Discurso durante a 101ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Equívocos da gestão Lula. Esforço publicitário para manter a credibilidade do Governo. (como Líder)

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Equívocos da gestão Lula. Esforço publicitário para manter a credibilidade do Governo. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 21/08/2003 - Página 24544
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • CRITICA, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, PUBLICIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REDUÇÃO, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MOTIVO, RECESSÃO, CONFLITO, SEM-TERRA, REFORMA AGRARIA, DESEMPREGO, INEFICACIA, POLITICA SOCIAL, PROGRAMA, COMBATE, FOME, EXCESSO, PROMESSA.
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, APROVAÇÃO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, ANTERIORIDADE, APRECIAÇÃO, SENADO, DESRESPEITO, LEGISLATIVO.
  • CRITICA, JOSE DIRCEU, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, DECLARAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, FALTA, COMPROMISSO, REESTRUTURAÇÃO, PACTO, FEDERAÇÃO.
  • DEFESA, MOBILIZAÇÃO, PREFEITO, LUTA, REFORMA TRIBUTARIA, FAVORECIMENTO, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
  • QUESTIONAMENTO, GESTÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE SEGURANÇA ALIMENTAR E COMBATE A FOME, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO EXTERIOR (MDIC), MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), PROCURADORIA GERAL DA REPUBLICA.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “as multidões, bem trabalhadas por um esperto demagogo, acreditam em qualquer coisa.” É o dizer de Henry Louis Mencken.

O Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, era até a semana passada um homem acuado pelo próprio discurso, quase taciturno. Após queimar parte considerável do seu estoque de prestígio popular com patriarcadas que o situavam acima das forças da natureza e imediatamente abaixo de Deus, o Presidente descobriu que a retórica salvacionista tinha lá seus dissabores. Embora tenha conservado os patamares pessoais de popularidade do início do mandato, as pesquisas de opinião pública começam a demonstrar queda acentuada de confiança no seu Governo.

Também pudera: o espetáculo do crescimento econômico deu lugar à recessão. A reforma agrária que não houve, um dos assentamentos primordiais da “lulasofia”, criou condições favoráveis à luta revolucionária no campo. Dos 10 milhões de empregos prometidos em 4 anos, ainda não foi criado um só novo posto de trabalho, mas acrescidos outros 600 mil desempregados desde o mês de janeiro.

A opção preferencial pelas políticas sociais continua sendo a marca deste Governo, embora o serviço público prestado indique propaganda enganosa. As ações contra a fome, por exemplo, continuam próximas do zero, ainda que o Ministro da Segurança Alimentar, José Graziano, pareça estar distribuindo alpiste para passarinho azul. O Líder do Governo nesta Casa, o brilhante Senador Aloizio Mercadante, reconheceu, na revista IstoÉ, com algum eufemismo, que “há sobreposições de funções e pulverização de ações” nas áreas sociais. Eu preferiria acreditar que a inação é fruto somente dos atropelos iniciais de um governo encantado consigo mesmo, mas é forçoso asseverar que ele está liquidando o otimismo do brasileiro.

Então, ante o quadro político desfavorável, especialmente agravado pelo fogo inusitado da dissidência do PT e suas torrentes anti-reformistas, o Presidente Lula decidiu que a campanha eleitoral não pode parar e fez alguns discursos ao povo. Neste final de semana, o Governo realizou um esforço publicitário espetacular, normalmente reservado ao ocaso ou aos momentos de estertor das administrações públicas.

Assim foi determinado: já que a economia não reage, o primeiro mandatário é o próprio incremento econômico. Anunciou-se o investimento estatal de R$191 bilhões e mil obras até o ano de 2007. Um feito e tanto para um governo divorciado da prática. Depois, o Presidente Lula apareceu em cadeia de rádio e TV, inaugurou turbina da época do seu antecessor na hidrelétrica de Itaipu, ocupou a capa da revista de maior circulação nacional em longa entrevista e fechou o domingo na intimidade do Palácio da Alvorada como se fosse fantástico o espetáculo da vida. O espasmo marqueteiro não é capaz de purgar os males da incompetência gerencial, mas causa a sensação de que a aposta não foi paga, mas o Governo continua sendo um bilhete premiado.

Em todas as entrevistas e pronunciamentos, o Presidente Lula lançou mão de metáforas de arquibancada, reclamou que governar é difícil, mas garantiu o gol. Como vem ocorrendo nos últimos oito meses, revigorou o bate-fundo extraordinário de que é preciso quebrar o ciclo da miséria, pediu paciência para que se ergam os alicerces, deu comida aos peixes, asseverou que o MST não vai fazer reforma agrária na marra e decretou que o povo brasileiro recuperou a auto-estima porque confia no seu Presidente.

Mais uma vez, distribuiu esperanças quirografárias e ostentou postura autocrática, sobejamente evidenciada em sua declaração de que, neste pouco tempo de governo, foi aprovada a reforma da Previdência. Uma alteração constitucional se faz em dois tempos em cada uma das duas Casas do Parlamento brasileiro. Foi cumprida uma fase de votação na Câmara dos Deputados. O Senado sequer recebeu a matéria para apreciação, mas o Presidente Lula anunciou para milhões de telespectadores que a etapa está vencida e trata-se de uma dádiva do Governo.

Conforme pude expressar na semana passada, a política de Governadores encetada no primeiro turno das votações da reforma da Previdência era um expediente, com aparência de legitimidade, destinado a minimizar o papel do Poder Legislativo. A declaração do Presidente de que as alterações previdenciárias foram ultimadas confirma a intenção de espezinhar o Congresso Nacional, mas o Senado não pode permitir que o Palácio do Planalto converta a função legiferante desta Casa em uma participação meramente regimental na condução das reformas. Daqui a pouco este Governo vai supor que a paciência do povo acabou e que é preciso repristinar o decurso de prazo.

A declaração do Ministro Chefe da Casa Civil, José Dirceu, dando conta de que o Palácio do Planalto não transige a repartição da Contribuição Provisória de Movimentação Financeira (CPMF) e o seu descompromisso manifesto de recomposição do pacto federativo atestam que os Governadores foram usados para aprovar a reforma da Previdência. Com uma agravante: se insistirem na repartição do bolo, não vai ter festa. Ou seja: a reforma tributária “vai empacar”, conforme vaticinou o Ministro Chefe do Gabinete Civil.

A reforma do sistema tributária brasileiro não é uma doação do Presidente Lula, mas um esforço decenário que vem sendo empreendido pelo Congresso Nacional para criar condições fiscais ao crescimento econômico. O que se pretende é racionalizar um sistema que é bom para o Governo, na medida em que garante o sustentáculo de caixa, mas pernicioso à competitividade do País e ao emprego.

Os Prefeitos precisam se manter mobilizados pela realização da reforma tributária porque a disposição do Presidente Lula de fazê-la já se tornou ocasional. Há forte impulso do Palácio do Planalto de fragmentar e protelar as alterações constitucionais da matéria uma vez que, para a União, tempo é literalmente superávit primário. O sistema atual é satisfatório para alimentar as necessidades de receita do Tesouro Nacional.

            O alongamento do embate da reforma tributária no Congresso também traz dividendos políticos ao Governo. O Partido dos Trabalhadores tem um projeto de afirmação nacional da legenda e pretende enfraquecer as atuais administrações locais. Imaginam que o poder da máquina da União será capaz de entregar ao PT um controle considerável das cidades e alterar favoravelmente a condução da reforma tributária.

As alterações do sistema devem coroar o reequilíbrio do pacto federativo e soerguer as instituições locais de governo. De acordo com informações do Ministério da Fazenda, 41,5% dos Municípios trabalham com déficit primário. Uma das grandes causas do passivo a descoberto são os custos que as Prefeituras têm de arcar com a manutenção das ações e serviços de responsabilidade dos Governos federal e estaduais, o que representa um valor médio de R$3,8 bilhões por ano. E o pior, Sr. Presidente: conforme dados do Instituto Brasileiro de Administração Municipal, justamente os Municípios com menor porte demográfico e economia rural são os que mais sofrem a asfixia imposta pela União. Quando são descontadas as receitas constitucionalmente vinculadas às áreas de educação e saúde, o comprometimento das receitas livres das prefeituras com atividades estranhas às suas finalidades alcança o índice de 27%.

O Ministro José Graziano, justamente por ser responsável pela alta taxa de anemia verificada no desempenho da administração do Partido dos Trabalhadores, foi incluído no remendo publicitário do último fim de semana. O titular do Fome Zero, que havia causada mal-estar com a adjetivação injuriosa do povo nordestino, declarou que os resultados do Programa são visíveis e, como exemplo, citou que em Guaribas, no Piauí, Município piloto da iniciativa de erradicar a pobreza, “a cor da cidade está mudando”, o “o arco-íris está presente” e “já existe até um cabeleireiro”. Agora, causou extremo desconforto ao setor produtivo a maneira pejorativa como o Ministro assegurou que a única indústria em recessão hoje no País é a da seca.

Sr. Presidente, será que o Ministro José Graziano, emocionado com o arco-íris no sertão, não foi informado de que o setor industrial acumula retração em 10 dos 12 Estados brasileiros pesquisados pelo IBGE e só em São Paulo a queda da produção acumulada no ano foi de 0,9%.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Eu gostaria de concluir, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos) - Senador Demóstenes Torres, eu apenas quero, em seu favor, prorrogar a sessão por mais três minutos, para que V. Exª possa finalizar o seu pronunciamento.

O SR. DEMÓSTENS TORRES (PFL - GO) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Certamente também deixou de tomar ciência do desânimo causado pelas Diretrizes da Política Industrial e Tecnológica (PIT) elaboradas pelo Governo. Trata-se de um devaneio acadêmico, que propõe a constituição de uma “força-tarefa de natureza superministerial” para revolucionar a política do setor terciário, mas não diz como nem quando.

Já o Ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, não é capaz de apresentar um plano de segurança ao Pais, sonega da nação a Reforma da Tranqüilidade Pública, acredita que poderá vencer o crime com ações de entretenimento, e ainda freqüenta com desenvoltura o anedotário político com manifestação anti-homossexual. O problema é que neste Governo ouvem-se mantras quando se deveria estar atento ao gravíssimo conflito social provocado pelo crime organizado e sua expressão no tráfico de drogas, no comércio ilegal de armas, na corrupção e na lavagem de dinheiro.

Sr. Presidente, desde a Constituição de 1988, o posicionamento constitucional do Ministério Público é de independência, mas o Procurador-Geral da República, Cláudio Lemos Fonteles, não perde uma oportunidade de praticar mesuras e enviar menções laudatórios para galvanizar prestígio no Poder Executivo. Mais uma vez, o Procurador-Geral da República ratificou a desobediência civil e o desrespeito à Constituição ao autorizar o esbulho possessório. Em uma intervenção inconveniente conseguiu interpretar que o direito à propriedade privada “não é um princípio absoluto”. Fui Procurador-Geral de Justiça em duas ocasiões, quando atuei na mediação do conflito agrário, e sempre acreditei que nestas ocasiões a exasperação das vontades é um pretexto ao imponderável.

Tenho algumas dúvidas sobre o que fundamenta as interferências do Chefe do Ministério Público Federal. Pretende o Dr. Cláudio Lemos Fonteles causar insegurança jurídica ao País para angariar poder? Seria o eminente Procurador um emissário geral de estranho e pequeno manual do zen-budismo dialético? Ou trata-se de um provocador estreante em guerra com o anonimato? O Exmo Sr. Procurador-Geral da República deveria estar cumprindo com o compromisso que firmou com o Senado de que faria a distribuição eletrônica dos procedimentos, respeitando-se o princípio do Promotor natural, mas parece que, a se considerar a sua gerência administrativa da instituição, a alternativa é de potencializar o vedetismo.

O Governo Lula foi muito bem no último final de semana e como não houve peladas na Granja do Torto também não foram verificados acidentes ortopédicos entre o corpo ministerial. Faço votos de que, a partir de agora, as instituições efetivamente andem e confirmem a felicidade publicitária do Senhor Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/08/2003 - Página 24544