Discurso durante a 103ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Distorções tributárias que afetam o Rio de Janeiro. Fusão das empresas aéreas VARIG e TAM.

Autor
Marcelo Crivella (PL - Partido Liberal/RJ)
Nome completo: Marcelo Bezerra Crivella
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Distorções tributárias que afetam o Rio de Janeiro. Fusão das empresas aéreas VARIG e TAM.
Aparteantes
Maguito Vilela, Renan Calheiros.
Publicação
Publicação no DSF de 23/08/2003 - Página 24853
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INSUFICIENCIA, RECURSOS FINANCEIROS, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, POPULAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, SAUDE.
  • COMENTARIO, SUPERIORIDADE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DISTRITO FEDERAL (DF), CONTRIBUIÇÃO, ARRECADAÇÃO, PAIS, CRITICA, FALTA, PROPORCIONALIDADE, DISTRIBUIÇÃO, VERBA, UNIÃO FEDERAL.
  • QUESTIONAMENTO, FALTA, PROPORCIONALIDADE, DISTRIBUIÇÃO, ARRECADAÇÃO, PREJUIZO, ESTADOS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), APREENSÃO, AGRAVAÇÃO, FINANÇAS, FUSÃO, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO.

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, muito agradecido. Quero saudar também esses jovens que abrilhantam o nosso Plenário.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos convictos de que a construção da cidadania plena no Brasil passa, necessariamente, pelo combate às brutais assimetrias sociais e regionais presentes em nossa sociedade. A idéia mesmo de uma União composta por diversos Estados federados implica, ademais, em uma aliança construtiva entre seus diversos componentes, em que aqueles capazes de contribuir com mais recursos têm o dever de fazê-lo para o bem de toda a coletividade nacional. Essa verdadeira ética da solidariedade encontra-se consagrada, aliás, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, e dela jamais abriremos mão.

E é precisamente em nome dessa solidariedade e em nome de um juízo de eqüidade que devem permear nossas ações não só no Parlamento, mas também na vida, que mais uma vez sinto-me no dever de assomar esta tribuna para sensibilizar meus Pares acerca das gravíssimas distorções que afetam o Estado do Rio de Janeiro em matéria tributária.

Em termos de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, o Rio de Janeiro é o segundo maior arrecadador do País, com um montante que chega aos R$40.406.000,00 no ano de 2002. Isso significa nada menos do que 18,18% de tudo o que foi arrecadado em impostos e contribuições federais no ano passado. E o que recebeu, de volta, o nosso Estado, em transferências obrigatórias por parte da União? Apenas 2,67% desse valor, ou seja, R$1.079.000,00. Essa quantia representa - pasmem, Srªs e Srs. Senadores - um trinta e sete avos do que foi arrecadado.

As conseqüências de tal injustiça distributiva se fazem sentir, diariamente, nas ruas, avenidas, becos e esquinas das cidades que compõem o meu Estado do Rio de Janeiro. Infelizmente, Sr. Presidente, notícias sobre nosso imenso potencial turístico, sobre a cordialidade de nosso povo e sobre as maravilhas de nossas praias, cantadas em prosa e verso por artistas de todo o mundo, têm caminhado, pari passu, com denúncias diárias de violência, de assassinatos, de balas perdidas, de narcotráfico, que servem, também, como trágica metáfora de nossos descaminhos na busca de uma sociedade mais justa.

E essa busca de maior justiça social tem como corolário a necessidade de haver eqüidade na distribuição de recursos tributários. Até quando teremos de ligar a televisão e assistirmos a repetidas manifestações de violência na segunda maior metrópole nacional, um de nossos mais destacados cartões de visita, para, aí sim, nos darmos conta de que nossa posição, como segundo maior arrecadador e apenas décimo recebedor de recursos, é profundamente injusta, o que prejudica de modo direto a vida de milhões de cariocas e fluminenses?

Falta, ou melhor, tem faltado, nos últimos anos, Sr. Presidente, aquilo que costumo chamar de “senso de prioridade” na condução da política nacional e na alocação de recursos públicos por parte de sucessivos governos. Parece-nos que nossos formuladores de políticas públicas se têm esquecido de que o Rio de Janeiro, síntese de nossas belezas naturais e humanas, concentra também, em seu diminuto território, as piores conseqüências que são fruto de nossa profunda desigualdade social.

Já tivemos a oportunidade, por exemplo, de denunciar deste Plenário as dificuldades por que passa a população do Distrito Industrial de Queimados, um triste exemplo de descaso para com nosso Estado. Esse Distrito, que conta hoje com 25 empresas em funcionamento, ainda não dispõe de um viaduto de acesso, que serviria, estamos certo, como elemento dinamizador para toda a área de sua influência econômica.

Manifestamos nossa indignação, também, quanto aos pífios repasses de recursos do SUS para o Estado do Rio de Janeiro, que destinou, no ano de 2002, risíveis um mil e quinhentos reais para o combate ao câncer de próstata como verba mensal. Naquela oportunidade, abordamos a constrangedora situação da Governadora do Estado, ameaçada, mais de uma vez, por medidas judiciais por enfrentar imensas dificuldades até para o pagamento de precatórios e da folha salarial do nosso Estado.

Todos esses fenômenos são sintoma, não tenho dúvida, do inaceitável descompasso entre a arrecadação tributária do Rio de Janeiro e o desproporcionalmente pequeno repasse desses mesmos recursos. É óbvio que nossos problemas não se reduzem a isso; não poderíamos, de maneira alguma, acalentar tal ingenuidade. Agora, em um contexto de arrocho econômico e de preocupante índice de desemprego, o quinhão tributário que ao Rio é devido por direito e por eqüidade econômica pode ser a esperança que nos resta tanto para sairmos do estado de emergência social, quanto para minorarmos os efeitos perniciosos do baixo crescimento da economia do País.

Neste ponto do meu pronunciamento, gostaria de deixar algo bem claro: estamos plenamente conscientes de que a divisão de parte das receitas entre os entes da Federação e os Fundos de Desenvolvimento Regional são instrumentos legítimos e necessários na promoção do equilíbrio sócio-econômico do nosso País e na redução de desigualdades nacionais. Estamos certos de que, às mais ricas unidades da Federação - como é o caso, por exemplo, do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Distrito Federal.

Imagine, Sr. Presidente, que o nosso País tem vivido uma crise econômica tão intensa, que a maior receita de impostos da União é o Imposto de Renda. O Imposto de Renda, em Brasília, é muito superior ao do Pará, da Bahia, do Espírito Santo, de Minas Gerais. Portanto, em termos de arrecadação nominal, primeiro São Paulo; segundo, Rio de Janeiro; terceiro, Brasília. É preciso, que nosso País tenha produção industrial, tenha turismo. É preciso que os minérios do Pará possam ser revertidos para fazer crescer a economia daquele Estado. Imaginem Brasília: onde estão as indústria de Brasília? Onde estão os minérios de Brasília? Onde está o petróleo de Brasília? Na verdade, não existem; são apenas recursos de Imposto de Renda, terceira principal arrecadação do Governo Federal no bolo tributário. Parece até que não temos outras tantas riquezas em nosso País!

Às mais ricas unidades da Federação cabe a nobilíssima função de distribuir parte de seus recursos às regiões mais carentes do País. Permito-me dizer que esse ethos, na medida em que nos lembra de nosso dever de repartir o pão, não é apenas constitucional; é, também, cristão e universal, sem nenhuma analogia à Igreja a que pertenço.

Entretanto, é necessário exercê-lo com moderação e com parcimônia, para que o Estado que repartir não fique em condições piores do que aquele que recebe - para não repetirmos aquela estória da vaca que mama no bezerro. É lícito indagarmos, por exemplo, se os índices estabelecidos pela Lei Complementar nº 62, de 28 de dezembro de 1989, que regulamenta a liberação de recursos do Fundo de Participação dos Estados e Municípios, mantêm, de maneira imaculada, sua validade. Os fins visados por essa Lei são os melhores, e a eles damos o nosso apoio incondicional.

Porém, preocupa-nos verificar que o Estado do Rio de Janeiro, que arrecadou, no ano de 2002, quase R$20 bilhões de Imposto de Renda e R$1,7 bilhão de IPI, recebeu do Fundo de Participação dos Estados, a minguada soma de R$271 milhões.

Talvez algum incauto dissesse: “Mas, Senador, o equilíbrio federativo impõe sacrifício dos Estados mais ricos”. Por que isso não acontece com o Estado de São Paulo, que em 2002 arrecadou R$99 bilhões e recebeu R$5,5 bilhões de volta? Por que será que o meu Estado do Rio de Janeiro que, nesse mesmo período, arrecadou R$40 bilhões e só recebeu R$1 bilhão?

São regras injustas desta Constituição tão bonita, cidadã, mas que infelizmente cometeu esse desatino contra o meu Estado, que já não agüenta mais tanto sacrifício.

Há que se levar em conta, também, o contexto de brutal concentração de recursos nas mãos da União. Por outras palavras, o Rio de Janeiro sofre duplamente: na excessiva centralização tributária na esfera federal, o que procuraremos mitigar na reforma tributária, e na injusta repartição dos créditos tributários devidos ao Estado, cujos números há pouco mencionados nos fornecem a exata noção da desigualdade que tem vitimado a população e o Governo do Estado do Rio de Janeiro.

Para reverter esse quadro, certamente apresentarei emenda à reforma tributária, propondo que um percentual mínimo de arrecadação dos Estados para a União seja transferido de volta para as unidades federadas. Penso ser muito justo que, do imposto de renda pago pelos fluminenses, pelo menos 30% sejam obrigatoriamente aplicados no Estado de origem. Que os recursos arrecadados venham para o governo federal, mas que retornem sob a forma de algum tipo de investimento. O fato de o Rio de Janeiro conviver com o paradoxo entre um setor de serviços avançadíssimo, de um lado, e o saneamento precário, o analfabetismo e a violência, de outro lado, motiva-nos a lutar, de maneira incansável, pelo aprimoramento dos critérios de divisão do bolo tributário.

Tencionamos, pois, a um só tempo, consolidar o papel do Rio como Estado transferidor de recursos e assegurar a prevalência de modelo tributário mais condizente com a realidade de nossas unidades federadas.

Tenho uma fé inabalável de que tais propósitos encontrarão respaldo inequívoco na sensibilidade política do Presidente Lula, que, aliás, recebeu, no Estado do Rio de Janeiro, sua mais expressiva votação, e não poderá jamais passar à história como perpetuador da discriminação contra o Estado do Rio, sob pena de cometer a maior ingratidão que um político já fez com o povo da minha terra. Tenho uma fé inabalável de que este Senado, como guardião do pacto federativo e dos mais altos interesses da Nação brasileira, há de rediscutir essa reforma tributária e encontrar solução para essa ganância insaciável da elite paulista que concentra tantos recursos, autora do maior casuísmo da Constituição, que é a forma de arrecadação do ICMS do petróleo, único produto que não arrecada ICMS na origem mas, sim, no refino, para beneficiar, mais uma vez, o Estado mais rico da Federação.

Sr. Presidente, quero agradecer por esse tempo.

O Sr. Maguito Vilela (PMDB - GO) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Com a maior vaidade, concedo a V. Exª este aparte.

O Sr. Maguito Vilela (PMDB - GO) - Senador Crivella, eu estava acompanhando o pronunciamento de V. Exª, pronunciamento justo na defesa dos interesses do Estado do Rio de Janeiro, que V. Exª representa extremamente bem. O Rio de Janeiro merece consideração da Nação brasileira, sempre foi um Estado referência, a cidade do Rio de Janeiro sempre foi referência, não só para o Brasil mas para o mundo, inclusive ganhando o título de Cidade Maravilhosa. O Estado do Rio de Janeiro é um dos mais importantes do Brasil e precisa ser tratado com o devido respeito. Talvez a violência que enfrenta o Estado, o desemprego e uma série de problemas que afligem o povo carioca sejam decorrência desse tratamento desigual que tem recebido o Rio de Janeiro ao longo das últimas décadas. Cumprimento-o como brasileiro que tem muita simpatia pelo Estado do Rio de Janeiro, pela cidade do Rio de Janeiro e pelos cariocas de uma forma geral, que escreveram e escrevem as mais belas páginas da história do Brasil. Portanto, esse Estado merece a consideração do Congresso Nacional, do Senado da República, do Governo Federal, principalmente neste momento em que estamos estudando uma distribuição de renda mais equânime para os estados e os municípios brasileiros por meio da reforma tributária. Quero cumprimentá-lo, pois V. Exª tem sido um defensor árduo do Rio de Janeiro, que precisava realmente de um Senador como V. Exª, alguém que chama a atenção do Congresso e do Brasil para as dificuldades pelas quais passa aquele estado, o que talvez seja conseqüência das injustiças sofridas ao longo das últimas décadas. Parabéns. Conte comigo na defesa desse importante Estado da Federação brasileira. Parabéns por seu pronunciamento.

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Muito obrigado, Senador, em nome de todos nós, fluminenses, pela solidariedade de V. Exª.

Sr. Presidente, gostaria, terminando minhas palavras, de lembrar que o nosso Estado do Rio de Janeiro sofre hoje uma crise também na área do turismo. A fusão da Varig com a TAM vai arrastar para São Paulo a nova companhia, desempregando dez mil fluminenses. E eu não sei qual a vantagem que vamos ter com a fusão dessas duas companhias, já que elas estão, na prática, fundidas, estão operando juntas e não melhoraram o seu resultado operacional. Precisamos realmente repensar essa união antes de levar para São Paulo mais uma empresa. O Rio de Janeiro, que já está exaurido, sangrando, sofrido, vai perder mais a Varig, que hoje emprega doze mil pessoas lá na Ilha do Governador, na cidade do Rio de Janeiro? Sinceramente, tenho medo de que, quando aquele parque industrial, que é o maior da América Latina, for abandonado, apareça mais uma favela. Vamos ter mais ataque do narcotráfico numa cidade já tão combalida.

Com muita honra, concedo um aparte ao nobre Líder do PMDB nesta Casa, Senador Renan Calheiros.

O Sr. Renan Calheiros (PMDB - AL) - Senador Marcelo Crivella, eu queria, mais uma vez, cumprimentar V. Exª pelo brilhante pronunciamento que faz. V. Exª defende, como pouquíssimos defenderam, o Rio de Janeiro, seu interesse, dando consistência à representação que, com tanta competência, aqui no Senado Federal V. Exª faz. Realmente precisamos defender os interesses do Rio de Janeiro. Esta Casa é a casa da Federação, tem compromissos com isso, óbvios compromissos com isso, e V. Exª, mais uma vez, se destaca na defesa intransigente dos interesses do seu Estado, da região que muito bem V. Exª representa aqui. Conte com o nosso apoio, conte com o apoio do nosso partido. O que for preciso fazer, nós vamos fazer em coro com V. Exª, para que o nosso Rio de Janeiro seja cada vez melhor. Parabéns.

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Muito obrigado, nobre Senador Renan Calheiros.

Somos todos brasileiros, gaúchos e nordestinos, mas, na alma, não deixamos de ser cariocas. Pela nossa generosidade, pela maneira alegre com que encaramos a vida, nós, brasileiros, todos, na alma, podemos dizer que nascemos naquela cidade maravilhosa. Dói em todos nós ver o nosso Estado tão abandonado, com tanto tráfico, com tantas crianças nos semáforos das cidades, com tanta gente desempregada e passando fome.

Realmente, conto com V. Exª, com o PMDB. V. Exª também é de um Estado produtor de petróleo, ali naquela região de Sergipe e de Alagoas. Portanto, precisamos lutar para tirar esse casuísmo da nossa Constituição e devolver aos nossos Estados o que eles têm de direito.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/08/2003 - Página 24853