Discurso durante a 97ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o programa Fome Zero.

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Considerações sobre o programa Fome Zero.
Aparteantes
João Capiberibe, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 15/08/2003 - Página 23677
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, MUNICIPIO, PARNAIBA (PI), ESTADO DO PIAUI (PI).
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), DENUNCIA, PARALISAÇÃO, PROGRAMA, COMBATE, FOME, ILEGALIDADE, ASSINATURA, RECIBO, AUSENCIA, PAGAMENTO, PROFESSOR, ALUNO, MUNICIPIOS, ESTADO DO PIAUI (PI), IRREGULARIDADE, GESTÃO, RECURSOS, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE SEGURANÇA ALIMENTAR E COMBATE A FOME, ESPECIFICAÇÃO, CONVENIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO).
  • SOLICITAÇÃO, CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU), APURAÇÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, PROGRAMA, COMBATE, FOME, ANUNCIO, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE, SENADO.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desejo fazer um esclarecimento mais detalhado sobre a questão levantada pelo Senador Heráclito Fortes, por coincidência, ocorrida no Piauí, aqui representado por V. Exª.

Aproveito a oportunidade para, em nome de V. Exª, também abraçar todos os filhos da sua querida cidade de Parnaíba, no Piauí. Peço a V. Exª que transmita aos seus correligionários, seus conterrâneos, seus amigos, a toda a população que a Paraíba está de braços dados com todos que, neste dia magnífico, comemoram o aniversário da sua querida Parnaíba.

Sr. Presidente, desejo destacar matéria publicada no Correio Braziliense intitulada “E o dinheiro não chegou”, em que professores e alunos de cursos de alfabetização do Programa Fome Zero relatam que deixam de receber R$100 mil do Governo.

É bom registrar que o Fome Zero era para ser o carro-chefe na área social, mas até agora está em ponto morto; não consegue andar. Prova disso é que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva apontará para outro alvo: a unificação dos programas de transferência de renda.

O lançamento do projeto tem sido prometido para outubro, mas até agora o Governo não terminou o cruzamento de dados para o cadastramento das pessoas que estão abaixo da linha de pobreza. Também não foi decidido qual Ministro presidirá o programa que contará com R$8 bilhões para 2004. É lógico, Senador Ney Suassuna, são 40 Ministérios neste Governo e, assim, fica difícil escolher quem vai tocar a área social.

Passo a ler a matéria na íntegra:

Em sete meses de governo, a pasta criada por Luiz Inácio Lula da Silva para resolver o problema da miséria do Brasil, o Ministério da Segurança Alimentar e Combate à Fome, pagou R$24 milhões [é bom que o Brasil todo tenha esse dado] em salários de técnicos que administram o programa Fome Zero.

Ou seja, pagaram R$24 milhões, mas não há R$100 mil para os professores do Piauí.

Mas o mesmo Ministério deve R$100 mil às famílias pobres dos Municípios piauienses de Guaribas e Acauã - V. Exª as conhece muito -, cidades-sede do projeto social do Executivo, que mistura distribuição de alimentos a cursos de alfabetizações para jovens e adultos.

Confiantes na promessa do Governo de serem premiados por se engajarem no programa Analfabetismo Zero, um dos braços do Fome Zero, 30 professores e 500 estudantes piauienses assinaram recibos. Teremos de discutir isso no decorrer do nosso discurso, pois eles não receberam o prometido e assinaram recibos. Esse é o aspecto mais importante nessa situação. Formalizaram que receberam o pagamento pelos serviços prestados.

Isso ocorreu há um mês, 30 dias depois da conclusão dos cursos. Até agora, entretanto, o dinheiro não chegou ao Piauí.

            No dia em que o Programa Fome Zero foi lançado oficialmente no Piauí, em 3 de fevereiro, o Ministro da Segurança Alimentar, José Graziano, assinou um protocolo de intenção com o Presidente da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) no Brasil, Dr. Jorge Werthein. A entidade entrou com o dinheiro, R$300 mil, e o ministério se encarregou por determinar o destino da doação aos beneficiados do Programa Analfabetismo Zero. Desse total, R$100 mil seriam distribuídos a professores de Guaribas e Acauã. Ficou acertado e prometido em público aos moradores dos dois municípios, que cada aluno alfabetizado receberia R$100 ao final do curso.

O benefício seria estendido aos professores, que ganhariam a mesma quantia por aluno que aprendesse a ler e a escrever. Ao todo foram formadas 30 turmas de alfabetização (24 em Acauã e 6 em Guaribas). Uma das exigências para o pagamento da bolsa era que professores provassem que ensinaram e alunos, que aprenderam.

Vejam bem, no fim tem que comprovar que os alunos estudaram e que os professores ensinaram. Veja esse detalhe. Como é engraçado esse Programa Fome Zero, é por isso que ele está em ponto morto, mesmo.

            A responsabilidade por atestar a eficiência do ensino ficou a cargo do Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação (Geempa), uma organização não-governamental presidida pela ex-deputada petista do Rio Grande do Sul, a Drª Esther Grossi.

É mais uma forma de atender os que não venceram, que não ganharam, além dos ministérios, onde foram feitos cargos para os que perderam, agora, também, estão entregando cargos no Programa Fome Zero.

Agora, perguntamos, e os 24 milhões que foram repassados para os técnicos? Não podia haver fiscalização desse recurso?

            O Geempa foi contratado por R$ 50 mil e também ficou encarregado de capacitar moradores dos municípios a dar aula de alfabetização para adultos.

Também queremos saber se houve concorrência para se contratar o Geempa. A presidente do Geempa, que foi minha colega, competente deputada, é uma das mulheres que mais entende de educação neste País. Mas, será que a condição é essa, de ex-deputada do PT? Nossa preocupação é também saber disso.

Então, o Senador Heráclito Fortes tem razão. É preciso que o ex-Deputado Valdir Pires, Controlador-Geral da União, observe a questão do Programa Fome Zero rapidamente.

O método usado para testar a eficiência do curso foi exigir que ao final de três meses os alfabetizandos conseguissem redigir um texto. “Nós temos documentadas 700 cartas de alunos de Guaribas e Acauã”, afirma Grossi. Ela conta que os textos, em sua maioria, têm o Presidente Lula como destinatário e palavras de agradecimento pela oportunidade de aprender a combinação das letras.

A maioria das turmas começou no final de março e as aulas encerraram-se em junho. Na última semana do mês, as cartas já estavam com a Coordenação da Geempa*. No dia 3 de julho, foram entregues ao Ministério. Uma semana depois, no dia 8 de julho, uma comitiva de professores e alunos veio a Brasília. V. Exªs lembram-se de que as crianças do Piauí, das cidades de Acauã e Guaribas, foram recebidas pelo Presidente Lula. O gesto simbolizou o cumprimento de professores e alunos do acordo firmado com o Ministério da Segurança Alimentar e Combate à Fome, responsável pela administração do Fome Zero. Nesse dia, em vez de receberem o dinheiro, os professores assinaram um recibo. Assinaram um recibo sem receber.

Nada mais nada menos do que o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, OAB, o Dr. Rubens Approbato, diz que o procedimento não é legal, já que o recibo é um mecanismo criado para assegurar que as duas partes envolvidas no acordo foram atendidas.

Nada mais, nada menos do que a autoridade do Dr. Rubens Approbato, homem sério, competente, com quem tive a oportunidade de conviver na Câmara dos Deputados.

Devo adiantar ainda que como nem todos os professores puderam vir à Brasília, os que vieram se encarregaram de entregar o mesmo documento aos colegas do Piauí. “Trouxemos os documentos em branco para que outras pessoas também assinassem. Depois mandamos de volta para a Unesco”, diz Marli Alves Rocha, 37 anos. Ela foi um dos moradores de Guariba que participou do projeto do governo - Marli esteve em Brasília e assinou o recibo. Deu aulas para uma turma da 18 jovens e adultos analfabetos. Conseguiu alfabetizar 16 deles. Os outros dois não terminaram às aulas, alegando dificuldade de visão.(sic)

Sr. Presidente Mão Santa, V. Exª conhece a D. Marli? Talvez não conheça, mas ela deve ser uma das pessoas importantes da cidade de Guariba.

E vejam bem, D. Marli, confiando que iria receber o dinheiro, comprou um fogão. Está escrito aqui, não sou eu que estou dizendo.

            Marli comprou um fogão [coitada, o fogão estão querendo tomar] em três prestações. Em Guaribas, cheques não circulam. A cobrança das prestações é feita pessoalmente na porta dos devedores. “Vieram me cobrar duas vezes. Estou aguardando o dinheiro do Governo para pagar o que devo” [disse D. Marli].

A professora Marli guarda em casa o recibo preenchido por um de seus alunos. O documento estava perdido e não foi enviado com os outros à sede da Unesco em Brasília. Ele é a prova de que alfabetizandos e alfabetizadores esperam por um dinheiro que, na teoria, já receberam. Outros seis professores procurados pelo Correio confirmaram, por telefone, ter assinado o documento. Disseram, porém, que não receberam o dinheiro. Segundo a coordenadora de educação da Unesco no Brasil, Ângela Barreto, o dinheiro está na conta da entidade. [Engraçado, e a pobre da D. Marli ameaçada de perder o fogão.] (...) Procurada pelo Correio, a assessoria do Ministério da Segurança Alimentar afirmou que os professores e alunos serão pagos a partir da segunda-feira.

Se Deus quiser. Vamos com essa esperança de que paguem a essas pessoas que trabalharam.

Minha preocupação, Senadores, não é criticar a ação de alfabetização tomada pelo Fome Zero, mas criticar a assinatura de recibo sem que ocorra o correspondente pagamento.

A minha segunda preocupação é levar recibos em branco para serem assinados e voltarem esses recibos, que são assinados, em branco. Essa é uma preocupação que temos que ter para a transparência desse processo. Não quero aqui dizer que está havendo desvio, mas há uma suspeita, há uma preocupação. Por isso estamos alertando o Governo.

Senador Ney Suassuna, observe que uma das possibilidades levantadas pela Unesco e pela Assessoria do Ministério da Segurança Alimentar e Combate à Fome e estudada pelo Ministério é a de enviar uma comitiva com técnicos dos dois órgãos aos Municípios e fazer o pagamento pessoalmente. Em Guaribas, 116 pessoas, entre professores e alunos, aguardam o dinheiro. No Município de Acauã são 384. Vão encher os técnicos de dinheiro, gastar com passagens para vários técnicos, os quais vão sair daqui e ir ao Piauí, onde pegarão um carro até Guaribas e Acauã, recebendo diárias. O dinheiro do Fome Zero só não serve para matar a fome do povo brasileiro, daquele que precisa. O Governo Lula, que tinha o Fome Zero como seu carro-chefe na área social - aqui mesmo Sua Excelência disse isso no seu primeiro discurso - precisa tomar cuidado, porque, no meu entender, há uma suspeita da imprensa, da classe política e do povo brasileiro de que esse dinheiro não está chegando aonde deve. Até agora, com diárias, passagens e contratos para elaborar esse projeto, foi gasto muito mais do que com o Fome Zero.

Peço ao querido Corregedor Waldir Pires que verifique. Sei da sua capacidade na condição de corregedor. Essa denúncia é pública, está em um dos jornais de maior circulação do País, o Correio Braziliense. A matéria é da equipe desse periódico e está assinada pela jornalista Lílian Tahan. Não se trata de uma denúncia de ponta de folha de jornal.

Então, eu gostaria de fazer esse registro e esclarecer exatamente o que quis dizer meu companheiro, o Senador Heráclito Fortes, também do Piauí, que levantou a questão e foi mal entendido.

Eu gostaria de esclarecer e, ao mesmo tempo, desta tribuna, pedir à Corregedoria que verifique o que está acontecendo, para que possamos, na realidade, esclarecer o fato ao povo brasileiro.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Peço-lhe um aparte, Senador Efraim Morais.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Ouço V. Exª, Senador João Capiberibe, com muito prazer.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Senador Efraim Morais, eu gostaria de subscrever o pedido de investigação formulado por V. Exª. Qualquer que seja a denúncia feita nesta Casa, temos obrigação de investigar e esclarecer, porque se trata de recursos públicos, de dinheiro do cidadão. Considero que houve um avanço imenso no processo de redemocratização política do País. Agora, temos de republicanizar o Estado brasileiro. Esse é o passo decisivo. A denúncia que V. Exª nos traz certamente merece nossa atenção. Faço questão de apor a minha assinatura no requerimento para que o Dr. Waldir Pires e o Ministério Público procedam a investigações profundas e esclareçam o fato, punindo quem deve ser punido e inocentando quem for inocente nesse processo. Muito obrigado.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Ouço V. Exª, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Nobre Senador Efraim Morais, perdoe-me. Apenas gostaria de acrescentar algo à sugestão muito bem-vinda do nobre Senador João Capiberibe. V. Exª, como Membro da Comissão de Fiscalização e Controle, pode apresentar um requerimento, e a própria Comissão - o Senado tem um organismo para isso -, na terça-feira, criará um grupo para fazer essa apuração e ajudar o Governo. V. Exª não precisa requerer a outros órgãos que investigue essa denúncia. A Comissão de que V. Exª faz parte e eu presido poderá exercer esse mandato.

            O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - V. Exª tem razão, Senador Ney Suassuna. Vou aceitar a sugestão de V. Ex.ª. Agradeço também ao querido Senador João Capiberibe a colaboração. Eu não esperava algo diferente. Eu sei da correção do Senador e não me surpreende a posição de S. Exª em relação a essa denúncia.

            Na Comissão de Fiscalização e Controle, sob a Presidência de V. Exª, Senador Ney Suassuna, poderemos ir mais longe. Primeiro, vamos saber como foi feito esse contrato de 24 milhões para que técnicos produzissem um monte de papel e mais nada. Um monte de papel!

Pagar 24 milhões para elaborar o Programa Fome Zero causa dúvida. Vamos ver também o contrato da Geempa. Aproveitemos e - quem sabe? - façamos uma revisão completa neste Programa. É bom que as coisas fiquem claras para que depois não venham dizer que o Senado não quer que o Fome Zero funcione. Sabemos que existem essas manhas. É bom que fique claro que o que queremos é esclarecer a denúncia feita por um dos jornais de maior circulação no País.

            Na realidade, Senador Ney Suassuna, teremos de empurrar este carro do “Fome Zero”, porque ele está em ponto morto. Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/08/2003 - Página 23677