Discurso durante a 109ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Pede ao governo uma atenção especial à pecuária leiteira na discussão da reforma tributária. (como Líder)

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PECUARIA.:
  • Pede ao governo uma atenção especial à pecuária leiteira na discussão da reforma tributária. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 02/09/2003 - Página 25609
Assunto
Outros > PECUARIA.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, PRODUÇÃO, LEITE, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ARRECADAÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), PRODUTO AGRICOLA, CRIAÇÃO, EMPREGO, RENDA, REGISTRO, FALTA, INVESTIMENTO, PECUARIA, GARANTIA, AUMENTO, EXPORTAÇÃO, PRODUTO NACIONAL.
  • ESCLARECIMENTOS, DIFICULDADE, PECUARIA, GADO LEITEIRO, BRASIL, INSUFICIENCIA, PREÇO, PRODUTO, PAGAMENTO, CUSTO DE PRODUÇÃO, DEFESA, INTERVENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MINISTERIO DA AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO (MAPA), INCENTIVO, AGROINDUSTRIA, LEITE, CONCORRENCIA, MERCADO EXTERNO.
  • LEITURA, TRECHO, DECLARAÇÃO, AUTORIA, PESQUISADOR, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), REGISTRO, EXPERIENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, POLITICA, PROTEÇÃO, LEITE.
  • EXPECTATIVA, ATENÇÃO, PECUARIA, DISCUSSÃO, REFORMA TRIBUTARIA, LEITURA, SUGESTÃO, PRODUTOR, LEITE, OBJETIVO, MELHORIA, SETOR.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil produz o leite mais barato do mundo, a dez centavos de dólares por litro. Com vinte milhões de vacas ordenhadas, temos o segundo maior rebanho leiteiro do planeta. Com cinco milhões de postos de trabalho o setor é o maior empregador do País. Por tudo isso, produzimos 21 bilhões de litros e aparecemos como o sexto maior produtor mundial.

O leite é o sexto colocado no Produto Interno Bruto agrícola, inclusive maior que café, laranja e suínos. Isso sem falar que temos a terceira maior exposição de gado leiteiro do mundo, a Expomilk, que este ano se realizará em outubro, na cidade de São Paulo.

A verdade é que a pecuária leiteira sobrevive enfrentando sérios problemas e obstáculos e, sem o apoio federal, sem dúvida, não terá fôlego para enfrentar a concorrência externa, que está cada dia mais acirrada. Para se ter uma idéia, o leite é o produto mais subsidiado no mundo. Para cada dólar recebido pelo produtor estrangeiro, 40 centavos de dólar são de subsídios.

Trata-se de uma cifra da ordem de US$40 bilhões dados pelos países industrializados aos seus produtores. Se nossos produtores não tivessem de enfrentar essas barreiras, certamente o leite produzido no Brasil estaria em posição de destaque na pauta das maiores exportações brasileiras.

Nas palavras do Presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Leite, Jorge Rubez, “nossas fazendas leiteiras não ficam nada a dever às do Primeiro Mundo. Tudo de mais moderno que existe lá também existe aqui. Na genética, qualquer vaca da raça holandesa de pedigree poderia competir e vencer nos Estados Unidos e na Europa”.

A realidade, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é que, embora alguns fatores sejam motivadores, a produção pecuária leiteira no Brasil não vive no melhor dos mundos. A realidade é outra. A produção nacional enfrenta dificuldades, e o resultado disso é que, recentemente, laticínios foram fechados em Estados propulsores da economia nacional como Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.

Problemas existem, por exemplo, na remuneração do pecuarista brasileiro, que é uma das mais baixas do mundo. Tenho colhido depoimentos dramáticos dos produtores alagoanos, que entregam o litro in natura do produto por cerca de 40 centavos de real - o preço mais baixo do Brasil! No Centro-Sul, a média é de 53 centavos. Nas palavras do diretor do Sindicato dos Produtores de Leite, Domício Silva, “o que recebemos não cobre sequer os custos de produção”.

O economista Paulo do Carmo Martins, doutor em Economia Aplicada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz e pesquisador da Embrapa, disse à revista Balde Branco, da Cooperativa de Laticínios do Estado de São Paulo, com muita propriedade:

Em todo o mundo, o leite é assunto de Estado. Estados Unidos, Canadá e União Européia reconhecem que o mercado não é o mecanismo competente para equilibrar os interesses e os riscos que a atividade apresenta. Na Nova Zelândia, a importância dada ao leite é tamanha que ocorre quase uma autogestão: as políticas públicas são, na prática, definidas pelos produtores. No Japão, impera o comércio estatal, ou seja, somente o governo pode importar leite.

Não estou aqui para defender que se chegue a tanto, mas para denunciar o dissimulado discurso, supostamente liberal, do Primeiro Mundo, que adota o protecionismo aos seus produtos, dificultando o acesso a produtos estrangeiros àqueles mercados consumidores.

Medidas precisam ser tomadas, no entanto, no sentido de aumentarmos a nossa competitividade. A situação torna-se ainda mais grave porque as partes envolvidas não têm o mesmo poder de negociação. Daí a importância da intermediação do Governo Federal e do Ministério da Agricultura.

Segundo o IBGE, o agronegócio do leite pagou R$768 milhões em salários e remunerações, só no ano de 2001. São valores que superam o que pagou o setor têxtil; duas vezes mais que os salários pagos na produção de aparelhos de rádio, televisores e som; quatro vezes mais que os salários pagos na torrefação e moagem de café. Além disso, 10% da renda familiar são gastos em consumo lácteo. Isso tudo terá de pesar consideravelmente na discussão da reforma tributária.

Para cada real de aumento na produção do sistema agroindustrial do leite, há um crescimento de, aproximadamente, cinco reais no Produto Interno Bruto, o que coloca o agronegócio do leite à frente de setores importantes como o da siderurgia e o da indústria têxtil.

A pecuária leiteira nacional encontra-se, no entanto, seriamente ameaçada, seja pela falta de organização interna para enfrentar um mundo globalizado e de enorme concorrência, seja pelas distorções ocorridas no mercado interno e externo. Senão, vejamos: metade da produção brasileira é adquirida exclusivamente por dez multinacionais da indústria láctea. Uma única empresa controla metade do mercado do leite em pó. Duas detêm 50% da produção de iogurte. E apenas três empresas distribuem metade do leite produzido. Isso é uma distorção que deforma e concentra o mercado, inibindo a concorrência e acarretando a conseqüente redução de preços ao produtor, e não ao consumidor. Para se ter uma idéia, um litro de leite custa hoje menos que um copo de água mineral! Todas essas dificuldades estão empurrando o setor leiteiro para a falta de rentabilidade, inibindo investimentos, o que provoca o atraso tecnológico e a inadimplência dos produtores.

Alagoas é, atualmente, o maior produtor das Regiões Norte e Nordeste e apresenta enorme potencial para elevar a produção, de forma a contribuir para o desenvolvimento do País. Só na bacia leiteira de Alagoas, há uma população de 2.500 proprietários rurais, que geram mais de 100 mil empregos diretos e indiretos. Isso sem contar que, hoje, praticamente todos os Municípios alagoanos produzem leite. Trata-se, portanto, de segmento vital para o desenvolvimento do nosso Estado.

A reforma tributária em discussão no Congresso Nacional não pode fechar os olhos para esse quadro. Daí a importância de a Bancada do Nordeste manter-se mobilizada, de modo a manter viva a discussão em torno da cobrança do ICMS para o setor. É inegável que, para a Região e, conseqüentemente, para o meu Estado, o mais viável é a cobrança do imposto no destino. Se tivermos que ceder - e talvez seja esse o melhor caminho -, poderia haver uma regra de transição.

O agronegócio do leite ocupa posição de destaque na economia brasileira. A iniciativa privada e o Governo precisam unir esforços para impulsionar as vendas externas de leite e derivados, criando um programa de incentivo às exportações.

            Em conversas com representantes do setor do meu Estado e do País, recebi importantes sugestões. Cito algumas delas:

1-     inclusão do leite na Política de Garantia de Preços Mínimos, possibilitando a implementação de mecanismos de venda dos produtos lácteos;

2-     criação de subsídios seletivos aos consumidores de baixa renda; está aí o Programa Fome Zero, com enorme potencial de demanda;

3-     instituição de uma câmara setorial e oferecimento de linhas de crédito específicas para os pequenos produtores;

4-     criação de um fundo para a promoção do consumo de leite e derivados no mercado interno;

5-     incentivo ao uso da produção interna na merenda escolar, garantindo as compras nos Estados e Municípios.

            O setor leiteiro é fundamental para o crescimento da economia do nosso País, para o desenvolvimento das nossas futuras gerações, para a criação de empregos, para incrementar o agronegócio. Tem de ser tratado com prioridade e com medidas que viabilizem a produção interna e coloquem o Brasil em condições de disputar, cada vez mais, o difícil mercado internacional.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/09/2003 - Página 25609