Discurso durante a 107ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Satisfação com a decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro, que permitiu a continuidade da produção de soja transgênica.

Autor
Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Valdir Raupp de Matos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Satisfação com a decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro, que permitiu a continuidade da produção de soja transgênica.
Publicação
Publicação no DSF de 29/08/2003 - Página 25312
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, PENDENCIA, UTILIZAÇÃO, SOJA, PRODUTO TRANSGENICO, REGISTRO, APROVAÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO, SAUDAÇÃO, DECISÃO, JUSTIÇA FEDERAL, APOIO, IMPORTANCIA, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, CRESCIMENTO, SAFRA, AUSENCIA, DANOS, SAUDE.
  • REGISTRO, HISTORIA, DESENVOLVIMENTO AGRARIO, EXISTENCIA, ALTERAÇÃO, ESPECIE, ALIMENTOS, IMPORTANCIA, COMBATE, FOME, ATUALIDADE, PROTEÇÃO, MEIO AMBIENTE, REDUÇÃO, UTILIZAÇÃO, AGROTOXICO, MELHORIA, QUALIDADE, NUTRIÇÃO, COMENTARIO, LEGISLAÇÃO.

O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente Mão Santa, do PMDB do Piauí, Srªs e Srs. Senadores, falávamos, recentemente, desta tribuna, da vitalidade e da importância que os agronegócios assumiram no contexto da economia nacional, a ponto de serem hoje responsáveis por mais de um quarto do PIB brasileiro. Dois fatos ocorridos recentemente nos trazem de volta ao assunto, desta vez para abordar a controvertida análise do que representam os transgênicos para a agricultura do País e para a saúde e bem-estar daqueles que consomem os alimentos assim modificados.

Temos, de um lado, a aprovação da Medida Provisória 113/03, que autorizou a comercialização da soja transgênica relativa à safra deste ano, e a pronta mobilização do Instituto de Defesa do Consumidor - Idec - e do Greenpeace para barrar a decisão do Governo, no âmbito da Ação Civil Pública, que movem há mais de cinco anos para impedir, entre outros, o cultivo e o consumo da espécie conhecida como Round up Ready, pelas empresas Monsanto do Brasil e Monsoy Ltda.

A proibição extensiva do registro ao consumo foi concedida por medida cautelar e, posteriormente, confirmada em sede de apelação pelo Tribunal Regional Federal da 10ª Região. Assim que editada a MP 113/03, o Idec ingressou com uma reclamação no TRF (Tribunal Regional Federal), por entender que a norma representava o descumprimento da decisão judicial a respeito da matéria.

Em direção oposta, a Monsanto e a Monsoy pediram a concessão de efeito suspensivo à apelação, alegando, entre outras razões, os prejuízos advindos do longo tempo de tramitação do processo e listando outras motivações para o atendimento do seu pleito, como o fato de que a indefinição acarreta a defasagem nas tecnologias em uso, em relação a outros países que não fazem restrições ao cultivo e ao consumo dos transgênicos.

Não podemos, Srªs e Srs. Senadores, mantermo-nos inertes ante assunto de tal relevância, eis que somente a safra gaúcha representa um potencial financeiro da maior envergadura, da ordem de US$1 bilhão, como noticiaram recentemente os jornais, e o aporte de significativas divisas para o País. Por outro lado, não podemos deixar de considerar que a soja transgênica vem sendo consumida em diversas nações do planeta há mais de sete anos, sem qualquer registro de efeitos danosos à saúde dos consumidores.

Sr. Presidente, há pessoas que nem sequer sabem como são plantados e colhidos os produtos agrícolas; não sabem nem se o arroz brota em cima ou embaixo da terra; se a espiga do milho é produzida embaixo ou em cima da terra; na ponta ou no pé. Então, não podemos permitir que essas pessoas venham à praça pública colocando-se contra os produtos transgênicos, simplesmente porque pegam a “onda” de algumas organizações, que têm interesses maiores, talvez. Pessoas que desconhecem totalmente o assunto ficam bradando, nos quatro cantos do nosso País, que são contra os produtos transgênicos, sem saberem se fazem bem ou mal à nossa saúde.

O Governo Federal se viu ante um fato consumado quando autorizou a comercialização da safra de soja transgência deste ano, porque os próprios produtores, especialmente os pequenos, enxergaram desde cedo os benefícios advindos do seu cultivo - visto ser a espécie mais resistente a pragas -, com a redução do uso de defensivos agrícolas. Com isso, a extensa fronteira entre a Argentina e o Rio Grande do Sul passou a ser percorrida clandestinamente pelos compradores e vendedores de sementes das espécies modificadas.

Nesse cenário, foi alvissareira a decisão prolatada pela Desembargadora Federal, Selene Maria de Almeida, do Tribunal Federal da 10ª Região, que, numa alentada sentença, em que analisou criteriosamente todos os ângulos da questão, tanto sob o ponto de vista tecnológico como jurídico, concedeu o efeito suspensivo para que a Monsanto e a Monsoy pudessem voltar a lidar com a Round up Ready sem as restrições impostas pela medida cautelar.

É bem verdade, Srªs e Srs. Senadores, que o assunto está longe de se esgotar e ainda vamos nos deparar com avanços e recuos até dispor de informações que nos dêem certezas sobre a ausência de riscos no consumo dos transgênicos, bem como garantias sobre a inexistência de impactos relevantes sobre o meio ambiente. Essas certezas virão com o tempo, fundadas em pesquisas e na difusão de seus resultados, a fim de que o convencimento sobre as vantagens dos transgênicos seja definitivo e não mais uma etapa na batalha entre aqueles que os defendem e aqueles que os renegam.

Para trazer um pouquinho mais de luz sobre tão polêmico assunto, vale lembrar que, nos primórdios da vida na terra, o ser humano se alimentava com o que encontrava na natureza. Só com a domesticação de plantas e animais foi possível aos grupos humanos abandonar, progressivamente, o nomadismo. Já estabelecidos, os grupamentos humanos começaram a introduzir modificações, variações e melhorias em relação aos alimentos.

Com o passar do tempo, pôde a humanidade conduzir as pesquisas sobre alimentação e nutrição de forma a obter maior segurança alimentar e nutricional. Ou seja, continuavam buscando garantir uma alimentação saudável para um número maior de pessoas, mas sem se desviar da necessidade de garantir a todos uma alimentação nutricionalmente equilibrada.

Ao longo da história da humanidade, a pesquisa sempre esteve presente para aumentar a quantidade e melhorar a qualidade dos nutrientes dos alimentos disponibilizados para a mesa dos comensais que se multiplicavam muito além do esperado. Numa abordagem atual, a expectativa é de que a população mundial possa atingir 7 bilhões de pessoas nos próximos 15 anos e chegar a mais de 10 bilhões em 2050. Apesar do esforço aplicado na produção de alimentos, a fome atinge em nossos dias mais de 800 milhões de pessoas, e a subnutrição prejudica o desenvolvimento físico e mental de mais de 200 milhões de crianças.

Assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não poderia ser diferente, a produção de alimentos, em qualidade e quantidade suficientes para alimentar essa crescente população, tem se convertido em notável desafio, ao exigir que o aumento de produtividade se faça paralelamente à proteção ambiental e à redução do uso de pesticidas e agrotóxicos.

A disponibilização de novos alimentos geneticamente modificados sinaliza nessa direção, ao permitir o aumento da produção de alimentos concomitantemente com a indispensável preservação do meio ambiente. O tomate, a soja, a batata e o milho foram os primeiros alimentos a serem modificados através da transgenia, que lhes permitiu retardar seu amadurecimento e torná-los mais resistentes a agrotóxicos ou a certas pragas.

A essa primeira onda, por assim dizer, seguiu-se uma segunda, em que o alimento passou a ter sua composição modificada em relação ao alimento tradicional. É o que já se alcançou em relação aos aminoácidos ou ao enriquecimento das vitaminas, cujos resultados obtidos representam um enorme avanço na prevenção de dois dos três maiores problemas de deficiência nutricional do mundo: a deficiência de vitamina “A” e de ferro, ao lado do iodo.

Em setembro de 2002, a Sociedade Brasileira de Toxicologia, organismo de renome internacional na área, publicou um documento endossado por um grupo de seus especialistas sobre a segurança dos alimentos geneticamente modificados, quais sejam, produzidos pela biotecnologia, trazendo esclarecimentos tranqüilizadores a respeito das modificações e de sua repercussão sobre seus consumidores.

Ressalve-se, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que toda tecnologia, se mal aplicada, pode acarretar riscos potenciais. O essencial, portanto, é identificar esses riscos e torná-los estatisticamente aceitáveis. Embora se saiba que poucos dos alimentos convencionais hoje consumidos foram submetidos a quaisquer testes toxicológicos, mesmo assim, esses alimentos são admitidos como seguros, com base em seu histórico de uso.

Depreende-se, em conseqüência, que produtos geneticamente modificados não são inerentemente perigosos. Acrescente-se, ainda, que a modificação genética tem sido utilizada na elaboração de produtos farmacêuticos há cerca de vinte e cinco anos, sem que tenham sido documentados casos de perigo atribuídos ao processo de modificação genética.

As novas técnicas desenvolvidas pela biologia molecular permitiram o desenvolvimento de plantas e animais com conteúdo genético modificado de forma específica, resultando num grande avanço para a produção de alimentos com mais eficiência e com propriedades nutricionais melhoradas.

Em todo caso, as ressalvas são fundamentais para garantir a segurança dos consumidores a respeito dos alimentos geneticamente modificados. E para garantir os brasileiros, o Decreto nº 3.871, de 18 de julho de 2001, estabelece que deverão ser rotulados os alimentos embalados destinados ao consumo humano que contenham ou sejam produzidos com organismo geneticamente modificado, cuja presença seja superior a 4% do produto. Esse limite refere-se à presença não intencional de organismo geneticamente modificado, seja em peso ou volume, em uma partida de um mesmo produto obtido por técnicas convencionais.

Contudo, em razão das preocupações que rondam a matéria, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CNTBio, do Ministério da Ciência e Tecnologia, é uma instância colegiada multidisciplinar com a finalidade de prestar apoio técnico consultivo e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança relativa ao Organismo Geneticamente Modificado. Cabe-lhe também estabelecer normas técnicas de segurança e emitir pareceres técnicos referentes à proteção da saúde humana, dos organismos vivos e do meio ambiente para atividades que envolvam construção, experimentação, cultivo, manipulação, transporte, comercialização, consumo, armazenamento, liberação e descarte de organismos geneticamente modificados e derivados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, depreende-se, então, dessas informações que a engenharia genética, se bem utilizada, juntamente com outras técnicas convencionais de melhoramento e manejo, tem enorme potencial para aumentar a produtividade agrícola, beneficiar o meio ambiente e melhorar a qualidade dos alimentos. Por isso, devemos saudar a iniciativa do Governo Federal, bem como a decisão do Tribunal Regional Federal, para impedir que a agricultura nacional seja engessada por tabus e preconceitos. É certo, porém, que estudos e pesquisas devem continuar sendo feitos com critério e responsabilidade porque, se precisamos aumentar a qualidade e quantidade dos alimentos produzidos, é indispensável que sejam saudáveis e seguros.

Era o que tinha para o momento, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/08/2003 - Página 25312