Discurso durante a 141ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Risco da importação de pneus usados.

Autor
Papaléo Paes (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Risco da importação de pneus usados.
Aparteantes
Ideli Salvatti, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 15/10/2003 - Página 31327
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, MEIO AMBIENTE, ABSORÇÃO, PNEUMATICO, AUSENCIA, UTILIZAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, AUMENTO, POLUIÇÃO, FAVORECIMENTO, DOENÇA TROPICAL, NECESSIDADE, BUSCA, ALTERNATIVA, RECICLAGEM, PRODUTO.
  • APREENSÃO, IMPORTAÇÃO, BRASIL, PNEUMATICO, MATERIAL USADO, DESTINAÇÃO, REUTILIZAÇÃO, PAIS, AUMENTO, RISCOS, ACIDENTES, REDUÇÃO, DURAÇÃO, PRODUTO, CONTRIBUIÇÃO, POLUIÇÃO.
  • COMENTARIO, POSSIBILIDADE, RECICLAGEM, PNEUMATICO, SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ELABORAÇÃO, POLITICA, GESTÃO, RESIDUO, IMPEDIMENTO, IMPACTO AMBIENTAL.

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a preservação do meio ambiente tem sido uma das minhas preocupações constantes nesta Casa. Em oportunidade recente, tive a chance de comunicar aos nobres colegas o meu assombro quanto ao espantoso aumento da quantidade de lixo produzido no Brasil. Naquele momento, concluí que esse fato exige a implantação de política nacional de controle de resíduos sólidos consistentes.

Os pneus utilizados em veículos automotores são, hoje, uma das grandes preocupações para aqueles que se importam com a preservação da natureza. É verdade que o pneu não pode ser considerado como resíduo perigoso, tal como são as baterias de celulares, por exemplo. Mesmo assim, os pneus são resíduos indesejáveis por várias razões. Vejamos.

A primeira razão é a dificuldade de decomposição do pneu. Ele não é biodegradável. Dessa forma, vejam bem, não existe estimativa de decomposição do pneu ou, em outras palavras, depois de terminado o seu tempo de utilização, o pneu continuará a nos incomodar por muito tempo.

A segunda razão é que os pneus usados ocupam grandes espaços. Como há uma sabida dificuldade em compactá-los, os aterros têm dificuldade de acomodá-los satisfatoriamente. Além disso, quando enterrados, os pneus tendem a subir à superfície.

A terceira razão é que os pneus podem, como todos estamos cansados de saber, servir de abrigo para a criação de insetos causadores de doenças. O exemplo mais conhecido, para nós, brasileiros, é o do mosquito da dengue. Nos últimos anos, lamentavelmente, como pudemos verificar por meio de inúmeras reportagens televisivas, os pneus foram responsáveis, em grande medida, pela existência de focos causadores da dengue. Essa doença, em sua forma mais virulenta, causou o óbito de muitos brasileiros.

A quarta razão é a possibilidade de incêndio. Certamente, todos já viram imagens de pneus sendo queimados em manifestações. Em geral, isso ocorre com poucos pneus. Há o risco, é bom lembrar, de incêndios nos aterros onde os pneus estão depositados. A combustão de pneus é de difícil controle. É preciso grande esforço para extingui-la. Tão importante quanto isso é dizer que o pneu, quando queimado, libera substâncias altamente tóxicas, que são prejudiciais tanto para o homem quanto para o meio ambiente.

Essas são as razões que tornam o pneu um tecido indesejado em todo o mundo. No caso do Brasil, existem algumas outras preocupações. Estudos estimam a existência de 100 milhões de pneus abandonados. A cada ano, a esse montante se juntam mais 30 milhões de pneus. Também é uma grave ameaça a possibilidade de importação de pneus usados. Pneus velhos são um problema ambiental sério nos países desenvolvidos. Nos Estados Unidos, por exemplo, são abandonados 240 milhões de pneus por ano! É importante manter a guarda para que o Brasil não se transforme em depósito de lixo dos países do chamado Primeiro Mundo.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP) - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Na legislatura passada, procuramos equacionar esse problema e foi criada uma legislação, só que ela não entrou em vigor ainda, não pegou. No Brasil existe isto: tem lei que pega e tem lei que não pega, parece brincadeira. Uma das soluções seria misturar a borracha do pneu com o asfalto, o que faria melhorar a frenagem e diminuir em 80% o ruído; além disso, a durabilidade do asfalto, em camada menor, é quase três vezes maior do que a do asfalto normal. Fomos visitar, na Califórnia, várias estradas feitas com resíduo dos pneus. Portugal e Espanha também já o utilizaram em muitas estradas. Realmente é um pouquinho mais caro, mas resolve um problema seriíssimo. Quem não está prestando atenção no discurso, está simplesmente olhando, pensa que se está somente falando em pneus. Não. Os pneus são um dos problemas mais sérios deste País atualmente, não só pela dengue, mas pela poluição em todo canto. V. Exª está abordando um problema sério. Deveríamos insistir sobre o que já foi estudado em relação aos pneus. Inclusive, há uma determinação no sentido de que quem vende os pneus tem a obrigação de arrumar um final para eles, seja de que forma for, reciclando-os ou não. Parabéns a V. Exª pelo discurso.

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP) - Agradeço a V. Exª pela participação. Durante o meu pronunciamento, vou fazer uma referência sobre a utilização de pneus usados.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP) - Ouço V. Exª.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Gostaria de parabenizá-lo pelo pronunciamento. Estamos acompanhando, com muita atenção, um encaminhamento que está sendo dado pela Secretaria Nacional da Aqüicultura e Pesca, do Ministro José Fritsch. Nos próximos dias, será realizado um seminário a respeito de recifes artificiais. Existe uma proposta de utilização de pneus, que, se devidamente preparados, não são materiais poluentes. Com a utilização de pneus, de acordo com a forma com que sejam fixados, pode-se realizar um belíssimo trabalho de criação de peixes e espécies marinhas, o que, inclusive, pode servir para o desenvolvimento do próprio turismo, com a prática do mergulho. A Secretaria Nacional da Aqüicultura e Pesca deve realizar esse seminário. Estamos aguardando que o resultado possa ser estabelecido. Inclusive, tínhamos a intenção de trazer esse assunto à baila, como V. Exª o faz neste momento. É gravíssimo esse problema. Embora esse material não seja poluente, não há muito o que se fazer com ele. Com isso, o meio ambiente é atingido. Há essa alternativa da utilização, num país como o nosso, que tem uma costa extensa e um grande potencial turístico. No Nordeste, em Porto de Galinhas, por exemplo, os recifes naturais são grandes atrativos para o turismo. Parabenizo-o pelo pronunciamento. Tão logo a Secretaria Nacional da Aqüicultura e Pesca realize o seminário, teremos a intenção de divulgar o resultado. Entendemos que essa é uma grande alternativa para várias áreas: será benéfica para a área ambiental, no que diz respeito à destinação e utilização do material, como também será incentivadora do turismo, da criação, manutenção e preservação de várias espécies marítimas, inclusive de algumas que estão correndo risco de extinção.

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP) - Agradeço-lhe a participação, Senadora Ideli Salvatti. V. Exª mostra um outra alternativa para o uso desses pneus. Essa é uma grande preocupação para as pessoas que são adeptas ao ecologismo. Incorporo as suas palavras ao meu discurso.

Hoje, apesar de proibida a importação de pneus usados, existe uma brecha legal que permite que países do Mercosul vendam para o Brasil pneus remoldados, ou seja, aqueles que foram reformados para reaproveitamento. Em 2002, foram vendidos, provenientes do Uruguai, 15,4 mil pneus recauchutados. Além disso, liminares judiciais diversas permitiram, também em 2002, de acordo com a Secex - Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, a entrada de 53 mil unidades vindas da Espanha, 35 mil da França, 51 mil do Reino Unido e 22 mil da Itália. Em relação ao pneu usado, é importante também verificar que há pesquisas que indicam que o pneu reformado tem vida útil menor do que um pneu novo. Assim, o pneu reformado se torna lixo em menor espaço de tempo. É de se concluir, portanto, que é duvidosa a resistência, a durabilidade e a segurança desse tipo de material.

Seria engraçado, não fosse trágico para o meio ambiente brasileiro, o teor de algumas dessas decisões. A Juíza Ana Inês Algorta Latorre, por exemplo, negou liminar pedida por Procuradores do Ministério Público para proibir a importação de pneus usados e remoldados. Segundo a revista eletrônica Consultor Jurídico, de 4 de setembro último, a Juíza estabeleceu como positivo o fato de que pneus descartados na Europa sejam reaproveitados no Brasil, “pois a questão ambiental deve ser considerada do ponto de vista mundial e não local”. Não me cabe, obviamente, questionar quaisquer decisões judiciais. Parece-me, porém, preocupante que parcelas esclarecidas da população considerem o Brasil bom depósito para o lixo dos europeus.

A rigor, o pneu não é verdadeiramente passível de reciclagem. Ele é composto de uma estrutura química bastante complexa, formada por borracha, aço, náilon ou poliéster. Como é resultado da aglutinação desses componentes por meio da vulcanização, é impossível reciclá-lo. É possível e desejável, porém, a recuperação e reutilização do pneu. Para tanto, existem hoje quatro alternativas viáveis.

A primeira possibilidade de utilização do pneu é como combustível em fornos de fábricas de cimento. Entretanto, esse processo tem algumas limitações. A principal é que os fornos destinados à tarefa de queimar pneus devem sofrer adaptações. Assim, essa utilização ainda é um tanto quanto limitada.

A segunda possibilidade é o uso do pneu como matéria-prima do asfalto, já referida aqui pelo Senador Ney Suassuna. Existem diversos centros tecnológicos pesquisando a possibilidade dessa reutilização para os pneus. Em primeiro lugar, essa alternativa é boa do ponto de vista ecológico, porque dá uma destinação aos pneus usados. Em segundo lugar, reduz os custos de manutenção das rodovias. Os pneus são misturados com petróleo e formam o produto que dá origem à mistura asfáltica, o popular asfalto.

A terceira possibilidade é a utilização dos pneus em artefatos de borracha. Essa utilização ainda é bastante limitada, porque não existe demanda suficiente por parte da indústria.

A última alternativa é o reaproveitamento do pneu como óleo combustível. A Petrobras desenvolveu um método que permite essa utilização. A tecnologia foi desenvolvida pela unidade da empresa localizada em São Mateus do Sul, no Paraná. Com a técnica desenvolvida, é possível usar pneus velhos, combinados com o mineral conhecido como xisto, para gerar óleo combustível. Além de ser ecologicamente boa, a reutilização de pneus velhos serve como fonte alternativa de renda para os catadores de pneus. Na pesquisa-piloto levada a cabo em Curitiba, um pneu velho rendia 30 centavos.

De acordo com a Petrobras, a reciclagem de pneus é tecnicamente viável e pode ser um negócio promissor. A usina existente no Paraná tem capacidade para reutilizar 27 milhões de pneus velhos por ano. Isso representa a quase totalidade de pneus jogados no lixo anualmente.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a destinação de pneus usados é um problema sério e merece, portanto, toda a atenção dos Membros desta Casa. Eu gostaria de concluir este pronunciamento lançando alguns temas para debate.

O primeiro diz respeito à importação de pneus velhos. Não podemos deixar que o Brasil se torne depósito de lixo vindo do estrangeiro. Se pneu velho fosse um bom negócio, os europeus estariam a importá-lo e não a enviá-lo a qualquer custo para países desavisados. Além de nos causar problemas ecológicos, importar pneus significa tirar o emprego de brasileiros nas indústrias de pneumáticos em troca da vinda de lixo para cá.

O segundo problema é quanto à destinação dos nossos próprios pneus velhos. Um meio para conseguir resolver o problema é transformar o reuso de pneus em uma atividade economicamente interessante, tal como ocorre hoje com as latas de alumínio. Tenho fé na criatividade do povo brasileiro para encontrar soluções viáveis.

Aqui, faço referência ao aparte feito pela Senadora Ideli Salvatti, para uma alternativa na área da pesca quanto aos pneus usados.

A natureza é um dos maiores patrimônios do Brasil. Uma das minhas missões nesta Casa é garantir que essa riqueza seja assegurada para as gerações presentes e futuras. Para isso, precisamos, com urgência, definir políticas públicas para a gestão de resíduos como, por exemplo, os pneus.

Era o que tinha a dizer, Srª Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/10/2003 - Página 31327