Discurso durante a 145ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários a artigo do jornalista Elio Gaspari, sobre o lançamento do livro Racismo à Brasileira, do escritor Edward Telles.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Comentários a artigo do jornalista Elio Gaspari, sobre o lançamento do livro Racismo à Brasileira, do escritor Edward Telles.
Publicação
Publicação no DSF de 21/10/2003 - Página 32918
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • ELOGIO, TEXTO, PUBLICAÇÃO, IMPRENSA, LANÇAMENTO, LIVRO, ANALISE, SITUAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, BRASIL, REGISTRO, IMPORTANCIA, DISCUSSÃO, APROVAÇÃO, ESTATUTO, DEFESA, IGUALDADE, RAÇA.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, ELIO GASPARI, JORNALISTA, REGISTRO, LANÇAMENTO, LIVRO, ANALISE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, BRASIL.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, neste fim de semana, a maioria dos jornais do País publicou um artigo do nobre e querido jornalista Élio Gaspari, em que registra, com entusiasmo, o lançamento do livro Racismo à brasileira, de Edward Telles.

Sr. Presidente, entendo que esse artigo vem ao encontro do Estatuto de Igualdade Racial, o qual estamos tentando aprovar ainda este ano - estamos trabalhando muito para isso.

É o seguinte o artigo do nobre jornalista, que tem com título “Um grande livro sobre o racismo (in)existente”:

Vem aí um livraço. É “Racismo à brasileira”, do professor americano Edward Telles, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles. Será um demarcador no debate do período pós-blablablá da questão racial brasileira. Ele trata do puro, velho e verdadeiro racismo nacional. Aquele que se disfarçou de branqueamento e democracia racial. Telles localiza na década de 90 o colapso dessas teorias de conveniência e saúda a entrada dos negros no debate. O livro deixa a impressão de que o andar de cima gosta de transformar a questão racial brasileira num eterno seminário em torno da obra de Gilberto Freyre ou de quem quer que seja, desde que os negros fiquem calados. Coisa assim: em 1998, num debate sobre as questões sociais da América Latina realizado em Nova York, um representante do movimento negro nacional disse que o Banco Interamericano de Desenvolvimento devia investir mais nos afro-brasileiros. Foi repreendido pelo representante oficial de Pindorama na reunião: “Eu acho que você não deveria levantar essa questão. Esse é um problema dos Estados Unidos, que não existe no Brasil.” Telles mostra como o andar de cima do Itamaraty ajudou a propagar a idéia da harmonia celestial. Cita o embaixador Celso Amorim, numa reunião em Genebra, em março de 2000: “A essência (do Brasil) como nação se expressa através da afirmativa da mistura étnica e da tolerância”. (Em 1999 havia 1.060 diplomatas e, no máximo, oito negros misturados ao grupo.)

Telles leu os livros, conheceu as pessoas (foi representante da Fundação Ford no Brasil), e é uma fera em demografia. Seu livro chega a machucar:

“O caso brasileiro demonstra que a industrialização pode, na realidade, aumentar a desigualdade no topo da estrutura de classes.”

O progresso não diminuiu a disparidade de renda entre brancos e negros. Pelo contrário. Em 1960, a renda de um homem negro equivalia a 60% da renda do branco.

Em 1976, no auge do Milagre Econômico, caíra para 36%. [Ou seja, houve um prejuízo de quase 50%.] Em 1999, estava em 46%. Entre 1960 e 1999 a diferença absoluta na escolaridade dos jovens brancos em relações aos negros passou de 1,6 para 2.2 anos.

Telles tirou do censo de 1991 uma chocante relação estatística: tomando-se negros e negras que têm irmãos ou irmãs brancas (com pais ou mães diferentes, entenda-se) vê-se que entre os 9 e os 16 anos a percentagem de jovens brancos que estavam nas séries escolares adequadas era superior à dos irmãos negros. A evasão superior escolar, sem sombra de dúvida, era maior entre os irmãos negros e o aproveitamento, maior entre os irmãos brancos.

Telles chega ao seu melhor momento num brilhante capítulo sobre as políticas de ação afirmativa. Ele defende [como eu defendo no Estatuto] um sistema de cotas para o acesso às universidades públicas. O professor compara números brasileiros e americanos de 1960 (quando começaram as cotas nos EUA) e 1996. Em 1960 um branco americano tinha 3,1 vezes mais chances de se tornar um profissional liberal do que um negro. Passados 36 anos, suas chances caíram para 1,6. Em Pindorama [no Brasil] as chances do branco eram de 3,1, em 1960; 36 anos depois elas aumentaram para quatro (4,8 para mulheres).

O argumento de Telles é simples: é lorota a história segunda a qual, no Brasil, há uma base de desigualdade social, mas não há racismo. Afirma Telles que não é somente social, é racismo mesmo. É o racismo que desenha a base da desigualdade.

“Racismo à brasileira” tem a marca das grandes obras: merece ser lido sobretudo por quem se dispõe a contrariá-lo.” Ou seja, sobretudo aqueles que dizem não haver racismo no Brasil.

            Concluo, Sr. Presidente, dizendo que espero que esse grande livro sobre o racismo seja efetivamente lido e discutido, porque a marca dele é “Racismo à brasileira”.

Era isso, Sr. Presidente.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/10/2003 - Página 32918