Discurso durante a 127ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Aplausos ao discurso do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Organização das Nações Unidas - ONU. Reflexão sobre a desigualdade social no Brasil. Defesa da aprovação, hoje, no Senado Federal do Estatuto do Idoso. (como Líder)

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA SOCIAL.:
  • Aplausos ao discurso do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Organização das Nações Unidas - ONU. Reflexão sobre a desigualdade social no Brasil. Defesa da aprovação, hoje, no Senado Federal do Estatuto do Idoso. (como Líder)
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 24/09/2003 - Página 28652
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ELOGIO, DISCURSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), LEITURA, TRECHO, REPUDIO, GUERRA, ORIENTE MEDIO, DEFESA, REFORÇO, ORGANISMO INTERNACIONAL, BUSCA, PAZ, ALTERNATIVA, AÇÃO MILITAR.
  • REITERAÇÃO, DENUNCIA, DESIGUALDADE SOCIAL, PROCESSO, HISTORIA, BRASIL, REGISTRO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), CRESCIMENTO, ECONOMIA INFORMAL, DESEMPREGO, SUBEMPREGO, GRAVIDADE, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, NECESSIDADE, MEDIDA DE EMERGENCIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, ASSISTENCIA SOCIAL, PRIORIDADE, SAUDE, EDUCAÇÃO, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA.
  • DEFESA, MANUTENÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, PERCENTAGEM, VERBA, EDUCAÇÃO, SAUDE.
  • IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, ESTATUTO, IDOSO.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de me dedicar ao assunto principal de minha fala de hoje à tarde, registro como brasileiro e integrante do Partido Socialista Brasileiro a presença marcante na Organização das Nações Unidas - ONU, do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pronunciou discurso muito aplaudido pelos representantes do mundo inteiro. Naturalmente, suas palavras espelharam o sentimento da humanidade diante da tragédia que se abateu sobre algumas nações, como o Iraque e as nações do Oriente Médio, envolvidos numa guerra sem fim, em que milhares e milhares de pessoas são destruídas de hora em hora, de minuto em minuto.

A causa dessa guerra, a meu ver, Srª Presidente, só encontra justificativa na falta de amor e na dedicação insana a um processo de violência que precisa ser contido a todo custo, e a ONU pode exercer um papel preponderante na consecução da paz.

Disse o Presidente em determinado momento:

As tragédias do Iraque e do Oriente Médio só encontrarão solução num quadro multilateral, em que a ONU tenha um papel central.

O Presidente quis dizer que uma nação inteira não pode arvorar-se de dona da paz ou da guerra. Uma nação não pode resolver os problemas do mundo na base da violência, da prepotência do dinheiro e do poderio econômico. Quem está dizendo isso sou eu. O Presidente Lula apenas, de forma genérica, quis dizer o que a humanidade está pensando neste momento sobre a atitude dos Estados Unidos diante da guerra enfrentada no Oriente Médio.

Sua Excelência ainda disse:

Pode-se, talvez, vencer uma guerra isoladamente, mas não se pode construir a paz duradoura sem o concurso de todos. (...) A ONU não foi concebida para remover os escombros dos conflitos que ela não pôde evitar - por mais valioso que seja o seu trabalho humanitário.

E, adiante, acrescentou:

Não podemos confiar mais na ação militar do que nas instituições que criamos com a visão da história e à luz da razão.

Para que a ONU cumpra o seu papel, o Presidente entende ser necessário reformar a instituição, o que também defendeu o Secretário-Geral Kofi Annan em discurso minutos antes pronunciado naquela instituição.

Sr. Presidente, também foi enfática a palavra de Luiz Inácio Lula da Silva sobre a fome, uma das grandes tragédias que se abatem sobre a humanidade. Mais de cem mil crianças abaixo de 5 anos morrem por dia em todo o mundo por falta de um prato de comida. E ele acertadamente afirmou: “A fome é uma emergência e como tal deve ser tratada”. E sugeriu a criação de um comitê mundial de combate à fome na ONU, para motivar contribuições financeiras a esta grande causa humanitária.

E termina suas palavras lembrando a lição de Gandhi:

A violência quando parece produzir o bem, é um bem temporário, enquanto o mal que faz é permanente.

Por isso, Sr. Presidente, aproveito este ensejo para transmitir os meus agradecimentos, como Senador da República de um Estado pequeno e pobre do Nordeste, pelas palavras pronunciadas pelo nosso Presidente nesta ocasião tão importante por que passa a nossa humanidade.

Agora, Srª. Presidente, irei diretamente ao discurso para o qual me inscrevi nesta tarde, sobre a desigualdade social - mais um discurso que pronuncio aqui, no recinto do Senado, sobre assunto tão candente.

Essa brutal característica, na qual o Brasil se destaca mundialmente, não caiu do céu e nem foi construída em um ou dois ou dez governos. Foi erguida num processo histórico, contra o qual muitos de nós temos levantado nossa voz, e tornou-se uma herança perversa que precisa ser urgentemente detida ou controlada.

A esse respeito, quero chamar a atenção para um dado social grave, recentemente divulgado pelo IBGE e que precisa merecer nossa reflexão. O IBGE informou, dias atrás, que a marcha da informalidade entre os trabalhadores brasileiros já se aproxima perigosamente dos 60% da PEA (população economicamente ativa).

O dado especifico é o seguinte: nos 12 meses que findaram em junho último, o número de pessoas ocupadas e sem carteira de trabalho assinada aumentou em 8% sobre igual período terminado em junho de 2002. No curto prazo de apenas um ano, no último ano, a nossa mão-de-obra sem carteira de trabalho assinada aumentou em 8%. O resultado desse indicador oficial não poderia ser menos preocupante: mais da metade dos brasileiros que trabalham - não vamos falar aqui dos altíssimos índices de desemprego, que são do conhecimento de todos - não têm carteira assinada. Mais da metade dos brasileiros! Corresponde a quase 60%, e isso sem considerarmos uma outra realidade que ampliaria mais ainda esse índice, se computássemos, por exemplo, aquela massa de empregados que têm a carteira assinada, mas que, segundo Celso Ming, recebem parte dos salários “por fora”..., a grande massa dos empregados com carteira-de-trabalho- laranja.

Ora, nós sabemos que, mesmo que haja um crescimento econômico significativo, ele não significará necessariamente um boom na mesma proporção, em termos de emprego. A terceirização, a aplicação da informática no trabalho, a tecnificação da indústria e serviços, a acumulada exclusão social, tudo isso impede que uma coisa conduza, de uma forma linear, à outra. Em outras palavras, se nós considerarmos essa marcha batida do nosso País para mais um recorde mundial no ranking das nações cuja economia mergulha fundo na informalidade e na precarização das relações de trabalho, e mais, se considerarmos que estamos entre os países do mundo de maior concentração de renda, me parece lógico - e creio que V. Exªs concordarão comigo - que temos que entrar em alerta vermelho em relação ao social, onde são cabíveis as medidas de emergência ora em discussão pelo Governo e onde não podemos permitir que ocorram retrocessos naquela esfera do social.

Em outras palavras, Srª. Presidente, para além das medidas em favor do desenvolvimento nacional, da produção de empregos e contra a fome, urgentes e necessárias e pelas quais temos nos batido nesta Casa, temos que trabalhar, em caráter de urgência, em prol de medidas imediatas que signifiquem distribuição de renda, que signifiquem proteção para os mais pobres, para os idosos, para os que são empurrados para a informalidade e a indigência. Temos que assegurar, acima de qualquer consideração casuística ou eleitoral, aquele núcleo de direitos sociais que está lá na nossa Constituição. Saúde e educação, por exemplo. Numa situação como a atual eles fazem toda a diferença.

Temos que preservar a todo custo o amparo social na educação e na saúde, itens que terminam se constituindo - além de outros - na fronteira entre a vida e a morte, entre a dignidade e a não-cidadania para a crescente massa de pessoas à margem do trabalho ou que trabalham em condições deploráveis, informais, precárias, e que constituem a face cruel de uma herança maldita de dez anos de desmanche do Estado brasileiro e de recessão econômica. Temos que voltar nosso olhar para a distribuição de renda, defendendo todas as medidas possíveis contra essa desigualdade social.

Nesse sentido e nesse contexto, Sr. Presidente, a saúde e a escola públicas são formas de redistribuição de renda que jamais deveremos perder de vista, e para as quais temos que assegurar as verbas necessárias. Lutei - como é do conhecimento de todos - para assegurar que o orçamento da educação e da saúde fosse definido por um percentual obrigatório da receita, e que isso fosse definido por emenda constitucional, porque entendi saúde e educação como direitos básicos e intocáveis da cidadania. Entendi e entendo que saúde e educação deveriam ter sua verba garantida independentemente da conjuntura política e dos interesses eleitoreiros e locais de cada governador. Fomos até o fim para garantir que as verbas de educação e saúde estivessem vinculadas a um percentual fixo que cada governador fosse obrigado a aplicar. Hoje vejo com preocupação alguns sinais e determinadas pressões que, no limite, ameaçam aquela conquista histórica.

Tenho me levantado contra isso, com a mesma disposição com que lutei por aquela emenda constitucional.

O que esta Casa pretendeu, Sr. Presidente, quando a aprovou por quase unanimidade, foi assegurar o direito dos mais pobres, daqueles 80% de brasileiros que não podem pagar por saúde. A intenção desta Casa e a nossa luta como Relator daquela proposta de emenda foi no sentido de garantir verbas para a saúde que não podem ser procrastinadas, verbas que não podem ser retiradas, nem desviadas, direitos que, da mesma forma que o da alimentação, se não existirem podem tornar a cidadania a mais vazia das palavras.

Por isso Sr. Presidente, neste dia em que o Senado Federal se debruça para discutir e aprovar uma matéria das mais relevantes, faço este discurso, porque sabemos que, ao lado dos mais pobres, ao lado das criaturas que não têm diariamente um prato de comida para dar aos seus filhos, existem também os mais velhos, aqueles que, durante a mocidade, ofereceram o melhor de suas vidas em favor do bem-estar de suas famílias, em favor do desenvolvimento do País, e que, muitas vezes, se vêem ameaçados pela violência até dos mais jovens, daqueles que se beneficiaram dos serviços prestados pelos mais idosos.

Então, quando o Brasil se apresenta perante o mundo como uma Nação democrática, uma Nação justa, uma Nação que tem um Presidente de coração aberto, de alma aberta para resolver os problemas sociais, é preciso que, neste dia histórico, estejamos unidos para aprovar o Estatuto do Idoso, assim como aprovamos, há algum tempo, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto da Mulher.

Hoje, quem tem 60 anos não pode ser considerado um velho. Já completei 60 anos e estou aprovando um estatuto, Sr. Presidente, que certamente não me servirá, porque sou Senador da República, e não servirá para muitas das pessoas que aqui se encontram, porque não vão precisar dessa proteção estatuída em lei. Entretanto, muitos daqueles que nos ouvem pelo rádio e pela televisão vão se sentir mais protegidos com o diploma legal que vai lhes assegurar direitos que antes eram postergados, esquecidos, como o direito à saúde, o direito de ir e vir, o direito de morrer sossegado quando estiver bem velhinho, o direito de ser assistido pelos seus filhos, e alguns deles abandonam seus pais em casas de caridade e por lá nunca mais aparecem. Mais de 80% das pessoas que são internadas nessas casas são abandonadas pelos seus entes, que deveriam ser entes queridos.

Sr. Presidente, tenho certeza absoluta que os direitos consubstanciados neste estatuto serão observados por todos aqueles que têm a responsabilidade de conduzir a Administração Pública, seja na União, nos Estados ou nos Municípios. Por isso quero parabenizar o nosso Senador Paulo Paim, que aqui no Senado Federal tem sido um exemplo edificante de trabalho em favor do social. Na Câmara dos Deputados, trabalhou pelo salário mínimo, um melhor salário mínimo para o trabalhador. E agora, com o Estatuto do Idoso, vejo que V. Exª, Senador Paulo Paim, é um homem comprometido com todas as idades. Meus parabéns pela iniciativa louvável que tomou em favor dos brasileiros que já passaram dos 60 anos.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Antonio Carlos Valadares, faço um aparte a V. Exª, como fiz ao Senador Demóstenes Torres, à Senadora Lúcia Vânia e ao Senador Sérgio Cabral, cumprimentando S. Exªs. Neste momento, Senador Antonio Carlos Valadares, quero cumprimentar V. Exª, a quem tive a alegria de me somar aqui no Senado, pelo trabalho que tem feito nessa área. Também quero cumprimentar o seu Partido pelo amplo entendimento que teve na Câmara dos Deputados. E a nobre Deputada Luiza Erundina foi muito importante no trabalho de articulação para que esta proposta fosse aprovada por unanimidade na Câmara dos Deputados. Ao cumprimentar V. Exª, também tenho que cumprimentar aqui, na figura do Senador, todos os Partidos; o PSDB, na figura do Deputado Eduardo Barbosa, que foi Presidente da Subcomissão Especial; o PMDB, na figura do Deputado Silas Brasileiro, que foi o Relator da matéria. Mas faço este aparte a V. Exª para dizer que hoje é uma data muito importante. Todos os Partidos na Câmara e no Senado estão de parabéns por fazerem com que este projeto, trabalhado por mais de 20 anos, torne-se realidade e seja aprovado o Estatuto do Idoso. V. Exª destaca os principais pontos, mas eu também destacaria que ele reduz para 60 anos a idade para que o idoso tenha direitos que antes só tinha assegurado a partir dos 65 anos. Se a própria Reforma da Previdência diz que “a aposentadoria é assegurada com 35 anos de contribuição e 60 de idade”, isso é um sinal que, a partir daí, estamos entrando na chamada terceira idade. Quero, portanto, cumprimentá-lo pelo brilhante trabalho que tem feito nesta área, aqui no Senado da República.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Nobre Senador Paulo Paim, o projeto não apóia o idoso apenas simbolicamente, ao contrário, abarca todas as necessidades do idoso, desde a proteção na doença e o respeito que deve merecer como pessoa humana até as punições que poderão ser aplicadas caso seja prejudicado nos seus direitos e humilhado na sua condição de pessoa humana.

Por isso V. Exª recebe nosso apoio, não apenas porque admiramos pessoas da terceira idade, mas porque é um dever admirarmos as pessoas que têm experiência, que prestaram serviços, que nos ensinaram a seguir os caminhos da verdade e do bem e a abandonar os caminhos do mal.

Temos admiração pelo idoso, é verdade, mas a discussão que vamos ter, daqui a pouco, em relação ao seu projeto nada tem a ver com isso, mas sim porque ele representa o sentimento da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. E o projeto vem se somar a todos os outros, como o do Senador Sérgio Cabral, que também, de forma acertada, apresentou um projeto na mesma direção, mas que, diante de um entendimento, visto que duas propostas que dispõem do mesmo assunto tramitam em conjunto, soube respeitar a prioridade, porque o seu projeto veio da Câmara já com o prestígio e a força do voto dos Deputados e Deputadas e também com todas as regras que foram consubstanciadas e aprovadas pela Câmara e que, com certeza, serão aprovadas hoje pelo Senado Federal.

Mais uma vez, meus parabéns a V. Exª e à Senadora Lúcia Vânia, que tanto trabalhou e proporcionou a oportunidade de que esta matéria viesse a ser discutida hoje à tarde nesta Casa.

Muito obrigado, Srª. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/09/2003 - Página 28652