Discurso durante a 105ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem a Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, pelo transcurso do seu bicentenário de nascimento.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem a Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, pelo transcurso do seu bicentenário de nascimento.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/2003 - Página 25030
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, LUIS ALVES DE LIMA E SILVA, GENERAL DE EXERCITO, ELOGIO, VIDA PUBLICA, CONTRIBUIÇÃO, MODERNIZAÇÃO, EXERCITO, ATUAÇÃO, PACIFICAÇÃO, CONFLITO, DEFESA, SEGURANÇA NACIONAL.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, em primeiro lugar, agradeço ao Senador Luiz Otávio a cessão de seu lugar na lista de inscrição.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nossa vida é uma longa caminhada, que chamamos de destino. Sempre achamos que Deus nos ensina o caminho e nós fazemos os atalhos, acertando ou errando pela nossa própria vontade. Ainda na juventude, depois de uma seleção, cruzei os umbrais do velho casarão de José Bonifácio, em São Paulo, onde se encontrava instalado o Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Estado de São Paulo. E, lá, pela primeira vez, vesti a farda de Caxias, e, com orgulho, a usei durante o tempo em que fiz o curso, por dois anos, meu Presidente. Depois, no estágio e durante a minha vida toda, sempre me orgulhei de um dia ter usado a farda de Caxias.

Temos de nos lembrar de que, no dia 25 último, ontem, foi comemorado o bicentenário desta ilustre figura brasileira, Duque de Caxias. A Câmara dos Deputados teve oportunidade de realizar uma sessão especial em homenagem ao grande soldado brasileiro. E, a convite do Presidente daquela Casa, participei da Mesa Diretora dos trabalhos.

Portanto, não podia fugir, hoje, primeiro dia depois da comemoração do bicentenário, de me dirigir aos meus Pares sobre esse herói.

A palavra herói encontra-se, hoje, injustamente depreciada. Tornou-se lugar-comum dizer que “infeliz é o país que precisa de heróis”. Nada mais falso. Herói, creio eu, é aquele que, a despeito de todas as adversidades, não se recusa a enfrentar os desafios, mesmo os mais difíceis. Herói é o abnegado que não se recusa a cumprir o seu dever. Herói, enfim, é aquele que merece o nosso respeito e admiração pelo que fez em vida. Triste, ao contrário do que afirma o lugar-comum, é o país que não teve heróis e, conseqüentemente, não tem exemplos para admirar, aprender e copiar.

Para felicidade do povo brasileiro, temos muitos homens dignos de serem chamados de heróis. Um deles é Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias. Em 25 de agosto de 2003, celebramos duzentos anos de seu nascimento.

Incorporaria, meus Senadores, minhas Senadoras, hoje, os vinte e um heróis da ocorrência na Base de Alcântara, de triste memória, onde perderam a vida, tentando colocar o Brasil no mundo da tecnologia, como um dos principais membros desse clube fechado.

Portanto, um dos mais importantes homens públicos brasileiros do século XIX, é responsável direto pela manutenção da integridade nacional, tantas vezes ameaçada, tanto interna, quanto externamente.

Esta é, pois, uma oportunidade única para honrarmos esse homem, um de nossos maiores heróis, exemplo de coragem e amor pelo Brasil. 

A sua vida esteve intimamente ligada à história brasileira. Não é exagero, como fazem alguns, dizer que o século XIX foi o século de Caxias. O século, aliás, foi um dos mais conturbados da história do nosso País. Houve a guerra pela independência na Bahia, onde as tropas portuguesas ofereceram resistência. Aconteceram conflitos externos na região do Prata, entre os quais o maior e mais longo foi a Guerra do Paraguai. Houve, ainda, inúmeras lutas internas, como a Revolução Farroupilha, no Rio Grande do Sul.

Muitas foram, pois, as dificuldades para manter a integridade do País. Caxias, sempre chamado, manteve-se fiel ao Brasil e aos brasileiros. Guerreiro quando necessário, mas negociador e pacificador sempre. Com cinco anos, iniciou sua vida como soldado no regimento comandado por seu avô. Com 14, foi incorporado ao serviço ativo. Com 15, tornou-se alferes e foi transferido para a Academia Real Militar, criada por D. João VI. Em 1921, com 17 anos, tornou-se tenente. No final desse mesmo ano, concluiu o curso de oficiais.

Em 1822, o Brasil tornou-se independente. Houve luta, em especial na Bahia, onde as tropas portuguesas ali instaladas resistiram contra a Independência. Ali, Caxias teve a sua primeira experiência em campo de batalha. Seu superior o descreveu como homem de bravura e habilidade. De volta ao Rio de Janeiro, Caxias recebeu de D. Pedro I a Imperial Ordem do Cruzeiro, a mais alta honraria brasileira, e foi promovido a capitão.

Nos anos seguintes, foi enviado para os campos de batalha da antiga Província Cisplatina, atual Uruguai. Foi três vezes citado por bravura, ganhou as comendas da Ordem de São Bento de Avis e Hábito de Rosa e foi promovido a major.

Em 1831, de volta ao Rio de Janeiro, foi submetido a uma prova de fogo. Povo e tropa exigiam a reformulação do Ministério e a abdicação de D. Pedro. Caxias, apesar de simpático à idéia, manteve-se fiel ao Imperador. Exemplo de fidelidade à lei e aos seus princípios mais íntimos, pois havia jurado lealdade à coroa.

Quando da Regência, houve a necessidade da criação de um corpo militar para garantir a ordem na capital. O comando foi entregue a Caxias, que impediu duas tentativas de sublevação da ordem.

Nos anos seguintes, Caxias foi essencial na pacificação de várias províncias que se levantaram em armas. A primeira pacificação foi no Maranhão em 1840. Ali, desde 1838, ocorria a Balaiada. Essa revolta se deveu a desavenças com o governo provincial. Caxias percebeu que, antes de combater diretamente os revoltosos, precisaria de condições para fazê-lo. Estruturou o exército e treinou soldados. Feito isso, atacou e conquistou a capital dos revoltosos, a cidade de Caxias. Tratou os prisioneiros com dignidade e respeito. Essa seria sua marca, que se repetiria no trato de diversas outras revoltas provinciais que enfrentou. No ano seguinte, em razão do seu sucesso, recebeu as insígnias de general-brigadeiro e o título de Barão de Caxias. Explicou-me o Presidente José Sarney que, o então General-Brigadeiro escolheu esse título, por ter conseguido estabelecer a paz naquela região de sublevados.

O ano de 1842 não foi menos movimentado para Caxias. Estourou a revolta liberal, em São Paulo. Com menos recursos e homens do que os revoltosos, Caxias conseguiu, com astúcia e estratégia, vencer os rebeldes. Com o objetivo de acalmar os espíritos, anistiou os revoltosos. Mal acabara de solucionar essa crise, foi chamado para resolver outra. Os liberais de Minas Gerais levantaram-se em armas. Novamente em inferioridade numérica, Caxias, com rara bravura, resistiu ao fogo inimigo, até que chegasse o reforço de tropas imperiais. Vencedor, tratou os derrotados com dignidade.

Com trinta e nove anos, já era general e pacificador de três províncias. Os seus maiores desafios, todavia, ainda estavam por vir. O primeiro deles era pacificar o Rio Grande do Sul. Ali, como é do conhecimento de todos, ocorreu a mais longa revolta interna da história brasileira. Apenas um homem como Caxias seria capaz de debelá-la.

Nomeado comandante militar e presidente da província, Caxias sabia que, para vencer, teria que adotar outras táticas. Reordenou o exército e reformou a administração burocrática. As prestações de contas tornaram-se obrigatórias, e soldados que usavam verbas do governo para fins particulares foram expulsos. Após dois anos de batalha, finalmente Caxias logrou êxito. A paz foi alcançada, devendo-se, em grande parte, a vitórias nos campos, por meio de negociações: anistiou os rebeldes, pagou as dívidas da República Farroupilha e evitou deixar que questiúnculas impedissem a reintegração dos rio-grandenses ao Brasil.

Em razão de seu sucesso, recebeu o título de Conde e foi escolhido Senador.

Em campanha, na década seguinte, no Uruguai, disse que “a verdadeira bravura do soldado é nobre, generosa e respeitadora dos princípios da humanidade. A propriedade de quem quer que seja, nacional, estrangeiro, amigo ou inimigo, é sagrada e inviolável e deve ser tão religiosamente respeitada pelo soldado do Exército Imperial como sua própria honra. O que por desgraça o violar será considerado indigno de pertencer às fileiras do Exército, assassino da honra e reputação nacional e, como tal, severa e inexoravelmente punido”. Não temer o combate, mas nunca desrespeitar o adversário era o ideal que movia as ações de Caxias.

Em 1865, iniciou-se a Guerra do Paraguai, o mais longo e sangrento conflito externo da história brasileira. Mais uma vez, Caxias foi chamado a cumprir o seu dever com a Pátria. Mais uma vez, ele o fez com brilho. Enfrentou dificuldades terríveis numa guerra em que a doença, a fome e o cansaço eram tão ferozes quanto o inimigo.

Na Batalha de Itororó, as tropas brasileiras lutavam contra grande resistência dos paraguaios, e a vitória só foi alcançada, quando Caxias, já um homem de 65 anos, montou em seu cavalo, tomou à frente da tropa e disse: “Sigam-me os que forem brasileiros!” Ali, graças a esse ato de bravura raro, presenciou-se a vitória decisiva para o sucesso brasileiro na guerra.

Vencedor no Paraguai, foi feito Duque. É, aliás, o único brasileiro a receber esse título.

Se Caxias foi o maior de nossos soldados, também cumpriu, com dignidade, as suas funções como homem público. Além das suas passagens como Presidente de Província - uma vez no Maranhão e duas no Rio Grande do Sul -, ocupou, ainda, por três vezes, o cargo de Ministro da Guerra concomitantemente com a de Presidente do Conselho de Ministro.

Entre as suas muitas realizações como Ministro da Guerra, a mais marcante foi a de transformar o Exército brasileiro em um corpo militar moderno: reformou o Quartel-General do Exército, estabeleceu o primeiro Regulamento Disciplinar do Exército Brasileiro e o primeiro Código Penal Militar Brasileiro.

Em uma de suas passagens pela chefia de governo, pronunciou as seguintes palavras sobre o dever de um homem público:

“Manter a paz externa, sem quebra da dignidade e direitos do Império; sermos moderados e justos, observando religiosamente as leis e resolvendo as questões internas com ânimo desprevenido. Continuaremos a desenvolver a educação e o ensino popular e procuraremos obter as providências que podem caber no tempo da presente sessão legislativa. Entre elas, mencionarei o orçamento, os auxílios à lavoura e a reforma eleitoral.”

Parece-me, Srªs e Srs. Senadores, que esse discurso poderia ser feito no dia de hoje, pelos momentos que passamos.

Sobre Caxias, enfim, creio que o historiador Pedro Calmon deixou a análise definitiva, que ora tomo a liberdade de reproduzir. Dizia Pedro Calmon:

Caxias venceu, sobretudo por convencer, pois a verdadeira vitória não consiste em sufocar ou subjugar o adversário, pois é antes uma tarefa de persuasão, de conquistas de corações para que atinja o ideal vencedor. E Caxias sobrepôs, aos olhos fratricidas, a dignidade da paz justa, cobrindo as forças em luta com o véu iluminado da concórdia e da pacificação. Pois ali reuniu ao gênio de guerreiro consumado, a generosidade clemente e aliciadora.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como disse no início do meu pronunciamento, não podemos deixar passar essa oportunidade de homenagear um dos nossos maiores heróis e copiá-lo em sua coragem, honestidade e amor pela Pátria e pela legalidade.

Nessa justa homenagem a um dos nossos maiores homens públicos, encerro dizendo: sigam o exemplo de Caxias os que forem brasileiros.

Era o que tinha a dizer.

Agradeço a atenção.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/2003 - Página 25030