Discurso durante a 98ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Empobrecimento da classe média brasileira.

Autor
Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Valdir Raupp de Matos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • Empobrecimento da classe média brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 16/08/2003 - Página 23915
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • ANALISE, DADOS, REDUÇÃO, POUPANÇA, CONSUMO, REAJUSTE, SALARIO, COMPROVAÇÃO, EMPOBRECIMENTO, CLASSE MEDIA, BRASIL, RECESSÃO, ECONOMIA NACIONAL, PREJUIZO, INDUSTRIA, COMERCIO, DESEMPREGO.
  • ANALISE, REDUÇÃO, INVESTIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, APREENSÃO, POSSIBILIDADE, INSUFICIENCIA, ABASTECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, ATRASO, INICIO, OBRA PUBLICA, USINA HIDROELETRICA, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.
  • NECESSIDADE, CONSCIENTIZAÇÃO, IMPORTANCIA, CLASSE MEDIA, BENEFICIO, DEMOCRACIA, DENUNCIA, REDUÇÃO, QUALIDADE DE VIDA.

O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a classe média está morrendo. Esse é o veredicto dado pela indústria e o comércio brasileiros.

É força de expressão, evidentemente, falar-se em morte da classe média, mas os sinais de sua decadência não são apenas óbvios, como ganham consistência e relevo ante a conferência de indicadores econômicos que lhe são inerentes, como poupança, nível de consumo, reposição salarial, entre outros. Completado com pesquisas de opinião pública, em que são ouvidos os próprios interessados, o contorno que nos é dado a observar tem a imagem do mais absoluto desalento: mostra uma classe média avançando em direção à pobreza.

É bem verdade que esse processo não começou agora e vem se desenvolvendo ao longo dos últimos dez anos. Porém, adquiriu tamanha visibilidade que não podemos desconhê-lo nem tampouco fugir da luta para sua solução.

Depoimento de empresários, sociólogos e pesquisadores não apenas corroboram e dão veracidade a essas conclusões, mas também nos alertam para a imensa tragédia que se abate sobre a classe média brasileira, dividida entre a legítima aspiração de ascender socialmente e o crescente receio de perder a posição conquistada, às vezes, duramente. Pune-se a classe média por escassez de idéias mais sensatas, criativas e, sobretudo, justas para administrar o País, esquecendo-se aqueles que assim agem do papel essencial que ela desempenha numa sociedade de classes, como recicladora das tensões sociais e depositária de tradições sem as quais uma nação não sobrevive.

Segundo notícia do Jornal do Brasil, Srªs e Srs. Senadores, o desemprego que assusta o País está concentrado nas grandes metrópoles e os executivos não escaparam da estagnação da economia brasileira. De acordo com os escritórios de contratação, recrutamento de presidentes e diretores de empresas, será lucro se, neste ano, a movimentação desses profissionais for a mesma do ano passado, quando os resultados do setor amargaram queda de 25% em relação a 2001.

Estão nas páginas dos jornais que o brutal aumento dos preços aos consumidores registrado ano passado e início de 2003 chegou ao fim, mas não livrou o País da recessão, do desemprego recorde e do achatamento salarial. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado como referência para a meta de inflação fixada pelo Governo, fechou junho com deflação de 0,15%, o que não ocorria há cinco anos, quando o IPCA foi negativo em 0,12%. Segundo o Correio Braziliense e na avaliação dos economistas, com o IPCA em níveis atuais, o Comitê de Política Monetária (Copom) possui todos os argumentos para promover um corte mais agressivo na taxa básica de juros (Selic) na sua reunião deste mês.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o cenário de recessão é visível no País. Apesar dos índices de preços estarem mostrando deflação, empresários e trabalhadores não têm o que comemorar. A produção industrial está despencando, o comércio não tem para quem vender e o poder de compra, cada vez menor da população, sequer permite a aquisição de alimentos básicos, principalmente para as camadas mais pobres da nossa sociedade.

Como exemplo, aqui mesmo na Capital Federal, relacionada entre as cidades de maior poder aquisitivo nacional, segundo a Federação das Indústrias de Brasília, o setor encolheu 6,24% este ano e fechou quase mil vagas. Na contabilidade da Câmara dos Dirigentes Lojistas do Distrito Federal, a queda do faturamento do comércio local chegou a 10%, conseguindo, dessa forma, atingir quase o dobro da média nacional (5,45%), calculada pelo IBGE.

Agora mesmo, está o Dieese a indicar um índice de desemprego da ordem de 20,3%. Em junho, a Federação das Indústrias de São Paulo apontou nível de emprego negativo em 0,30% e o Serviço de Proteção ao Crédito da capital daquele Estado revelou aumento negativo de 2,21% no último mês de julho.

A Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) realizou pesquisas e revelou que as empresas com ações negociadas em bolsa apostam em investimentos menores e queda do emprego no segundo semestre, se comparado com o primeiro semestre de 2003. No início do ano, segundo levantamento realizado em janeiro, 25% dos entrevistados acreditavam em aumento dos investimentos, mas agora esse percentual situa-se em apenas 8%.

Investidores, operadores e fornecedores de serviços do setor de infra-estrutura estão fortemente preocupados com as graves conseqüências da indefinição do modelo energético do País. Segundo calcula a Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (ABDIB), um mínimo de 150 mil empregos poderiam ser criados com as obras das usinas geradoras de energia elétrica que já estão licitadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Como uma usina dessa leva, em média, quatro anos para ser construída, deve o Governo começar a se preocupar com os possíveis problemas nesse setor, a exemplo do que aconteceu ontem nos Estados Unidos da América e no Canadá. Mais de 50 milhões de pessoas ficaram sem energia elétrica. Inicialmente, informaram que um raio foi o causador do apagão, mas descobriu-se que a causa do mesmo foi a superdemanda ou a falta de capacidade de geração. Nesse sentido, obras já licitadas deveriam ser iniciadas e outras, como as hidrelétricas do rio Madeira, no meu Estado, e também a usina de Belo Monte, no Estado Pará, visando ao desenvolvimento da Região Amazônica, devem ter seus cronogramas mantidos, realizados e priorizados. Juntas, tais ações de desenvolvimento geram milhares de empregos e ajudam a solucionar graves problemas importantes para a população, como a ampliação do atendimento à saúde, à educação, a moradias e casas populares.

Obras como essas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, devem ter início imediatamente. O Governo anuncia um pacote de investimentos na infra-estrutura na ordem de R$190 bilhões. No início, era um pouco mais, agora já diminuiu, mas, talvez, com a iniciativa privada investindo conjuntamente com o Governo Federal nas áreas de infra-estrutura, como já citamos aqui, nas hidrelétricas, nas rodovias, nas ferrovias, nos gasodutos que interligam as usinas termoelétricas, com a geração de energia limpa e barata, um programa de moradias, de saneamentos, etc. essas obras vão gerar não milhares, mas milhões de empregos em todo o Brasil. É disso que o Brasil - que tem um potencial tão grande - está precisando para se transformar em um verdadeiro canteiro de obras, para gerar emprego, renda e dar condições de melhoria de vida para o nosso povo.

Nessa marcha, por ser o segmento mais numeroso - que compõe, nos seus diferentes estratos, cerca de 75% do mercado de consumo - a classe média é, inevitavelmente, a mais atingida e, com ela, submergem as ilusões de prosperidade, os valores morais e éticos que dão sustentação à própria sociedade e sua opção pela democracia. Em seu lugar, emergem comportamentos inconvenientes, como aqueles que decorrem da “filosofia da razão cínica” - como denominou o psicanalista Jurandir Freire - voltados para o oportunismo e marcados por desvios de caráter extremamente nefastos à integridade social.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Aristóteles já dizia em sua obra Política que a comunidade civil mais perfeita é a que existe entre os cidadãos de uma condição mediana, lembrando que, não pode haver Estados bem administrados a não ser aqueles em que a classe média é numerosa e mais poderosa que as outras, ou, pelo menos, mais poderosa que cada uma delas. No que acordam os sociólogos como Leôncio Martins Rodrigues, ao eleger a classe média como o “grupo mais importante de todas as sociedades industriais” e levou José Arthur Rios a advertir que “nenhuma transformação política essencial e democrática criará raízes no vácuo social que resulta da ausência de uma classe média”. São autores, aliás, com um brilhante conteúdo em suas obras e significação em suas lições.

Os desafios que se interpõem à sobrevivência da classe média, como disse, são amplos e numerosos. Mas poderão ser enfrentados a partir da consciência dos problemas e de uma intransigente defesa que contemple, por exemplo, a denúncia das injustiças fiscais e a permanente exigência de salários dignos. As atuais taxas de juros praticadas no Brasil inviabilizam quaisquer iniciativas no desafiante mercado competitivo.

Nós precisamos, Sr. Presidente,Srªs e Srs. Senadores, fazer com que a classe mais pobre ascenda à classe média, mas jamais permitir que a classe média possa se tornar neste País uma única classe pobre.

Vale lembrar, a propósito, o que dizia o pensador francês Blaise Pascal: “O homem é visivelmente feito para pensar; aí reside toda a sua dignidade e todo o seu mérito, e todo seu dever é pensar com acerto.”

Pensar com acerto! É o que suponho estarmos fazendo, Srª e Srs. Senadores, ao constatar e denunciar o que está acontecendo contra a classe média, em particular, e a todos os brasileiros, em geral, que estão sentindo o deterioração da qualidade de vida.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/08/2003 - Página 23915