Discurso durante a 139ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Protestos contra o posicionamento do Presidente Lula de apoiar a proposta da representante da Organização das Nações Unidas - ONU, para direitos humanos, de inspeção no Judiciário brasileiro. (como Líder)

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SOBERANIA NACIONAL. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Protestos contra o posicionamento do Presidente Lula de apoiar a proposta da representante da Organização das Nações Unidas - ONU, para direitos humanos, de inspeção no Judiciário brasileiro. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 10/10/2003 - Página 31026
Assunto
Outros > SOBERANIA NACIONAL. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REGISTRO, APOIO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROPOSTA, INSPEÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), JUDICIARIO, BRASIL, CRITICA, ORADOR, INTERVENÇÃO, SOBERANIA NACIONAL, SUSPEIÇÃO, CONFLITO, PRESIDENTE, EXECUTIVO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
  • CONTRADIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RECUSA, RECEBIMENTO, DISCUSSÃO, RELATORIO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SITUAÇÃO, DIREITOS HUMANOS, BRASIL.
  • DECLARAÇÃO, POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), OPOSIÇÃO, INTERFERENCIA, SOBERANIA, BRASIL, CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PREJUIZO, DEMOCRACIA.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não gosto de trabalhar com a idéia de dois pesos e duas medidas. A justiça só é justa se é impessoal. Disso não escapa nenhuma pessoa que se cinja aos limites do bom senso.

Trago mais uma demonstração de incoerência deste Governo: dois pesos e duas medidas. “O Judiciário como alvo. Relatora da ONU propõe inspeção na Justiça brasileira, e o Governo Lula apóia” é o título de matéria de página inteira do jornal O Globo.

Não discuto o valor, a honradez, a boa intenção da Srª Asma Jahangir, mas entendo que ela não tem o direito de intervir no Judiciário brasileiro - não tem. Trata-se de Poder independente e o Brasil não está sob intervenção internacional. Isso depõe até contra o Governo Lula, porque, afinal de contas, o Brasil está ou não está vivendo um clima de normalidade? Portanto, é descabida a pretensão da ONU - se for da ONU -, da Delegada da ONU - se for da Delegada da ONU -, de quem quer que seja a idéia de que alguma instituição neste País esteja a carecer de intervenção de fora para dentro. Não precisa nem de dentro para dentro. Os Poderes estão funcionando, o Brasil está em normalidade e dispensa esse tipo de ajuda que a nós nos humilha e a nós nos define; e não aceitamos essa definição como República bananeira, como cubata africana, como país sem foro e civilização sem amadurecimento democrático.

O mais estarrecedor é o fato de o Presidente Lula apoiar. Apoiar o quê? O Presidente Lula acha que o Judiciário não está funcionando? Ou o Presidente Lula está ainda zangado com o Presidente Maurício Corrêa, do Supremo Tribunal Federal, e vai levar esse sentimento pequeno, canhestro, mesquinho e medíocre até o momento em que o Supremo deixe de existir? O Presidente Lula está errado, porque abre uma exceção. E Sua Excelência que se vangloria tanto de trabalhar o Brasil como uma entidade soberana, está aqui a se curvar a uma pressão externa; está aqui a se ajoelhar diante do que imagina ser um Poder legítimo - e não é - para intervir sobre o Judiciário brasileiro.

Quais são os dois pesos e as duas medidas?

O mesmo jornal O Globo, em outra matéria, na página seguinte, diz: “Governo recusa relatório dos EUA sobre direitos humanos”. E aí o Presidente Lula considera ilegítimo, na mesma audiência em que Sua Excelência concedeu à Srª Asma Jahangir, se recusa a receber e a discutir o relatório sobre a situação dos direitos humanos no Brasil, produzido pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América.

O Presidente está errado ao dizer que a questão dos direitos humanos no Brasil não é assunto para ser tratado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos? Sua Excelência não está errado. Sua Excelência está certo. E, aqui, a Oposição, o PSDB, sem dúvida alguma, hipoteca o Presidente em inteira solidariedade. Sua Excelência não tem que se cingir nem se jungir; nem se ajoelhar diante de pressões, venham de onde vierem, para que assuntos brasileiros sejam resolvidos - e só podem sê-lo se isso for feito dentro das leis brasileiras e sob o crivo do mais restrito respeito à soberania nacional.

Por outro lado, o mesmo Presidente Lula, que rejeita o relatório dos Estados Unidos sobre direitos humanos, diz que “é mesmo justo e legítimo que a relatora da ONU, Srª Asma Jahangir, proponha inspeção na Justiça brasileira”, como se, na verdade, Sua Excelência respondesse pela soberania nacional, a razão inteiramente à Sua Excelência lhe assistisse e não coubesse ao Judiciário nem o direito ao amor próprio nem o direito à legitimidade, muito menos o respeito que o Poder independente deve ter.

O PSDB, pela minha voz, pela voz de sua Liderança, repudia, de maneira veemente, o que me parece um gesto oportunista do Presidente Lula. Quando é o de Sua Excelência, sobre o relatório dos Estados Unidos, não serve; Sua Excelência está certo. Não serve mesmo, que o Departamento de Estado americano venha nos dizer o que fazer a respeito deste ou de qualquer tema. Mas é oportunista Sua Excelência imaginar que é possível haver intervenção no Judiciário.

O Presidente Lula precisa parar com o que me parece uma criancice: a de levar brigas pessoais e sentimentos menores para dentro de uma questão tão importante e tão forte do ponto de vista da sua repercussão no Estado brasileiro.

Sem personalizar, sem “fulanizar”, o Presidente deveria, em primeira instância, ter dito, à Srª Asma Jahangir que a ONU não é legítima para interferir sobre o Judiciário brasileiro, como os Estados Unidos não são legítimos para dizer se o Brasil cuida ou não cuida bem de sua política de direitos humanos. Quando o Presidente diz que com Sua Excelência não pode, porque Sua Excelência é o Presidente de um Estado soberano, e ao mesmo tempo Sua Excelência endossa a tese de intervenção no Judiciário, o Presidente Lula, isso me põe inquieto, porque me passa a impressão de alguém que não superou os limites da luta sindical, não superou os limites da luta contra quem quer seja, pensa que ainda está em eleição e divide o mundo de maneira maniqueísta entre amigos e inimigos. Os inimigos de Sua Excelência têm que ser destruídos - e Sua Excelência, infelizmente, parece que considera o Judiciário um Poder inimigo. E Governante que considera o Judiciário Poder inimigo é Governante que talvez esteja sonhando com a autocracia; talvez esteja incomodado com a democracia; talvez esteja incomodado com o fato de seu Poder ter limite. O Presidente Lula tem que ouvir do Judiciário, da Nação brasileira e do Congresso, pela nossa voz, algo bem claro: “Presidente Lula, o Senhor não é dono do Brasil. Seu poder tem limite, sim. Seu limite é a lei. Se precisar, o Senhor será julgado por este Congresso ou pelo Judiciário. O Senhor não está acima da lei; e o Senhor, portanto, não agiu com um Chefe de Estado ao minimizar e humilhar o Poder Judiciário brasileiro perante alguém que supostamente representa um poder internacional. Poder internacional, para além das nossas fronteiras. Dentro do Brasil, mandamos nós, manda Vossa Excelência, manda o Congresso e manda o Judiciário, em igualdade de condições. Fora isso, Senhor Presidente, é Vossa Excelência marchar no rumo incerto, lamentável, mesquinho, canhestro e medíocre da insensatez.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/10/2003 - Página 31026