sua vida, que justificam seus predicados de solidariedade humana e serviço público.

Devo registrar um fato, entretanto, que bem demonstra a fortaleza de espírito de Dinarte Mariz. Em depoimento, publicado sob o título “Memória Viva”, o ex-Deputado, Governador e Ministro Aluízio Alves se confessou adversário político do Senador Dinarte Mariz, indo essa histórica divergência política aos limites da inimizade pessoal. O então Senador Magalhães Pinto procurou Aluízio Alves para contar-lhe que Dinarte Mariz, já muito doente, o chamara, pedindo que o ajudasse a morrer em paz com Deus e com os homens; visitara, há pouco, o Rio Grande do Norte e Caicó, refizera várias amizades, rompidas ao longo dos anos de lutas, mas ainda tinha Aluízio Alves como inimigo. Atendendo à grandeza do apelo de um homem que tanto lutou, mas buscava assim sofregamente a paz, houve o encontro, onde o perdão recíproco sepultou 25 anos de inimizade.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no plano administrativo, a grande obra de Dinarte Mariz, e de que tanto se orgulhava, foi a criação da Universidade do Rio Grande do Norte, fundada e implantada quando exerceu o Governo do Estado, de 1956 a 1961. Nomeou o primeiro Reitor, Professor Onofre Lopes, encarregado que fora da elaboração do projeto e sua execução. Nomeou todo o corpo docente, figurando entre os seus componentes e luminares notáveis representantes da inteligência potiguar, entre eles, Luiz da Câmara Cascudo e Edgar Barbosa.

Hoje, a Universidade, federalizada, graças aos seus esforços e prestígio, constitui o referencial maior de nossas potencialidades culturais pela capacidade de seus executivos e pelo valor de seus mestres.

Homem de palavra e de ação, hábil articulador e conversador exímio, sabia ouvir, ser solidário e possuía o mais aguçado poder de conhecimento e decisão. Ouvi de todos que conviveram mais de perto, ter sido Dinarte Mariz um homem sincero, leal e amigo.

Fundador de emissoras de rádio e jornais, participou da fundação ou da direção dos jornais A Razão, A Notícia, Correio do Povo e Tribuna do Norte. A Rádio Nordeste de Natal também foi obra sua.

Fui seu admirador, conquanto seu adversário, e, nas contradições, descobrimos afinidades; as divergências eram superadas pelas contingências e até pelas convergências, e no horizonte, que parecia distante, havia um instante de paz, de compreensão, de renúncia e de perdão, que eventual e casualmente presidem os atos humanos, mostrando que todas as coisas importantes da vida giram em torno do homem, sua condição e sua circunstância.

Esta Casa, Sr. Presidente, o Senado Federal, onde viveu a maior parte de sua carreira política como representante do Rio Grande do Norte, em quatro mandatos sucessivos, guarda a sua presença e memória, especialmente pelo período em que foi durante sete vezes eleito e reeleito 1º Secretário. Isso demonstra, só por si, o grau de relacionamento com seus Pares, além da confiança reiteradamente depositada em sua capacidade administrativa. Tenho a certeza de que muitos dos mais antigos servidores da Casa aqui estão para se associarem, com todo o direito, a esta homenagem que o Senado presta a Dinarte Mariz.

Ainda sobre suas atividades no Parlamento, Sr. Presidente, não posso deixar de registrar sua permanente preocupação com os problemas do Nordeste, como fez o Senador José Agripino e o Senador Marco Maciel.

A Comissão Coordenadora de Estudos do Nordeste - Cocene foi fruto de sugestão do Senador Dinarte Mariz, eleito seu Presidente.

Esta foi uma tentativa extremamente válida de se identificarem propostas para impulsionar o desenvolvimento do Nordeste, tendo contado a Comissão com a participação de Senadores e Deputados, sendo Relator o então Senador Virgílio Távora*.

O também ex-Governador do Rio Grande do Norte Cortez Pereira, suplente de Dinarte Mariz nesta Casa, em um de seus mandatos, registrou a súmula do pensamento de Dinarte Mariz acerca dos graves problemas que, já naquela época, comprometiam a idéia da Sudene. São palavras de Dinarte na Cocene:

Fui vencido na idéia central que defendi: cheguei à triste realidade de que os incentivos fiscais, dentro das atividades da Sudene, não têm condições de promover a integração econômica com o País. Permitir a continuidade do atual sistema de incentivos é multiplicar fortunas das empresas do Centro-Sul, escravizando cada vez mais a região empobrecida. Não creio que uma Nação enriqueça outra Nação, não creio que um Estado venha desenvolver outro Estado.

Essas ponderações, de impressionante atualidade, demonstram a lucidez do pensamento político e econômico de Dinarte Mariz.

A vocação de serviço estava aí atuante, com presença firme e permanente. Já pensava, então, na constituição de um fundo orçamentário, desvinculado dos empresários beneficiados pelas deduções de impostos, tal qual, muitos anos depois, a Constituição de 1988 começou a organizar.

Este depoimento que faço ao Senado talvez encerre o sentido maior de minha homenagem: este visionário da melhor causa do Nordeste certamente está fazendo muita falta, quando suas idéias, tão ousadas ao tempo em que inovadoramente expostas, agora clamam por aguerrida defesa, corajosa implementação, aperfeiçoamento eficaz, para que se torne realidade o fim da desigualdade regional no Brasil.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, disse pouco sobre o muito que pode ser dito a respeito de um homem do nosso Rio Grande do Norte, que foi maior que o tempo que pôde viver, pois, em tudo o que viveu, mais buscou fazer pela terra, sua gente e seu povo.

Sertanejo autêntico, afeito às asperezas da vida, preocupado pelo ingente esforço dos conterrâneos mais humildes por superar as prementes necessidades materiais do cotidiano, nem por isso o Senador Dinarte Mariz deixava de lado as coisas do espírito.

Outro fato envolvendo outro Senador do Rio Grande do Norte é bem ilustrativo a respeito.

Esta Casa, Sr. Presidente, há anos passados, tributou o melhor de suas homenagens a outro norte-rio-grandense da mesma linhagem e, por sinal, da mesma família de Dinarte Mariz - como os familiares que aqui estão: o Senador José Augusto Bezerra de Medeiros, também ex-Deputado, ex-Senador, ex-Governador do Rio Grande do Norte. Naquela sessão de homenagem ao grande potiguar e brasileiro, o Senador Afonso Arinos proferiu histórica oração, evocando as virtudes e os méritos de José Augusto, salientando, entre os atributos de sua marcante personalidade, além da cultura, da sabedoria, do trabalho e da lealdade, o mais impressionante de todos, que era aquela permanente juventude, que o enchia de energia para os deveres públicos.

Disse, textualmente, o Senador Afonso Arinos:

José Augusto é um homem que, em todos os Departamentos onde exerce as suas atividades, tem sempre marcada essa posição peculiar e altamente atraente, que é a da sua juventude.

Dinarte Mariz e José Augusto eram primos pela mesma árvore genealógica e conterrâneos pelas raízes fincadas na mesma região e no mesmo chão de Serra Negra e Caicó. Eis por que, sempre que se fala no Seridó e no Rio Grande do Norte, vêm à lembrança os nomes de Dinarte Mariz e José Augusto.

O Senador Dinarte Mariz, no leito de morte, ainda ditou para seu assessor e amigo, o jornalista Joanilo de Paula Rego, a reconstrução de uma palestra intitulada “José Augusto - o Líder”, publicada em livro pela gráfica desta Casa e pela Fundação José Augusto, de Natal, no ano de 1984, obra assim revista pelo autor. Esse perfil de José Augusto foi a sua última contribuição à crônica política do Rio Grande do Norte.

Lembro ao Senado, Sr. presidente, por oportunas, as últimas palavras de José Augusto Bezerra de Medeiros, quando deixou o Parlamento, em sessão da Câmara dos Deputados de 31 de janeiro de 1955:

Recordo-me, Sr. Presidente [dizia José Augusto] de ter lido há pouco tempo uma oração famosa de Briand, o grande, o extraordinário parlamentar francês. Disse ele no Parlamento, examinando os vários processos da vida política, num gesto um tanto patético: “Vede as minhas mãos - nenhuma gota de sangue”.

Eu posso, Sr. Presidente, Srs. Deputados [finalizou José Augusto], parodiando o grande estadista gaulês, o grande parlamentar, na hora em que pela vez derradeira falo ao Parlamento da minha Pátria e, como ele, erguendo as minhas mãos, dizer: “Vede, não só nenhuma gota de sangue, mas também nenhuma tacha de azinhavre.

Dedico a lembrança dessas palavras de José Augusto Bezerra de Medeiros à memória do Senador Dinarte de Medeiros Mariz, (*) que foi mesmo um chefe de bando, mas bando do bem comum, como muito bem dele disse o Presidente José Sarney.

Muito obrigado.

(Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/08/2003 - Página 23520