Discurso durante a 99ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre declarações do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Comentários sobre declarações do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/2003 - Página 24022
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PUBLICAÇÃO, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), APRESENTAÇÃO, PROGRAMA, TELEVISÃO, CONFIRMAÇÃO, INTERESSE, SOLUÇÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS, ESPECIFICAÇÃO, CONFLITO, CAMPO, FOME, VIABILIDADE, DIALOGO, DIVERSIDADE, SETOR, SOCIEDADE, IMPORTANCIA, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA ASSISTENCIAL, TRANSFERENCIA, RENDA, TENTATIVA, COMBATE, CRIME.
  • LEITURA, TRECHO, ENTREVISTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PUBLICAÇÃO, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, FOME, BRASIL.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Valdir Raupp, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente Lula resolveu, neste final de semana, dar algumas entrevistas e declarações de grande relevância. Quero ressaltar sua observação, ali em Araraquara, onde esteve visitando um projeto de realização de reforma agrária. Sua Excelência observou que o Brasil tem oportunidade de fazer uma revolução pacífica, como alguns outros países já tentaram. Outros países promoveram revoluções que acabaram não dando certo, mas o Brasil tem condições excepcionais de realizar uma transformação social de profundidade. O Presidente Lula pode liderar um processo no qual as pessoas que estiveram destituídas de direitos ao longo da nossa História passem a ter voz, vez e direito a uma vida com dignidade.

Quero dizer que estou inteiramente de acordo com as observações do Presidente Lula ao convidar a todos os brasileiros para realizarem essa manifestação, essa transformação, essa revolução pacífica.

O Presidente Lula, a propósito, tem sido aberto ao diálogo com todos os segmentos da sociedade. Os proprietários rurais chegam a se assustar, quando Presidente Lula recebe com tanto carinho e atenção os membros do MST, deixando que em Sua Excelência coloquem um boné, porque avaliam que isso seja inadequado. Mas, no Palácio do Planalto ou em tantos outros lugares - como o fez em Araraquara no sábado último, ao estar com o Sr. Cutrale, um dos responsáveis pela produção de suco de laranja no Brasil, e, hoje de manhã, em Jacareí, quando esteve na inauguração da fábrica de papel do Grupo Votorantim, junto ao Sr. Antonio Ermírio de Morais e assim por diante -, são tantas as oportunidades em que o Presidente Lula mostra sua disposição de dialogar com todos os segmentos, convidando-os para a realização dessa revolução pacífica.

Duas entrevistas importantes foram para as páginas amarelas da revista Veja, bem como para o Fantástico, ontem à noite. Quero ressaltar alguns pontos, em especial o referente à transformação pacífica que propõe realizar o Presidente Lula.

O Presidente Lula informou que, hoje, são quase 300 mil famílias beneficiadas pelo Programa Cartão Alimentação e outros programas sociais. Mas referente ao Programa Cartão Alimentação, se hoje são 300 mil famílias, até o mês de outubro passarão a ser um milhão de famílias.

Na medida em que houver a unificação dos programas sociais, é possível que haja uma multiplicação muito significativa até o final do ano. E, ao longo do próximo ano de 2004, mais do que 3,5 milhões de famílias estarão sendo beneficiadas pelo novo projeto de transferência de renda que está por ser anunciado nos próximos dias.

Tem dito o Presidente Lula que muitas vezes prefere aguardar um pouco. Salienta Sua Excelência em sua entrevista à revista Veja: “A história do Brasil já mostrou que choques criam uma euforia na sociedade que dura dois meses; depois disso, o resultado é sempre pior. Minha lógica é da paciência. Se tivermos de esperar um dia a mais, um mês a mais, para tomar uma decisão mais consistente, vamos aguardar”.

Muitos têm sido aqueles que cobram do Presidente Lula maior pressa na realização dos programas sociais. Aqui observo que será muito importante que o passo dado para definir o novo programa de transferência de renda seja objeto da necessária reflexão, para que, depois, ele possa caminhar com muito maior acerto do que o que até agora foi realizado.

E é necessário ressaltar que hoje temos um número bastante acentuado, diversificado, de programas sociais, mais de dez, cada um com uma formulação diferente, seja o Bolsa-Escola, o Bolsa-Alimentação, o Bolsa-Renda, o Cartão-Alimentação, o Auxílio-Gás, o Agente Jovem, apenas para citar alguns dos programas de transferência de renda, aqueles que serão justamente objeto da unificação, racionalização e coordenação.

Espero que a decisão a ser tomada pelo Presidente seja, de fato, fruto dessa paciência a que Sua Excelência se refere, mas que seja também na direção mais correta possível.

Espero que o Presidente Lula, conforme ressaltou ontem na entrevista ao Fantástico, da Rede Globo, por sua história pessoal e pela maneira como tem se conduzido, não apenas dê um exemplo de revolução pacífica e democrática no Brasil, mas que possa, com seu exemplo, colaborar e cooperar para que nas outras nações latino-americanas haja a repercussão dele e, mais do que isso, para que o Brasil, como ressaltou ontem o Presidente Lula, ajude a Colômbia a chegar a um entendimento, com uma transformação pacífica entre o Governo Álvaro Uribe e todas as forças que ele representa, as Farc, a M-19 e outras forças que têm travado uma luta revolucionária naquele vizinho país, de povo irmão do povo brasileiro.

O Presidente Lula, ontem, mencionou que está empenhado para que haja um diálogo, inclusive com a cooperação das Nações Unidas. O Secretário-Geral da ONU, Kofi Anan, está empenhado em realizar esse entendimento entre aquelas partes; e o Presidente Lula mencionou que o está apoiando e considera que justamente as Nações Unidas podem se constituir num foro de pacificação.

Conforme tenho ressaltado, mais e mais o Brasil poderá ser um exemplo para mostrar à Colômbia e aos demais países um possível caminho de pacificação se aqui houver o acerto na realização dos programas sociais, dos programas de transferência de renda, dos programas que possam garantir o crescimento da economia, com efetiva criação de empregos, programas de realização de reforma agrária mais eficazes do que os que até agora têm sido feitos.

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma observação, ontem, a respeito da questão da pobreza em nosso País, da qual me permitam ler um breve trecho que considero bastante interessante.

O SR. PRESIDENTE (Valdir Raupp) - Senador Eduardo Suplicy, eu gostaria de pedir a compreensão de V. Exª para prorrogar a sessão por mais dez minutos, a fim de que V. Exª possa concluir o seu pronunciamento e para que o nobre Senador Marcelo Crivella também faça uso da palavra.

A Mesa prorroga a sessão por mais dez minutos.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Muito obrigado.

            Diz o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva:

Há mais ou menos um ano e meio tenho pensado muito em como quebrar o ciclo de miséria, violência e isolamento que aflige as pessoas na periferia das grandes cidades. A questão não é apenas falta de dinheiro. Temos um problema sério que é o processo de desagregação da estrutura da sociedade, que começa com a implosão da família. Existe uma pobreza passiva e uma ativa. Quando o cidadão está no semi-árido nordestino, ele é pobre, mas ele tem a mãe dele, o pai. Além disso, ele tem uma relação com São José, porque ele espera todo ano até 19 de março para chover, depois ele tem uma relação com o padre Cícero. Ou seja, ele tem fé. Quando esse mesmo cidadão se desloca para um grande centro urbano, seja Recife, seja São Paulo, ele vai morar numa favela e perde essa rede de proteção. Não tem mais o conforto dessas relações. Passa a ser um sujeito que mora num barraco cercado de estranhos. O único ambiente agradável que ele tem por perto é o bar, o único conforto, a bebida. O morador do interior do Nordeste tem a paciência de esperar pela chuva, por uma vida melhor. O filho adolescente do nordestino que migrou para a cidade grande não tem mais a mesma paciência. Quando ele vê, está no fio da navalha. Para cair na criminalidade, é um pulo.

Veja - Como lidar com isso?

Lula - Nós temos de ter planos emergenciais para atuar nas grandes periferias, porque é ali que a desgraça acontece, ali que imperam a criminalidade, o tráfico de drogas. Atacar isso é possivelmente mais útil à segurança que todos nós queremos do que contratar mais policiais. Nós estamos pensando como fazer para atacar esse problema nos grandes centros urbanos, com obras de saneamento, obras de habitação, para gerar emprego e um mínimo de qualidade de vida para essas pessoas.

Considero, Sr. Presidente, que um bem desenhado programa de transferência de renda pode ser a solução inclusive para a geração de demanda por bens e serviços de primeira necessidade e de uma outra condição de liberdade e dignidade para os trabalhadores, permitindo-lhes uma melhor colaboração.

Sr. Presidente, apenas uma reflexão final. Ontem, o Presidente Lula fez uma observação sobre a reeleição, afirmando que sempre foi contrário a ela. Sua Excelência já demonstrou muitas vezes na história a sua extraordinária intuição política, sensibilidade, acuidade, e acredito que ontem mostrou isso.

Como o Presidente Lula, também sempre fui crítico da reeleição. Aqui expressei as lições de Alexis de Tocqueville, transmitindo ao então Presidente Fernando Henrique Cardoso, que era seu admirador, que, na democracia na América, segundo Tocqueville, não seria saudável o direito de reeleição. O Presidente tem a percepção exata de que a reeleição possivelmente não será o melhor. Se Sua Excelência acertar - e tenho certeza de que vai acertar e estou disposto a ajudá-lo -, tenho a convicção de que haverá demanda, pela sociedade, na base do PT, para que ele se candidate novamente. Mas talvez o Presidente Lula esteja correto.

Tenho a impressão - e estou de acordo com Sua Excelência nessa afirmação - de que ele aponta um caminho correto: que teria sido mais saudável se o Presidente Fernando Henrique Cardoso tivesse abraçado essa idéia também quando aqui propôs a reeleição.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Deixe-me apenas concluir, Senador Mão Santa.

            E há outro aspecto interessante. V. Exª deve ter visto ontem que o Presidente Lula falou um pouco dos cuidados com a sua saúde, informando que, aos 57 anos, hoje observa que o tempo que tem pela frente é menor do que o que já teve e que agora precisa se cuidar muito bem para poder continuar contribuindo para as coisas nas quais tanto acredita.

Tendo 57 anos, pode o Presidente Lula estar visualizando que talvez - conforme mencionou na sua entrevista à revista Veja - alguém de seu próprio Partido ou da coalisão possa muito bem dar continuidade ao trabalho que vem realizando. E como, quatro anos depois, Sua Excelência terá não mais do que 65 anos, cuidando-se muito bem, estará novamente com a sua legitimidade ainda mais reforçada, para, eventualmente, concluir uma obra de tamanho significado quanto aquilo que nos convida a todos os brasileiros realizar: uma revolução pacífica.

Acho que o Presidente Lula acertou.

O SR. PRESIDENTE (Valdir Raupp) - Eu gostaria de pedir a compreensão do Senador Mão Santa, porque o tempo do Senador Eduardo Suplicy já está esgotado em cinco minutos e ainda temos o Senador Marcelo Crivella para falar e a sessão se encerra às 18 horas e 52 minutos. Eu gostaria que V. Exª me perdoasse por isso.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Pois não.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Obrigado, Senador Mão Santa, pela intenção do seu aparte.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/2003 - Página 24022