Pronunciamento de João Capiberibe em 05/09/2003
Discurso durante a 114ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Considerações às emendas de autoria de S.Exa., que incluem o controle social na reforma da Previdência.
- Autor
- João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
- Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
PREVIDENCIA SOCIAL.:
- Considerações às emendas de autoria de S.Exa., que incluem o controle social na reforma da Previdência.
- Aparteantes
- Marcelo Crivella, Papaléo Paes.
- Publicação
- Publicação no DSF de 06/09/2003 - Página 26312
- Assunto
- Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
- Indexação
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- COMENTARIO, EMENDA, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, AUTORIA, ORADOR, PROMOÇÃO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, RECEITA, DESPESA, REGIME GERAL DE PREVIDENCIA SOCIAL, IMPEDIMENTO, CORRUPÇÃO, DESVIO, RECURSOS FINANCEIROS, REALIZAÇÃO, OBRA PUBLICA.
- PROTESTO, PERDÃO, RESPONSAVEL, APROPRIAÇÃO INDEBITA, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), ESTADO DO AMAPA (AP), ANISTIA FISCAL, EMPRESA ESTRANGEIRA, INSTALAÇÃO, ESTADO DA BAHIA (BA), PREJUIZO, REPUTAÇÃO, BRASIL, FAVORECIMENTO, CORRUPÇÃO, AUMENTO, TRANSFERENCIA, RENDA, REDUÇÃO, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.
- COMENTARIO, PRESENÇA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA DEFESA, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), COMANDANTE, AERONAUTICA, ESCLARECIMENTOS, EXPLOSÃO, BASE AEREA, ESTADO DO MARANHÃO (MA).
- COMENTARIO, POBREZA, MUNICIPIO, ALCANTARA (MA), ESTADO DO MARANHÃO (MA), QUESTIONAMENTO, AUSENCIA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, LOCAL, POSTERIORIDADE, INSTALAÇÃO, BASE AEREA.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a propósito da reforma da Previdência, como foi reafirmado pelo Senador Paulo Paim, esta Casa é soberana para aprimorar, para melhorar aquilo que já foi aprovado pela Câmara Federal.
Nesse sentido, apresentei uma emenda, com dois pequenos parágrafos, que considero importante serem acrescidos à reforma da Previdência. São leis que garantem a transparência das receitas e das despesas, já coincidentes com as emendas do Senador Paulo Paim, e também que estabelecem controle social.
Art.195………………………………….……………………….......................................................................................................................................................
§ 11. Visando a permitir o controle social sobre as contas do regime geral de que trata o art. 201, lei disporá sobre:
I - a disponibilização ao público, em tempo real, das informações diárias sobre as respectivas receitas e despesas realizadas;
II - a instituição de colegiado formado majoritariamente por representantes dos segurados daquele regime, com a finalidade de fiscalizar e controlar as respectivas receitas e despesas, que terá poderes de requisitar ao sistema de controle interno do Poder Executivo e ao Tribunal de Contas a realização de inspeções e auditorias, bem como para representar ao Ministério Público sobre as ilegalidades encontradas.
A Previdência Social, Sr. Presidente, é matéria que interessa a todos os cidadãos. Assim, impõe-se ao Poder Público facilitar, de todas as formas possíveis, o controle social sobre as suas contas.
Como é de conhecimento geral, estabelece a Constituição da República, no caput do seu art. 37, que “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...”.
Trata-se de disposição que visa garantir transparência à gestão da coisa pública e, evidentemente, prevenir o combate à corrupção.
Queremos acrescentar esses dois parágrafos à reforma da previdência exatamente com o objetivo de recuperar aquilo que é muito caro para a sociedade brasileira, que são os princípios republicanos, ou seja, o controle do Estado pela sociedade, porque o regime previdenciário já foi acusado de desviar recursos para a construção da ponte Rio-Niterói, para a Belém-Brasília; uma série de acusações de desvio de recursos de suas reais finalidades, pesa sobre o sistema previdenciário.
Hoje, temos instrumentos tecnológicos capazes de nos propiciar absoluta transparência e informação em tempo real, e há várias experiências no País nesse sentido. Uma vez estabelecido o controle das contas públicas, o assegurado vai poder acompanhar o ingresso das receitas do sistema previdenciário e também a aplicação desses recursos. Eu insisto na necessidade da transparência do controle social, Srªs. e Srs. Senadores, porque há uma permanente transferência de renda dos pobres para os ricos, seja no momento da arrecadação da receita, seja na aplicação do dinheiro público. É sabido que o grau de sonegação, de apropriação indébita, é elevadíssimo, chega a ser alarmante.
Senador Mão Santa - V. Exª que foi Governador -, veja o que acontece na arrecadação do ICMS. O ICMS é um tributo pago pelo consumidor. O Estado escolheu um intermediário para que o consumidor depositasse, em suas mãos, o recolhimento desse tributo: os comerciantes. No entanto, uma parcela significativa e importante da contribuição sobre consumo paga pelo cidadão não é recolhida aos cofres públicos, não chega às secretarias de Fazenda. Há uma série de mecanismos, seja por cumplicidade e acordos políticos, em que parte do empresariado fica dispensada de recolher a contribuição do consumidor, seja por desorganização no sistema de arrecadação tributária dos Estados. A verdade é que, na ponta da arrecadação, há apropriação indébita dos impostos pagos pelo cidadão.
Como o Sr. Presidente e as Srªs e os Srs. Senadores sabem, governei o Amapá durante quase oito anos e tratei de prestar todas as informações, ser transparente, abrir a execução orçamentária e financeira, para que o conjunto da sociedade pudesse acompanhar meu governo. Estou muito feliz com essa iniciativa, porque hoje posso acompanhar todos os procedimentos financeiros e orçamentários do meu Estado.
Senador Papaléo Paes, ontem, pela Internet, tomei conhecimento da queda do ICMS deste ano: 32,44%. Ora, como vamos explicar, de um ano para outro, uma queda tão significativa na arrecadação? Não podemos atribuí-la, de maneira nenhuma, à estagnação econômica, o que, no máximo, poderia fazer empatar a relação de um ano para outro, porque tivemos uma inflação galopante e crescente no último ano e no início deste ano.
Na verdade, no ano passado, a Governadora anistiou os que se apropriaram do ICMS. O ICMS é pago pelo consumidor. O comerciante não é um contribuinte; é o fiel depositário, o intermediário entre o consumidor e o Fisco. Portanto, anistiar aqueles que se apropriaram de impostos do consumidor significa transferir renda dos pobres para os ricos. Neste ano, o governo já fez uma segunda anistia. O que vai acontecer? A queda na arrecadação deste ano, no Amapá, será significativa. Esse dinheiro vai se concentrar, Srªs. e Srs. Senadores, nas mãos de poucos e vai faltar para comprar o medicamento na unidade hospitalar; vai faltar para garantir a merenda escolar.
Portanto, é necessário que, na reforma da previdência, estabeleçamos critérios de transparência de controle social, para que possamos conhecer as receitas e também saber das despesas.
Concedo o aparte ao Senador Papaléo Paes.
O Sr. Papaléo Paes (PMDB - AP) - Senador João Capiberibe, é muito importante o seu pronunciamento, mas, como representante do Estado do Amapá, precisamos fazer alguns esclarecimentos para nossos Pares, que talvez não saibam da realidade econômica do Estado. O Estado do Amapá é um ex-território - como outros Estados o foram, a exemplo de Roraima -, que não conseguiu até hoje impor sua autonomia de Estado, principalmente na questão econômica. Dizemos sempre, no Amapá, que o Estado tem sua economia centralizada no contracheque. São os funcionários das prefeituras, os funcionários do Estado, os funcionários federais que levam para lá um volume expressivo de recursos, com os seus salários, e a fonte principal de renda e produção do Estado, de recursos financeiros, é o comércio, sem dúvida nenhuma. Podemos dizer que a nossa indústria, quantitativamente, é insignificante. O Estado do Amapá vive dos recursos do Fundo de Participação dos Estados (FPE); as prefeituras sobrevivem praticamente do FPM; 80% da arrecadação de Macapá são decorrentes do FPM. No meu tempo, eram 85%. As outras prefeituras, quase 100% do FPM. E isso faz com que fiquemos numa situação de engessamento econômico. Acredito que, na composição da receita do Estado, o ICMS tenha uma participação de cerca de 10% na receita. Então, seria uma participação bem modesta, mas importante. Reconheço que o seu governo foi muito eficaz na questão de captação de impostos, principalmente ICMS, mas o governo atual sofre as conseqüências do ano passado e está tentando readaptar mecanismos para que consiga voltar à arrecadação normal. Porém, existem muitos obstáculos para isso, principalmente o contingenciamento de verbas federais para o Estado. V. Exª sabe que cada vez que o Governo Federal injeta recursos no Estado do Amapá, faz um movimento geral na economia do Estado. Então, estamos sem esses recursos extras, extra-orçamentários, para o Estado; estamos passando por uma conseqüência do ano passado, da atitude da ex-Governadora. Não digo que o mecanismo tenha tido outra intenção senão a de tentar recolher recursos, porque estava em final de governo. V. Exª sabe que existe um certo descontrole por parte daqueles que captam os recursos, recolhem os impostos e daqueles que contribuem. Geralmente, existe uma insubordinação em final de governo. O processo de captação do ICMS deverá se normalizar quando o Governo Federal voltar a destinar verbas para o nosso Estado. O Amapá depende dessas verbas para investir nas áreas de educação e saúde, principalmente saúde, o nosso grande problema, onde há as maiores dificuldades, deficiência no atendimento aos doentes e no fornecimento de medicamentos. Parabenizo V. Exª pela importância do seu pronunciamento. E quero dizer aos governantes deste País que o Amapá está no extremo norte do Brasil, é um Estado riquíssimo, mas precisa de apoio porque ainda é uma criança. Muito obrigado.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Muito obrigado a V. Exª, Senador Papaléo Paes.
Insisto na minha tese: na ponta da arrecadação, há uma apropriação indébita do imposto do consumidor. Citei o Amapá como exemplo, mas poderia citar outros Estados, porque o que acontece lá acontece do Rio Grande do Sul ao Oiapoque. Há uma transferência clara de renda dos pobres para os ricos, e o caso do Amapá é elucidativo porque, no ano passado, houve anistia de dívidas do ICMS. Isso não pode existir no País! Anistiar dívida do ICMS é fazer transferência de renda direta do consumidor para os apaniguados, os afilhados de quem perdoou a dívida. Este ano, novamente anistiaram-se recursos que estavam nas mãos dos fiéis depositários. Não se pode anistiá-los, porque eles não são devedores, mas repassadores de receitas e de contribuição.
Na ponta da arrecadação, com o Imposto de Renda ocorre a mesma coisa. Na reforma tributária, os donos de jatinho, de lancha de R$30 milhões estavam isentos. Agora, serão taxados. Na ponta da arrecadação, há esse processo de apropriação; na ponta da aplicação, não precisamos discutir, porque a corrupção no nosso País é institucional e fica impune. Só tem um caso de corrupto punido até hoje: o juiz Nicolau. O caso dele é até emblemático, porque contamos no dedo os casos apurados.
Concedo um aparte ao Senador Marcelo Crivella.
O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PL - RJ) - Senador João Capiberibe, na nossa Casa, V. Exª tem sido o paladino da transparência, mas não por discursos. V. Exª tem dado o exemplo, porque, quando Governador do Amapá, as contas do Estado estavam na Internet e qualquer cidadão, contribuinte ou não, podia entrar no site e ver quanto o governo tinha no banco naquele dia. Quando V. Exª se refere a essa sangria desatada que leva recursos dos pobres para os ricos, traduz talvez a maior injustiça deste País. Se um brasileiro pobre tiver R$500 na poupança, receberá de rendimento menos de 1% ao mês, enquanto que se um brasileiro rico tiver R$300 mil reais, receberá 2%. Os juros pagos no País são inversamente proporcionais à distribuição de renda. Paga-se mais para quem tem mais; paga-se menos para quem tem menos. O ICMS é um imposto que sempre me deixou triste. Por exemplo, o petróleo, no meu Estado, não paga ICMS. Quando apresentei aqui a emenda do Senador Geraldo Melo, o Governador da Bahia, que, na época, era Senador, tinha parecer contrário. Mas a mesma Bahia que requer o ICMS do petróleo do Rio de Janeiro abriu mão do ICMS para a Ford, que montou uma empresa, à custa do capital nacional, por R$2 bilhões. E não paga ICMS neste País. São esses fatos que nos deixam tristes, revoltados. Esperamos que a sua voz, Senador João Capiberibe, seja ouvida por nossas autoridades para mudar esse estado de coisas. Muito obrigado a V. Exª e parabéns.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Obrigado, Senador Marcelo Crivella. Eis mais um exemplo claro de transferência de renda dos pobres para os ricos: dispensar a Ford de pagar o ICMS significa sacrificar a população da Bahia, porque o Estado não terá receita para atender adequadamente escolas e hospitais, garantir a segurança pública do cidadão. A receita que deveria prestar esses serviços ao conjunto da população se concentra nas mãos da Ford e daqueles que podem comprar um veículo.
É esse aspecto da desigualdade institucional da sociedade brasileira que temos que discutir nesta Casa. Parece-me justo que possamos discutir e formular projetos. A emenda que estou apresentando à reforma da Previdência tem dois parágrafos: um é para garantir o controle social de receitas e despesas e o outro é para haver um colegiado majoritariamente composto pelos segurados da Previdência, para que eles controlem e garantam o futuro, para que esse dinheiro não escorra pelo ralo, como já ocorreu em várias instituições brasileiras.
Vou trazer mais um exemplo claro de transferência de renda dos pobres para os ricos: o caso Sudam, em que desapareceu US$1,4 bilhão entre 1995 e 2002. E qual era a origem desse dinheiro? Ele era o resultado da contribuição do cidadão que pagou seus impostos. E foi colocado numa instituição de desenvolvimento regional, transferindo essa renda para os amigos do rei, ou seja, para meia dúzia de pessoas. Se esse valor fosse aplicado corretamente no desenvolvimento dos recursos da biodiversidade amazônica, no adensamento da cadeia produtiva de espécies da natureza, geraria empregos que poderiam absorver a mão-de-obra de toda a Amazônia e garantir qualidade de vida.
Sr. Presidente Geraldo Mesquita, Srs. Senadores, ontem, recebemos os Ministros da Defesa e da Ciência e Tecnologia, o Comandante da Aeronáutica e todos os dirigentes do Programa Aeroespacial Brasileiro para explicar - ou tentar explicar -, na Comissão de Relações Exteriores, o acidente de Alcântara. Só que Alcântara tem dois graves acidentes: o que ceifou a vida de 21 técnicos altamente qualificados, nos quais a sociedade brasileira investiu uma soma significativa de recursos, e um outro mais grave, que é o divórcio litigioso entre a Base de Alcântara e a comunidade do Município de Alcântara.
O investimento que a sociedade brasileira faz em ciência e tecnologia é para melhorar a qualidade de vida de todos nós, e a presença da Base de Alcântara começa por piorar a qualidade de vida dos moradores, dos pescadores e dos agricultores familiares, que foram expulsos de suas terras, de suas comunidades originais. Portanto, a presença da Base, que deveria gerar melhoria na qualidade de vida, começa por criar constrangimento para aquela comunidade.
No início deste ano, vinte e poucos anos depois da instalação da Base no Município de Alcântara, eu estive no local, Senador Marcelo Crivella, e verifiquei que a pobreza lá é grande, é maior do que quando a Base se instalou. O Município de Alcântara é um dos que têm um elevado índice de exclusão social, está entre os mais pobres do País. Como podemos explicar um centro de alta tecnologia ao lado de uma comunidade excluída, abandonada, justamente com a implantação dessa Base?
Essa injustiça precisa ser corrigida com urgência. Precisamos marcar uma audiência lá em Alcântara para explicar aos moradores daquele Município o que ocorreu, por que ocorreu esse acidente e por que há esse divórcio entre aquele centro de alta tecnologia e aquela comunidade pobre.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.
Muito obrigado.