Discurso durante a 145ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários a editorial do jornal O Estado de S.Paulo, intitulado "Iminência de uma tragédia".

Autor
Reginaldo Duarte (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: José Reginaldo Duarte
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Comentários a editorial do jornal O Estado de S.Paulo, intitulado "Iminência de uma tragédia".
Publicação
Publicação no DSF de 21/10/2003 - Página 32943
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, FALTA, PROVIDENCIA, COMBATE, CRESCIMENTO, CRIME, ZONA RURAL, DEMORA, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, VIOLENCIA, INVASÃO, PROPRIEDADE PARTICULAR, REFERENCIA, DENUNCIA, IMPRENSA, SITUAÇÃO, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN).
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, GRAVIDADE, VIOLENCIA, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, PEQUENO AGRICULTOR, APREENSÃO, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL, RISCOS, AGRAVAÇÃO, CRIME, SEGURANÇA PUBLICA.

O SR. REGINALDO DUARTE (PSDB - CE. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por diversas vezes, o PSDB denunciou desta tribuna a leniência do Governo petista do Presidente Lula em relação à escalada da violência no meio rural. Como de hábito, todas as autoridades responsáveis fizeram ouvidos moucos às advertências. O Governo petista finge que não vê; finge que não ouve as advertências.

Propusemos, inclusive, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para o exame do gravíssimo problema da ação dos sem-terra, acobertada pelo Governo petista do Presidente Lula. Depois, numa evidência clara de que o assunto é delicado, a CPI foi transformada em Comissão Mista do Congresso Nacional. O PT resiste. Finge que não sabe da gravidade do problema. Finge que não ouve nossas advertências.

Hoje, meu partido incorpora-se à denúncia de um dos principais jornais do País, O Estado de S.Paulo. Será que mesmo assim a postura petista vai seguir na base do finge que não vê?

A denúncia veio em editorial do Estadão,e a sua síntese foi feita pelo próprio editorialista: “A omissão do Governo ante as desordens do MST é receita para o desastre.”

De duas, uma: o Governo petista está mesmo mudo ou anseia pelo desastre. Pela receita do desastre, como bem nomeia o Estadão.

Dou um exemplo: na semana passada, depois de receber um telefonema de nosso ex-colega Geraldo Mello, do Rio Grande do Norte, denunciei aqui a invasão, por um grupo de 300 desordeiros do MST, à Prefeitura de Ceará-Mirim.

O Líder do Governo limitou-se a uma rápida resposta, prometendo que, em seguida, traria a este Plenário a palavra do Governo. Não trouxe. 

Para conhecimento, não apenas da Liderança Governista, mas de todo o Senado, aqui vai a descrição daquele ato de puro vandalismo. Abro aspas para um trecho do editorial de O Estado de S.Paulo:

“Um grupo de 300 militantes do MSTinvadiu a Prefeitura de Ceará-Mirim, na área metropolitana de Natal, expulsou os funcionários, hasteou a bandeira encarnada à frente e acima do pavilhão nacional e ateou fogo à porta do prédio - uma construção histórica, de 1889 - tendo a fachada, reformada em abril, ficado chamuscada e as paredes internas escurecidas pela fumaça. Motivo? Os sem-terra reivindicam a construção de postos de saúde e de escolas nos assentamentos existentes na região - o que a prefeita não tem condições de atender, por falta de recursos. Mas o desrespeito não deixou de ser premiado: a superintendência do Incra prometeu mandar consertar dois ônibus, fornecer lonas e combustível e promover a análise de terras para desapropriação em várias cidades do Estado.”

Como diz a denúncia, provavelmente só depois de uma grande tragédia o Governo petista tomará consciência da gravidade da omissão governamental, “que fecha os olhos para o desenfreio dos desrespeitadores da Lei, da ordem pública e dos direitos alheios, travestidos de militantes de movimentos sociais.”

Antes que seja demasiado tarde, é preciso que o Governo comece a governar. Já reclamei isso diversas vezes. Afinal, o Governo não pode seguir nessa sua simplória atitude, fechando os olhos à realidade brasileira.

Não pode também esse mesmo Governo surdo, mudo e cego, seguir entendendo que “Le Roi cest moi”. Assim tem sido, como nesse final de semana, em que Lula, e agora, por incrível que pareça, o presidente do PT, ex-Deputado José Genoíno, reiteraram que o episódio Benedita da Silva “está encerrado e ponto final!” .

Primeiro de tudo, o Presidente não é juiz para sentenciar a absolvição de ninguém. Segundo, onde o presidente de um partido, o PT, foi buscar autoridade para decidir as coisas pelo Governo?

Seria bom que o ex-Deputado entendesse que muito mais valia tem o coro que ecoou da platéia de domingo, no show de Paulinho da Viola, em Brasília. É a voz do povo, Presidente. Ouvi-la faz bem. Desentope ouvidos e aguça a vista.

Requeiro, Sr.Presidente, que a íntegra do editorial de O Estado de S.Paulo passe a fazer parte deste pronunciamento e os Anais do Senado da República.

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ARTHUR VIRGÍLIO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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IMINÊNCIA DE UMA TRAGÉDIA

A "cultura" da violência não se instala de chofre em uma sociedade.

Ela se infiltra aos poucos em todos os espaços abertos pela leniência dos agentes que deveriam zelar pelo primado da lei, até que a aplicação arbitrária da força substitua as formas racionais e civilizadas de dirimir conflitos e evitar tragédias. Esse processo é gradativo: o homem que mata a companheira geralmente a espancou antes, sem ser punido; os grupos que provocam grandes destruições de bens públicos e privados geralmente chegaram lá pelo pequeno vandalismo que não foi contido e punido pela lei.

Estas considerações vêm a propósito da ampla escalada da violência, organizada e simultânea, em vários pontos do território nacional, comandada pelo Movimento dos Sem-Terra (MST) e entidades que lhes são assemelhadas. Os noticiários dos jornais são um verdadeiro "diário da guerra no campo".

Tomem-se os exemplos das ocorrências de um só dia, terça-feira. Um grupo de 300 militantes do MST invadiu a prefeitura de Ceará-Mirim, na área metropolitana de Natal, expulsou os funcionários, hasteou sua bandeira encarnada à frente e acima do pavilhão nacional e ateou fogo à porta do prédio - uma construção histórica, de 1889 - tendo a fachada, reformada em abril, ficado chamuscada e as paredes internas escurecidas pela fumaça.

Motivo? Os sem-terra reivindicavam a construção de postos de saúde e de escolas nos quatro assentamentos existentes na região - o que a prefeita não tem condições de atender, por falta de recursos. Mas o desrespeito não deixou de ser premiado: a superintendência do Incra prometeu mandar consertar dois ônibus, fornecer lonas e combustível e promover a análise de terras para desapropriação em várias cidades do Estado.

Grupos compostos de 100 a 250 manifestantes, do MST e do MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), ocuparam agências do Banco do Brasil nas cidades gaúchas de Pelotas, Santa Maria, Santo Ângelo, Bagé e Livramento, impedindo funcionários e clientes de entrar. Em Porto Alegre, o prédio do Ministério da Fazenda, onde também funciona a Receita Federal, foi tomado às 7 horas da manhã por 800 manifestantes, que só deixavam circular os agentes de segurança. Quem ia trabalhar ou encaminhar documentos era mandado de volta para casa. Motivo? Tratava-se de um "protesto" contra a falta de recursos para plantio e infra-estrutura, contra a lentidão nas vistorias e desapropriações. Com lonas, cobertores e fogões, os manifestantes na sede da Fazenda federal avisaram que vão ficar no prédio "por tempo indeterminado", até o governo federal liberar recursos para o custeio da lavoura e apresentar um programa de assentamento.

No Paraná, membros do MST também acamparam diante de agências do Banco do Brasil, de vários municípios. Motivo? Especialmente para pressionar a Assembléia Legislativa a aprovar projeto de lei que proíbe, do cultivo à comercialização, os produtos transgênicos no Estado, mas também para efetuar um protesto de natureza mais genérica, como o contido na nota divulgada pelo movimento, nestes termos: "Já se passaram dez meses do início do novo governo e até agora não temos nenhuma resposta às nossas reivindicações."

Esses atos somam-se às múltiplas invasões e ocupações que se acumulam em diversas regiões do País, gerando uma permanente tensão no campo e provocando - como não poderia deixar de ser - reações igualmente violentas.

Por exemplo, na região central do Paraná, entre Palmital e Laranjal, a Polícia Federal prendeu oito pessoas, acusadas de porte ilegal de armas e formação de quadrilha, numa operação - a "Paz no Campo" - que apreendeu 50 armas. Só que, segundo depoimento do presidente da Associação de Produtores Rurais de Laranjal, os 100 policiais iniciaram essa operação às 6 horas, prendendo muitos fazendeiros e seus funcionários por porte ilegal de armas, mas chegaram aos acampamentos dos sem-terra somente às 15 horas, dando-lhes, assim, um bom tempo pra escapar... Donde se conclui que o MST e assemelhados têm muito mais noção do alcance da simultaneidade, nas suas operações, do que o pessoal da Polícia Federal...

Será que só depois de uma grande tragédia se tomará consciência da gravidade da omissão do governo, que fecha os olhos para o desenfreio dos desrespeitadores da Lei, da ordem pública e dos direitos alheios, travestidos de militantes de "movimentos sociais"?

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/10/2003 - Página 32943