Discurso durante a 107ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a questão habitacional brasileira.

Autor
Romero Jucá (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA HABITACIONAL.:
  • Comentários sobre a questão habitacional brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 29/08/2003 - Página 25322
Assunto
Outros > POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, DEFICIT, HABITAÇÃO POPULAR, CONTRIBUIÇÃO, AUMENTO, VIOLENCIA, CIDADE, FORMAÇÃO, FAVELA, INVASÃO, PROPRIEDADE PARTICULAR.
  • REGISTRO, URGENCIA, ELABORAÇÃO, POLITICA, FACILITAÇÃO, AQUISIÇÃO, CASA PROPRIA, INCENTIVO, EXPANSÃO, CONSTRUÇÃO CIVIL, AUMENTO, OFERTA, HABITAÇÃO, CRIAÇÃO, DISPOSITIVOS, IMPEDIMENTO, INADIMPLENCIA, SETOR, REDUÇÃO, PREÇO, IMOVEL.

O SR. ROMERO JUCÁ (PMDB - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, minha presença na tribuna desta Casa destina-se, desta feita, a tecer comentários sobre a questão habitacional brasileira, vista sob a ótica de sua correlação com maior ou menor estabilidade macroeconômica nacional.

A experiência histórica, não só em nosso País, mas em alguns vizinhos da América do Sul, como o Chile e a Argentina, vem demonstrando que uma das razões fundamentais para a falência de modelos de política habitacional tem sido a incompatibilidade entre a estabilidade necessária aos financiamentos de longo prazo requeridos pelo setor e as crises inflacionárias a que essas economias estiveram submetidas durante várias décadas.

No Brasil dos últimos anos, em que se conseguiu uma relativa estabilidade inflacionária, pudemos observar um crescimento significativo na oferta de unidades habitacionais, mas estamos ainda distantes de nossas necessidades, havendo um déficit estimado de cerca de sete milhões de habitações, que tende a crescer, porquanto o atual ritmo de construções não vem correspondendo nem mesmo à demanda necessária para fazer face ao crescimento vegetativo decorrente da expansão populacional.

É importante ressaltar que o déficit de sete milhões de habitações, quando estratificado por faixa de renda dos demandantes, nos revela que cerca de oitenta por cento das habitações necessárias se destinariam a famílias com renda mensal inferior a três salários mínimos, um perfil que deve orientar, de forma predominante, a formulação de qualquer política setorial para a construção civil.

Por outro lado, ainda que os agentes desse processo estejam empenhados na geração de oferta, torna-se imprescindível uma política habitacional que permita a participação do Estado na viabilização dos mecanismos de financiamento, sem os quais não se poderá esperar uma solução realmente eficaz para a questão habitacional brasileira.

Esses mecanismos, no entanto, não podem significar para o Governo um ônus que venha a causar distorções fiscais, pois, nesse caso, os malefícios à economia em geral seriam indubitavelmente superiores aos benefícios da geração de moradias.

O negócio da construção civil, que, modernamente, transcende de muito a simples construção, é um dos setores econômicos mais enraizados da economia, iniciando-se desde a ação governamental, em que se incluem o planejamento urbano, a adequação ambiental e o provimento de infra-estrutura, passando pela efetiva construção das moradias e abrangendo, ainda, a ambientação social das novas comunidades geradas, com suas necessidades de educação, saúde, cultura e lazer.

Em todas essas nuances, é fundamental a conjugação de esforços entre o Poder Público e a sociedade, para que se atinjam os objetivos de implantação de novos grupamentos habitacionais e populacionais.

Sr. Presidente, a questão habitacional deve ser atacada com alta prioridade em nosso País e muitos são os motivos para essa relevância.

A primeira e mais óbvia razão para se combater o déficit habitacional é a total desorganização social por ele provocada, tanto na ocupação descontrolada do espaço urbano, como, principalmente, pela formação de núcleos de marginalidade e descontrole social, em que até mesmo a presença do Estado, no que tange à segurança pública, torna-se de difícil constituição e manutenção.

Ao lado disso, a habitação torna-se um fator reconhecidamente importante para a formação dos núcleos familiares, contribuindo decisivamente para o aprimoramento da sociedade.

Do ponto de vista das políticas públicas, é também significativa a influência da construção civil no desenvolvimento econômico, uma vez que o setor se constitui no mais expressivo gerador de empregos da economia, com capacidade de absorção de mão-de-obra menos especializada em quantidades não superadas por qualquer outra atividade econômica.

Além disso, por ser o setor caracteristicamente interno ao País, em termos de seus insumos e produtos, sua capacidade de geração de empregos e renda é altamente benéfica para as contas nacionais, representando uma relevante parcela na formação de nosso produto interno bruto.

Srªs e Srs. Senadores, efetuado esse diagnóstico, não só da relevância do setor da construção civil, mas principalmente da necessidade de formulação de uma política habitacional de longo prazo, consistente com o equilíbrio macroeconômico de nosso desenvolvimento, cabe, então, refletir sobre requisitos que deveria possuir tal política, para garantia de eficácia de seus objetivos e sustentabilidade em longo prazo.

Para isso, dois vetores de atuação devem nortear uma política de habitação: o incentivo à expansão da oferta de moradia e o incentivo à pontualidade, minimizando a inadimplência, causa primordial de desequilíbrio econômico dos financiamentos e, portanto, de elevação dos custos financeiros dos mesmos.

A limitação dos recursos públicos para uso na geração de oferta é reconhecida, e mesmo um esforço de priorização por parte das autoridades orçamentárias não teria o poder de gerar montantes suficientes para o pleno atendimento das necessidades habitacionais brasileiras.

Para sua complementação, em nível, inclusive, de alta participação no total dos recursos, deveriam ser buscados capitais privados entre aqueles destinados à formação de estoques de capital, seja nas poupanças de longo prazo, como os títulos de capitalização, seja nas reservas atuariais dos fundos de pensão, ora em via de expressivo ganho de relevância, em função da nova política previdenciária a ser promulgada pela Congresso Nacional.

Para tanto, a revitalização das letras hipotecárias, devidamente modernizadas e lastreadas em ativos imobiliários construídos, poderia constituir-se no mecanismo formal de consecução de recursos privados expressivos para o setor, uma vez que o mercado brasileiro de capitais já é suficientemente maduro para absorver essa modalidade de aplicação em longo prazo.

Quanto à questão da redução da inadimplência, ela pode ser resolvida em sua essência com a criação de um seguro de crédito, mas as condições de tal seguro devem ser objeto de uma análise mais aprofundada, uma vez que os riscos e conseqüentes prêmios devem ser minimizados, para conferir viabilidade à sua utilização, principalmente nos financiamentos para famílias de baixa renda.

Aspectos como a estabilidade econômica do setor (inclusive com o resseguro público), a credibilidade dos contratos firmados pela garantia de manutenção do arcabouço legal de sua sustentação, a disponibilidade de informações confiáveis sobre o comportamento dos agentes e a qualidade de critérios de concessão de financiamentos, entre outros, são fundamentais para assegurar credibilidade e confiabilidade a uma política de financiamento e seguro habitacional.

Sr. Presidente, muitas são as considerações que ainda caberiam na discussão desse relevante tema da vida nacional. Cabe, em síntese, ressaltar a urgência de ações firmes, amplas e conseqüentes para a questão habitacional, sob pena de continuarmos convivendo com uma das mais infelizes e endêmicas mazelas de nossa sociedade: a carência de um teto.

Urge refletir, planejar e implementar uma política habitacional, e é essa a mensagem que deixo, desta tribuna, aos responsáveis, no Poder Executivo, por essa nobre missão.

Tenho, também, a mais firme convicção de que, no que couber ao Congresso Nacional, estaremos todos empenhados em prestar nossa contribuição e colaboração para que tal política se efetive, pois temos consciência plena dos grandes benefícios que a solução do problema da moradia trará a milhões de brasileiros que ainda não a possuem.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/08/2003 - Página 25322