Fala da Presidência durante a 97ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao ex-Senador Dinarte Mariz pelo transcurso dos cem anos de seu nascimento.

Autor
José Sarney (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: José Sarney
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao ex-Senador Dinarte Mariz pelo transcurso dos cem anos de seu nascimento.
Publicação
Publicação no DSF de 15/08/2003 - Página 23523
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, DINARTE MARIZ, EX SENADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ELOGIO, VIDA PUBLICA.

O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Antes de suspender esta sessão, devo confessar à Casa que a presido com especial comoção, neste momento em que o Senado recorda Dinarte Mariz, uma das maiores e mais atuantes figuras que por aqui passaram ao longo de nossa história.

Conheci Dinarte Mariz na década de 50. Sou a última das pessoas que com ele conviveram e estiveram nesta Casa àquele tempo. Éramos ambos da União Democrática Nacional. Pertencíamos à corrente mais exaltada do partido sob a Liderança de Carlos Lacerda. E Dinarte, nessa corrente radical, era o mais brando, o mais à direita de todos. Era então Governador do Rio Grande do Norte, cargo para o qual tinha sido eleito com o apoio de um velho adversário seu, o Presidente Café Filho.

Fomos amigos, estreitos amigos nesta Casa e na vivência da política. Tenho orgulho de dizer que essa amizade se estendeu a seus filhos. E aqui, na pessoa do Dr. Eduardo Mariz, cumprimento a todos da família que se encontram neste plenário.

O nosso reencontro deu-se nesta Casa, numa convivência em que quase diariamente falávamos dos problemas do Nordeste. Conversávamos sobre a vivência da vida partidária. Ele contava as sagas e as cantigas de Caicó. E então foram crescendo, cada vez mais, uma admiração e uma amizade que se consolidaram ao longo do tempo.

Foi citado aqui que tive a oportunidade de dizer que Dinarte era o chefe de um bando do bem comum. Mas também era o chefe de outro bando de cangaceiros do bem comum que, nesta Casa, tomava assento em defesa do Nordeste. Recordo José Agripino, Nilo Coelho, Paulo Guerra, Virgílio Távora, Teotônio Vilela; e eu, como o mais novo, me incorporava a todos eles, na resistência heróica na defesa dos problemas do Nordeste, no sentido de olhar a política como uma paixão sem volta, de doação absoluta que Dinarte tinha na arte de fazer o caminho do possível para conseguir o impossível.

Dele recebíamos conselhos, informações, impressões, tudo que passou a ser o barro de uma constante obra de olaria política em que sempre convivemos.

Repito que passei a estimá-lo, admirá-lo, querer-lhe bem quase como um patriarca, desses que são constantes e que vivem eternamente em nossas vidas.

Quero recordar um primeiro fato que pertence à minha chegada ao Senado Federal em 1971. Ainda com aquela chama com que chegam os Deputados, os políticos que vêm da Câmara dos Deputados, ainda cheios daquela vibração borbulhante e viva que é o plenário da Câmara dos Deputados, aqui estreei com um discurso um pouco discurso de Deputado. Dinarte chamou-me, ali, e me deu um conselho: “Olhe, Sarney, você é muito novo, mas agora é Senador. A linguagem do Senado não é a linguagem da Câmara dos Deputados. Vamos ter todos que conviver juntos e vamos falar coisas que possamos ouvir juntos”. Foi um conselho. Repito-o sempre aos jovens que aqui chegam da Câmara dos Deputados.

Recordo também que Winston Churchill, quando chegou à Câmara dos Comuns - ele relata isso no seu livro de memórias, Minha Mocidade - estava muito ansioso de falar naquela assembléia. E Henry Chaplin chamou-o e disse: “Não tenha nenhuma pressa. Se você tiver alguma coisa a dizer, espere que em algum momento a Câmara vai ter oportunidade de ouvi-lo”. Então são conselhos de homens sábios que guardamos e que não esquecemos.

Dinarte Mariz começou como Prefeito de Caicó, essa Caicó de que ele se recordava permanentemente e cujos costumes nós todos passamos a conhecer através das histórias que ele contava. Ele apoiou João Pessoa e participou da Revolução de 30. Na Revolução Constitucionalista de 32, com o mesmo temperamento de lutador, esteve presente e foi preso três vezes. Em 1935, na chamada Revolução Comunista de Natal, ele, à frente de 150 homens, com aquele seu vigoroso temperamento de revolucionário, ajudava a dominá-los e a retomar Natal para a causa da ordem. Em 1954, ele chega ao Senado, mas, dois anos depois, saiu desta Casa para ser Governador do Rio Grande do Norte. Acompanhei dentro da UDN aquela luta e, ao mesmo tempo, a esperança de todos nós naquele tempo de fazer Governadores dos Estados. E Dinarte conquistava para a UDN o Governo do Rio Grande do Norte.

Em quatro mandatos em que aqui esteve - foi Senador em 1962, 1970 e 1978 -, ele se tornou uma liderança forte, marcante e decisiva. Os oradores que aqui falaram tiveram a oportunidade de dizer que, sobretudo na administração da Casa por sete anos, por sete vezes foi Secretário do Senado.

Dinarte era um homem que recolhia informações e sabia guardá-las. Era um homem extremamente informado. Nos momentos difíceis que atravessamos - foram momentos de muita turbulência -, ele era uma fonte extraordinária de acontecimentos e de previsão dos acontecimentos. Sabia tudo o que ia acontecer no Senado e na República.

Ele também tinha uma extrema e grande convivência com os jornalistas; sabia lidar com os homens de informação. Era ao mesmo tempo uma fonte e um homem de convivência muito forte com a imprensa.

Seu conhecimento e domínio da vida pública faziam com que isso se estendesse não somente numa influência no terreno político, como também na vivência com os militares - naquele momento, ele era presença importante não como militar, mas na política brasileira.

Assim, com amizade, recordo-me dele. Vi-o atravessar os tempos de Juscelino, as convulsões de Jânio, de Jango, os governos militares e trinta anos de nossa história. Foram trinta anos de sua presença na política dominantemente no Senado Federal.

Mas, devo lembrar que, quando nasci, ele já participava das lutas políticas - eu, um dos velhos remanescentes daqueles tempos.

Cito a maneira como dinarte se definia. E há uma nota autobiográfica na qual ele diz: “Os fatos me fizeram do jeito que eu sou. Fizeram-me um irredento, um irrequieto, uma corrente que não pára de correr, um vento que não cessa de soprar, um eterno conspirador contra a inércia, o conformismo, a estagnação e o imobilismo. Um trabalhador para quem o repouso consiste em variar de trabalho”. Este é o retrato de Dinarte, que ele mesmo faz e no qual nós apenas temos que colocar uma moldura para enfeitá-lo com todas as honras que merece.

Portanto, deixo nestas palavras, a homenagem da minha recordação e a memória da nossa amizade. E meus olhos, ao se fixarem neste plenário, os vê ali, em uma dessas cadeiras, levantando e certamente proferindo palavras em defesa do Brasil, em defesa do Nordeste e do Rio Grande do Norte.

Muito obrigado.

Agradeço a todos pela presença.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/08/2003 - Página 23523