Discurso durante a 99ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Ações do governo para baixar os juros e ampliar o crédito no mercado.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Ações do governo para baixar os juros e ampliar o crédito no mercado.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/2003 - Página 23995
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANUNCIO, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, CONSELHO, POLITICA MONETARIA, DISCUSSÃO, PERCENTAGEM, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS, DEFESA, IMPORTANCIA, ATENÇÃO, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, ECONOMIA INTERNACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, RISCOS, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), INVESTIMENTO.
  • COMENTARIO, ELOGIO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS, DEPOSITO COMPULSORIO, TENTATIVA, AUMENTO, OFERTA, CREDITOS, POPULAÇÃO.
  • REGISTRO, EFEITO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, FAVORECIMENTO, BANCOS, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS, FINANCIAMENTO, EMPRESTIMO, CREDITOS, CHEQUE.
  • APRESENTAÇÃO, PROVIDENCIA, GOVERNO, FACILITAÇÃO, ACESSO, CREDITOS, POPULAÇÃO, INCENTIVO, CONCORRENCIA, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, REDUÇÃO, EXCESSO, LUCRO.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Agradeço, Sr. Presidente.

Desejo cumprimentar os Senadores aqui presentes neste início de semana, que começa com discursos contundentes do Líder do PSDB. Tanta contundência assim, Senador Eurípedes, seria bom que tivesse havido no período anterior. Dizem que não há herança, mas estamos aí administrando e tentando sair da crise em que nos deixaram.

Esta semana, no mês passado, foi apelidada pelo nosso Ministro da Fazenda de “Semana da TPC” - Tensão Pré-Copom. Trata-se da semana em que se faz todo o debate a respeito do percentual de queda na taxa Selic, sobre a qual o Copom decidirá.

Temos várias apostas, projeções, desafios, tais como de 1,5%, 2%, e, conforme foi dito no discurso que me antecedeu, se for corajoso, decidirá até por três pontos de queda.

Mas é importante registrar que, antes da queda que todos sabemos que irá acontecer esta semana, já demos conta, em sete meses, de colocar a taxa de juros em percentuais menores do que encontramos. E tenho certeza absoluta de que o Copom desta semana irá decidir pela queda da taxa de juros compatível com a situação que este País atravessa. Terá que ser dada uma atenção toda especial para a questão interna, mas também para algo que está ocorrendo nos Estados Unidos e para que todos temos a obrigação de estar muito atentos. Ou seja, além do famoso e famigerado risco Brasil, agora, temos também para debater e analisar o tal risco Estados Unidos. E isso está sendo divulgado pelos nossos jornais, dando conta de que o desajuste nas contas do Governo George Bush vem derrubando o preço dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos e, conseqüentemente, aumentando a remuneração desses papéis chamados no mercado de treasures.

É o risco Estados Unidos que tem o curioso efeito de reduzir a diferença entre os títulos americanos e os de países emergentes. Investidores são estimulados, com esse fenômeno, a repatriar seus dólares para o mercado americano, teoricamente mais seguro.

Portanto, a decisão do Copom desta semana terá, obviamente, o ingrediente da análise criteriosa da queda da inflação, da perspectiva que está colocada para o próximo período nos indicadores econômicos brasileiros. Mas, indiscutivelmente, terá que se levar em consideração o risco Estados Unidos, porque os investimentos internacionais vêm secando, sendo cada vez em volumes menores, reduzidos. E todos sabemos da importância dos investimentos, principalmente, para a infra-estrutura alavancadora do desenvolvimento e da geração de emprego.

Mas todos os indicadores também apontam, apesar de haver dúvidas se o Copom baixará em 1,5%, em 2%, ou corajosamente, como bravateiam alguns, em 3%, que deveremos virar o ano com uma taxa Selic de 19%. Todos os agentes econômicos estão trabalhando com essa perspectiva.

O Governo tomou, recentemente, uma medida muito importante, que também vinha sendo cobrada, na questão do compulsório. Trata-se daquela parcela, aquela alíquota dos depósitos à vista dos bancos que fica retida no Banco Central. Esse compulsório que nos foi entregue num patamar, numa alíquota bastante elevada também, com a medida tomada nos últimos dias pelo Banco Central, já retornou ao patamar de junho de 2000, ou seja, houve a diminuição do compulsório dos depósitos à vista de 60% para 45%. Portanto, em poucos meses estamos fazendo equivalência com indicadores macroeconômicos de anos anteriores, referentes ao Governo Fernando Henrique.

Esse compulsório reduzido coloca à disposição algo em tornos de R$8 bilhões, que deixarão de estar retidos no Banco Central e estarão disponíveis nos bancos para serem transformados em crédito. Isso é algo que todos desejamos, porque, com a ampliação da oferta do dinheiro, é possível a redução dos juros e principalmente do spread. Mas todos temos a clareza de que essa quantia poderá não ir totalmente para o crédito; poderá alimentar a compra de dólares, como também a compra de títulos, na rolagem da dívida. Esse é o nosso grande risco, porque os juros reais, infelizmente, continuam muito altos; esse é o perfil da nossa dívida, apesar de o Governo Lula estar trabalhando diuturnamente para alongá-lo, para que não vença em tão curto prazo e para que não tenha tanta vinculação ao dólar, essa é a situação que nos foi legada. E os títulos públicos ainda são altamente atrativos. Portanto, os bancos, ao terem a disponibilidade desses recursos, que deixaram de ser retidos no compulsório do Banco Central, continuarão tendo uma forte atração para a compra de títulos do Governo, porque tem muito menos risco, tem maior remuneração e dá muito menos trabalho do que ofertar crédito para o setor produtivo ou para as pessoas físicas.

Por isso que, junto com a redução do compulsório, há também uma expectativa de vincular essa queda maior na taxa de juros Selic, porque essas duas medidas podem se complementar e fazer com que efetivamente esse volume maior de recursos, com a diminuição do compulsório, possa ser catalisado para aquilo que nos interessa, que é a oferta de crédito.

Todas essas medidas relacionadas ao compulsório têm como principal objetivo a alteração da taxa de juros, mas, principalmente, do spread, que é a diferença entre o que o banco paga para quem coloca dinheiro no banco e aquilo que o banco cobra quando empresta dinheiro. Então, a diferença do spread, que no Brasil é elevadíssima, é escorchante, é absurda, é que o compulsório tem alguma possibilidade de mexer, bem como outras medidas que vêm sendo adotadas pelo Governo Federal.

Essa mudança no compulsório trouxe, nos dias seguintes (no primeiro, no segundo e no terceiro dia) à redução do compulsório, os jornais atestaram que vários bancos adotaram a redução das suas taxas de juros em várias modalidades de empréstimo. O Banco do Brasil cortou, pela terceira vez este ano, suas taxas sobre operações de Crédito Direto ao Consumidor, cheque especial, cartão de crédito e financiamento de micros e pequenas empresas. No caso da Caixa Econômica Federal, trata-se da segunda redução de juros promovida em dois meses. Além do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, o Bradesco, o Itaú, o Unibanco, o HSBC, o Real e a Nossa Caixa já cortaram taxas depois que o Banco Central reduziu os compulsórios.

Os três maiores bancos privados do País fizeram os seguintes cortes: o Bradesco cortou a taxa em cinco linhas de financiamento. O juro máximo do cheque especial para pessoas físicas, por exemplo, caiu de 9,3% para 8,7% ao mês. O Itaú reduziu a taxa em quatro linhas de crédito: os juros do cheque especial recuaram de 9,35% para 8,9% ao mês. O Unibanco, por sua vez, baixou o custo em cinco modalidades: no desconto de duplicatas, as taxas, que variavam de 3,4% a 4,3% caíram para 2,4% a 2,9%.

            Portanto, a reação do sistema financeiro brasileiro, dos principais bancos - dos dois bancos públicos, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, e dos principais bancos privados - foi positiva. E essa reação dá a medida de quanto as iniciativas do Governo de casar modificações da taxa Selic com o compulsório já podem ser observadas e sentidas no bolso da população. Isso acaba provocando uma reação em cadeia, porque algumas redes de lojas também já praticaram, este mês, uma diminuição das taxas cobradas no crédito ao consumidor. Inúmeras casas, grandes redes, já apresentaram diminuição nos juros cobrados.

Além dessas medidas, eu gostaria de ressaltar que no sistema financeiro brasileiro as medidas são adotadas em uma perspectiva oligopolizada. É muito difícil quebrar-se toda a estrutura armada para manter a maior taxa de lucratividade do Sistema Financeiro Internacional. Além das medidas macroeconômicas, o Governo Lula vem adotando outras medidas para quebrar essa estrutura oligopolizada, para minar a verdadeira casamata que acoberta os grandes interesses do sistema financeiro que atuam no Brasil.

Eu gostaria de listar algumas medidas que estão em andamento - e outras que estão anunciadas - que são muito importantes para tentar derrubar o spread, os juros, o lucro abusivo dos bancos em nosso País.

Até o final de agosto, o governo brasileiro, por meio de uma proposta apresentada pela Central Única dos Trabalhadores, vai ampliar, de forma significativa, a possibilidade de se obter um empréstimo com desconto em folha; ou seja, todos que trabalham com registro em carteira vão poder acessar empréstimos bancários com juros inferiores aos do mercado, com spread significativamente menor, porque o desconto em folha garante que não haja risco nesse tipo de operação bancária.

É uma forma de ofertar crédito mais barato e de colocar nesse mercado oligopolizado um ingrediente, num volume significativo de recursos emprestados sem grande risco, para oferecer uma alternativa de competição. Essa medida, debatida a partir da proposta da Central Única dos Trabalhadores, tem previsão de ser anunciada e implementada em grande escala em todo o Brasil nos próximos dias.

A outra medida, que, aliás, veio na forma de medida provisória e está agora chegando ao Senado...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senadora Ideli.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Pois não.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Eu gostaria de dar uma contribuição a V. Exª, autêntica e brava mulher. Presidente Siqueira Campos, eu queria recordar a informação trazida por V. Exª - e também lembrando a competência do seu velho pai, a trazer para o cerrado o Prodecer; e tecemos louvor àquele grande homem público - de que os juros do Prodecer no Japão eram de 2% ao ano. Aqui é de 8,7% ao mês, acumulado. É uma lástima. É uma matemática. Quero apenas reavivar esse fato para prestar a minha homenagem a Siqueira Campos, que foi buscar no Japão juros para o Proceder. Daí a vitória da agricultura, da produção de grãos, da soja, que está sustentando 2% ao ano. É muito diferente da exploração de 8,7% ao mês, acumulado.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - E é para que isso não aconteça, Senador Mão Santa, que precisamos ter medidas para desmontar, ter alternativas e criar a competitividade no Sistema Financeiro brasileiro, que não existe. É um oligopólio, eles se regem pelas regras... E, portanto, as medidas, como essa de empréstimo em folha, têm esse objetivo de minar, de criar mecanismos para que o dinheiro possa ser ofertado.

A outra medida que está para ser apreciada pelo Senado Federal, através de medida provisória, trata do microcrédito. O recolhimento de 2% do compulsório pode ir para os bancos para que eles possam fazer empréstimos a juros de 2% ao mês, ainda muito alto, muito elevado, em face de 2% ao ano. Mas aqui 2% ao mês é uma vitória, tendo em vista que as taxas são, mesmo reduzidas, como já li, na faixa de 7%, 8% ou 9%.

Houve muitas críticas quando o Governo Lula apresentou a medida provisória do microcrédito: banco privado preferirá deixar o dinheiro lá a retirar esse dinheiro do compulsório para fazer microcrédito. E aí estão os fatos para desmentir, porque o Bradesco estréia no microcrédito. É o primeiro banco privado a aderir ao programa. “O Bradesco foi o primeiro banco privado brasileiro a aproveitar resolução aprovada no mês passado pelo Conselho Monetário Nacional que libera dois pontos percentuais do recolhimento compulsório sobre depósitos à vista - dinheiro das contas correntes que os bancos são obrigados a deixar parado nos cofres do Banco Central - para operações de microcrédito.

O banco lançou ontem - dia 13 de agosto - linhas para que seus clientes, pessoas físicas, possam tomar empréstimo no valor máximo de R$500, com taxa de 2% ao mês e prazo de um a doze meses. Já para os microempresários, o valor máximo sobe para R$1.000. Nos dois casos, a prestação mínima para quitação do empréstimo deverá ser de R$20,00.”

Portanto, é a prática desmentindo o discurso de que não seria usado pelos bancos privados, de que só o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal iriam utilizar essa modalidade de microcrédito. Estão aí agora porque começa a se instalar a concorrência. Quando o Banco do Brasil e a Caixa Econômica saem na frente, fazendo a conta fácil, como é o caso da Caixa Econômica, que, sem todas aquelas exigências, sem todas as garantias, sem todos os documentos exigidos pelos outros bancos, permite que aquele contingente de 25 milhões de brasileiros que nunca puderam ter acesso ao Sistema financeiro possam fazê-lo, através das contas fáceis, isso instala a concorrência, isso instala a disputa do mercado e faz com que os bancos privados sejam obrigados a vir atrás, como já aconteceu. Registrei aqui a questão do Bradesco.

Essa concorrência está sendo incentivada pelo Governo Lula. Quando se tomam as medidas de empréstimo com desconto em folha, microcrédito e conta fácil, instala-se esse salutar espaço de concorrência.

E o Banco do Brasil, conforme reportagem de Míriam Leitão, acabou sendo o instrumento do Governo Lula para instalar esse verdadeiro clima de concorrência. E farei aqui o registro:

“O Banco do Brasil vai reduzir as taxas de juros bem mais que o resto do mercado. Os bancos estão reduzindo, por causa da liberação do compulsório, 0,1 a 0,2 ponto percentual. E o Banco do Brasil está anunciando quedas que chegam a um ponto percentual em taxas que já eram mais baixas que as das outras instituições. ‘Vamos chutar o balde’, diz o Presidente Cássio Casseb. O Banco do Brasil, em seis meses, conquistou mais 1,5 milhão de clientes(...).

(...) O cheque especial de pessoa jurídica vai cair de 8,69% para 7,69%. Esse é o produto mais caro para empresas. O cheque especial e o cartão para pessoa física também têm o juro mais alto, vai cair de 8,70% para 7,90%. O Crédito Direto ao Consumidor vai de 5,90% para 5,40%, Os juros são ainda altos, mas o Presidente do Banco do Brasil diz que essa queda é pela liberação do compulsório. E que a atitude daqui para a frente será esta:

- Vamos ser mais agressivos, saindo na frente nesta redução dos juros, porque queremos crescer, tomar mercado(...)

(...) - Há dois anos, éramos o oitavo no segmento corporativo; este ano, fomos para quarto, já estamos em terceiro e o objetivo é chegar ao fim do ano em segundo lugar. Estamos avançando no segmento previdenciário; em julho, batemos o recorde em seguro de carro.”

E assim o Governo Lula, por meio do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal e por intermédio de medidas, como da medida provisória do microcrédito, da modificação na legislação para cooperativas de crédito, está definitivamente, e até que enfim, instalando a concorrência dentro do sistema bancário brasileiro. A disputa pelos clientes vai fazer, obrigatoriamente, com que os bancos privados tenham que modificar a sua postura, os seus parâmetros de cobrança, o seu spread. E é desta forma que nós poderemos ter, aí sim, alguma perspectiva neste País, havendo uma modificação no comportamento do sistema financeiro brasileiro.

Quem me precedeu falou que não existe herança. O problema era o medo do Lula e não a política econômica adotada e o que foi feito neste País. Então, somente para completar o pensamento, para que não paire nenhuma dúvida sobre o que nos sobrou para administrar, o “estudo da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe*, Cepal*, mostra que o investimento produtivo no Brasil, a chamada Formação Bruta de Capital Fixo* - FBCF*, atingiu apenas 18,6% do Produto Interno Bruto, em 2002, contra 19,7% do PIB, em 2001”.

Esse percentual era de 21,5% em 1997. Portanto, o índice que demonstra o grau, o percentual de investimento produtivo relacionado diminuir de 21,5%, em 1997, para 18,6% em 2002.

Então, quem quiser continuar mascarando que o que estamos administrando hoje é fruto da herança maldita que nos foi legada, sim, que continue fazendo discursos. Todos os indicadores apontam que nos deixaram para administrar o osso. O osso! Um dado, inclusive não computado por nenhuma instituição brasileira, nem pela Cepal, demonstra, de forma muito clara, que, de 1997 a 2002, que a Formação Bruta de Capital Fixo, que é a medida exata do nosso investimento produtivo, baixou de 21,5% para 18,6%.

Agradeço-lhe a compreensão, Sr. Presidente. Desculpe-me ter extrapolado o tempo em alguns minutos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/2003 - Página 23995