Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Repúdio a empresários inescrupulosos que usam o trabalho escravo no Brasil.

Autor
Valmir Amaral (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/DF)
Nome completo: Valmir Antônio Amaral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Repúdio a empresários inescrupulosos que usam o trabalho escravo no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 02/10/2003 - Página 29842
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, TRABALHO ESCRAVO, BRASIL, REGISTRO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, SOLUÇÃO, PROBLEMA, ESPECIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, PLANO NACIONAL, ERRADICAÇÃO, TRABALHO, AUSENCIA, REMUNERAÇÃO.
  • REPUDIO, EMPRESARIO, FAZENDEIRO, UTILIZAÇÃO, TRABALHO ESCRAVO.

O SR. VALMIR AMARAL (PMDB - DF. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho por costume e gosto de falar nesta tribuna sobre acontecimentos ou ações que tenham como principal objetivo a melhoria da qualidade de vida da população brasileira, e em especial, a brasiliense.

Algumas vezes ocupo a tribuna para questionar atitudes ou providências tomadas por agente ou órgão público, por entender que aquela ação foi inadequada, ou, no mínimo, merecedora de melhor análise.

Mas, desta vez, não posso ficar calado, não posso me furtar de expressar o meu sentimento de incredulidade, de espanto e de repúdio diante de acontecimentos recentes, os quais considero agressivos a toda sociedade brasileira e uma afronta extrema ao princípio maior da convivência humana. O princípio é a liberdade e a afronta a escravidão.

Sem dúvida alguma a maior vergonha que o homem pode sofrer é a de ser escravizado, ou estar em condição análoga à de escravo. É, também, uma ofensa a toda humanidade.

Vejam bem, Srªs e Srs. Senadores, passados mais de cem anos da assinatura da Lei Áurea, a escravidão ainda é manchete de jornais, revistas e, pior, ainda é atividade mercantil e utilizada por empresários oportunistas e desprovidos de qualquer outro sentimento senão o da cobiça como forma de assegurar uma mão de obra sem custo algum.

Segundo a Comissão Pastoral da Terra, hoje, no Brasil, vinte e cinco mil pessoas são consideradas escravas ou vivem em condições semelhantes à de escravos.

Vinte e cinco mil! Srªs e Srs. Senadores, é importante frisar que o Governo está fazendo sua parte, tanto que é prioridade a erradicação de todas as formas atuais de escravidão, e para isso foi criado o Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo. Vale aqui destacar o Grupo Especial de Fiscalização Móvel, do Ministério do Trabalho e Emprego, cuja atuação já tem mostrado resultados.

Vinte e cinco mil brasileiros em condições análogas à de escravo ou escravizado. Um absurdo inominável.

Mas como alguém se torna escravo nos dias de hoje? Como é possível? Podem até pensar alguns ouvintes, em decorrência do absurdo da palavra, ao concretismo do que deveria ser termo abstrato. Trabalho escravo.

Há de se perceber que a escravidão de hoje diferencia-se daquela conhecida nos livros de história, mas mantém o mesmo perfil de crueldade, de submissão, de humilhação de um ser humano por outro, se é que podemos considerar do ponto de vista racional aquele que escraviza como humano.

Procurando por emprego essas pessoas acabam aliciadas por contratadores de mão-de-obra, chamados “Gatos”, que trabalham para empresários inescrupulosos. São iludidos com a promessa de trabalho e dinheiro, inclusive com moradia, comida, assistência médica... etc. Tudo feito para enganá-lo.

Então, a pobre vítima é levada de ônibus, até mesmo em caminhões, sem a mínima condição de segurança, até o local de trabalho.

            A ilusão termina com o fim da viagem. Nem bem chega e o agora infeliz e desiludido trabalhador percebe que foi enganado. O transporte gratuito agora custa um determinado valor, a comida, a roupa, o remédio, a bota, o dormitório, a pilha do rádio, tudo tem um custo e vai sendo anotado pelo Gato. Resumindo, Srªs e Srs. Senadores, quanto mais esse cidadão trabalhar, mais vai dever. Não pode sair sem pagar a dívida, que é impagável e corrupta. Imoral.

Inicialmente o peão acredita que deve pagar seu compromisso, pois são homens de honra, acostumados a fazer acordos pelo fio do bigode, como diziam os antigos.

Quando percebem a arapuca e querem ir embora, capangas fortemente armados mostram a dura realidade. Agora são escravos.

Sr. Presidente, é algo indigno. Absurdamente indigno.

Pergunto: O que vai acontecer com esses senhores feudais que escravizam em pleno século XXI? Respondo: Não sei. Mas sei o que deveria acontecer: deveriam ser processados para se apurar a verdade, e condenados, se verídica a acusação. Srªs e Srs. Senadores, o Brasil está mudando e acredito piamente na ação do Ministério Público.

Pensei em uma proposição que atingisse as propriedades onde houvesse trabalho escravo da mesma forma que atinge aquelas propriedades usadas pelo crime organizado do tráfico de drogas. Mas ela já existe, trata-se da PEC 57, de 1999, da lavra do ex-Senador Ademir Andrade, que hoje está na Câmara dos Deputados como PEC 438, de 2001, encontrando-se na CCJR desde 1º de agosto deste ano aguardando parecer.

Finalizo reiterando o meu repúdio, a minha decepção em saber que empresários inescrupulosos estão enriquecendo assim, dessa maneira criminosa, que envergonha também todo o Brasil, afirmando que não me calarei diante de aberrações como esta - a escravidão contemporânea.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/10/2003 - Página 29842