Discurso durante a 115ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Ações adotadas pelo governo Lula contra a corrupção. Necessidade de investigações dos reais motivos que levaram à crise na área de saúde nos últimos dias.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. SAUDE.:
  • Ações adotadas pelo governo Lula contra a corrupção. Necessidade de investigações dos reais motivos que levaram à crise na área de saúde nos últimos dias.
Aparteantes
Ana Júlia Carepa.
Publicação
Publicação no DSF de 09/09/2003 - Página 26418
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, COMPROMISSO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMBATE, CORRUPÇÃO, DESVIO, FUNDOS PUBLICOS, REGISTRO, CRIAÇÃO, SISTEMA, CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU), SORTEIO, REALIZAÇÃO, AUDITORIA, MUNICIPIOS, APURAÇÃO, SITUAÇÃO, RECURSOS, INVESTIGAÇÃO, FRAUDE, ROUBO, IRREGULARIDADE, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, PUNIÇÃO, CRIMINOSO.
  • ESCLARECIMENTOS, PROVIDENCIA, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), COMBATE, FRAUDE, SONEGAÇÃO FISCAL, PUBLICAÇÃO, DOCUMENTO, DIVULGAÇÃO, DEVEDOR, PREVIDENCIA SOCIAL, REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS).
  • ANALISE, GRAVIDADE, CRISE, SAUDE PUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, EXCESSO, AUMENTO, PREÇO, PRODUTO FARMACEUTICO, LABORATORIO, FALTA, CONTROLE, AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA (ANVISA), EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, REQUERIMENTO, VISITA, SENADO, HUMBERTO COSTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), ESCLARECIMENTOS, SITUAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DO CANCER.
  • LEITURA, TRECHO, PUBLICAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), IRREGULARIDADE, MEDICAMENTOS, INSTITUTO NACIONAL DO CANCER, SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, REFORÇO, PROVIDENCIA, COMBATE, CORRUPÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, SAUDE.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Agradeço, Sr. Presidente.

Cumprimento as Sras e os Srs. Senadores que participam desta sessão.

Uma das questões que motivaram de forma significativa o desejo de mudanças, a busca de uma alternativa de Governo, que acabou sendo personalizada na figura de Luiz Inácio Lula da Silva, deve-se indiscutivelmente à absoluta insatisfação popular, que não agüenta mais ser açodada diariamente por questões ligadas à corrupção, ao dinheiro público tão necessário, que falta nas áreas essenciais no cotidiano das pessoas, e que é desviado para o ralo, para a vala do benefício social ou de grupos e interesses econômicos. Por isso, a população se manifestou de forma tão clara e exige, indiscutivelmente, do Governo Lula iniciativas que possam coibir, identificar e punir os responsáveis pelos desmandos, essa chaga que consome parte significativa dos recursos arrecadados pelos tributos e que não chegam ao seu fim, ao atendimento da população.

Eu gostaria de ressaltar duas iniciativas extremamente salutares adotadas pelo Governo Lula nesses primeiros meses e que já estão apresentando resultados. A primeira delas é o sistema montado pela Controladoria-Geral da União, na figura tão querida e emblemática no combate à Corrupção do Dr. Valdir Pires, que há cinco meses estabelece um procedimento público transparente de sorteio de municípios que são, em seguida, auditados, investigados, passados a limpo em todas as verbas que recebem, sendo identificados os desvios, a má aplicação das verbas, roubos e fraudes. Identificados imediatamente, os processos são encaminhados às autoridades judiciais para que os responsáveis possam ser punidos e os recursos devolvidos.

Nesse sistema da Controladoria-Geral da União já foram sorteados 181 municípios, sendo que 131 tiveram as auditorias concluídas. Assusta-nos o fato de que aproximadamente 90% dos municípios cujas auditorias foram concluídas apresentam irregularidades, fraudes, desvios, roubos e falsificações de documentos. Essas irregularidades apontadas nos relatórios nos assustam, pois dos últimos 50 municípios que foram auditados no mês de julho, 45 apresentaram irregularidades. E, infelizmente, elas aparecem exatamente naquelas duas áreas mais sensíveis para a população, principalmente para a de mais baixa renda: educação e saúde.

Há um trabalho minucioso, detalhista e imprescindível sendo feito para que tenhamos a moralidade pública restabelecida no nosso País. Esse é um mecanismo que está se apresentando eficiente, e até o final do ano terá a oportunidade de auditar um número significativo de municípios brasileiros, a fim de que sejam punidos os responsáveis. Com essa medida, instaura-se um clima segundo o qual a impunidade não continuará reinando no nosso País, porque, a qualquer momento, o município poderá ser sorteado e auditado e as suas autoridades responsabilizadas pelo desvio, quando for o caso.

A outra iniciativa de combate à corrupção que ressalto é a adotada na nossa querida Previdência, cujo Ministro, Ricardo Berzoini, de forma muito clara, retomou duas providências de fundamental importância. A primeira foi a publicação da lista dos devedores e fraudadores da Previdência. Com a publicação da lista e as campanhas publicitárias incentivando as pessoas a denunciarem, a apresentarem provas e caminhos, tendo em vista a reparação do dano, identificou-se algo em torno de mais de R$1 bilhão em bens que poderão agora retornar ao erário, eliminando a chaga da sonegação na Previdência.

Além da publicação da lista dos fraudadores, da campanha publicitária, das denúncias oriundas da população e da opinião pública, uma outra providência foi o cruzamento dos dados da Dataprev com o TRE, com a CPMF, ou seja, todos os cruzamentos possíveis e imagináveis que estão sendo feitos entre os dados do Governo. Essa medida permite identificar absurdos como aqueles famosos mortos que, muito vivos, estão recebendo os benefícios da Previdência. Mais de 80 mil mortos vivíssimos, que continuam recebendo benefícios da Previdência foram identificados exatamente por essa iniciativa do Ministério da Previdência, na batuta do nosso Ministro Ricardo Berzoini.

Eu gostaria de conceder o aparte à eminente Senadora Ana Júlia Carepa.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Senadora Ideli Salvatti, parabenizo V. Exª pela oportunidade de trazer um assunto que tem sido alvo de tantas críticas, segundo as quais o Governo estaria procedendo a uma reforma da Previdência, mas não estaria tratando de recuperar, na verdade, os débitos que datam de muitos anos, de muitas décadas com a Previdência Social. V. Exª aborda, de forma clara, exatamente o contrário, ou seja, o Governo tem acelerado o processo e já conta com disponibilidade de recursos e com a possibilidade de transformar tais bens em recursos para a Previdência Social. Sem dúvida nenhuma, quanto ao combate da corrupção nos nossos Municípios, ou contamos com o apoio da sociedade, ou a choradeira vai continuar. Reconheço que alguns Municípios passam dificuldades, mas, quando viajo no meu Estado, observo situações absolutamente estapafúrdias. É um descalabro o que muitos Prefeitos infelizmente desviam de recursos da educação, do Fundef! Há Municípios, no meu Estado, que apresentam três folhas de pagamento: uma real, uma para que o Prefeito preste contas ao Conselho Municipal, para a qual, na maioria das vezes, a sociedade tem que estar atenta, pois os Prefeitos acabam manipulando esses conselhos, e uma folha de pagamento que o prefeito apresenta ao Tribunal de Contas para prestar contas. E são completamente diferentes umas das outras todas essas folhas de pagamentos. É necessário que se combata a corrupção, porque não é possível que, de cada R$100,00 que saem, apenas cheguem R$60,00, para beneficiar o cidadão. Temos que dar um ponto final, com certeza, na corrupção. E é importante que a população de cada município fiscalize o que está sendo feito e como estão sendo gastos os recursos lá nos Municípios. Parabéns, Senadora.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço, Senadora Ana Júlia Carepa. E quero dizer que, quando há manifestações, greves, por parte dos prefeitos e a rediscussão do pacto federativo, creio que temos que ter abertura para fazê-lo com tranqüilidade. Mas não dá para ser conivente com um sistema como esse montado na Controladoria, em que 90% dos Municípios apresentam irregularidades. Aliás, “irregularidades” é assim um termo suave; o que existe mesmo é a roubalheira instituída em boa parte dos Municípios auditados até agora.

Voltando às medidas adotadas pelo INSS: a primeira foi a da lista e o do cruzamento dos dados; e a segunda, de fundamental importância, foi a restauração e a implementação, a todo o vapor, das forças-tarefas, que congregam auditores do INSS, Ministério Público e Polícia Federal e que são instaladas já no Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Piauí, Pará, Maranhão, Amazonas, Distrito Federal, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Santa Catarina, Bahia e Pernambuco.

Essas forças-tarefas, montadas pelo Instituto Nacional de Previdência, juntamente com o Ministério Público e a Polícia Federal, estão produzindo grandes resultados em descobrir as fraudes instaladas dentro do aparelho estatal do Ministério da Previdência e do INSS.

Graças à presença da Polícia Federal nessas forças-tarefas é possível fazer prisão em flagrante, ou seja, não ocorre mais aquele encaminhamento moroso de um processo que vai para o Ministério Púbico e que, depois, vai para a Justiça. Não, a prisão é feita no ato.

O resultado das ações das forças-tarefas já instaladas é da seguinte ordem: 165 inquéritos policiais instaurados, 42 inquéritos relatados, 121 inquéritos policiais em andamento, 409 operações deflagradas, 160 mandados de busca obtidos, 156 mandados de busca cumpridos, 200 autos de apreensão de documentos, 400 indiciamentos e mais de 50 prisões em flagrante, além de funcionários demitidos e afastados em sindicância, por conta de estarem contribuindo ou acobertando a corrupção dentro do sistema previdenciário brasileiro.

Além de ressaltar essas ações que agora estão institucionalizadas como ação de Governo dentro da Controladoria-Geral da União, com relação aos Municípios, e dentro do Ministério da Previdência, com relação ao combate à sonegação e à fraude ao INSS, eu gostaria ainda de me reportar aos episódios das últimas semanas com relação ao Ministério da Saúde.

Antes de conceder o aparte ao Senador Ramez Tebet, quero dizer que, ouvindo os noticiários, começamos a entender o porquê de toda a movimentação na área da saúde. Estão tomando medidas para multar os laboratórios e obrigá-los a baixar os preços que aumentaram de forma exorbitante depois do acordo firmado em março, que limitou o índice a 8,63%. Houve laboratório que aumentou mais de 50% ou 60% o preço de alguns remédios e agora terá de reduzi-lo. Portanto, não há condições de os laboratórios atingidos ficarem quietos. Sempre aumentaram preços, mas nunca houve uma ação concreta e forte que fizesse com que isso não se perpetuasse.

Outra questão que está no noticiário e tem a ver com a crise no Ministério da Saúde e com toda a movimentação que está sendo feita para desestabilizar a gestão do Ministro Humberto Costa diz respeito à Câmara Técnica de Medicamentos, a Cateme, órgão que tem a responsabilidade de aprovar a venda dos remédios similares, que não eram mais fiscalizados - o Senador Papaléo Paes, por ser médico, sabe bem do que estou falando. Havia uma fórmula padrão e os similares de marca fantasia obtinham autorização para produzir e colocar no mercado esses remédios. Por isso, hoje há uma infinidade de medicamentos nas prateleiras das farmácias, cuja fórmula não está de acordo com a original. São remédios que não servem à população brasileira, porque, eu até diria, são falsificados, pois não seguem a fórmula original.

A alteração feita pela Câmara Técnica de Medicamentos, a Cateme, tem muito a ver com a crise, porque mexe em interesses grandiosos até mesmo de laboratórios internacionais, que estão muito bem acobertados e sossegados com a falta de uma fiscalização rígida até mesmo por parte da Anvisa e um monitoramento mais efetivo da Cateme.

Ainda com respeito à crise da saúde, gerada no Instituto Nacional do Câncer, tenho duas notícias a transmitir. Creio que aprovaram um requerimento solicitando a vinda do Ministro Humberto Costa a algumas Comissões. Há também pedido de instauração de uma CPI. É muito bom que investiguemos o assunto e convidemos o Ministro a vir a esta Casa, mas devemos chamar todos os envolvidos.

O Jornal do Brasil, de 04 de setembro, trouxe uma matéria que me chamou a atenção e que é da colunista Hildegard Angel. Ela começa meio jocosa:

Baixada a poeira, Hildezinha foi atrás do affair Inca, e o que é que ela apurou? Há muitos anos - e Jamil Haddad ficou lá apenas alguns meses -, todas as compras de medicamentos no Inca são feitas em caráter emergencial. O que isso significa? Que nesse caso não há licitação. Deixam-se os medicamentos chegarem quase ao final e compra-se em caráter emergencial, sem licitação, e aí, é claro, com preços aumentados em pelo menos 150%!...

A última compra, por exemplo, antes da crise, e para solucioná-la, teve orçamento de R$600 mil cotados em Belo Horizonte, o que pelos grandes gestores e protetores do Inca sairia pela bagatela de R$1,6 milhão!... [se fosse feito pelo sistema já tradicional, já usual no Inca].

Este teria sido o real motivo da queda de Haddad, que começou a reduzir custos de compras e não pôde nomear o gerente de informática, que controla os gastos.

Portanto, parece que aquela história de comprar no limite, quando os produtos estão acabando, para não haver licitação era usual, além de ser a grande maneira de comprar por três vezes o preço. Precisamos investigar esses fatos, para realmente saber se isso sempre ocorreu no Instituto Nacional do Câncer.

Concedo um aparte ao Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senadora Ideli Salvatti, declino do aparte.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Obrigada, Senador Ramez Tebet.

Passo à notícia publicada, hoje, no Jornal do Brasil, na coluna da jornalista Márcia Peltier:

A Fundação Ary Frauzino (FAF), entidade repassadora de recursos do SUS para o Inca, acaba de rescindir na Justiça o contrato do advogado Dácio Ferreira, tido como pivô da crise que estourou logo depois que o então presidente Jamil Haddad pediu a sua demissão. Alagoano, Dácio Ferreira veio para o Rio no governo Collor para ser chefe de gabinete do médico Marcos de Moraes, que assumira a direção geral do Inca.

Mera coincidência

Nos últimos sete anos, Ferreira foi o responsável pelos contratos de serviços e licitações do Inca. Para Jamil Haddad, “tudo não passa de uma coincidência coincidente, pois Marcos de Moraes é o presidente do Conselho Curador da FAF”. [quem contratava o advogado que tratava das licitações e compras dentro do Instituto Nacional do Câncer].

Portanto, como tive a oportunidade de dizer, essa questão da corrupção, que o Governo Lula está tentando combater e inibir, por meio de uma série de iniciativas e ações deflagradas, ainda está posta. Por trás das ditas crises de que estamos tratando nos últimos dias, quando começamos a pesquisar, vemos que o que está em jogo são os grandes interesses. Por exemplo, no caso da saúde, há um grande interesse dos laboratórios. Há ainda interesse quando se trata de compras sem licitação, para obtenção de preços superfaturados. São esses interesses que estão monitorando, inflando toda essa situação criada.

Assim, é de fundamental importância que tenhamos oportunidade não só de fortalecer as ações de combate à corrupção, instaladas pelo Governo, mas de contribuir, no Congresso Nacional, em nossas ações fiscalizadoras, para que não se perpetuem essas ações que tantos malefícios trazem à população brasileira, por desvio de verbas públicas, tão necessárias, principalmente na área da educação e saúde.

Agradeço, Sr. Presidente, a oportunidade.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/09/2003 - Página 26418