Discurso durante a 115ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Necessidade de aumento significativo de investimentos no programa aeroespacial brasileiro.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Necessidade de aumento significativo de investimentos no programa aeroespacial brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 09/09/2003 - Página 26467
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • IMPORTANCIA, IDENTIFICAÇÃO, MOTIVO, EFEITO, DESASTRE, EXPLOSÃO, CENTRO DE LANÇAMENTO DE ALCANTARA (CLA).
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), GRAVIDADE, SITUAÇÃO, REDUÇÃO, INVESTIMENTO, POLITICA AEROESPACIAL, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, GARANTIA, RECURSOS, AUMENTO, INVESTIMENTO, PROGRAMA, LANÇAMENTO AEROESPACIAL.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda hoje, duas semanas já decorridas, o povo brasileiro permanece chocado com o que aconteceu em Alcântara no último dia 22 de agosto.

De fato, a explosão do Veículo Lançador de Satélites teve a cruel capacidade de juntar, num único evento, significativas perdas humanas, científicas e materiais. E é natural, portanto, que estejamos ainda sob o impacto dos muitos detalhes da tragédia a que fomos apresentados.

Não obstante, Sr. Presidente, é imprescindível que à justa comoção acrescentemos um compromisso: o de buscar, com isenção e serenidade, a identificação das causas e das conseqüências do acidente.

Quanto às causas, é evidente que não devemos ser açodados: somente uma investigação criteriosa, a cargo das entidades competentes, será capaz de determiná-las. Até lá, o que temos são hipóteses, insinuações, palpites e conjecturas.

De qualquer maneira, eu penso que seria omisso se não apontasse um fato. Um fato que talvez venha a ser caracterizado, tão-somente, como infeliz coincidência. Mas que pode, por outro lado, ter alguma correlação com os rumos que tomaram os acontecimentos.

Refiro-me, Srªs e Srs. Senadores, à dramática redução, ao longo dos anos, dos investimentos realizados no programa aeroespacial brasileiro.

Nesse sentido, cabe atentar para matéria publicada no Correio Braziliense, em sua edição do último dia 28 de agosto.

De acordo com a referida matéria, entre 1985 e 1989, o Governo Federal investiu no programa, por ano, valor equivalente a 104 milhões de dólares.

Entre 1990 e 1994, os investimentos anuais caíram para 52 milhões de dólares; ou seja, metade do que fora desembolsado no período anterior.

Entre 1995 e 2002, investiu-se ainda menos: 35 milhões de dólares por ano.

Por fim, chegamos ao ponto de, nos primeiros oito meses de 2003, ter investido no programa aeroespacial do Brasil a modesta quantia de 21 milhões de reais, que equivalem a 7 milhões de dólares.

Em resumo: num programa de tal magnitude, num programa de inegável relevância para o desenvolvimento científico e tecnológico de nosso País - isso para não falar de seus desdobramentos no campo econômico -, estamos investindo, hoje, cerca de 10% do que investíamos na segunda metade da década de 80.

Infelizmente, é muito pouco.

E o valor torna-se ainda mais irrisório se comparado a outros números que costumam freqüentar nosso cenário econômico.

Por exemplo: de acordo com informações da Secretaria do Tesouro Nacional, o Brasil gastou, somente no ano passado, 75 bilhões de reais - que representam 25 bilhões de dólares - no pagamento dos juros nominais de sua dívida pública. Um valor, vejam bem, quase 1000 vezes maior que o despendido no programa aeroespacial.

É claro que um Governo, se deseja ser respeitado, não pode ignorar seus compromissos.

Mas ao mesmo tempo, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, não deixa de ser frustrante verificar que uma pequeníssima mudança na taxa de juros, na segunda ou terceira casa depois da vírgula, já seria suficiente para permitir o melhor desenvolvimento desse e de outros programas essenciais ao Brasil.

De modo que é preciso, é flagrantemente preciso, que o Governo Federal conceda a nosso programa aeroespacial, em termos políticos e, como decorrência, em termos orçamentários, a importância e a urgência devidas.

Quanto às conseqüências da tragédia, são por demais evidentes.

Em primeiro lugar, a mais dolorosa, a mais irreparável: as perdas humanas.

É inconteste, Sr. Presidente, que os números chocam. Afinal, são 21 mortos. Mas o choque é ainda maior, ainda mais carregado de emoção e pungência, se começamos a associar nomes a esses números.

O tempo, obviamente, não me permite a citação de todos.

Mas tomemos alguns nomes, ao acaso.

Sidney Aparecido de Moraes, técnico em eletrônica de 38 anos, era um brasileiro como todos nós. Sua esposa, Berenice, é uma brasileira como todos nós. Seus filhos, Victor, de 10 anos, e Lucas, de 2 anos, brasileiros como nossos filhos ou netos, perderam o pai, o ídolo.

Maurício Biella de Souza Valle, engenheiro mecânico de 42 anos, deixa a esposa, Teresinha.

E outros 19 técnicos deixam a saudade em suas esposas, em seus filhos, em seus pais, em seus irmãos, em seus amigos.

Essa, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, é a perda crucial: brasileiros mortos; sonhos desfeitos; esperanças perdidas.

De outra parte, há que se lamentar a perda de conhecimento.

Perderam a vida, no acidente, técnicos de capacidade inquestionável; técnicos que trabalhavam no CTA há 15 ou 20 anos; técnicos forjados em freqüentes cursos de especialização, mestrado, doutorado ou pós-doutorado, muitos deles realizados no exterior; técnicos que dominavam as diversas áreas da ciência aeroespacial.

Substituí-los, sabemos todos, não será fácil.

Finalmente, existem as perdas materiais: uma boa parte do bilhão de dólares investido nos últimos vinte anos, no desenvolvimento de satélites e lançadores, foi, de uma forma ou de outra, desaproveitada.

De qualquer maneira, Sr. Presidente, é importantíssimo que o trágico balanço do acidente não nos leve ao desânimo. Ao contrário: no interesse de nosso País, na busca do conhecimento científico e tecnológico - e do avanço econômico e social que ele propicia -, e até como homenagem aos 21 mártires de Alcântara, é preciso que o programa aeroespacial brasileiro seja retomado com vigor ainda maior.

Não podemos, afinal, desprezar todo o esforço já empreendido; não podemos ignorar as peculiares condições naturais do sítio de Alcântara, que o tornam ideal para o lançamento de satélites e despertam o interesse de muitos países; não podemos, acima de tudo, ficar indiferentes ao fato de que o domínio dessa área da ciência e da tecnologia é fundamental para a soberania do Brasil.

De forma que volto, Srªs e Srs. Senadores, a meu apelo inicial: é preciso aumentar, significativamente, os investimentos no programa.

E é preciso, antes de mais nada, vislumbrar as fontes de recursos que viabilizariam esse aumento dos investimentos. O próprio Presidente da Agência Espacial Brasileira acaba de oferecer uma opção: a utilização no programa aeroespacial de verbas da Infraero, que poderiam garantir, nos próximos três anos, um aporte adicional de recursos da ordem de 240 milhões de reais.

Neste ano, repito, gastamos até agosto cerca de 21 milhões de reais. Isso quando o orçamento aprovado é de 132 milhões de reais. Um orçamento que, ainda assim, está longe de ser o ideal.

O dispêndio anual dos Estados Unidos com seu programa aeroespacial, por exemplo, é 338 vezes maior. E vale lembrar que o Produto Interno Bruto daquele País é cerca de 14 vezes superior ao nosso. Ocorre, Sr. Presidente, que, entre outras diferenças, nos Estados Unidos um pesquisador da Nasa com nível de doutorado ganha o equivalente a 30.000 reais por mês; no Brasil, um pesquisador com a mesma formação tem salário mensal de 4.500 reais.

De outra parte, o investimento do Japão em seu programa aeroespacial é 19 vezes maior que o do Brasil.

Em suma: nota-se que países como os Estados Unidos e o Japão preocupam-se com seu futuro. É tempo de que também nos preocupemos com o nosso.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/09/2003 - Página 26467