Discurso durante a 144ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem à Medicina pela passagem do Dia do Médico.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à Medicina pela passagem do Dia do Médico.
Publicação
Publicação no DSF de 18/10/2003 - Página 32823
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, PRESENÇA, MEDICO, SENADO, PRESIDENTE, CONSELHO FEDERAL, CONSELHO REGIONAL, MEDICINA, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • HOMENAGEM, DIA, MEDICO, REGISTRO, HISTORIA, MEDICINA.
  • HOMENAGEM, CIENTISTA, MEDICO, ESPECIALISTA, BRASIL, ELOGIO, ATUAÇÃO, CLASSE PROFISSIONAL, ETICA, BENEFICIO, SAUDE, POPULAÇÃO.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, colegas médicos aqui presentes, registro a presença do Presidente do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal; do Conselheiro Federal do mesmo Conselho junto ao Conselho Federal de Medicina; dos membros do Serviço Médico desta Casa; da esposa do colega Papaléo Paes, também médica; do colega médico Evaldo Carneiro, que é de Roraima - o que me dá muita honra - e atualmente está no Distrito Federal.

Inicialmente, esclareço que esse requerimento - embora pela praxe regimental se diga que é do primeiro signatário e de outros Srs. Senadores -, na verdade, foi assinado por toda a bancada médica do Senado, composta por seis Senadores, a saber: os Senadores Augusto Botelho, Mão Santa, Papaléo Paes, Tião Viana e Antonio Carlos Magalhães e eu. Portanto, seis Senadores médicos assinaram o requerimento de homenagem à Medicina brasileira, pela passagem do Dia do Médico que transcorre amanhã.

Creio ser a primeira vez que se faz uma homenagem especial à categoria no Senado Federal. Individualmente, é certo que vários Senadores - assim como eu - já a prestaram em anos anteriores, por ocasião da passagem do Dia do Médico.

Raros são os profissionais que lidam tão proximamente com a condição humana quanto os médicos, em sua tarefa quotidiana de mitigar o sofrimento e de prolongar a vida do semelhante. Nada mais justo, portanto, que homenageá-los pelo transcurso do Dia do Médico, dia 18 de outubro, também conhecido como Dia de São Lucas, o patrono de nossa categoria.

A atividade médica se confunde, Sr. Presidente, no sentido amplo, com a história da humanidade, porquanto compreende o socorro às dores e enfermidades do homem, desde seus primórdios. A Medicina, tal como a conhecemos hoje, é resultado de uma longa e incessante evolução, cujo ritmo se vem tornando crescentemente mais rápido e admirável nos tempos mais recentes. As novas descobertas e as novas técnicas de diagnóstico e de tratamento apresentam um grau de sofisticação simplesmente inimaginável há algumas décadas.

A história da Medicina ocidental, no entender de Jean Bernard, da Academia Francesa, pode ser dividida em cinco etapas. A primeira remonta ao chamado “período mágico”, no passado mais longínquo, quando se confundia com a religião, com a mitologia, com os rituais. Era, então, exercida por feiticeiros, xamãs ou pajés, que, na realidade, acumulavam as funções de curandeiro e sacerdote das sociedades primitivas.

A prática médica racional, fundamentada no conhecimento empírico, seria inaugurada por Hipócrates, considerado o Pai da Medicina, na Grécia antiga. A partir dele, a Medicina se afastou da mera especulação e da crença religiosa, passando a observar os sintomas, comparar os casos e estabelecer uma relação com os tratamentos a que os homens eram submetidos.

Interessante notar, Srªs e Srs. Senadores e prezados colegas, que a Medicina, desde então, desenvolveu-se em duas vertentes básicas: uma, configurada na observação empírica e na busca de uma formulação do conhecimento; a outra, na concepção ética já então estabelecida por Hipócrates e até hoje repetida pelos formandos de Medicina.

Em que pese a importância dessa etapa, quando se alicerçaram os fundamentos da ciência médica moderna, os tratamentos apresentavam resultados poucos satisfatórios.

Para Bernard, a terceira etapa da história da Medicina se dá num brevíssimo período, de apenas seis anos, entre 1859 e 1865. Ele explica: em 1859, Darwin publica seu livro Sobre a Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural; daquele ano até 1865, Pasteur desenvolve suas importantes experiências, criando a ciência dos micróbios; em 1865, Claude Bernard publica sua Introdução ao Estudo da Medicina Experimental; e, no mesmo ano, o monge Gregor Mendel decifra as leis da hereditariedade.

Diz Jean Bernard, em Esperanças e Sabedoria da Medicina: “Esses seis anos, esses seis gloriosos anos, mudaram mais o destino dos homens que as guerras, batalhas, vitórias, derrotas que enchem os nossos livros de História. Permitiram o surgimento das primeiras vacinas, o nascimento da cirurgia e da obstetrícia modernas. Mas, por um paradoxo particular, durante muito tempo eles tiveram apenas uma pequena influência sobre a terapêutica das doenças”.

O quarto período - esse, sim, terapêutico - inaugura-se em 1936, com a descoberta das sulfas, que teve prosseguimento com a descoberta da penicilina, de outros antibióticos, além dos hormônios. É quando, lembra Bernard, os cirurgiões abrem os corações, os pulmões, os cérebros, quando os hematologistas salvam os recém-nascidos trocando todo o seu sangue. A Medicina se torna eficaz, embora continue empírica.

Srªs e Srs. Senadores, colegas profissionais, ouvintes da Rádio Senado e telespectadores da TV Senado, eis que chegamos à Medicina do século XXI, que Bernard chama de período racional, que se caracteriza por elevada eficácia, inclusive na prevenção de doenças. Na moderna Medicina, as imagens têm um papel fundamental, na forma da radiografia, da ecografia, da tomografia computadorizada, da ressonância magnética. As microcâmeras vasculham o organismo humano. A cada dia se descobrem drogas mais potentes e eficazes, e os transplantes se popularizam: órgãos do corpo humano defeituosos são substituídos por outros. Nas cirurgias, o raio laser substitui o bisturi, e o robô, as mãos do cirurgião. Não bastasse isso, a engenharia genética começa a desvendar os mecanismos das doenças, para sua cura ou prevenção.

Os resultados já obtidos e as projeções de como evoluirá a Medicina num futuro próximo nos dão muitas esperanças de reduzir o sofrimento, de prolongar a vida das pessoas, além de melhorar a sua qualidade. Entretanto, muitos desafios ainda devem ser vencidos. Primeiramente, é necessário lembrar que a própria longevidade do homem implica um desgaste maior do seu organismo no longo prazo, o que, por sua vez, dialeticamente, requereria novos cuidados médicos.

Além disso, há que se lembrar que o grande avanço tecnológico permite tratamentos e cirurgias de alta complexidade e sofisticação, mas a um custo proibitivo para grandes parcelas da população. Esse é um desafio, especialmente para nós, brasileiros, que possuímos uma tecnologia de ponta em diversas especialidades médicas, mas que, ao mesmo tempo, vemos que a maioria da população está desassistida, mesmo das práticas mais corriqueiras.

De fato, Sr. Presidente, a Medicina brasileira é uma das mais avançadas do planeta. O primeiro bebê de proveta brasileiro, uma menina, completou, há dias, 17 anos. Há pouco mais de um mês, especialistas corrigiram uma má-formação na coluna de um feto com 28 semanas de gestação, utilizando a técnica de operação fetal a céu aberto, nunca antes aplicada em nosso País. E, recuando mais alguns meses, aconteceu outra cirurgia inédita, em São Paulo, com a extirpação de um câncer de próstata por um robô, sob a direção de uma competente equipe médica. Esses são apenas alguns exemplos da alta sofisticação da Medicina brasileira. Em algumas especialidades, conseguimos um avanço de tal ordem, que pessoas de todas as partes do mundo procuram tratamento para suas moléstias em nosso País.

Aliás, o Brasil é pródigo no que concerne a grandes vultos da Medicina, e, mesmo correndo riscos de cometer graves injustiças, dada a impossibilidade de citar todos esses expoentes, eu não poderia deixar de citar alguns, como homenagem à categoria médica.

De imediato, vem-me à mente o nome de Osvaldo Cruz, médico e cientista que, entre outros feitos, trabalhou no Instituto Pasteur, em Paris, ao lado de Roux, Nihert, Metchinikoff e outros; que erradicou a febre amarela que assolava o Rio de Janeiro, então Capital da República, no início do século passado; que extinguiu as epidemias de peste bubônica e de varíola; que reformou o Código Sanitário e que remodelou os serviços de higiene e de saúde no Brasil. Diretor do Instituto Soroterápico Federal, levou aquela entidade - hoje Fundação Osvaldo Cruz, em justa homenagem - a ultrapassar sua finalidade de mero produtor de vacinas para se dedicar à pesquisa e à medicina experimental, o que a credenciou a receber a Medalha de Ouro no IV Congresso Internacional de Higiene e Demografia, em Berlim.

Um de seus mais ilustres colaboradores, que depois alçaria vôo próprio, foi Carlos Chagas, médico, pesquisador e sanitarista que erradicou a malária da cidade de Santos (SP), que levantou a carta epidemiológica do Vale Amazônico, que chefiou a campanha contra a epidemia da gripe “espanhola” e que modernizou os serviços sanitários da Capital da República. Desenvolveu as pesquisas para debelar a tripanossomíase, que ficaria conhecida como “doença de Chagas”, e, tendo identificado o agente causador da doença, deu-lhe o nome de Trypanossoma Cruzi, em homenagem a Osvaldo Cruz.

Na mesma equipe, cintilariam outros grandes nomes da pesquisa médica, como Artur Neiva, Adolfo Lutz, Emílio Ribas e Vital Brasil.

Mais recentemente, nossas atenções se voltariam para o médico e Professor Euryclides de Jesus Zerbini, pioneiro dos transplantes de coração na América Latina, idealizador e diretor, por vários anos, do Instituto do Coração, o Incor; para o também cardiologista Adib Jateme, que, aluno de Zerbini, se apaixonaria pela cirurgia cardíaca. Ministro da Saúde em duas ocasiões, Jatene chefia uma equipe que já operou muitos milhares de pacientes, o que o credencia como o cirurgião cardíaco mais importante do Brasil.

Quero também lembrar, já que falamos tanto em CPMF, que foi justamente o Dr. Adib Jatene, quando à frente do Ministério da Saúde, que idealizou, para resolver os problemas da saúde, essa Contribuição Provisória, que está virando definitiva e que, depois, foi modificada de tal forma, que hoje o percentual que se destina à saúde é muito pequeno.

No campo da cirurgia plástica, não há como ignorar Ivo Pitanguy, a cuja clínica afluem pacientes de todas as partes do mundo. Professor convidado em mais de uma centena de instituições, autor de mais de 800 trabalhos publicados em revistas científicas nacionais e do exterior, ele é também o idealizador e fundador do Curso de Especialização em Cirurgia Plástica, que já formou mais de 500 cirurgiões do Brasil e de outros 40 países.

Aqui em Brasília, temos o exemplo do Dr. Aloysio Campos da Paz, Fundador da Rede Sarah e cirurgião-chefe do serviço de Ortopedia. Defensor da tese de que “não basta tratar a doença, é preciso tratar o doente”, Campos da Paz tornou a Rede Sarah uma referência da Ortopedia nacional no mundo.

Sr. Presidente, antes de concluir, eu não poderia deixar de fazer uma homenagem aos médicos do meu Estado, Roraima, e aos médicos de toda a Amazônia, porque exatamente é lá onde vemos o exercício mais difícil da Medicina, porque é lá onde estão, pelo menos até há pouco tempo, os hospitais menos equipados e as populações mais dispersas, mais longínquas, desde os nossos irmãos índios até os caboclos ribeirinhos.

Quero prestar esta homenagem hoje, Sr. Presidente, coincidentemente, quando V. Exª, Senador Augusto Botelho, preside esta sessão, no nome do seu pai, o ex-Deputado Federal e médico ilustre de Roraima, um dos pioneiros da Medicina em Roraima, que morreu no exercício da profissão. Com ele, tive a satisfação de aprender o muito que pude da Medicina que exerci.

E também não posso deixar de me referir à presença aqui do nosso companheiro Evaldo, cardiologista que para lá foi trabalhar pelo Exército brasileiro, pelo 6º BEC, inclusive desbravando mesmo áreas inóspitas. É cardiologista e clínico geral, que terminou casando em Roraima. Cumprimento também a sua esposa e a sua filha, que aqui se encontram presentes.

Como já prevenira, Srªs e Srs. Senadores e prezados colegas, esses são apenas alguns dos grandes expoentes da Medicina brasileira. Ao citá-los, quero prestar minha homenagem a toda classe médica brasileira, aqui incluídos os profissionais anônimos, que, quase sempre, lutando contra a precariedade dos meios disponíveis e com os salários achatados, dão o melhor de si para mitigar a dor do próximo. A esses profissionais que exercem a Medicina como sacerdócio, que delineiam sua atividade profissional pelos parâmetros da ética e do humanismo, a esses profissionais, sobretudo, quero prestar esta simples, mas justa homenagem pelo transcurso do Dia do Médico.

Ressalto também a presença aqui dos nossos colegas do Serviço Médico do Senado, que estão sempre a postos, não só para eventualmente socorrer um Senador, mas todos os servidores da Casa.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/10/2003 - Página 32823