Discurso durante a 140ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a tramitação, nesta Casa, de proposta de emenda à Constituição paralela à reforma da Previdência.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Preocupação com a tramitação, nesta Casa, de proposta de emenda à Constituição paralela à reforma da Previdência.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/2003 - Página 31213
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • APREENSÃO, TRAMITAÇÃO, SENADO, ALTERNATIVA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, SIMULTANEIDADE, EMENDA, INICIATIVA, EXECUTIVO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • QUESTIONAMENTO, NATUREZA JURIDICA, IRREGULARIDADE, TRAMITAÇÃO, ELABORAÇÃO, ALTERNATIVA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, vou falar - e não tenho como me omitir num momento como este - sobre a chamada PEC paralela à reforma da previdência.

Não discutirei aqui o mérito do que está técnica e conceitualmente escrito na chamada PEC alternativa. Preocupa-me o fato de ser essa PEC uma inovação - vou provar aqui no meu pronunciamento -, e essas inovações podem fazer com que o que hoje é uma exceção se torne uma regra permanente na vida do nosso Congresso Nacional, que é o símbolo maior da democracia.

Sr. Presidente, o Senado Federal foi surpreendido ontem - eu, pelo menos, fui - com a apresentação de uma emenda paralela à Proposta de Emenda à Constituição nº 67, de 2003, que trata da previdência.

A nova emenda não é paralela. Paralelas, para mim, são duas vias no mesmo sentido. Se ela fosse paralela, em primeiro lugar, teria que tramitar efetivamente junto à outra. Nem isso ela faz, não tramita junto. A PEC que veio da Câmara tramitará com urgência urgentíssima de forma natural, e a PEC dita paralela virá atrás, entrará na vala comum. Assim, nem paralela ela é, em primeiro lugar. Estive estudando com todo carinho o tema. Para ser paralela, ela teria de ser votada no mesmo dia e na mesma hora tanto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, como no plenário do Senado. Não irá acontecer isso. Essa é a primeira consideração.

Ontem, participei de uma reunião com os líderes do movimento sindical e da chamada Frente Parlamentar em Defesa da Previdência, que pediram que os Senadores retirassem essa proposta e continuassem fazendo o bom debate sobre a proposta de emenda constitucional que veio da Câmara dos Deputados.

Sr. Presidente, a PEC nº 67 será votada em primeiro lugar. Depois é que virá a PEC nº 77. Por isso, digo que ela não é paralela, como era a idéia original - pelo que sei - daqueles que a orientaram. Haveria sentido, no campo político, se efetivamente ela circulasse de forma paralela. Por isso, entendo que seja correto a sugestão aqui apresentada, que o Plenário vai decidir, de que no mínimo ela seja anexada à PEC nº 67. Isso para mim tem mais lógica.

Além disso, a nova PEC não tem sentido e vou explicar o porquê: a proposta não se apega a uma norma já existente, mas, sim, à expectativa de uma norma que hipoteticamente poderá ser aprovada, que é a PEC nº 67.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, encaminhei a dois juristas, para estudo, a PEC ora apresentada. Eles me responderam o seguinte: como fazer uma emenda à expectativa de uma proposta de emenda constitucional que virá a existir um dia? Há apenas uma expectativa. Inclusive a redação dada, se essa for a intenção, é equivocada, porque ela tenta se adaptar à PEC nº 67 como se ela já estivesse aprovada. Como encaminhar uma proposta a um corpo que inexiste? Eu tenho que encaminhar uma proposta de emenda à Constituição, se quero alterá-la Mas observem a forma como essa proposta foi redigida: como se estivesse se enquadrando à PEC nº 67! PEC, como o próprio nome diz, é uma proposta de emenda à constituição. Não é algo escrito na Constituição.

A forma como foi redigida, aliás, cria alguns hiatos. Por exemplo, está lá: “Acrescente-se o art. 21, anexado ao art. 20”. Só que, na Constituição atual, não existe o art. 20; só existe na PEC nº 67. Vai haver uma enorme confusão.

Quando apresentei o Estatuto do Idoso, Sr. Presidente, tive uma preocupação. Ele foi amplamente discutido nas duas Casas, mas eu tinha uma correção a fazer. O que fiz? Esperei que o Estatuto do Idoso fosse sancionado - e sei que o Senador Heráclito Fortes também tem uma proposta - para, então, fazer uma emenda, porque aí já existe o corpo, existe o processo, existe a lei.

Nesse caso da PEC, não, Sr. Presidente! Eles estão fazendo uma emenda a uma expectativa de que a Constituição no futuro vá contemplar a redação ora escrita na PEC. Portanto, estaríamos diante de uma inovação em nosso ordenamento jurídico, que seria propor a alteração de uma norma inexistente - estou pegando o campo jurídico, não estou entrando nem na questão regimental. Estamos propondo alterações a uma norma inexistente.

Vou citar um exemplo: A PEC nº 77 prevê a criação dos §§ 21 e 22 do art. 40 da Constituição Federal, já contando que a PEC nº 67 teria incluído o seu precedente, o § 21, a esse mesmo artigo.

Outra situação esdrúxula está no art. 3º da PEC nº 77, que prevê a existência do “art. 4º da Emenda à Constituição ...”. Está escrito assim. Vejam bem Srs. Senadores, porque essa parte é interessante. Não se refere à Constituição. Refere-se à “Emenda nº ....” Ou seja, qual é o número da emenda a que se refere? Não existe. Como é que se vai fazer?

Além de questões jurídicas, enfrentamos, no meu entendimento, a quebra de tradição. A idéia era dividir tarefas. Enquanto a Câmara examinava a reforma da previdência, o Senado cuidaria da questão tributária. Se essa era a intenção na época - e estou pegando o aspecto político, porque, no meu entendimento, poderíamos, sim, já naquela época, começar aqui a discutir a reforma tributária enquanto lá se discutia a reforma da previdência -, não houve entendimento político, embora regimentalmente fosse possível. Quebrou-se esse entendimento e agora podemos fazer essa discussão da previdência para remeter para a Câmara. Não estou dizendo que, regimentalmente, isso não poderia acontecer, mas politicamente não houve acordo. Tanto foi assim que decidimos discutir as duas reformas depois que elas aqui chegassem; depois, nós as mandaríamos de volta para a Câmara, se fosse o caso. Agora, inovou-se de novo o acordo firmado naquele momento.

Sr. Presidente, fica a pergunta: por que, então, agora, fazer o que não pôde ser feito antes? Por que votar separadamente uma PEC aqui no Senado, ainda que ela tenha sentido, já que trata da mesma matéria da PEC que está tramitando e que veio da Câmara? Se a intenção é que a promulgação seja feita na mesma data, por que duas PECs?

Ora, se essa é a boa vontade dos legisladores - e eu entendo até que seja - não há razão para duas PECs. Vamos alterar a PEC da Câmara; ela volta rapidamente para aquela Casa; a Câmara a vota, mediante acordo com os partidos; a emenda é promulgada; e termina a novela.

Eu queria que ficasse claro, Senador Agripino, que não estou discutindo o mérito. Estou preocupado com essa inovação que fere o aspecto jurídico. Isso me assusta! Sou da base do Governo e, no momento, isso pode ser até interessante para a base do Governo, mas é um precedente que se abre. Daqui para frente vão começar a fazer emendas a leis inexistentes. Por exemplo, o Senador José Agripino tem um projeto que trata da estabilidade no emprego e eu apresento um projeto de lei emendando o que ele pretende que um dia se torne lei. S. Exª vai dizer: “Isso é um absurdo, companheiro Paim. Não é por aí. Depois que for lei, V. Exª pode fazer uma emenda à minha lei”.

Vejam aonde chegamos e a razão da minha preocupação.

Mesmo após as explicações, vejo que os Senadores estão procurando entender o que está acontecendo. Calculem então como será difícil para a população lá fora entender! Tratando de um assunto tão importante quanto esse há duas PECs, que não se encontram, mas que também nem paralelas de fato são. Imaginem a confusão que isso cria na cabeça da população!

Concluindo, Sr. Presidente, se aprovarmos separadamente as duas emendas, quem garante que, chegando à Câmara, a PEC nº 77 não será alterada? E, se isso ocorresse, teria ou não que voltar para o Senado? Estou falando apenas do processo legislativo, sem nenhuma preocupação, neste momento, com o mérito da matéria. Vamos aprovar hoje uma PEC e, em seguida, votaremos outra alterando a primeira? Ou seja, vamos fazer para depois desfazer? Como dizia o poeta, “se for para desfazer, porque então não se faz primeiro?”. Ou seja, a confusão está efetivamente montada.

Antes de voltarmos nossa atenção para essa nova PEC, precisamos iniciar neste plenário a discussão das emendas dos Srs. Senadores, inclusive a PEC nº 67, que foram rejeitadas na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, para que as alterações desejadas, Sr. Presidente, sejam feitas dentro das prerrogativas constitucionais do Senado Federal, para que possamos oferecer uma contribuição ao que foi aprovado na Câmara. Vamos submeter a voto cada uma das emendas aqui apresentadas. Eu mesmo apresentei 21 emendas e gostaria que elas fossem discutidas.

Por exemplo, tenho uma posição muito crítica em matéria da regra de transição. Repito - e vou repetir todos os dias, se for necessário - que o trabalhador que começou na atividade lá na Prefeitura de Canoas, perto da minha cidade, ou de Caxias, cidade onde nasci, com 15 anos de idade vai ter que contribuir por 45 anos; enquanto aquele que começou a trabalhar só depois dos 25 anos vai contribuir 35 anos e terá os mesmos direitos. Então, vai chegar o momento em que a conclusão será a seguinte: começo a trabalhar com 15 ou 16 anos, mas não vou contribuir para a previdência. Por que vou contribuir se esse tempo não vai contar para nada? Se vão contar na verdade só os últimos 35 anos de contribuição, por que vou contribuir 10 anos antes?

            É um incentivo à falcatrua; é um incentivo a não contribuir, porque esse tempo não será contado. Só serão contados 35 anos de contribuição. Por isso é que temos que construir uma regra de transição que incentive as pessoas a efetivamente contribuir para a previdência.

Sr. Presidente, termino, convocando a todos para o bom combate, o bom debate em torno da reforma da previdência. Percebo que muitos Senadores preferem discutir a reforma tributária. Respeito-os e acho que é importante. Quero discutir os dois temas. Mas, neste momento, a prioridade é a reforma da Previdência.

Espero que essa PEC paralela, que não é paralela nem alternativa, que trabalha sobre uma expectativa de uma emenda que será aprovada um dia, seja retirada para que as águas voltem ao seu transcurso normal e caminhemos para um grande entendimento. Gosto de insistir com os poetas. Os poetas dizem que as águas do rio, queiram ou não os homens, continuarão sempre em direção ao mar. Que a nossa PEC - essa que está em debate - siga pelo caminho da alteração da Carta Magna. Não vamos inventar outra PEC para alterar uma proposta de PEC que está em debate, como se fossem dois projetos. Existe um único projeto em debate sobre a reforma da previdência. Não se pode fazer com que outra lei altere uma lei inexistente. Posso fazer com que uma lei altere uma lei que existe.

Por isso, faço um apelo ao meu Líder, Senador Tião Viana. Entendo que foi boa a intenção, mas, infelizmente, não tem como continuarmos a insistir com essa PEC paralela.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR PAULO PAIM.

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O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senado Federal foi surpreendido ontem com a apresentação de uma emenda paralela à Proposta de Emenda à Constituição nº 67 de 2003, que trata das alterações nos regimes de Previdência Social.

A nova emenda, que nem paralela é, pois não preenche os requisitos para isso, teve também a recusa da sociedade, que está atônita sem entender o que anda acontecendo nos laboratórios legislativos do Congresso Nacional.

A reação de líderes sindicais à essa nova PEC foi imediata. Ontem mesmo muitos deles, com outros Senadores, realizaram nas dependências desta Casa uma manifestação contra essa PEC dita paralela.

Ela não é paralela porque não teve sua tramitação iniciada com a PEC 67. Da mesma forma, não está tramitando paralelamente. A PEC 67 será votada em primeiro lugar, para depois votarmos a PEC 77. Por isso ela não tem o significado das emendas paralelas.

Além disso a nova PEC também não tem sentido. A proposta não se apega a uma norma já existente, mas sim a uma expectativa ou uma nova norma hipotética como ainda é a PEC 67, que só se existiria após sua aprovação e promulgação.

Portanto, estaríamos diante de uma inovação em nosso ordenamento jurídico, que seria propor a alteração de uma norma inexistente.

Vou citar exemplos. A PEC 77 prevê a criação dos parágrafos 21 e 22 ao artigo 40 da Constituição Federal, já contando que a PEC 67 inclua o seu precedente parágrafo 21 a esse mesmo artigo.

Outra situação esdrúxula está no artigo terceiro dessa PEC 77 que prevê a existência do artigo 4º da Emenda Constitucional nº .......Ou seja, qual é o número da Emenda a que se refere? Ela ainda não existe.

Além das questões jurídicas, enfrentamos a quebra da tradição do processo legislativo. Quando as emendas da Reforma Tributária e da Reforma da Previdência estavam para serem enviadas ao Congresso Nacional, se tentou na ocasião que a Reforma Tributária tivesse sua tramitação iniciada aqui no Senado.

A idéia era dividir tarefas, enquanto a Câmara examinava a Reforma da Previdência o Senado cuidaria das questões tributárias. Isso até que fazia sentido, tendo em vista que o Senado é a Casa das unidades da Federação.

Mas a proposta foi rejeitada porque feria a tradição do processo legislativo, segundo a qual o rito de matéria de iniciativa do Poder Executivo determina que sua tramitação deve ser iniciada pela Câmara.

Por que, então, agora, fazer o que não pôde ser feito antes? Por que vamos votar separadamente uma PEC aqui no Senado - ainda que ela tivesse sentido - que trata da mesma matéria de outra PEC que já está tramitando?

Se aprovarmos separadamente as duas emendas, quem garante que chegando à Câmara a PEC 77 não será alterada? E isso ocorrendo, ela não teria de voltar ao Senado? Qual o tempo de tramitação?

Estou falando apenas de processo legislativo, sem nenhuma preocupação com o mérito da matéria. Por que vamos aprovar hoje uma PEC para em seguida votarmos outra alterando a primeira? Por que vamos fazer, para depois desfazer? Com dizia o poeta, se foi para desfazer, porque que fez?

Antes de voltarmos nossa atenção para esta nova PEC, precisamos iniciar neste Plenário a discussão das emendas dos Senhores e das Senhoras Senadoras à PEC 67 e que foram rejeitadas na Comissão de Constituição e Justiça.

Que as alterações desejadas sejam feitas dentro das prerrogativas constitucionais do Senado Federal para que possamos oferecer uma contribuição ao aperfeiçoamento do projeto aprovado na Câmara e submetido à nossa revisão.

Vamos submeter ao voto cada uma das emendas aqui apresentadas. Eu mesmo apresentei 21 emendas e gostaria que elas fossem discutidas e votadas. Se possível, aprovadas.

Assim é o processo legislativo. Quando se quer aprovar um projeto de lei, uma PEC, submete-se à votação. Enfrenta-se o voto no bom combate. Seja ele favorável ou contrário.

Eu por exemplo questiono alguns artigos da PEC vinda da Câmara dos Deputados. Principalmente as regras de transição, que penalizam os mais pobres, os que entram no mercado de trabalho mais cedo. Terão que contribuir por 45 anos e os mais ricos, 35 anos. E terão os mesmos direitos. Isto não é justo. Isto levará Robin Hood reclamar lá no céu, dizendo “meu Deus, estão invertendo tudo”.

Senhor Presidente quero aproveitar esta oportunidade para saudar desta tribuna os jovens estudantes de Jornalismo da PUC do Rio Grande do Sul Ângela Carneiro e Lucas Azevedo, aqui presentes,que sob a orientação do vice-governador Antonio Dolfeldt um trabalho de conclusão do curso sobre este Senador.

Sob o título “A Construção da imagem de Paulo Paim: de metalúrgico a senador”, os jovens formandos, fazem uma homenagem que me orgulha muito, ao levar para a comunidade acadêmica a trajetória de um metalúrgico, negro, sindicalista, que hoje ocupa, na ausência do presidente José Sarney, a Presidência do Senado da República.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/2003 - Página 31213