Discurso durante a 107ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Criticas às declarações do Ministro da Saúde sobre a situação no Instituto Nacional do Câncer (Inca). (como Líder)

Autor
José Agripino (PFL - Partido da Frente Liberal/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Criticas às declarações do Ministro da Saúde sobre a situação no Instituto Nacional do Câncer (Inca). (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 29/08/2003 - Página 25307
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, POLITICA PARTIDARIA, CRITERIOS, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PREJUIZO, SAUDE PUBLICA.
  • DEFESA, CRITERIOS, COMPETENCIA, SERVIDOR, NOMEAÇÃO, CARGO DE DIREÇÃO, SERVIÇO PUBLICO, REGISTRO, PROBLEMA, GESTÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAUDE, INSTITUTO NACIONAL DO CANCER, MOTIVO, POLITICA PARTIDARIA.

O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente quero agradecer a cessão da palavra que me é dada pelo Senador Garibaldi Alves Filho, mas quero dizer a V. Exªs que meu pronunciamento é rápido, porque aqui quero apenas manifestar uma preocupação.

O Senador Ney Suassuna, agora há pouco, disse que o que nos restava - e referia-se à falta d’água e ao carro-pipa - era protestar. Acredito que esta Casa é ouvida, e tão mais ouvida quanto mais argumentos sólidos sejam produzidos. Eu quero me referir - e o faço com muita preocupação - a uma entrevista, que eu li no jornal Folha de S.Paulo de hoje, na primeira página, com declarações atribuídas - suponho que verdadeiras, porque são as piadas - ao Ministro da Saúde a respeito do affair do Instituto Nacional do Câncer. A manchete diz: “Ministro diz que trabalha só com quem ‘tem lado’”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o atendimento à saúde pública no Brasil é um problema seriíssimo. Eu já fui duas vezes governador e sei como é difícil. Ninguém pode se dar ao luxo de trabalhar no sistema de saúde somente com aqueles que são “do nosso lado”.

Eu tive oportunidade de, no Governo, para beneficiar a todos da sociedade, contar com a colaboração dos que eram do meu lado preferencialmente, mas não abrir mão de pessoas que não votaram em mim, que não eram do meu lado, mas que tinham uma contribuição a dar à sociedade. E a isso eu chamo “espírito público”. Raciocinar em que só se deve chamar para trabalhar no âmbito do Governo quem é do nosso lado é, no mínimo, um egoísmo injustificado.

Sr. Presidente, a saúde pública no Brasil é desempenhada por três níveis de atuação: Municipal, Estadual e Federal. O Sistema Unificado de Saúde determina responsabilidades à esfera estadual, responsabilidades à esfera municipal e guarda para si responsabilidades em centros de referências ou na implementação de políticas públicas de saúde.

Nós temos ícones de bom desempenho. Eu citaria duas fundações, por exemplo: a Fundação Sarah Kubitscheck, que sobrevive com recursos públicos e é exemplar no Brasil e no plano internacional; outra Fundação é a Funasa, que trata de saúde pública preventiva, um órgão que até bem pouco tempo era gerido por pessoas do ramo - havia determinação. O Incor é outra referência nacional como o Instituto Nacional do Câncer é outra referência nacional, pelo menos o foi até bem pouco tempo. A única referência nacional sediada no Rio de Janeiro, no plano de saúde, melhor do que qualquer outra em qualquer parte do Brasil é o Instituto Nacional do Câncer.

V. Exª já imaginou se o Governo inventasse de destituir - porque não seria “do lado” do Governo - o Dr. Campos da Paz, da Fundação Sarah Kubitscheck? V. Exª já imaginou se o Governo inventasse - porque ele não é “do nosso lado” de destituir a direção do Incor?

Vejo essas coisas todas com muita preocupação; e com maior preocupação eu li as declarações na Folha de S.Paulo e que reproduzo sobre o Ministro Humberto Costa, da Saúde, com quem tive oportunidade de estar numa audiência com a Governadora do meu Estado e de quem até tive boa impressão:

Diz a matéria:

O Ministro Humberto Costa, da Saúde, disse que, para trabalhar no Governo ‘é preciso ter lado’. ‘Vamos governar com inimigos? Vamos continuar a trabalhar com gente competente, mas que tenha lado’.

            Para mim, vem a pergunta: o que é mais importante, ser competente ou “ter lado”? Vamos para a análise dos fatos mais recentes: a questão Funasa. A Funasa, como eu disse a V. Exªs, até há bem pouco tempo, era gerida por pessoas do quadro, pessoas do ramo, do setor de saúde pública. Recentemente, mudou tudo. Qualquer pessoa passou a poder ocupar função de gerência - e isso ocorreu aqui no Distrito Federal. Para a Superintendência do Distrito Federal foi nomeado o marido da Deputada Maria José Maninha. Não sei se ele é competente ou não, mas me parece não ser do ramo. Repito: não sei se ele é competente ou não; sei apenas que ele não era do ramo. Era “do lado” do Governo, até que a Deputada Maninha absteve-se de votar uma matéria de interesse do Governo. Por esse motivo, por razões políticas, seu marido foi demitido. Se ele era competente ou não, pouco importava. Ele foi demitido, porque deixou de ser “do lado” do Governo.

Sr. Presidente, não pode haver egoísmo no plano da saúde, não pode haver o egoísmo de trabalhar apenas com pessoas que têm “lado”, quando as pessoas precisam ser técnicas para desempenhar um papel que já é muito complicado. Ao assistir na televisão às filas do INSS, com mães e pais de família carregando suas crianças nas filas da madrugada do INSS, não pode passar pela cabeça de um brasileiro com espírito público declarar: “Vamos trabalhar apenas com quem está ‘do nosso lado’”!

Esse pensamento está errado e não chegará a bom termo. E quem pagará por essa atitude será a sociedade brasileira, que tem esperança, que votou no Presidente Lula e que espera de Sua Excelência o cumprimento de compromissos, a começar pelo trabalho árduo no campo social. E, no campo social, nada precisa de mais energia do Governo do que o bom desempenho na área da saúde.

Sr. Presidente, o recente episódio do Inca causa-nos espécie. Ah, quem me dera ser Presidente da República! O Dr. Jacob Kligerman, um dos melhores oncologistas do Brasil, dirigiu com maestria o Instituto Nacional do Câncer até 31 de dezembro de 2002, creio eu. O Instituto já era uma referência nacional, mas o Dr. Jacob potencializou no limite máximo seu desempenho. Conheço o Dr. Jacob, e sei que ele não milita do lado do atual Governo, mas é um técnico de mão cheia. Sua ação profissional levou bem-estar e esperança de vida a milhares de brasileiros portadores de câncer, doença desesperadora. Se eu fosse Presidente da República, juro a V. Exª, Sr. Presidente, e se eu tivesse a chance de ter o Dr. Jacob presidindo o Inca, pediria para continuar a fazê-lo em nome do interesse da sociedade, por espírito público. Mas isso não ocorreu. Entregou-se o Inca a um partido político. O Governo pensa como um Ministro questiona: “Vamos governar com inimigos?” E responde: “Vamos continuar a trabalhar com gente competente, mas que tenha lado”. No caso da Funasa, viu-se que a competência não está em primeiro lugar; o que importa é estar do lado do Governo.

A matéria de primeira página da Folha de S.Paulo é relativa ao tenebroso caso Inca, instituição até pouco tempo modelar, que deixou de sê-lo pela falta de medicamentos. “Estão abertos os inquéritos para apurar denúncias de corrupção. Tudo porque entregou-se a um partido político da base do governo, que lá instalou-se, e, no meio de um grande conflito, levou o órgão a uma situação administrativa absolutamente insustentável e à demissão de toda a diretoria”.

Diz o final da matéria: “Na segunda-feira, a diretoria do Instituto Nacional do Câncer se demitiu, alegando suposta ingerência política no órgão ”. O Brasil todo assistiu à polêmica do Inca. E conclui: “O Governo interveio, e o diretor-geral se exonerou”.

Sr. Presidente, com este alerta, quero dizer: que não me venham com essa história, mais uma vez, para justificar os malfeitos e o “desadestramento” administrativo, marca deste Governo, com a desculpa da herança maldita. Essa não aceito.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/08/2003 - Página 25307