Discurso durante a 116ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Expectativa com a posse do antropólogo Mércio Pereira Gomes, na presidência da Fundação Nacional do Índio - Funai, para resolução dos problemas relativos as demarcações de terras indígenas. (como Líder)

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Expectativa com a posse do antropólogo Mércio Pereira Gomes, na presidência da Fundação Nacional do Índio - Funai, para resolução dos problemas relativos as demarcações de terras indígenas. (como Líder)
Aparteantes
Augusto Botelho.
Publicação
Publicação no DSF de 10/09/2003 - Página 26594
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • EXPECTATIVA, ATUAÇÃO, MERCIO PEREIRA GOMES, PRESIDENTE, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), CONCLUSÃO, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS.
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), AUSENCIA, APOIO, CONSELHO, POLITICA INDIGENISTA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), NOMEAÇÃO, MERCIO PEREIRA GOMES, PRESIDENTE, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), QUESTIONAMENTO, QUANTIDADE, PERCENTAGEM, TERRAS, TERRITORIO NACIONAL, DESTINAÇÃO, MINORIA, INDIO.
  • IMPORTANCIA, INDEPENDENCIA, ATUAÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), AUSENCIA, INFLUENCIA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), ATENDIMENTO, NECESSIDADE, COMUNIDADE INDIGENA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tomou posse, ontem, na Presidência da Funai o antropólogo Mércio Pereira Gomes, e eu, que tenho pregado desta tribuna a nomeação de um índio para presidir a Funai, quero fazer hoje uma reflexão sobre essa nomeação.

Pela primeira vez, vejo um Presidente da Funai assumir claramente, pregando, o que é óbvio, o final das demarcações das terras indígenas. Segundo as palavras do Dr. Mércio Pereira Gomes, faltam apenas 30% das áreas identificadas a serem demarcadas. O novo Presidente pregou também o que, no meu entender, é muito importante: a autonomia econômica das comunidades indígenas. Isso porque a única preocupação da política indigenista do País tem sido a demarcação de terras, e não os índios em si. Dessa forma, terras enormes e ricas, como são as terras dos ianomâmis, são habitadas por índios pobres, doentes, vítimas de enfermidades como a oncocercose - doença praticamente incurável porque de difícil tratamento e ele não tem sido feito adequadamente. A preocupação com o ser humano índio não tem existido ao longo da nossa História. Conseqüentemente, entendo que a posição adotada pelo Dr. Mércio Pereira Gomes é muito importante. O Ministro da Justiça deu-lhe carta branca do Ministério para renovar e reconstruir a Funai.

Realmente, todo mundo que tem em seus Estados problemas com questões indígenas e que lida com a Funai sabe que ela vem sendo, ao longo das décadas, desmantelada e propositadamente desconstruída e a política indigenista passou a ser comandada por um conjunto de Organizações Não-Governamentais que têm a sua frente, em seu comando, o Conselho Indigenista Missionário - o Cime.

Não foi, portanto, admirável ver que o Cime reagiu de maneira muito dura à nomeação do Dr. Mércio, porque, pela primeira vez, o Cime e as ONGs que comanda apoiaram um índio para ocupar a Presidência da Funai. Até então a filosofia dessas organizações era a de que não se podia nomear um índio já que os índios são considerados relativamente incapazes. Não se nomeava também um índio porque pertencia a determinada etnia e, portanto, poderia haver conflito com as outras etnias indígenas, mas se poderia nomear um branco, um não-índio para comandá-las.

O Cime foi muito duro em sua nota quando diz, no título da reportagem de hoje do Jornal do Brasil, o seguinte: “Cimi diz que Lula despreza os índios” e tece uma série de comentários a respeito da política indigenista praticada pelo Governo Lula. Quero dizer que nunca vi, em tão pouco espaço de tempo, nenhum Presidente demarcar, homologar mais terras indígenas que o Presidente Lula. Agora, o que ele está fazendo, no meu entender, é realmente mudar essa política indigenista, a prática da ação da Funai, que tem sido, como digo, na verdade, uma ação comandada por essas instituições. E aqui está provado, o próprio Cime é muito claro quando, numa longa matéria, faz as críticas á nomeação do Dr. Mércio. E essa matéria repercutiu em vários jornais.

É importante salientar isso, Sr. Presidente. E aqui quero também louvar uma matéria publicada, hoje, no jornal O Estado de S.Paulo, justamente para mostrar a “grandeza” dessa questão de demarcação de terras indígenas.

O Estado de S.Paulo publicou, hoje, o seguinte artigo: “15% do Brasil para 0,2% dos brasileiros”. É exatamente de 0,2% a população indígena no Brasil. Apenas 0,2% da população do Brasil é composta por indígenas. E 15% do território do Brasil já está destinado a terras indígenas. Até aí, tudo bem! Segundo o novo Presidente falta demarcar mais 30%. Então, vamos avançar, talvez atingindo 20% do território nacional, para 320 mil índios.

Mas o mais sério, Sr. Presidente, é que, por trás da movimentação dessas Organizações Não-Governamentais, não está o interesse pelo índio, está o interesse no que há nas terras que são consideradas terras indígenas e que, na verdade, pertencem à União. É uma forma de esterilizar qualquer tipo de ação que possa ser desenvolvida, seja agricultura, seja pecuária, seja mineração, todo tipo de ação que possa dar ao Brasil desenvolvimento e condições de melhorar a sua situação econômico-financeira.

Ora, Sr. Presidente, se pudéssemos explorar adequadamente - e aqui não estou pregando a exploração irracional e predatória de nossas riquezas minerais, da fauna e da flora -, com certeza não estaríamos devendo o que devemos hoje aos países ricos e ao FMI, pois teríamos com que pagar. Mas não interessa aos países ricos que paguemos a dívida. Interessa, sim, que continuemos dependentes, pagando juros, que o povo continue com dificuldades, que milhões de brasileiros estejam desempregados, enquanto levantam uma falsa tese de defesa da política indigenista apenas voltada para a terra, e não para o índio, para o ser humano.

Por isso, Sr. Presidente, quero dar ao Dr. Mércio Pereira Gomes um voto de confiança, não de apoio incondicional, pois pretendo acompanhar seu trabalho, para o qual recebeu carta-branca do Ministro a fim de reconstruir a Funai, o que é realmente necessário. Existem absurdos praticados na Funai em nome dos índios e que, na verdade, precisam ser corrigidos.

Concedo o aparte ao Senador Augusto Botelho, com muito prazer.

O Sr. Augusto Botelho (PDT - RR) - Senador Mozarildo Cavalcanti, penso que logo virão outras nomeações se realmente não for feita uma política indigenista voltada para o cidadão índio. Todas essas políticas feitas até agora só se preocuparam com a terra do índio, que é um simples objeto que vive em cima da terra ou uma simples peça de museu na política indigenista atual. Tenho confiança no Ministro da Justiça e no Presidente Lula. Creio que esta é uma oportunidade, em virtude dos conhecimentos antropológicos de alto nível do novo Presidente da Funai, de desenvolvermos uma política indigenista discutida com as próprias comunidades indígenas, não se adotando decisões de cima para baixo. Os índios sabem bem o que querem. Participei da elaboração do PPA indígena de Roraima, fui no dia da consolidação e ouvi as suas reivindicações bem claras. Creio que temos de exigir que seja elaborada uma nova política indígena, já que está havendo essa mudança. Não apenas os Parlamentares devem participar dessa política, mas também o devem as comunidades indígenas. Elas já têm uma política indígena que querem escrita, só falta o Governo tomar a decisão de aplicar a política que os índios querem ver aplicada. O meu aparte foi para frisar bem que eu gostaria que esse novo Presidente olhasse para o ser humano, o nosso irmão índio, não apenas para as suas terras.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Senador Augusto Botelho, agradeço muito o aparte de V. Exª, que conhece como poucos a questão indígena.

Quero realmente me louvar das afirmações do Ministro da Justiça que disse que o novo Presidente tem carta-branca para renovar e reconstruir a Funai. Portanto, para renová-la e reconstruí-la, precisa fazer uma descontaminação da Funai e de muitas organizações que falam em nome dos índios sem ter procuração para isso. Ele deve ir às comunidades, Estado por Estado, falar diretamente com as pessoas, procurar receber as lideranças indígenas legítimas e afastar essas ONGs, reconstruindo, a partir daí, um órgão que possa fazer uma política voltada para dar dignidade à pessoa do índio, como ele muito bem diz, para dar autonomia econômica a cada comunidade indígena. Os índios produzem, por exemplo, artesanato, são excelentes produtores na área da agricultura e têm todas as condições, se os recursos realmente forem voltados para eles, de ter essa autonomia econômica. Aí sim, a partir daí, poderá surgir o restante, que é o direito de eles realmente poderem ser cidadãos por completo.

Continuo com a minha tese de que quem deve presidir a Funai é um índio, mas dou um crédito de confiança ao novo Presidente, até para que ele prepare essa Funai para, futuramente, ser presidida por um índio, que é quem legitimamente tem o dever e o direito de dirigir a questão indígena. Não adianta dizer que indigenista, sertanista ou antropólogo conhece mais de índio do que o próprio índio.

Portanto, penso que é chegado o momento de corrigirmos essas distorções da política indigenista, de mudarmos essa Funai que está aí, totalmente comandada, em todos os Estados, por essas organizações que se dizem procuradoras dos índios, mas que não o são.

Os jornais de hoje dizem que o orçamento da Funai já está zerado. É bom que o Presidente veja como foi zerado esse orçamento, embora eu saiba que ele é pequeno.

Sou um dos poucos Senadores, senão o único, que apresentou emenda individual no orçamento para ser aplicada nas comunidades indígenas. Até agora, não vi esses recursos serem aplicados.

Portanto, deixo registrado meu voto de confiança no novo Presidente da Funai, esperando que ele faça mesmo a renovação e a reconstrução daquele órgão.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/09/2003 - Página 26594