Discurso durante a 113ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Interpelação ao Senhor Vice-Presidente da República, Doutor José Alencar, acerca da transposição das águas do Rio São Francisco.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Interpelação ao Senhor Vice-Presidente da República, Doutor José Alencar, acerca da transposição das águas do Rio São Francisco.
Publicação
Publicação no DSF de 05/09/2003 - Página 26132
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • AGRADECIMENTO, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, GESTÃO, AGILIZAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, VINCULAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, RECUPERAÇÃO, MANUTENÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, LEITURA, TRECHO, DISCURSO, EPOCA, EXERCICIO, MANDATO PARLAMENTAR, JOSE ALENCAR, SENADOR, JUSTIFICAÇÃO, VOTO FAVORAVEL, PROPOSIÇÃO.
  • LEITURA, MANIFESTO, REUNIÃO, INDIO, AMERICA DO SUL, DEFESA, PRESERVAÇÃO, AGUA, DIREITOS, ACESSO, POPULAÇÃO.
  • LEITURA, TEXTO, HOMENAGEM, RIO SÃO FRANCISCO.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Sr. Presidente, Senador José Sarney; Sr. Vice-Presidente José Alencar, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, gostaria de agradecer o esforço de V. Exª, Dr. José Alencar, desenvolvido junto à Câmara dos Deputados, no sentido de agilizar a Proposta de Emenda à Constituição nº 524, que está em tramitação naquela Casa e que já foi aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e de Redação por unanimidade, depois de ter passado no Senado, aqui também aprovada por unanimidade. Faltando, agora, um pronunciamento da Comissão Especial e a nomeação, anteriormente, pelos Líderes dos Membros daquela Comissão.

E lembro também a V. Exª que não é de agora que o Senado Federal registrou o seu apoio em torno das grandes questões ligadas ao desenvolvimento da bacia do São Francisco, notadamente a revitalização do Velho Chico. Eu consegui, no Diário do Senado Federal, na sessão de quinta-feira, no mês de abril, de 2002, encontrar um pronunciamento de V. Exª, defendendo com ardor a aprovação da PEC nº 27, que se transformou na PEC nº 524, na Câmara. Se V. Exª me permite, apenas irei sublinhar suas palavras:

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, naquela ocasião, tive a oportunidade de sugerir que, antes da transposição, pura e simplesmente, das águas do São Francisco, precisávamos realizar obras de desassoreamento do rio e de recomposição não só das matas ciliares, como também da vegetação rasteira ciliar, cuja recomposição deveria ser feita com essências nativas - e a Embrapa possui tecnologia para recomendar tais essências no percurso do rio em cada região - para, assim, evitarmos novos assoreamentos. Todo esse trabalho deveria estar concluído antes de se pensar na transposição das águas do rio São Francisco.

Quero dizer que jamais pensei em transposição das águas do Tocantins, mas em transferência de parte das suas águas para enriquecer a bacia do São Francisco.

Então, V. Exª enfatiza aqui, nesse pronunciamento realizado em 2002, com seu espírito de visão, a necessidade imperiosa da revitalização, como condição indispensável para salvar o Velho Chico, recompondo as suas matas ciliares, reforçando a sua calha, com a vazão maior, acabando com a degradação que destrói o Rio da Unidade Nacional.

Não é de agora que essa preocupação vem se revestindo de prioridade no Senado Federal e na Câmara dos Deputados. Ainda há pouco recebi, ao meu lado, a visita do Deputado Gadelha, que é da Paraíba. S. Exª foi relator de uma Comissão presidida por Henrique Alves, que tratava justamente das questões ligadas ao rio São Francisco, sua revitalização e transposição.

O Senado Federal também se debruçou sobre este assunto na Comissão da Revitalização, que teve como Relator o Senador Waldeck Ornélas. Grandes participantes estudaram os problemas do rio São Francisco, inclusive a Senadora Heloísa Helena e eu. Então, as duas Casas se juntaram e apresentaram, sem dúvida alguma, subsídios importantes visando à completa recuperação do nosso rio e à execução de projetos de desenvolvimento sustentado ligados à agricultura, à irrigação, à piscicultura, à navegação, ao turismo rural. Enfim, as duas Casas fizeram um trabalho edificante, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, como consta dos Anais da História do Brasil, que resultou em dois relatórios que poderão servir de base aos estudos que estão sendo realizados junto ao Governo Federal, coordenados por V. Exª.

Desde 1946, havia a previsão de recursos da ordem de 1% para a realização de projetos visando ao fortalecimento da bacia do rio São Francisco. Em face dessa verba obrigatória, criada na Constituição de 1946 - creio que o Presidente José Sarney já estava por lá como constituinte e tenho certeza de que foi um dos grandes defensores dessa idéia, assim como o Deputado Novaes, pelo Estado da Bahia -, criou-se Três Marias, obra que evitou as enchentes, como também permitiu a realização de trabalhos fundamentais na área de saúde. A Fundação Sesp esteve lá para ajudar as pessoas mais pobres da região.

Com o advento da Constituição de 1967, não se destinou mais nada para o rio São Francisco. Foi promulgada a Constituição de 1988, e permaneceu a mesma omissão. Ou seja, duas oportunidades de ouro tivemos para fortalecer o rio São Francisco, com a obrigatoriedade do direcionamento de verbas constante nas Constituições de 1967 e de 1988.

Contudo, Sr. Presidente, essa correção foi feita pelo Senado Federal, que aprovou a Emenda Constitucional nº 27, por unanimidade, com o voto de V. Exª, do Presidente José Sarney e de todos aqueles que participaram da legislatura passada.

Para concluir, porque já me alonguei muito, Sr. Vice-Presidente, saliento que a água é um bem que pertence a todos, é um bem da humanidade. Até os índios - e algumas pessoas pensam que eles ignoram a importância da água - consideram vital sua permanência no seio da humanidade, pois a água traz o peixe para sua alimentação, o banho que permite a limpeza do corpo. Afinal, a água é importante para tudo, é vida! Basta dizer que temos 70% de água no corpo. Os índios se reuniram com pessoas de outras cores na Bolívia e dessa reunião nasceu uma pequena proclamação em torno da importância da água na ecologia mundial:

A água pertence à terra e a todas as espécies e é sagrada para a vida. Portanto, a água deve ser conservada, recuperada e protegida para todas as gerações futuras. Os seus padrões naturais devem ser respeitados. A água é um direito humano fundamental e uma custódia pública a ser protegida por todos os níveis de Governo. Portanto, ela não deverá ser negociada, privatizada ou comercializada para propósitos comerciais. Esses direitos devem ser salvaguardados em todos os níveis de Governo. Em particular, um tratado internacional deve assegurar que esses princípios não sejam controvertíveis. A água é mais bem protegida pelas comunidades locais. Cidadãos devem ser respeitados como parceiros iguais aos Governos na proteção e regulação da água. O povo da terra é o único veículo para promover a democracia e para salvar a água.

Veja V. Exª que homens simples se reuniram e conseguiram divulgar, pela imprensa, para o mundo inteiro palavras simples, mas que expressam o sentimento de todos nós, quando dizem que as comunidades locais devem ser ouvidas no uso da água. Daí a importância dos comitês de bacia, que são constituídos de autoridades, de instituições e de pessoas ligadas ao aproveitamento da água naquele local. Por essa razão, enalteço o trabalho que V. Exª desenvolveu.

Se o Sr. Presidente me permitir, presto uma homenagem ao rio São Francisco. Não sou poeta. O Sr. Epitácio Mendes Silva enviou-me uma poesia pela Internet por ocasião do lançamento dessa proposta.

Rio São Francisco

De gota em gota te formaste,

cristalino, manso, e logo caudaloso,

nas longínquas e alterosas nascentes

como uma imensa dádiva de Deus.

E dia a dia segues, inconfundível,

do gotejante berço até o mar,

desenvolto, belo e imperecível;

correndo sobre desfiladeiros e planícies.

Fecundas as tuas margens, teus vales, tuas ilhas,

e a luz do sol brinca, ágil, em tua superfície,

enquanto a vida explode em alegrias, quando passas,

criando em teu percurso eternas esperanças.

Ah!, Velho Chico da minha infância machucada,

quando eu sonhava tuas águas transportadas

para as longínquas solidões do meu sertão

onde há misérias e a vida é uma aflição.

Essa pessoa já tinha a visão de que, um dia, a revitalização e a transposição ocorreriam ao mesmo tempo.

Sr. José Alencar, cumprimento-o pelo seu trabalho e manifesto o meu apoio integral a V. Exª e ao Governo Lula para que realizem o sonho daqueles que vivem hoje na miséria - do lado de cá, as pessoas que têm o rio São Francisco e, do lado de lá, aquelas que não têm o rio São Francisco.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/09/2003 - Página 26132