Discurso durante a 121ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Congratulações com o Presidente argentino pela firmeza nas negociações com o FMI. Posicionamento do Brasil nas negociações na reunião da Organização Mundial do Comércio, em Cancún, México. Dificuldades de captação de recursos do BNDES.

Autor
Hélio Costa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MG)
Nome completo: Hélio Calixto da Costa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. COMERCIO EXTERIOR.:
  • Congratulações com o Presidente argentino pela firmeza nas negociações com o FMI. Posicionamento do Brasil nas negociações na reunião da Organização Mundial do Comércio, em Cancún, México. Dificuldades de captação de recursos do BNDES.
Publicação
Publicação no DSF de 16/09/2003 - Página 27135
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. COMERCIO EXTERIOR.
Indexação
  • CONGRATULAÇÕES, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, FORMA, NEGOCIAÇÃO, ACORDO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI).
  • ELOGIO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, RECUPERAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, REDUÇÃO, RISCOS, BRASIL, RETORNO, INVESTIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, MELHORIA, ECONOMIA, OFERECIMENTO, VANTAGENS, PAIS, RENEGOCIAÇÃO, ACORDO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), POSSIBILIDADE, GOVERNO, REJEIÇÃO, ASSINATURA, ACORDO INTERNACIONAL.
  • EXPECTATIVA, GOVERNO FEDERAL, ESPECIFICAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), RETIRADA, CLAUSULA, ACORDO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), IMPEDIMENTO, GASTOS PUBLICOS, SANEAMENTO BASICO, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, ESTADOS.
  • CONGRATULAÇÕES, GOVERNO FEDERAL, PARTICIPAÇÃO, REUNIÃO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, MEXICO, EMPENHO, NEGOCIAÇÃO, PAIS INDUSTRIALIZADO, EXTINÇÃO, SUBSIDIOS, AGRICULTURA, GARANTIA, LIVRE CONCORRENCIA, PROGRESSO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO.

O SR. HÉLIO COSTA (PMDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Srªs e Srs. Senadores, na semana passada, a Argentina conseguiu uma grande vitória nas negociações que vinha fazendo há vários meses com o Fundo Monetário Internacional. Todo o crédito foi para o Presidente Néstor Kirchner, porque conduziu esses entendimentos de uma forma firme, dura e, sobretudo, altaneira, mostrando que o povo argentino está decidido a trabalhar pela recuperação do país. A posição do Presidente foi tão firme, que ontem conseguiu virar a eleição municipal em Buenos Aires. O candidato da oposição, Mauricio Macri, que já estava com o primeiro turno vencido, acabou perdendo ontem o segundo turno, surpreendentemente, para o candidato do Presidente, Aníbal Ibarra.

Estou fazendo essa observação, Sr. Presidente, porque o Brasil está numa posição diferente. O Brasil nunca se deixou chegar à situação a que chegou a Argentina nos últimos meses, a ponto de, há duas semanas, correr o risco dar o calote no Fundo Monetário Internacional.

O Brasil, nestes primeiros oito meses do Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, conseguiu a credibilidade internacional, conseguiu reduzir o risco País de 2.400 pontos para 640 pontos e hoje conseguiu trazer de volta os investidores de longo prazo, não aqueles que vêm apenas para se aproveitarem de uma taxa de juros surpreendentemente melhor do que em qualquer outro lugar do mundo, mas aqueles investidores que vêm para realmente ficar, criar empregos, fazer funcionar, gerar e aquecer a nossa economia.

O Brasil consegue, nestes primeiros oito meses, a credibilidade internacional, o respeito da comunidade internacional. Por essa razão, é tão importante fazer essa correlação, porque agora, quando estamos prestes a refazer o acordo Brasil-Fundo Monetário Internacional, o Brasil pode dar-se ao luxo de dizer que não tem interesse de fazer, neste momento, a renovação do acordo com o Fundo Monetário Internacional.

Não é necessariamente essa a necessidade que existe no momento, porque o Brasil está agora numa posição de força para negociar, para fazer realmente um ajuste que não seja tão duro como foi no passado esse acordo com o FMI. Na verdade, nos últimos anos, mais de dez anos, o Brasil vem, em todos os anos, na dependência de acertar e fechar o acordo com o FMI. Caso contrário, entraria em colapso a sua economia e os nossos investidores desapareceriam. O Brasil corria todos esses riscos. Não corre mais!

Agora, o Brasil pode negociar, partindo do pressuposto de que não precisa assinar um novo acordo. O Brasil não tem necessariamente de fazer um acordo com o FMI. Pode-se dar a esse luxo! Devemos até fazer, porque vai garantir ao País recursos em qualquer circunstância, principalmente para emergências, quando poderá sacar o que tem direito no Fundo Monetário Internacional. Mas não precisa fazê-lo! E, por não precisar refazer o acordo, o Brasil vai aproveitar a mesma seriedade com que o Presidente Lula conduziu as ações, nestes oito meses, para fazer a recuperação da economia. O Brasil vai poder agora discutir em alto nível com o Fundo Monetário Internacional. Ou seja, as imposições que existem no atual contrato têm de ser renegociadas, a começar pelo engessamento de todas as negociações, engessamento feito pelo art. 35 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que impede o próprio Governo de investir, que impede os Estados de renegociarem suas dívidas e que impede as cidades de contraírem o famoso e conhecido empréstimo com o BNDES para saneamento básico. Isso ocorre porque o Fundo Monetário Internacional entende que investimentos em saneamento, em habitação e em linhas de transmissão de companhias energéticas estatais são considerados déficit público. Por se tratar de déficit público, esses investimentos contam contra o Brasil no momento de qualquer entendimento ou ajuste que passe pelo acordo do FMI.

Ora, Sr. Presidente, se uma estatal modelo, como a Cemig ou a Companhia Energética do Paraná, necessita de uma nova empresa ou de uma intervenção imediata em linhas de transmissão, não pode fazer esse investimento por ser considerado déficit público. Não podemos fazer investimento na energia que se precisa levar ao Jequitinhonha ou ao norte de Minas Gerais, a fim de que aquela região se desenvolva, porque não podemos investir em linhas de transmissão. Da mesma forma, as empresas estatais e até municipais com direito a conseguir recursos para saneamento não podem fazer empréstimos, pois saneamento, como tipo de investimento, é déficit público e está certamente amarrado, engessado pelo art. 35 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que vai também impedir que as cidades, os Estados façam esse tipo de empréstimo, esse tipo de transação financeiro-comercial.

Ora, Sr. Presidente, é lamentável que isso ocorra com um país como o nosso, onde 60% das residências, principalmente as do interior, ainda não dispõem de esgoto, ainda não têm como despejar o seu esgoto. Toda cidade do interior de meu Estado que visito tem esse problema, cidade de 100, 200 mil habitantes.

A região metropolitana de Belo Horizonte tem mais de quatro milhões de habitantes; mas só no ano passado foi inaugurada a primeira estação de tratamento de esgoto da capital mineira. Antes, até o ano passado, o esgoto de toda a Belo Horizonte era despejado no rio Arrudas, que desaguava no rio das Velhas, que acabava no rio São Francisco, poluindo todas as regiões por onde passa o grande rio.

Infelizmente, essa é a situação que estamos vivendo. E não podemos fazer investimentos, porque estamos amarrados à Lei de Responsabilidade Fiscal, a seu art. 35 - e o FMI insiste que não podemos desamarrar.

O mesmo ocorre com a habitação, que também é considerada pelo FMI, em seu presente acordo, como déficit público. Assim, ficaremos permanentemente sem condições de fazer casa popular. Se o Presidente Lula quiser lançar um grande programa nacional - como há no Ministério das Cidades a previsão de um grande mutirão de construção de casas populares no País -, não poderá, pois, na realidade, não terá, sequer, como aplicar recursos, porque o programa de habitação popular está amarrado no acordo do FMI.

Por essa razão, Sr. Presidente, citei o caso da Argentina no começo de meu discurso, que vinha, nos últimos meses, anunciando que pediria a moratória de suas pendências com o Fundo Monetário Internacional, mas conseguiu convencê-lo a aceitar as suas posições, as suas exigências.

O Brasil está bem melhor, está lá na frente, já superou todos esses momentos difíceis. O Brasil já está em condições de fazer propostas ao FMI, pois, afinal de contas, é o seu maior credor, uma vez que 40% de todo o investimento do FMI na América Latina está no Brasil.

Então, temos que trabalhar dentro de uma proposta firme, sólida, que vise, sobretudo, a corrigir essas injustiças que o acordo ainda em vigor - e que termina no final deste ano - impôs à economia brasileira e à sociedade brasileira.

Por essa razão, o Ministro Antônio Palocci tem falado com absoluta convicção que o Brasil não precisa renovar com o Fundo Monetário Internacional. Esse é o mesmo motivo que tem levado o Presidente Lula a dizer que não temos de renovar. Podemos e devemos até renovar, mas não com esse engessamento proposto que persiste há quase dez anos.

Em todo final de ano, nos últimos oito anos principalmente, havia aquela correria para saber se o Brasil conseguiria ou não fechar o ano, se conseguiria ou não superar a meta estabelecida pelo FMI, e vinham para cá os diretores do FMI, que se apresentam como os senhores absolutos da situação.

Pois agora, este Governo consegue, em oito meses, superar, quase duplicar a exigência imposta pelo FMI para o superávit primário, praticamente o dobro do solicitado, o que certamente trouxe muita dificuldade para o Governo. Foram penosos esses primeiros oito meses, foram difíceis, mas superamos, conseguimos vencer todas as barreiras. E agora o País começa a partir para o desenvolvimento.

Quero também destacar, Sr. Presidente, a posição firme do Brasil na Organização Mundial do Comércio - OMC, na reunião terminada esse fim de semana em Cancún, no México. Foi, mais uma vez, a firmeza do Governo brasileiro que confrontou os países ricos. O Brasil esteve representado pelo Presidente Lula, pela presença firme do nosso chanceler, mostrando que o País tem liderança e que não aceitará as imposições feitas pelos Governos dos Estados Unidos e da União Européia aos subsídios agrícolas, que simplesmente impedem a agricultura brasileira de competir. Como competiremos? No ano passado, os americanos investiram US$40 bilhões em subsídios para os produtos agrícolas e a União Européia, US$35 bilhões em subsídios.

Hoje está em todas as publicações nacionais: uma vaca, na Holanda, recebe um subsídio de US$3 mil por ano, mais do que recebe um ser humano nos países em desenvolvimento, Sr. Presidente. Trata-se melhor uma vaca na Europa do que um ser humano na África ou em certos lugares da América Latina. E é esse subsídio que torna praticamente impossível ao Brasil competir. Como competiremos com a soja, com o suco de laranja? Somos o segundo maior produtor de soja do mundo, caminhando para sermos o primeiro, e já somos o primeiro produtor de suco de laranja. Mas como continuaremos vendendo suco de laranja com o subsídio imposto por esses países todos, ou com as sobretaxas que impõem aos nossos produtos agrícolas? Pouca gente sabe que, quando o nosso suco de laranja chega ao Japão, Sr. Presidente, pagamos uma taxa de 200%. Isso não é uma taxa, mas uma punição, uma imposição que se faz contra o produto brasileiro!

Como competiremos? De que maneira conseguiremos um lugar especial se sobre os 10 produtos que mais exportamos para os Estados Unidos há uma taxação de 40%? No entanto, dos 10 produtos que mais importamos dos Estados Unidos aqui cobramos 14%. Não é justo! O mesmo ocorre com a União Européia. Agora, o Comissário da Agricultura, o Sr. Franz Fischler, da União Européia diz que o Brasil está fora de órbita querendo o fim dos subsídios. Ora, Sr. Presidente, eles é que estão fora de órbita.

Se os Países ricos não entenderem que já detêm o absoluto e completo domínio das exportações dos manufaturados e que cabe aos países em desenvolvimento que têm competência, como o Brasil com sua agricultura, de produzir mais e exportar, porque é na agricultura que conseguiremos essa paridade na exportação, como o Brasil vai vencer esse desafio da globalização? Como poderemos representar o progresso que esperamos não só para nós, mas para toda a América Latina?

A região do mundo que mais produz está entre Brasil e Argentina. Conseguimos superar todas as marcas de competência na produção de soja, de milho, de suco de laranja. Somos os maiores produtores de açúcar, no entanto, a Europa impõe uma barreira de 40% de taxa sobre nosso açúcar. Por quê? De onde tiraram isso? Será que fazemos o mesmo com os produtos que importamos? Por acaso, taxamos os vinhos franceses em 40%?

Não podemos, Sr. Presidente, não temos como permitir que persista essa disparidade, os países ricos dominando o comércio internacional e pedindo aos países pobres que apenas contribuam com seu trabalho, que não será bem remunerado porque nossos produtos não obterão preços competitivos lá fora.

Na verdade, voltamos à velha posição de que os países ricos têm que entender que o equilíbrio social se faz pela América do Sul, América Central, África e partes da Ásia e que a diferença do Norte para o Sul precisa ser atendida e diminuída, porque, enquanto continuarem os muito ricos dominando os muito pobres, não vamos conseguir igualdade e justiça social em todo o mundo.

Volto a dizer da firmeza com que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva atuou nessa questão do Fundo Monetário Internacional e da maneira firme como o Ministro Antonio Palocci vem defendendo a posição do Brasil de só agora firmar um acordo com o FMI se forem retiradas as cláusulas que engessam o investimento que precisa ser feito no setor social e energético.

Insisto ainda que os investimentos em energia, na abertura de novos espaços em linhas de transmissão por todo o Brasil, são empregos. Trata-se da geração de energia para outras regiões do País. Da mesma forma, empresas que necessitam investir no saneamento básico precisam acabar com as amarras impostas pelo acordo do FMI. E a certeza, Sr. Presidente, de que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Ministro Antonio Palocci estão trabalhando para que esse acordo seja renovado lá na frente, mas de uma forma que não prejudique as propostas de investimentos sociais do País.

Por essa razão, Sr. Presidente, faço aqui uma saudação muito especial àqueles que estiveram à frente dessas negociações e, sobretudo, também pela posição firme do Brasil, adotada neste fim de semana na reunião de Cancún, em defesa daqueles que produzem com competência na agricultura. Não aceitamos mais a imposição dos países ricos, notadamente Estados Unidos e União Européia, com subsídios absurdos que concedem neste momento, inviabilizando aqueles que trabalham na agricultura, aqueles que realmente vivem do solo, aqueles que, como no Brasil inteiro - sabemos -, fazem do solo a sua maneira de viver honestamente.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/09/2003 - Página 27135