Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação de acordo de cooperação tecnológica entre o Brasil e a Ucrânia, na área de lançamento de foguetes a partir da base de Alcântara/MA.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Defesa da aprovação de acordo de cooperação tecnológica entre o Brasil e a Ucrânia, na área de lançamento de foguetes a partir da base de Alcântara/MA.
Aparteantes
Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2003 - Página 25144
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • DEFESA, REFORÇO, POLICIA FEDERAL, EFETIVAÇÃO, CONTRATAÇÃO, POLICIAL, AUMENTO, RECURSOS.
  • NECESSIDADE, PRIORIDADE, COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL, ELOGIO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AMBITO, POLITICA NACIONAL, POLITICA EXTERNA, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL, ANALISE, IMPORTANCIA, DOMINIO, TECNOLOGIA, LANÇAMENTO, SATELITE, APROVEITAMENTO, CENTRO DE LANÇAMENTO DE ALCANTARA (CLA).
  • PARTICIPAÇÃO, ORADOR, VISITA, ROBERTO AMARAL, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), PAIS ESTRANGEIRO, UCRANIA, ANALISE, VANTAGENS, ACORDO INTERNACIONAL, PARCERIA, LANÇAMENTO, SATELITE, CENTRO DE LANÇAMENTO DE ALCANTARA (CLA), TRANSFERENCIA, TECNOLOGIA, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, SENADO.
  • HOMENAGEM POSTUMA, TECNICO, CIENTISTA, MORTE, EXPLOSÃO, CENTRO DE LANÇAMENTO DE ALCANTARA (CLA), EXPECTATIVA, CONTINUAÇÃO, PROGRAMA NACIONAL, ATIVIDADES AEROESPACIAIS, DESCENTRALIZAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há poucos minutos, ouvi o Senador Ramez Tebet falar sobre um grave problema e a necessidade de intervenção e de mediação da Polícia Federal. Concordo com S. Exª em gênero, número e grau. Por isso mesmo, antes de iniciar o meu discurso, eu queria abordar um assunto para se fazer justiça à Polícia Federal.

A Polícia Federal, que tem uma imagem excepcionalmente boa no País, tem apenas 6 mil policiais, quando deveríamos ter 18 mil. Está prevista a contratação de mais 3 ou 4 mil policiais. É preciso que essa medida seja tomada, como também é preciso que se dê recursos à Polícia Federal, porque todos os problemas deste País passam por ali. Por isso a PF precisa de meios e de ampliar seu quadro de pessoal.

Concordo com V. Exª, mas creio que nós, que tanto cobramos e tantas responsabilidades transferimos para a Polícia Federal, precisamos dar-lhe uma dimensão condizente com o tamanho do País.

Muito obrigado.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - V. Exª tem razão. É a credibilidade da Polícia Federal que a coloca no centro de todas as possíveis soluções desses problemas.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a busca do desenvolvimento econômico e social pleno é um propósito capaz de unir as mais divergentes ideologias, de aparar quaisquer arestas partidárias, de fazer cessar rivalidades e até mesmo contradições entre as pessoas.

Entretanto, alcançar desenvolvimento efetivo significa enfrentar as duríssimas antinomias globais, traduzidas pela abissal distância entre a pujança econômica e tecnológica de alguns e a miséria de outros povos e países menos desenvolvidos.

Tais condições verificam-se também em nosso imenso País, com a convivência - tão real quanto absurda - entre a tecnologia de ponta e a fome e a pobreza desmedidas.

É por tais motivos, Sr. Presidente, que nos enchem de esperança as perspectivas representadas pelo atual Governo, cujo supremo mandatário pagou com a própria trajetória de vida o elevado preço das desigualdades e da injusta concentração de renda em alguns pontos do território nacional.

O Presidente Lula sabe, como poucos, da importância de se buscar um desenvolvimento equilibrado que contemple as mais diversas regiões componentes do nosso território, da necessidade de se fundar um modelo de crescimento econômico que seja capaz de corrigir as brutais assimetrias internas.

Já podemos ver em ação essas linhas mestras na condução da política externa, com o corajoso elo que o Presidente Lula tem feito entre o clube da elite - representado, entre outros, por Davos e pelo Grupo dos Oito, o G-8 - e os países que buscam uma ordem mundial mais justa - agregados, por exemplo, pelas propostas do Fórum Social Mundial, reunido na cidade de Porto Alegre.

Sabemos da ilegitimidade que alimenta as assimetrias mundiais. Sabemos que um projeto nacional que busque assegurar a soberania brasileira terá de ser criativo e corajoso; deverá buscar, de modo incansável, acordos e parcerias que potencializem as riquezas e os talentos nacionais.

É nesse contexto, Sr. Presidente, que se insere a visita à Ucrânia realizada pelo Ministro da Ciência e da Tecnologia, Roberto Amaral, entre os dias 28 de maio e 1º de junho.

Tive a imensa honra de fazer parte da comitiva do Ministro nessa visita que pode marcar um ponto de inflexão na história nacional no que diz respeito ao uso e à transferência de tecnologias sensíveis.

A visita do Ministro Roberto Amaral é importante no sentido de se agregar o sólido desenvolvimento tecnológico ucraniano, alcançado, por exemplo, na fabricação de veículos lançadores de foguetes, com a invejável infra-estrutura e posição geográfica do Centro de Lançamento de Alcântara - e, aí, falo do Estado do nobre Senador Edison Lobão.

É impossível proferir este pronunciamento sem render um tributo aos bravos trabalhadores brasileiros, engenheiros e operários - alguns deles foram sepultados hoje -, desaparecidos no acidente na Base de Alcântara, e o faço registrando a minha certeza de que o exemplo de dedicação e competência dos companheiros que se foram servirá de inspiração a sucessivas gerações de brasileiros e brasileiras que acreditam na educação e na pesquisa como pressupostos básicos do desenvolvimento.

Prossigo, Srªs e Srs. Senadores, ainda tocado pela emoção, no espinhoso tema da transferência de tecnologias sensíveis, do perigo potencial representado pelos artefatos tecnológicos de uso dual, ou seja, artefatos que podem servir tanto a propósitos pacíficos quanto a propósitos militares.

Os foguetes lançadores de satélites podem ser utilizados, mediante algumas adaptações, para lançamento de mísseis balísticos, o que teria sérias repercussões para a segurança mundial.

A preocupação de coibir a proliferação de tecnologias capazes de afetar a segurança internacional é tamanha que foi instituído, em 1987, o Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis, o MTCR, com o objetivo de se estabelecer procedimento comum de controle de exportação de bens e de serviços que envolvam tais tecnologias sensíveis.

Tanto o Brasil quanto a Ucrânia fazem parte desse regime internacional, o que aumenta de modo significativo as possibilidades de ganhos recíprocos e complementares entre si, se for consolidada a parceria firmada entre Brasília e Kiev.

A cooperação tecnológica na área espacial entre Ucrânia e Brasil é fundamental para a inserção definitiva do nosso País no mercado mundial de lançamento de satélites comerciais, que movimenta, anualmente, a cifra astronômica de US$30 bilhões.

Essa quantia tende a aumentar exponencialmente com a entrada em operação da Estação Espacial Internacional, prevista para 2010.

Sr. Presidente, há no mundo crescente demanda por transporte de carga para o espaço, crescente demanda para o lançamento de satélites, cuja importância se faz sentir nas telecomunicações, na agricultura, no monitoramento da nossa cobiçada Amazônia, na segurança interna, entre outros itens.

Nosso grande desafio deve ser o de consolidar internacionalmente o Centro de Lançamento de Alcântara como referência mundial no lançamento de foguetes comerciais. Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, é preciso que fique bem claro que Alcântara possui condições objetivas inigualáveis em relação a qualquer outra base de lançamento de foguetes no mundo.

Situada precisamente a 2º e 18 minutos de latitude sul da linha do Equador, a Base de Alcântara é capaz de proporcionar às empresas responsáveis pelo lançamento de satélites notável economia de custos.

A economia de custos, que chega a cerca de 30%, advém basicamente do menor consumo de combustível decorrente da proximidade da linha do Equador. É importante ressaltar que a essa vantagem se somam as excelentes condições climáticas da região, a baixa densidade populacional e as excepcionais condições de segurança e de acesso por terra, mar e ar.

Esse conjunto de predicados invejáveis faz de Alcântara objeto de cobiça internacional, inclusive dos Estados Unidos, país que fabrica sozinho cerca de 80% dos satélites comercializados no Planeta.

Quando privatizamos o nosso satélite principal, já tive oportunidade de dizer, sabíamos que a sua data de expiração estava próxima. O preço para se colocar um único satélite novo é de US$500 milhões - vejam só o preço do lançamento e a importância de fazermos a nossa inserção nesse novo nicho que é o de lançamento de satélites artificiais.

Significa dizer que a celebração e a aprovação, pelo Congresso Nacional, de um acordo de salvaguardas tecnológicas com os norte-americanos - precisamos desses acordos, que foram brecados na Câmara; precisamos renegociá-los - que contemple bem os interesses brasileiros é fundamental para que nosso País participe do seletíssimo grupo das nações que exploram comercialmente o lançamento de foguetes.

A hegemonia norte-americana nesse setor específico é um dado da realidade. Entretanto, tão forte quanto essa premissa é o caráter estratégico do Centro de Lançamento de Alcântara, atualmente a melhor e mais bem localizada base de lançamentos do mundo, considerando-se os outros nove excelentes centros que existem no Planeta.

Isso nos permite lutar por acordos de salvaguarda tecnológica que garantam condições satisfatórias de segurança para as empresas envolvidas no lançamento, sem, contudo, impedir o Brasil de avançar no conhecimento e no domínio de tecnologias espaciais avançadas e sensíveis.

Estou abordando esse tema hoje, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, porque vamos votar, brevemente, o acordo Brasil/Ucrânia. Ao fazê-lo, vamos usufruir de uma posição única, pois é um país que detém tecnologia, que quer o intercâmbio com o Brasil e vai nos cobrar apenas US$52 milhões por essa transferência, que é a parte brasileira que vamos aplicar. Acabei de dizer que por um único satélite cobraram US$500 milhões. Temos a oportunidade ímpar de fazer essa transferência de tecnologia e precisamos votar esse acordo internacional, principalmente agora que perdemos uma grande parcela da inteligência brasileira no setor com o triste acontecimento da explosão do veículo propulsor em Alcântara.

O veículo que vamos lançar é o Cyclone 4, referência mundial em tecnologia e confiabilidade. Até hoje, só houve três falhas em um total de cem lançamentos do Cyclone 4, a melhor marca já alcançada entre todas as agências que lançam foguetes no mundo.

Por esses motivos, pedimos especial atenção de V. Exªs para a tramitação do Projeto de Decreto Legislativo nº 2.226, de 2002, que aprova esse acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da Ucrânia sobre Salvaguardas Tecnológicas relacionadas ao lançamento de foguetes a partir do Centro de Lançamentos de Alcântara, celebrado em Kiev, no dia 16 de janeiro de 2002.

A Ucrânia, além de participar do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis - MTCR -, detém outras tecnologias que nos interessam, por exemplo, a de turbinas a gás, e essa, mais uma vez alerto os Srs. Senadores, é outra ocasião ímpar, porque o acordo com a Ucrânia vai nos permitir vencer um fosso tecnológico gigantesco. Neste momento de tristeza em que lamentamos o acidente, essa é a única forma que temos de queimar etapas e vencer obstáculos.

Não é necessário nos perdermos em divagações academicistas para concluirmos que a priorização da ciência e tecnologia é fundamental para revertermos o quadro de concentração de renda e de poder na mão de poucos países.

Pensar estrategicamente em ciência e tecnologia requer, sobretudo, uma boa dose de realismo político. Não há mais espaço para simplificações entre esquerda e direita, não há espaço para edificarmos um discurso nacionalista bem ao gosto da dicotomia vigente no período da Guerra Fria. Esse tipo de visão, à guisa de proteger pretensos interesses nacionais, acaba por prejudicar todo o País.

Que fortaleçamos, pois, nossos laços com a Ucrânia, com a China, com a África e Israel. Mas tal fortalecimento não pode se verificar às expensas de nosso entendimento com a Europa, com a Federação Russa e com os Estados Unidos, três mercados fundamentais para o nosso projeto de desenvolvimento nacional.

É com essas inquietações em mente que reduziremos não só as desigualdades externas, mas também - e sobretudo - os desníveis e as injustiças internas.

O desenvolvimento nacional, Sr. Presidente, para fazer jus ao nome, deve contemplar todas as regiões, e cada uma em particular, que compõem nossa tão diversa realidade. Que o aproveitamento comercial da Base de Alcântara, criada pelo Presidente José Sarney, fundado sobre premissas asseguradoras de nossa soberania, possa incluir definitivamente as Regiões Norte e Nordeste na rota das pesquisas científicas brasileiras.

Tenho muita confiança em que o Presidente Lula e seus Ministros saberão, como já têm demonstrado, buscar uma melhor inserção do Brasil no mundo, principalmente no tecnológico. E, é claro, fazer valer o enorme potencial das Regiões Norte e Nordeste na busca sistemática de um País mais justo e solidário.

Em cerimônia realizada hoje, em São José dos Campos, durante o velório dos trabalhadores mortos no acidente em Alcântara, o Presidente Lula sintetizou o sentimento dos brasileiros com relação ao ocorrido: “A melhor homenagem e o maior reconhecimento que o Brasil deve prestar a estes pioneiros é a continuação e o fortalecimento do Projeto Espacial. Os homens vencem a morte através da perpetuação do sonho”.

Sr. Presidente, ao encerrar, deixo um apelo: que sejamos rápidos na aprovação do acordo Brasil/Ucrânia. Ele vai nos permitir vencer um enorme fosso tecnológico.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2003 - Página 25144