Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Desencontro entre o discurso do PT na campanha e as ações tomadas no governo.

Autor
Lúcia Vânia (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Lúcia Vânia Abrão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Desencontro entre o discurso do PT na campanha e as ações tomadas no governo.
Publicação
Publicação no DSF de 02/10/2003 - Página 29838
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • CRITICA, INCOERENCIA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DISCURSO, PERIODO, ANTERIORIDADE, ELEIÇÕES, PROVOCAÇÃO, DISSIDIO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PREJUIZO, POPULARIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, FAVORECIMENTO, PERDA, CONFIANÇA, MERCADO INTERNACIONAL, CAPACIDADE, GOVERNO, MANUTENÇÃO, ESTABILIDADE, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), EXERCICIO, OPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ESCLARECIMENTOS, AUSENCIA, INTERESSE, PREJUIZO, GOVERNO, MANIFESTAÇÃO, PRIORIDADE, LEGENDA, DEFESA, POPULAÇÃO.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “o vínculo da autoridade constrói-se a partir de imagens de força e fraqueza; é a expressão emocional do poder”.

Recorro a uma simplificação do pensamento de Richard Sennett para compreender o Brasil do Presidente Lula, que completou nove meses. O mestre inglês articula conceitos da psicologia e sociologia para explicar o que se passa nos corações e nas mentes em relação à imagem da autoridade nas sociedades modernas.

É fato que nascemos todos carentes de autoridade. É uma necessidade fundamental do ser humano desde a infância. Ainda que seja para contestá-la, pelo temor de que se cerceie a nossa liberdade. Sentimos o desejo natural de orientação, segurança e estabilidade. Da capacidade superior de julgamento.

Quando autoridade e legitimidade caminham juntas, a resposta à liderança é quase voluntária. Já quando falta legitimidade, as pessoas se recusam a seguir aqueles que consideram contraditórios. Ignorar ou questionar lideranças é um dos sinais de reação ao fosso entre o discurso messiânico do PT de palanque e as ações palacianas do PT de terno e gravata. O resultado é o constante desencontro de opiniões entre os que estão no poder.

Ao fim de um novo mês de Governo, o nono mês de Governo, cresce a sensação de falta de unidade da equipe do Governo e a concentração de autoridade por um pequeno grupo. Como se houvesse três governos: um do Presidente, dono de inegável carisma e capacidade de conquistar as platéias com seu discurso sincero, outro que pilota o rolo compressor para impor a sua vontade ao Congresso e ao País e que estimula o troca-troca partidário e um terceiro, integrado pelo PT e por aliados que fazem oposição ao Governo, contesta propostas e projetos, aumentando as divergências entre todas as instâncias do poder.

Na verdade, o excesso de vozes de comando em estratégia se traduz na falta de comando.

As manchetes sobre desencontros de opiniões, desmentidos e turbulências na negociação das reformas, cujo ímpeto foi freado com competência pela oposição, tem como pano de fundo um triste cenário: a queda na atividade industrial, enquanto os bancos obtêm lucro fundamental, o desemprego recorde de 13% e a crescente tensão rural.

Com tantos desafios, o País precisa fortalecer os canais institucionais de negociação e participação popular organizada em diversas instâncias, inclusive no Congresso, capazes de mediar a diversidade de conflitos e amadurecer o debate. Assim não se improvisam prioridades, como a defesa dos transgênicos, surpreendendo os próprios integrantes do Governo.

Talvez isso explique o resultado da pesquisa Ibope/CNTI apontando a queda de confiança no Presidente Lula. Não é de estranhar o fortalecimento do coro dos que já atestam a incapacidade de governar do PT, nem a crescente desilusão de quem acreditou em suas propostas. Assim, a autoridade legítima vem deixando de ser reconhecida.

Na verdade, crises sempre existiram e representam oportunidade para estabelecer pactos e propor novos comportamentos e valores. O que a sensibilidade dos mercados não digere é o excesso de sinais confusos emitidos pelo Governo e a maneira contraditória como lida com a complexidade do País, com a máquina administrativa e com a pressão dos movimentos sociais, em especial o MST.

Os movimentos sociais, que não se submetem ao controle do Governo, mas atuam exatamente em oposição a situações indesejadas, são essenciais à oxigenação da sociedade e ao regime democrático. Exigem negociação permanente, ampliação de direitos e também limites e deveres. Portanto, é mais que natural a tensão entre a ordem estabelecida e as demandas de grupos organizados.

A chegada do PT ao poder potencializou as expectativas de mudanças profundas no Brasil. Por isso a sociedade se frustra quando o PT hoje no poder vira pelo avesso o discurso de oposição ferrenha, que impediu avanços sociais significativos nos últimos oito anos, como alguns petistas já reconhecem.

Concordo com o Presidente quando diz que não tem o direito de errar. Por isso cabe um alerta à falta de coesão interna dos que chamei aqui de três poderes, o Presidente, os que dão e impõem ordens e o Partido.

Passados nove meses de Governo, a constante mudança de discurso e a imposição da vontade de poucos, num Governo que se anunciou democrático como nunca, decepciona a todos.

Não se pode ignorar que promessas e planos não cumpridos acirram ainda mais os ânimos e roubam a esperança dos que votaram em mudanças radicais e de prioridades: o social antes do econômico.

É fato que o desemprego tem agravado a tensão social. Aos eleitores que votaram na “obsessão do emprego” resta a decepção de um crescimento recorde, que atinge de forma mais dramática os nossos jovens. Por conseqüência, a atividade econômica estagnada leva à redução de pagamento de impostos, o que inviabiliza a vida de Estados e Municípios.

Na oposição, o PT sempre estimulou todo tipo de demanda social e de investimentos públicos em políticas sociais. Mas é com desalento que constatamos a redução do Orçamento para a prometida unificação dos programas sociais.

Srªs e Srs. Senadores, a campanha eleitoral fortaleceu a mensagem “tudo vai ser diferente”. Encontram-se agora mobilizadas forças de todo tipo, à espera de atitudes firmes que apontem para a solução do desemprego e da falta de ação na área social. Não há mais tempo ou espaço para discursos sobre o passado nem explicações sobre falta de recursos devido à situação econômica internacional.

O que se espera é o exercício pleno da autoridade. Já é tempo de o Governo sincronizar sua agenda com a da maioria da população, que certamente tem outras prioridades além das reformas.

Cabe ao Governo apontar como iremos vencer o desemprego, a violência, a falta de moradia, as deficiências na educação e na saúde. Queremos debater nosso projeto de país e não ser governados aos solavancos por uma colcha de retalhos de medidas improvisadas diante de cada turbulência, do contrário, seremos condenados a um vácuo de autoridade.

Minhas colocações não têm o intuito de agravar ou exacerbar uma crise prematura a menos de um ano de Governo e, sim, de alertar para a necessidade urgente de discutir e trabalhar efetivamente pela governabilidade. Este País custou a conquistar a democracia. E o papel do PSDB nessa luta é inquestionável. Estivemos ao lado do PT em diversos palanques e movimentos sociais. Não temos sequer o direito de torcer para o “quanto pior melhor”. Ao contrário.

No Congresso, demonstramos, nesses nove meses, nossa firme disposição de aperfeiçoar projetos encaminhados pelo Executivo, como o cartão alimentação e a proposta de Orçamento. Emendas do PSDB foram oferecidas no sentido de melhorar a Reforma da Previdência. No Senado, o clima cordial entre Governo e Oposição não apequena o debate político nem mascara a divergência de opiniões.

Os Governadores do PSDB, por sua vez, não se furtam a participar de reuniões e negociar com o Planalto, como fizeram ontem, em relação à unificação de programas e à Reforma Tributária. Demonstramos, assim, nossa responsabilidade e nosso compromisso com objetivos maiores, apesar das interpretações equivocadas de que estamos sem rumo na Oposição.

Rumo sempre tivemos. Nosso programa o aponta claramente. Temos, sim, enorme apreço pela democracia e compromisso com o Brasil, como atestam nossa história e a experiência política e administrativa em oito Estados e em mais de mil prefeituras. Não somos incendiários à espreita das contradições do Governo para fazer chantagem ou desestabilizar as instituições.

Nem podemos cruzar os braços a cada incidente alardeado como ameaça ao regime democrático, seja ele provocado por movimentos sociais ou corporativos.

A autoridade do Governo e das instituições paira acima das divergências partidárias. Maior do que o PT ou o PSDB é a Nação brasileira.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/10/2003 - Página 29838