Discurso durante a 128ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a penúltima colocação dos estudantes brasileiros no último Programa Internacional de Avaliação de Estudantes-PISA.

Autor
Papaléo Paes (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Comentários sobre a penúltima colocação dos estudantes brasileiros no último Programa Internacional de Avaliação de Estudantes-PISA.
Publicação
Publicação no DSF de 25/09/2003 - Página 28961
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, RESULTADO, PROGRAMA, AMBITO INTERNACIONAL, AVALIAÇÃO, ESTUDANTE, REALIZAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), ORGANIZAÇÃO, COOPERAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, PARTICIPAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, DIFICULDADE, LEITURA, INTERPRETAÇÃO, TEXTO.
  • ESCLARECIMENTOS, INTERPRETAÇÃO, PROGRAMA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), ANALISE, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, EDUCAÇÃO, BRASIL, MOTIVO, INSUFICIENCIA, INVESTIMENTO, ESTUDANTE, EXCESSO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, DIFICULDADE, ACESSO, ENSINO, CIDADÃO, OCORRENCIA, ABANDONO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO.
  • MANIFESTAÇÃO, APOIO, POLITICA NACIONAL, LIVRO, ANTERIORIDADE, APROVAÇÃO, SENADO, INCENTIVO, LEITURA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, EXPECTATIVA, PROVIDENCIA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), GOVERNO FEDERAL, INCLUSÃO, POPULAÇÃO CARENTE, MELHORIA, QUALIDADE, ENSINO, INVESTIMENTO, VALORIZAÇÃO, PROFESSOR, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL.

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foram divulgados, no dia 1º de julho último, os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, conhecido pela sigla de PISA. Avaliando o desempenho de estudantes de 15 anos, de 41 diferentes países, em interpretação de textos, matemática e ciências, o Pisa traz notícias para a educação brasileira que não são de modo algum animadoras: nossos jovens ficaram em penúltimo lugar, considerando a média das notas nas três áreas aferidas.

O PISA é um prestigioso programa de avaliação educacional, desenvolvido conjuntamente pela Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura e pela OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, com a participação dos países que estão sendo avaliados, não só na sua execução, mas também no planejamento.

Uma equipe internacional, envolvendo especialistas de renome, elaborou as provas em cada uma das disciplinas, com elevado padrão técnico e de modo que os resultados não fossem afetados pelas diferenças culturais entre os países. As questões procuram exigir a aplicação dos conhecimentos à vida prática e a situações novas, aferindo o grau de efetiva assimilação de conteúdos-chave e de processos, em lugar de privilegiar conteúdos mais específicos.

A ênfase dessa primeira avaliação recaiu sobre a leitura, ficando o Brasil, nesse item, apenas um pouco acima da Macedônia, Indonésia, Albânia e Peru. Foi avaliada, na prova de leitura, de acordo com o texto oficial de apresentação do PISA, a "capacidade de recuperar informações, compreender textos em um nível geral, interpretá-los, refletir sobre o conteúdo e a forma dos textos em relação ao seu próprio conhecimento do mundo e de avaliar e defender seu próprio ponto de vista". 56% dos jovens brasileiros avaliados ficaram no nível 1, que corresponde ao grau mais básico de compreensão de texto, deparando-se os jovens avaliados "com sérias dificuldades para utilizar a leitura como instrumento que lhes permita progredir e aumentar seus conhecimentos e competências em outros âmbitos".

Não é de modo algum casual, Srªs e Srs. Senadores, a prioridade concedida nessa primeira etapa à avaliação da capacidade de leitura e de outros desempenhos verbais a ela relacionados. Todos eles são fundamentais, quer para a inserção no mundo do trabalho, quer para a continuidade dos estudos. Afinal, como disse o Presidente José Sarney, em justificativa ao seu projeto de lei que institui a Política Nacional do Livro, "em plena era da informação, o livro e a leitura continuam a ser os principais instrumentos para a difusão da cultura e do saber". Observamos, apenas, que corresponde à leitura, justamente por estarmos na era da informação, um universo ainda mais amplo que o do livro, abrangendo, entre outros modos de apresentação, os periódicos mais diversos, os inumeráveis textos que circulam pela Internet e outros textos em formato digital.

É certo, Srªs e Srs. Senadores, que não podemos aceitar passivamente essa situação! Ela não se coaduna com a grandeza de nosso País e com o valor de nossas tradições culturais. Há, sem dúvida, muitos problemas em nosso sistema educacional, e mesmo em nossa vida sociocultural que levam a esses resultados pífios.

A avaliação oferecida pelo PISA, é bom que se diga, não serve apenas para um campeonato de conhecimento entre diferentes países. As provas são acompanhadas de questionários que solicitam informações sobre a situação econômica e familiar dos estudantes, sobre suas atitudes e hábitos. Com essas informações, ficamos sabendo que os jovens que são leitores assíduos têm um resultado médio superior em 13 pontos aos daqueles que não o são, para uma nota máxima de 100. Verificamos, ainda, que as meninas demonstram maior amor aos livros que os meninos. Enquanto 58% dos rapazes afirmaram ler apenas para adquirir informações necessárias para a escola, entre as meninas esse índice ficou nos 33%.

É lastimável, Sr. Presidente, que não estejamos sabendo despertar o gosto pelo maravilhoso mundo dos livros entre os jovens, trocado pelo acúmulo de informações muitas vezes banais e desprovidas de profundidade. Os dados que há pouco citei referem-se aos estudantes avaliados em todos os países. Sabemos que a prática da leitura no Brasil situa-se em um nível inferior ao de países comparáveis ao nosso, como os da América Latina. Historicamente, avançamos de modo muito lento na alfabetização de nossa população - e quando esse processo começou a se intensificar, passamos a ser bombardeados e seduzidos por meios de comunicação de massa, os quais nem sempre mostram a vocação de nos tornar mais inteligentes, ou de nos propiciar uma melhor compreensão sobre o mundo que nos cerca.

Outras correlações revelam-se talvez ainda mais decisivas para que possamos compreender as causas de nossas deficiências e para que possamos corrigi-las. No Brasil, o gasto acumulado por aluno até os 15 anos é mais de sete vezes inferior aos dos países que mais investem em seus alunos, como a Áustria e os Estados Unidos, ficando acima apenas, entre os países avaliados, da Indonésia e do Peru. Nossos investimentos em educação mostram-se, portanto, compatíveis com os péssimos resultados obtidos pelos estudantes brasileiros. O relatório do Pisa adverte, entretanto, que, por mais que o volume de gastos seja um pré-requisito importante para alcançar uma educação de qualidade, é também fundamental a eficácia com que os recursos são aplicados.

Outra correlação analisada pelo PISA revela que o desempenho dos alunos decai à medida que os países apresentam uma maior concentração de renda. O Brasil é justamente o país com a maior concentração de renda, entre todos os que foram avaliados. Aqueles estudantes que receberam menos recursos na escola e contam com condições menos favoráveis aos estudos em suas famílias "puxam", evidentemente, a média para baixo. O mais grave, talvez, é que a média alcançada pelos estudantes brasileiros reflete tão-somente a situação dos jovens de 15 anos que estão no sistema escolar, quando sabemos que um número considerável dos nossos jovens dessa idade se viu levado a abandonar as escolas.

Um dado mais pontual diz respeito ao momento de início da educação fundamental. Enquanto para a grande maioria dos países ela começa com as crianças de 6 anos de idade, no Brasil e em outros 4 países a idade de início é de 7 anos. Um ano de diferença em fase tão decisiva parece ter grandes conseqüências sobre as competências cognitivas consolidadas aos 15 anos.

Antecipar em um ano o início do ensino fundamental, Sr. Presidente, pode ser uma medida de considerável impacto para a formação de nossos jovens. Mas a necessidade de mudanças é muito mais ampla, envolvendo grande variedade de fatores e de ações, nenhum dos quais pode ser menosprezado.

A Política Nacional do Livro, instituída pelo projeto de lei já aprovado nesta Casa, representará relevante contribuição do Legislativo para "a implantação e (...) consolidação do hábito de ler" entre a nossa população. Uma medida singela como a introdução da hora de leitura diária nas escolas pode ter efeitos espetaculares para a consecução desse objetivo.

Mas cabe antes de tudo ao Ministério da Educação responder à gravidade da situação estampada pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos. Segundo a Secretária de Educação Fundamental, Maria José Feres, seus "dados vêm confirmar o que já era de conhecimento do Ministério", uma vez que o Saeb - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica já constatara que 59% dos estudantes da 4ª série do ensino fundamental não tinham desenvolvido as competências básicas de leitura.

Ao apontar como "nosso grande desafio" a garantia de "inclusão e qualidade", a Secretária de Educação Fundamental relaciona algumas medidas que devem atuar nesse sentido, como "valorização e formação dos professores, incentivo aos sistemas estaduais de avaliação dos alunos e ampliação do ensino fundamental para nove anos". Tais idéias são um bom ponto de partida para um processo de transformação que desejamos amplo e bem-sucedido, sob o comando do Professor Cristovam Buarque.

Sabemos, entretanto, que o Ministério da Educação, juntamente com os sistemas estaduais e municipais de ensino, só avançarão de modo significativo rumo à inclusão e à qualidade, se houver o compromisso decidido dos governantes em priorizar a área de educação, garantindo a alocação de recursos em níveis condizentes com suas muitas necessidades e acompanhando sua correta e eficaz utilização. Ainda não tivemos provas cabais de que este será o comportamento do Governo Federal, o que não deixa de trazer inquietações quanto ao futuro da educação nos próximos anos.

A educação em nosso País, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não pode continuar como peça indispensável da retórica dos governantes, enquanto ela é mantida em um estado inercial, no qual os dados formais, como aprovação em uma determinada série, contam mais que uma realidade por demais desanimadora. Ao contrário, tornou-se imprescindível e inadiável um choque de qualidade na educação brasileira, sob pena de permanecermos como espectadores - de modo algum privilegiados - de um mundo que se transforma aceleradamente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/09/2003 - Página 28961