Discurso durante a 130ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da democracia como forma ideal de governo. Condenação pela participação de jovens adolescentes e crianças em tropas de guerrilhas.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Defesa da democracia como forma ideal de governo. Condenação pela participação de jovens adolescentes e crianças em tropas de guerrilhas.
Publicação
Publicação no DSF de 27/09/2003 - Página 29466
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, RELATORIO, ORGANISMO INTERNACIONAL, DIVULGAÇÃO, AUMENTO, RECRUTAMENTO, CRIANÇA, PARTICIPAÇÃO, GUERRILHA, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, AFRICA.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os problemas mundiais são naturalmente angustiantes para os que amam a paz e a liberdade, mas nunca, felizmente, desaparecem as esperanças de que governos democráticos, com a evolução cultural dos seres humanos, ainda encontrarão as veredas por onde caminham as soluções.

Entre os tantos complexos e gravíssimos problemas do nosso mundo, acompanho com profundo pesar o que, em determinados países, envolve as crianças em guerras fratricidas. Há desditosas nações em que a guerra, com seus tormentos, é uma realidade diária para milhões de crianças. Estas não raro ou nascem com a família já dizimada pela barbárie, ou com os pais portando armas de grosso calibre ou fugindo pelos campos secos dos inimigos que os caçam como feras.

Além das guerras, essas crianças sofrem de desnutrição se não morrem de fome; bebem águas insalubres, não têm o amparo de condições sanitárias mínimas ou de assistência médico-hospitalar. Jamais conhecerão os entretenimentos próprios da infância.

Abordo hoje este assunto, Sr. Presidente, em virtude de mais um relatório da organização Human Rights Watch, divulgado no último dia 18 de setembro.

Através desse documento, sabe-se que mais de 11 mil crianças integram nos dias atuais, como soldadinhos impúberes ou “buchas de canhão”, tanto as FARCs quanto as forças paramilitares que se opõem a essas ditas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, ambos grupos rebeldes rivais que infernizam a população daquele país amigo.

As crianças combatentes - que fazem lembrar um pouco os seus coetâneos das perigosas favelas do Rio e de São Paulo - têm a violência, o sofrimento e o medo como terrível rotina das suas vidas. Testemunham a morte e a desumana tortura ao seu redor. Fácil imaginar o que lhes reserva, no futuro, esse aprendizado macabro. Cumprindo ordens, assassinam friamente os que lhes são indicados para morrer. Integrando tropas militares, as crianças “barateiam” custos e não questionam os que as lideram.

O relatório do Human Rights Watch, com 150 páginas - intitulado “Você aprenderá a não chorar: Crianças Combatentes na Colômbia” -, apresenta um conteúdo extraído de entrevistas com 112 ex-combatentes infantis, mostrando como a pobreza encontrada em regiões rurais da Colômbia é explorada pelos guerrilheiros para recrutar menores. Relatou um desses menores: “Eles te ensinam aos poucos, primeiro com um revólver 38 e então com uma arma maior. Eu atirava com um rifle AK-47 antes de completar oito anos”.

Há dois anos, já ocupei esta tribuna para tratar do mesmo tema. Trata-se realmente de um fato estarrecedor esse de praticamente “seqüestrar” crianças para transformá-las em soldados-mirins. O documento da citada organização internacional aponta que o número de menores combatentes aumentou nos últimos anos. Apenas Myanmar (ex-Birmânia) e a República Democrática do Congo têm mais combatentes infantis do que a Colômbia.

São usadas essas crianças em todo tipo de operação subversiva, encarregadas inclusive de matar outros combatentes infantis que tentam desertar, como relata matéria publicada na Internet, no site da British Broadcast Corporation, a BBC, de Londres.

Ao recorrer a crianças para lutar, as guerrilhas e os paramilitares estão causando um mal incalculável à sociedade colombiana, disse José Miguel Vivanco, diretor-executivo para a região das Américas da Human Rights Watch.

Pelo menos um em cada quatro combatentes irregulares no país tem menos de 18 anos. Desses, milhares têm menos de 15 anos, idade mínima permitida para recrutamento pela Convenção de Genebra.

O uso de combatentes com menos de 15 anos é, portanto, um crime de guerra, segundo a avaliação dos especialistas em Direito Internacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o alerta que lancei desta tribuna há dois anos vale a pena ser renovado e novamente citado. Disse então: Nos últimos três anos aumentou de 30 para 41 os países que estão utilizando crianças como soldados em guerras, missões militares diversas e conflitos civis. Esse número de crianças chega a 300 mil. Tal informação faz parte de um relatório divulgado por uma coalizão internacional de entidades criada para pôr fim ao uso de crianças como soldados. Segundo o relatório, a África é o continente que mais utiliza crianças como soldados.

Na oportunidade, registrei que a estimativa era de que, naquele continente, o número de soldados mirins fosse aproximadamente de 120 mil. A situação mais alarmante era a da Birmânia, com 50 mil. O número de crianças usadas como soldados está diretamente relacionado às guerras civis. Na África, elas são obrigadas a vigiar minas de petróleo e diamantes que os rebeldes africanos usam para financiar suas ações.

Já naquele discurso mencionei que “aqui, na nossa América do Sul, na vizinha Colômbia, onde os conflitos permanecem constantes, o número de crianças soldados também se mantém alto. Usadas nas linhas de frente dos combates, elas trabalham também como carregadores e escravos sexuais”.

Sr. Presidente, aos poucos, a sociedade brasileira, através da sua representação política, vai encontrando as soluções que correspondam aos anseios pela formação de gerações que, amantes da paz e da liberdade, darão continuidade aos nossos foros de país moderno e de alto desenvolvimento social.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Obrigado.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR EDISON LOBÃO.

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O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os problemas mundiais são naturalmente angustiantes para os que amam a paz e a liberdade, mas nunca, felizmente, desaparecem as esperanças de que governos democráticos, com a evolução cultural dos seres humanos, ainda encontrarão as veredas por onde caminham as soluções.

Entre os tantos complexos e gravíssimos problemas do nosso mundo, acompanho com profundo pesar o que, em determinados países, envolve as crianças em guerras fratricidas. Há desditosas nações em que a guerra, com seus tormentos, é uma realidade diária para milhões de crianças. Estas não raro ou nascem com a família já dizimada pela barbárie, ou com os pais portando armas de grosso calibre ou fugindo pelos campos secos dos inimigos que os caçam como feras.

Além das guerras, essas crianças sofrem de desnutrição se não morrem de fome; bebem águas insalubres, não têm o amparo de condições sanitárias mínimas ou de assistência médico-hospitalar. Jamais conhecerão os entretenimentos próprios da infância.

Abordo hoje este assunto, Sr. Presidente, em virtude de mais um relatório da organização Human Rights Watch, divulgado no último dia 18 de setembro.

Através desse documento, sabe-se que mais de 11 mil crianças integram nos dias atuais, como soldadinhos impúberes ou ‘buchas de canhão’, tanto as FARCs quanto as forças paramilitares que se opõem a essas ditas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, ambos grupos rebeldes rivais que infernizam a população daquele país amigo.

As crianças combatentes - que fazem lembrar um pouco os seus coetâneos das perigosas favelas do Rio e São Paulo - têm a violência, o sofrimento e o medo como a terrível rotina das suas vidas. Testemunham a morte e a desumana tortura ao seu redor. Fácil imaginar o que lhes reserva, no futuro, esse aprendizado macabro. Cumprindo ordens, assassinam friamente os que lhes são indicados para morrer. Integrando tropas militares, as crianças ‘barateiam’ custos e não questionam os que as lideram.

O relatório do Human Rights Watch, com 150 páginas - intitulado Você aprenderá a não chorar: Crianças Combatentes na Colômbia -, apresenta um conteúdo extraído de entrevistas com 112 ex-combatentes infantis, mostrando como a pobreza encontrada em regiões rurais da Colômbia é explorada pelos guerrilheiros para recrutar menores. Relatou um desses menores: "Eles te ensinam aos poucos, primeiro com um revólver 38 e então com uma arma maior. Eu atirava com um rifle AK-47 antes de completar oito anos".

Há dois anos, já ocupei esta tribuna para tratar do mesmo tema. Trata-se realmente de um fato estarrecedor, esse de praticamente ‘seqüestrar’ crianças para transformá-las em soldados-mirins. O documento da citada organização internacional aponta que o número de menores combatentes aumentou nos últimos anos. Apenas Myanmar (ex-Birmânia) e a República Democrática do Congo têm mais combatentes infantis do que a Colômbia.

São usadas essas crianças em todo tipo de operação subversiva, encarregadas inclusive de matar outros combatentes infantis que tentam desertar, como relata matéria publicada na Internet, no site da British Broadcast Corporation, a BBC de Londres.

Ao recorrer a crianças para lutar, as guerrilhas e os paramilitares estão causando um mal incalculável à sociedade colombiana, disse José Miguel Vivanco, diretor-executivo para a região das Américas da Human Rights Watch.

Pelo menos um em cada quatro combatentes irregulares no país tem menos de 18 anos. Desses, milhares têm menos de 15 anos, idade mínima permitida para recrutamento pela Convenção de Genebra.

O uso de combatentes com menos de 15 anos é, portanto, um crime de guerra, segundo a avaliação dos especialistas em direito internacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o alerta que lancei desta tribuna há dois anos vale a pena ser novamente citado. Disse então:

“Nos últimos três anos aumentou de 30 para 41 os países que estão utilizando crianças como soldados em guerras, missões militares diversas e conflitos civis. Esse número de crianças chega a 300 mil. Tal informação faz parte de um relatório divulgado por uma coalizão internacional de entidades criada para pôr fim ao uso de crianças como soldados. Segundo o relatório, a África é o continente que mais utiliza crianças como soldados”.

Na oportunidade, registrei que a estimativa era de que, naquele continente, o número de soldados mirins fosse aproximadamente de 120 mil. A situação mais alarmante era a da Birmânia, com 50 mil. O número de crianças usadas como soldados está diretamente relacionado às guerras civis. Na África, elas são obrigadas a vigiar minas de petróleo e diamantes que os rebeldes africanos usam para financiar suas ações.

Já naquele discurso mencionei que “aqui, na nossa América do Sul, na vizinha Colômbia, onde os conflitos permanecem constantes, o número de crianças soldados também se mantém alto. Usadas nas linhas de frente dos combates, elas trabalham também como carregadores e escravos sexuais”.

Infelizmente, de lá para cá, a situação piorou.

Lembrei, naquela oportunidade, que os países continuavam recrutando crianças para o combate devido às suas “qualidades” infantis “que os fazem baratos, prescindíveis e fáceis de treinar para que matem sem temor e obedeçam sem questionar".

A guerra viola todos os direitos de uma criança, tais como o direito à vida, o direito de estar com a família e com a comunidade, o direito à saúde, o direito ao desenvolvimento da personalidade e o direito à proteção e à educação. Tais crianças jamais conheceram outro tipo de vida, crescendo no meio de guerras civis, guerrilhas ou longas ocupações de um exército estrangeiro. Por mais miseráveis que sejam, os conflitos invertem suas perspectivas. Separam-se de suas famílias ou se perdem, quando invasões ou “limpezas étnicas” os obrigam a tomar a estrada como refugiados ou pessoas deslocadas.

Milhares dessas crianças são mortas, ficam incapacitadas ou órfãs, traumatizadas pelo que vêem.

É chocante saber que em pleno século XXI, quando a Humanidade rompe a barreira de diversas conquistas científicas e tecnológicas, centenas de milhares de crianças em todo o mundo ainda são obrigadas a participar de matanças.

Muitas dessas crianças, pelo que registram os relatórios internacionais, são deliberadamente mortas por forças de segurança e grupos de oposição armada, quer como retaliação, quer para provocar a ira de comunidades rivais. Podem também ser mortas e torturadas em virtude do lugar onde vivem ou por outras motivações selváticas: política, religião ou origem étnica. Algumas, especialmente meninas, são escolhidas para abusos sexuais.

É bem verdade que no Brasil os conflitos éticos, religiosos ou de outras motivações, envolvendo crianças, ocorrem episodicamente em determinados lugares, mas em proporção insignificante se comparados com os que estão sendo narrados neste discurso. Centram-se principalmente nos grandes núcleos urbanos, onde meninos e meninas são recrutados pelo tráfico de drogas ou utilizados em trabalhos não condizentes com as suas idades.

Mas, aos poucos, a sociedade brasileira, através da sua representação política, vai encontrando as soluções que correspondam aos anseios pela formação de gerações que, amantes da paz e da liberdade, darão continuidade aos nossos foros de país moderno e de alto desenvolvimento social.

Era o que tinha a dizer.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/09/2003 - Página 29466