Discurso durante a 119ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa dos interesses nacionais pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), que está sendo realizada em Cancún, no México. Segundo aniversário dos atentados terroristas às torres do World Trade Center e ao Pentágono.

Autor
Hélio Costa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MG)
Nome completo: Hélio Calixto da Costa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMERCIO EXTERIOR. HOMENAGEM.:
  • Defesa dos interesses nacionais pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), que está sendo realizada em Cancún, no México. Segundo aniversário dos atentados terroristas às torres do World Trade Center e ao Pentágono.
Aparteantes
Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 12/09/2003 - Página 26943
Assunto
Outros > COMERCIO EXTERIOR. HOMENAGEM.
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, MEXICO, REUNIÃO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), ELOGIO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMISSÃO, REPRESENTAÇÃO, BRASIL, EMPENHO, DEFESA, INTERESSE, AGRICULTURA, PAIS, COMBATE, SUBSIDIOS, PRODUÇÃO AGRICOLA, PAIS INDUSTRIALIZADO, ESPECIFICAÇÃO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), UNIÃO EUROPEIA.
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, PRODUÇÃO AGRICOLA, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, ACESSO, MERCADO INTERNO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), UNIÃO EUROPEIA, MOTIVO, EXCESSO, TARIFA ADUANEIRA, SUBSIDIOS, AGRICULTURA.
  • CRITICA, PROPOSTA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SUBSIDIOS, AGRICULTURA, IMPOSIÇÃO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, LUTA, EFETIVAÇÃO, RECIPROCIDADE, COMERCIO EXTERIOR.
  • REGISTRO, ANIVERSARIO, ATENTADO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), HOMENAGEM POSTUMA, VITIMA, TERRORISMO, AMERICA DO NORTE.

O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, quero destacar a firme posição manifestada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na defesa dos interesses nacionais, especialmente da agricultura brasileira, na Rodada de Negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC), que se realiza em Cancún, no México.

Disse o Presidente Lula com extrema propriedade: “Sem avanços significativos na negociação agrícola, não será possível avançar nas demais áreas”. Essas palavras já produzem os primeiros frutos positivos.

Lamentavelmente, todos sabemos que o Brasil exporta hoje US$1,4 bilhão de carne bovina, e nenhum quilo dessa carne vai para os Estados Unidos. As barreiras que ainda existem no comércio entre o Brasil e os Estados Unidos precisam ser derrubadas; e começam a ser derrubadas neste momento em que o Brasil se faz presente por esta figura forte e firme, que é o Embaixador Rubens Ricupero, na reunião da OMC, em Cancún, no México.

O avanço das negociações sobre o setor agrícola ficou evidenciado em razão da decisão da Organização Mundial do Comércio de discutir três pontos considerados fundamentais pelo Chanceler Celso Amorim: o acesso a mercados, os subsídios à exportação e o mecanismo de apoio interno.

A abertura das discussões desses três temas fundamentais ao futuro da agricultura brasileira representa uma vitória sobre a tese defendida pelo Presidente do Conselho Geral da OMC, o diplomata uruguaio Carlos Perez Del Castillo. A proposta de Del Castillo de promover a extinção gradual dos subsídios dados à exportação para apenas alguns produtos agrícolas seria extremamente nociva aos interesses e à competitividade do Brasil e da Argentina, perante os demais países em desenvolvimento. Essa é a proposta americana, secundada e aprovada pela União Européia.

Entretanto, esse avanço ainda não representa uma vitória certa nessa guerra comercial entre ricos e pobres. Isto porque a Comissão de Agricultura da União Européia já adiantou que os europeus pretendem lutar para manter tanto os subsídios quanto uma política agrícola em bloco.

Vejam V. Exªs que, só no ano passado, o subsídio americano à agricultura chegou a US$40 bilhões, e o subsídio dos países da União Européia à agricultura, a US$38 bilhões. Como é que o Brasil vai competir, quando aqui, lamentavelmente, não temos nem sequer dinheiro suficiente para levar tranqüilidade ao produtor rural?

Mas há também, Sr Presidente, apoios muito importantes e muito bem-vindos que devem ser enfatizados à posição do Brasil. Verifiquei que o jornal The New York Times defendeu abertamente a posição do Brasil ontem. Diz o trecho do editorial: “Poucas coisas poderiam melhorar a vida de muita gente, inclusive o 1 bilhão de pessoas que vive com um dólar ao dia, do que um resultado positivo em Cancun. Com isso, queremos defender um compromisso forte da OMC para criar um mercado justo e eficiente para produtos agrícolas. Até hoje, a globalização continua a ser um jogo desequilibrado, no qual as normas foram fixadas pelos países ricos.”

Quem diz isso é o The New York Times, defendendo a posição que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou, por intermédio dos seus representantes na OMC, o Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e o Embaixador Rubens Ricupero. Essa é uma posição firme.

Ouço o Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Seria bom se todo o País estivesse acompanhando e entendendo o assunto de que fala V. Exª, porque nós, que o estamos acompanhando no dia-a-dia, sabemos das dificuldades. V. Exª, que é um homem com conhecimento e com experiência, sabe do nosso prejuízo. A nossa carne custa a metade do preço do produto australiano, mas a Europa, os Estados Unidos e o Japão criam barreiras fitossanitárias que nos cerceiam. Temos Estados inteiros, regiões inteiras que não têm aftosa, mas eles só querem a totalidade do país, não aceitam que Estados, que muitas vezes são maiores do que países, obtenham o certificado. Na área das leguminosas, estamos levando uma desvantagem muito grande. A nossa soja é produtiva e barata, mas estão começando a procurar chifre em cabeça de cavalo. Ouviu-se que estão querendo vetá-la por causa da ferrugem, que pode estar presente em nossa soja. Acabamos de ter um problema sério com um pesquisador americano, acusado por alguns de estar trazendo contaminação em vez de estar fazendo pesquisa. É, realmente, uma situação injusta, que precisamos corrigir, e só na OMC podemos ganhar espaço. Por isso, congratulo-me com V. Exª, que realmente está trazendo um tema que representa bilhões de dólares para o País, pois, se ganharmos pelo menos um espaço, isso poderá significar muitos empregos. Muito obrigado por estar abordando, no Senado da República, um tema tão importante, que nos alerta, como Parlamentares, para essas responsabilidades.

O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG) - Agradeço a sua intervenção, Senador Ney Suassuna. O Brasil está muito bem representado nessa reunião de Cancun, e esperamos que os resultados do primeiro dia se multipliquem e que o Brasil possa sair vitorioso desse encontro. Até os mais importantes jornais dos Estados Unidos, como o The New York Times, que acabo de citar, defendem a posição do Brasil, de que os países pobres que produzem bem na agricultura e os países em desenvolvimento que deslancharam a sua agricultura, como fez o nosso País, merecem uma posição especial no concerto do mercado internacional. Do contrário, vamos ficar sempre impedidos pelas barreiras fitossanitárias e pelas dificuldades que são impostas aos nossos produtos.

O Presidente Lula, Sr. Presidente, fez a declaração de que o Brasil precisa se estabelecer firmemente no mercado internacional como um recado direto ao seu colega Presidente dos Estados Unidos, George Bush, que continua determinado a manter um pesado subsídio para proteger a produção agrícola americana da concorrência que se faz no mundo. É preciso falar duro, como está fazendo o Presidente Lula. É preciso conversar à altura, como está sendo feito pelo Presidente e pelos seus representantes na Conferência da OMC, em Cancún, no México.

O subsídio, Sr. Presidente, literalmente bloqueia as exportações brasileiras. Somos prejudicados diretamente. Hoje, estamos tendo um prejuízo de cerca de US$8 bilhões por ano em função dos subsídios que são apresentados não só nos Estados Unidos como na União Européia.

Traduzindo a urgência com que esse assunto tem que ser encarado, o Presidente Lula afirmou que “não podemos esperar por outra rodada para que nossos interesses sejam atendidos, sobretudo em agricultura”. Mas a pressão pela abertura do mercado agrícola mundial, em tempos de globalização, não é uma iniciativa solitária do Brasil. Não é só o nosso País que pede isso.

Essa pressão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, conta com a adesão expressa de cento e quarenta e seis países que, em novembro de 2001, durante a Rodada de Doha da OMC, aprovaram a recomendação de que os subsídios agrícolas teriam de ser reduzidos até sua completa eliminação, principalmente nos estados Unidos e na União Européia. Há países, na Europa, onde uma vaca é mais bem tratada do que um ser humano na América Latina. Essa é a verdade que estamos encontrando a cada momento em que nos aprofundamos estudando essa questão.

A livre competição, essência da liberdade de mercado preconizada pelos Estados Unidos, Europa e Japão, não está sendo praticada pelos que a criaram. Os países ricos se limitam apenas a defender a abertura de mercados para itens de maior tecnologia e valor agregado.

Isso é rigorosamente o que acontece com o Brasil. Dos dez itens que mais importamos dos Estados Unidos, cobramos, em média, 14 a 16% de impostos. Dos dez produtos que exportamos para os Estados Unidos, a média de impostos é de 40%. Essa é a diferença. Esse é o problema maior que estamos vivendo: as barreiras que se impõem aos produtos brasileiros.

Hoje, produzimos, com excelência, o aço, têxteis, sucos, notadamente o suco de laranja, e soja.Temos condições de competir firmemente com qualquer país, mas as barreiras são imensas para sermos produtivos a ponto de, com a nossa agricultura, conseguirmos superar os problemas sociais que temos. Enquanto isso, esses mesmos países ricos fecham as portas de seus mercados aos produtos agrícolas brasileiros e de outras nações por um simples motivo: os produtos agrícolas brasileiros são competitivos em preço e em qualidade, mais até do que seus concorrentes europeus ou americanos.

Para sair desse impasse, entendo que será preciso ir muito além da mera busca de consenso anunciada pelo Presidente Bush. Caso contrário, corremos o risco de os produtos brasileiros continuarem alijados sine die dos maiores mercados consumidores do mundo, notadamente dos Estados Unidos e da Europa.

Por isso, Sr. Presidente, tenho a maior preocupação com a reunião que se realiza neste momento em Cancún, no México, com a presença do Brasil, defendendo os interesses, principalmente, da nossa agricultura, que se mostrou capaz de exportar e de trazer divisas para o Brasil.

Sr.Presidente, quero, também, nesta oportunidade, lembrar uma data que ficou marcada para todas as pessoas de bem, no mundo inteiro. Há dois anos, pouco antes das 9 horas, começavam os ataques terroristas às torres do World Trade Center, em Nova Iorque, e ao edifício do Pentágono, em Washington.

Há, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta minha fala de hoje, uma veia de emoção que não posso esconder. As palavras que vão brotar desta tribuna, ao evocar a tragédia de 11 de setembro de 2001, saem do fundo da alma de um cidadão brasileiro que morou por cerca de dezoito anos na cidade de Nova Iorque, onde tem inúmeros amigos - brasileiros, americanos e de outras nacionalidades. Foi ali, por entre aquelas duas torres que a barbárie destruiu, que pude construir a minha vida profissional, junto com outros companheiros que na época trabalhavam comigo, numa ação pioneira da TV brasileira, que, partindo de Nova Iorque, acabou passando por setenta e três países em todo o mundo, fazendo coberturas jornalísticas.

Hoje, no segundo aniversário dessa tragédia, quero fazer uma homenagem muito especial aos cerca de cem brasileiros e brasileiras que morreram naquela dia 11 de setembro, em Nova Iorque, no instante em que as torres do World Trade Center foram destruídas. Para quem conviveu com essas pessoas, muitas delas trabalhando no subsolo do World Trade Center, como engraxates, atendentes, garçons e garçonetes, ou em outras atividades nas inúmeras empresas que estavam colocadas ali, ou trabalhando em escritórios nas torres, como representantes de uma nova geração de brasileiros inseridos no mercado internacional, nas finanças internacionais, que, ao se destacarem, são levados a trabalhar pelo mundo afora - não só nos Estados Unidos, mas também na Europa. Esses brasileiros que ali perderam suas vidas são o símbolo, para nós, daquela tragédia.

Sr. Presidente, uma outra tragédia, provocada por esse ataque insano de 11 de setembro, ocorreu mais recentemente: o assassinato bárbaro, frio e absurdo de Sérgio Vieira de Mello, Alto Comissário dos Direitos Humanos da ONU, que estava em Bagdá como representante daquela organização internacional. Esta é a forma de se estabelecer o que aconteceu em Bagdá naquele dia: mais um resultado da ação insana do 11 de setembro de 2001. Além disso, tivemos as guerras no Afeganistão e no Iraque.

Sr. Presidente, quantas vidas perdidas! Quanto sofrimento para tantos povos! Inclusive para o povo americano, que vê seus filhos serem enviados para o teatro da guerra. Enfim, tudo isso provocado por uma ação insana, lamentável, terrível, que provocou, provoca e ainda provocará muita dor em tanta gente, inclusive em nós, brasileiros.

Portanto, é com muita emoção que me lembro do 11 de setembro e de suas três mil vítimas, inclusive os mais de 100 brasileiros que ali morreram. Muitos dos nossos conterrâneos ainda estão por ser identificados por se tratarem de brasileiros que estavam ilegalmente em Nova Iorque - portanto, sem identificação - e sequer tiveram suas identidades reclamadas.

É com pesar que relembramos o 11 de setembro, um dia que trouxe intranqüilidade para a cidade de Nova Iorque, para os Estados Unidos como um todo e, certamente, para o mundo, que continua sofrendo as conseqüências desse ato lamentável e insano, que não foi apenas o de derrubar as torres do World Trade Center, mas, sim, de agredir o povo americano. Os resultados desse ato aí estão: centenas de vidas perdidas nos conflitos estabelecidos e nas guerras que a partir dali surgiram.

É sempre importante lembrar: temos que fazer uma diferença profunda entre governo e povo. O governo dos Estados Unidos se diferencia do povo dos Estados Unidos. Conheci e convivi com ambos. O povo americano é simples, cumpridor de seus deveres, atencioso. Com ele convivi nas pequenas e nas grandes cidades, e só tenho elogios a fazer ao povo americano, que trata bem as pessoas que chegam a suas cidades, reconhecendo o valor de cada um. Lamentavelmente, as diferenças que temos para com os governos têm que ser colocadas separadamente. Governo é governo; povo é povo. Infelizmente, não se faz tal distinção. Dá-se a entender que é o povo americano quem agride, e que as conseqüências do 11 de setembro são resultados de ações do povo americano. Não é verdade. As conseqüências são resultados de ações do governo americano. Por isso, Sr. Presidente, é importante ressaltar essas posições.

Às famílias dos brasileiros que perderam suas vidas nas torres do World Trade Center no dia 11 de setembro de 2001, quero dizer do meu sentimento, da minha dor, e, sobretudo, que aqueles brasileiros que ali perderam suas vidas não morreram em vão. Eles representam um pouco do que queremos que o mundo inteiro possa fazer a cada dia, que é lutar pela paz mundial. Eles representam o esforço pela paz mundial, e, para tanto, deram suas vidas.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/09/2003 - Página 26943