Pronunciamento de Ney Suassuna em 25/08/2003
Discurso durante a 104ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Crise financeira dos municípios e estados brasileiros.
- Autor
- Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
- Nome completo: Ney Robinson Suassuna
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.:
- Crise financeira dos municípios e estados brasileiros.
- Aparteantes
- Antonio Carlos Magalhães, Tasso Jereissati.
- Publicação
- Publicação no DSF de 26/08/2003 - Página 24961
- Assunto
- Outros > ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
- Indexação
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- GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, PARALISAÇÃO, SERVIÇO, PROGRAMA, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, DEMISSÃO, FUNCIONARIOS, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, REPASSE, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM), RECESSÃO, ECONOMIA.
- CRITICA, LEGISLAÇÃO, CRIAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, AUSENCIA, DIVISÃO, ARRECADAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, NECESSIDADE, ATENÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, BUSCA, SOLUÇÃO, REGISTRO, TRABALHO, SUBCOMISSÃO, SENADO, DIVIDA PUBLICA, GOVERNO ESTADUAL.
- JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, LIMITAÇÃO, PERCENTAGEM, PAGAMENTO, PRECATORIO, PREFEITURA.
O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é grave a crise financeira dos Municípios brasileiros. Prefeituras estão fechando as portas por total falta de condições para operar. São levadas a demitir funcionários e compelidas a interromper serviços e programas necessários à população.
De vários Estados chegam-nos notícias das aflições dos prefeitos. Todas as administrações municipais estão em crise.
A União dos Municípios da Bahia avalia que, nas últimas semanas, já foram demitidos naquele Estado 5.000 trabalhadores municipais e que as demissões, em breve, se não houver uma reversão desse fenômeno, deverão totalizar 40 mil funcionários.
Em São Paulo, carro-chefe da economia brasileira, centenas de Prefeitos protestam, decretam ponto facultativo, demonstram que não lhes resta outro caminho senão a paralisação de grande parte das atividades da Prefeitura, em detrimento do bem-estar da população.
Os exemplos multiplicam-se país afora. O movimento de indignação e protesto alcança escala nacional, chega a Brasília, bate às portas do Congresso, que não pode e não deve negar apoio; ao contrário, deve estar de ouvido atento, com compreensão, solidariedade e outras medidas concretas.
A causa imediata da crise, o pingo d’água, é a redução, nos meses recentes, dos repasses constitucionais aos Municípios por parte dos Estados e da União. Essa redução, por sua vez, deve-se à queda geral na arrecadação da União e dos Estados, reflexo da contração da atividade econômica.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nós começamos a analisar esse fenômeno, que, por sinal, não é um fenômeno apenas das Prefeituras. No começo deste ano, fizemos um requerimento na Comissão de Assuntos Econômicos desta Casa pedindo a criação de uma subcomissão do endividamento dos Estados. Para nossa surpresa, de repente eclodiu a crise das prefeituras. Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passamos a querer entender o que ocorreu e concluímos que grande parcela desse problema é culpa nossa. Permitimos, por descuido, por pouca atenção, que o Governo fosse criando mais contribuições - CPMF, PIS, Pasep, Cofins, Cide e outras -, que não são divididas com Estados e Municípios. Quando imposto, é dividido; quando contribuição, não. E o Governo Federal optou pelas contribuições. Essa é uma forma de receber o dinheiro sozinho. E fomos coniventes com essa atitude. Por isso, cabe a nós agora parte da solução. E devemos buscá-la juntamente com o Governo Federal, porque não foi o atual Governo que, em meses, gerou toda essa crise. Ela ocorre desde a promulgação da Constituição de 1988.
Ao instalarmos a Subcomissão da Comissão de Assuntos Econômicos para analisar o endividamento dos Estados, ficamos estarrecidos. Por que os Estados estão nessa situação? Uma das causas é o famoso apagão do ano retrasado, que retirou dos cofres estaduais a parcela do ICMS que lhes correspondia. Vários Estados perderam quase 30% da sua arrecadação inteira. O Estado do Rio de Janeiro perdeu R$500 milhões naquele mês. E muitos Estados perderam, porque o imposto sobre a eletricidade é alto: mais de 35%.
O consumo se regularizou, Sr. Presidente, mas nunca mais atingiu os níveis de antes: as lâmpadas que esquentavam foram trocadas por lâmpadas frias, houve revisão nos sistemas elétricos das casas e das indústrias, e nunca mais o consumo voltou a ser o mesmo. No ano passado, dois anos depois do fenômeno, o Rio de Janeiro ainda perdia R$1,8 bilhão em relação ao que arrecadava antes. Na verdade, isso aconteceu nos Estados todos.
Mas não foi só isso. O Supremo Tribunal Federal, devido à Emenda nº 20, feita por nós, proibiu a cobrança sobre os aposentados. Muitos Estados faziam essa cobrança - na verdade, 16 deles - e perderam novamente centenas de milhões de reais. Planos de reclassificação de categorias, como foi o caso do Rio de Janeiro com relação aos professores, custaram anualmente R$600 milhões. Isso se repetiu em muitos Estados. Alguns governadores, ao saírem, deixaram para o outro governo esses planos de reclassificação.
A verdade é que, hoje, cerca de 18 Estados estão em uma situação muito complexa. Os 13% iniciais que o Governo cobrava das dívidas todas dos Estados para com a União cresceram. Há Estados hoje que ficam com apenas 20% do que arrecadam. Mas nós, de novo, erramos - e, neste caso, de boa-fé - quando criamos mais 12% de contribuição para a Saúde. Os Estados e Municípios passaram a ter que aplicar 12% da sua arrecadação, o que é uma medida correta, na teoria, mas não é tão correta na prática: se tomarmos um Município e destinarmos 25% da sua arrecadação para a Educação, 12% para a Saúde, 9% para pagar os atrasados do INSS - que não eram cobrados antes -, serão 48%, ou seja, metade da arrecadação da Prefeitura já estará rotulada e carimbada. E a folha de pagamentos, que pode chegar a 60%, pela Lei Camata? Mesmo que ela esteja bem, em 50%, sobram 2% para aplicação.
Agora, sobre todo esse quadro, ainda cai a arrecadação: nos últimos meses, houve uma queda de 48%. Não é à toa que estamos vivendo esse caos e que as Prefeituras e os Estados estão gritando.
Como fazer se o cobertor é curto, Sr. Presidente? Se tirarmos do Governo Federal, vai faltar; se tirarmos do Governo Estadual, também vai faltar, cada um na sua instância. Mas onde vive a população? Onde a população tem a merenda, a saúde, a educação, principalmente a de massa, que é dos 7 aos 14 anos de idade? É na Prefeitura. E as Prefeituras estão em situação de calamidade, como vemos.
A Volkswagen ia demitir 4 mil pessoas, mas o Governo mexeu no IPI para evitar isso. Só na Bahia, existe a possibilidade de demissão de 40 mil. E o que o Governo vai fazer? Precisamos tomar uma decisão que ajude os Municípios e os Estados. Não queremos, de maneira nenhuma, o sacrifício do Governo Federal, mas queremos também que os Estados não passem pelo vexame que estão passando, menos ainda as Prefeituras, onde as pessoas vivem. Estamos em uma situação difícil, mas, analisando novamente, a culpa também é nossa, porque deixamos o Governo Federal cobrar sempre dos mesmos. Mas deixam de cobrar dívidas importantes, como há hoje no âmbito da Justiça Federal e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional: quase um PIB para ser cobrado. “Ah, mas nunca vamos receber esse dinheiro todo!” Eu sei, mas, se recebêssemos 30% desse dinheiro, já estaria superada a crise.
Por essa razão, penso que existem inúmeras medidas de melhoria que podem ser tomadas. Por exemplo, os depósitos judiciais podiam ser usados pela União e pelos Estados, mas não pelas Prefeituras. Estamos buscando isso. Não há uma tabela que limite o saque das arrecadações das prefeituras no que se refere a precatórios, nem de Estados. São medidas de curta e imediata aplicação.
O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Concede-me V. Exª um aparte?
O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Concedo o aparte ao nobre Senador Antonio Carlos Magalhães, que, com certeza, acrescentará dados importantes ao nosso discurso.
O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Senador Ney Suassuna, V. Exª aborda um dos assuntos mais graves e importantes do momento. E nós, do Congresso Nacional - Câmara e Senado -, temos que dar uma demonstração de que não vamos deixar os Municípios totalmente abandonados, como se encontram. O número mencionado por V. Exª sobre as demissões da Bahia é real. E creio que isso ocorre em todo o Brasil. Conseqüentemente, temos de assumir um compromisso com a sociedade, com os Municípios e com os Estados. Devemos dar apoio aos três pontos fundamentais: aos Municípios, aos Estados e ao contribuinte, que está sofrendo muito com essa reforma que não atende a ninguém, salvo aos cofres da União. Devemos agir acima de partidos. O próprio PT pode participar. Se quiser negociar, que venha, mas não podemos aceitar a reforma do jeito que está sendo votada na Câmara dos Deputados. Já demos o nosso alerta. Um Deputado já expôs esse ponto de vista naquela Casa. No momento oportuno, também ocuparei essa tribuna ora utilizada por V. Exª. E creio que o momento oportuno é agora. V. Exª faz muito bem em salientar esse ponto, mesmo em uma sessão de segunda-feira. E terá que voltar muitas vezes. E terá que lutar em sua Bancada a fim de que ela não se deixe enganar. Para ser prestigiada, ela tem que demonstrar autonomia. Caso contrário, ficará sempre esperando, sem nunca ser atendida. Mas nós agora devemos lutar pelos Municípios, pelo contribuinte e pelos Estados.
O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Agradeço muito o aparte de V. Exª e insisto em dizer: 25% é tirado da arrecadação da prefeitura para a educação, e para o Estado também - votado por nós; 12% para a saúde - votado por nós; 9% o INSS, que ninguém pagava nas prefeituras anteriormente e que hoje paga o atrasado, mas ainda tem que pagar o do mês, 21% sobre a folha, que normalmente é de 50%. E os precatórios? E a própria folha? E ainda cai 48% na arrecadação. A arrecadação das prefeituras estabelecida no Fundo era de 19%, caiu para 13%. E R$100 bilhões passam por fora, só para o bolso do Governo Federal, não entrando na divisão. Nem Cristo é capaz de fazer o milagre de sobreviver numa situação como essa! Nem Cristo! Porque, se tiraram os meios, como pode a prefeitura, o povo sobreviver?
O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Em relação aos precatórios, V. Exª tem toda a razão, principalmente os trabalhistas. Várias prefeituras estão falindo porque não podem pagar os precatórios trabalhistas e ficam com o seu Fundo de Participação retido. Porque muitas vezes os juízes não têm a noção exata do problema social e querem examinar legalmente, e sempre os mais poderosos, que são os que estão à vista, recebem os benefícios. Mas os precatórios caem nas costas do contribuinte, da prefeitura, que fica sem poder investir um centavo em qualquer obra. De modo que V. Exª, mais uma vez, entra no importante assunto dos precatórios.
O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Sobre os precatórios, nobre Senador, V. Exª ouviu - na reunião dos Prefeitos de seu Partido - a declaração de um Prefeito dizendo que, quando foi receber o Fundo de Participação, não recebeu nada e ainda estava devendo para o mês seguinte.
Realmente, deve haver um tabelamento. Quanto a essa matéria, o Senador Efraim Morais já apresentou um projeto; nós, uma emenda, que, com apoio do próprio Senador Mercadante, haveremos de votar.
Nobre Senador Tasso Jereissati, V. Exª tem a palavra.
O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Senador Suassuna, gostaria também de me congratular com a oportunidade de seu pronunciamento. Como estamos prestes a discutir a reforma tributária, eu queria lembrar que aqui Casa é essencialmente a Casa da Federação. Por essa razão, temos que ter um papel nessa discussão muito mais como Senadores do que como partidos políticos, porque temos a obrigação constitucional de representar o interesse de nossos Estados, da Federação e, por conseqüência, dos Municípios. Nesta Casa, já tive oportunidade de manifestar - e pretendo novamente tratar do tema na quarta-feira - que a questão tributária precede a questão federativa. Durante anos - e isso posso dizer até com certa tranqüilidade, porque faz parte de um processo do qual meu Partido já participou - os Municípios e também os Estados têm sido prejudicados pela União e por esta Casa, quando tem votado uma série de contribuições que tem sido, nada mais nada menos, do que um disfarce para deles tirar dinheiro, concentrando na União. É nosso papel, é nossa obrigação discutir essa questão com a maior profundidade possível. Tenho certeza de que esta Casa dará atenção e assumirá sua responsabilidade nessa discussão. É evidente que nós, Senadores do Brasil - pois, no conjunto, formamos o Brasil -, não podemos pensar apenas nos Estados e nos Municípios; temos que pensar na economia. Mesmo quanto à econômica, a reforma tributária apresentada não atende a nenhum dos requisitos básicos de que a economia brasileira precisa. Portanto, apóio as palavras de V. Exª e agradeço a oportunidade.
O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador. Acrescento que não estamos fazendo carga sobre este Governo. Essas distorções não ocorreram agora, mas vêm se somando.
Não estou deixando de estender a mão e dizer que somos culpados, pode bater - fomos culpados. Estou pedindo que se busquem os recursos onde há. E em muitos lugares há recursos. Mas temos que aprender a cobrar de quem deve. Temos que encontrar soluções, como a Itália e os Estados Unidos, estabelecer acordos, economizar em tudo que seja possível, receber o que é passado e corrigir a sonegação.
No entanto, temos que buscar o equilíbrio difícil de uma equação em que, de um lado, temos o coitado do contribuinte, que não quer pagar mais, pois pagam com dificuldades e não recebem os serviços, e, de outro, as prefeituras, que precisam receber mais recursos e o Estado, que precisa sobreviver, pois também paga pelos serviços de segurança, saúde etc.
Com certeza, não será um tempo fácil, mas temos a obrigação, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de encontrar uma solução. Está é a Casa do pacto federativo; aqui temos que encontrar soluções, inclusive, para mostrar ao Governo possibilidades de economia que vão resultar, com toda a certeza, em novos recursos para o atendimento de nossa população.
Muito obrigado.