Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apoio do Presidente Luís Inácio Lula da Silva a criação do programa que tem como modelo o antigo Projeto Rondon.

Autor
Luiz Otavio (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PA)
Nome completo: Luiz Otavio Oliveira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Apoio do Presidente Luís Inácio Lula da Silva a criação do programa que tem como modelo o antigo Projeto Rondon.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/2003 - Página 33076
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, RELEVANCIA, PROJETO RONDON, PERIODO, REGIME MILITAR, VIABILIDADE, JUVENTUDE, EXPERIENCIA, CONHECIMENTO, PROBLEMAS BRASILEIROS, ASSISTENCIA, POPULAÇÃO CARENTE, REGIÃO, INTERIOR, PAIS.
  • REGISTRO, MANIFESTAÇÃO, INTERESSE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRIAÇÃO, PROGRAMA, SIMILARIDADE, PROJETO RONDON.

O SR. LUIZ OTÁVIO (PMDB - PA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, algumas boas idéias postas em prática no passado terminam por retornar por sua própria força e mérito. É o que acontece, hoje em dia, com o ideário do Projeto Rondon, que propiciou valiosas e inesquecíveis experiências aos seus participantes e significativas contribuições ao nosso povo, ao longo de seus 22 anos de existência.

Inspirado na admirável ação do Marechal Cândido Rondon, que percorreu as vastidões abandonadas do interior do País de mãos desarmadas e ânimo patriótico e solidário, o Projeto Rondon permitiu que um grande número de jovens tivesse contato com a realidade mais profunda do Brasil - uma realidade dura, é certo, mas humanamente envolvente e plena de possibilidades de transformação.

Eis a razão pela qual o Projeto Rondon, mesmo tendo sido criado e desenvolvido durante o regime militar, nunca foi instrumento de acomodação ou de conformismo político e social. O próprio espírito inquieto e questionador dos jovens, tanto mais quando alimentado com a prática da reflexão independente do saber universitário, impedia que o projeto se traduzisse em mero assistencialismo.

Não há melhor confirmação disso, Sr. Presidente, do que o fato de que, ainda há pouco, o Presidente da União Nacional dos Estudantes, pediu pessoalmente ao Presidente da República a criação de um programa com o modelo, explicitamente referido, do Projeto Rondon.

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva manifestou seu apoio à idéia, apostando que o programa, por meio de um "choque de realidade", levaria os estudantes a resgatarem valores patrióticos e a se envolverem com os problemas sociais do País. A instituição de um programa governamental que leve professores e estudantes universitários a atuarem junto a comunidades carentes do interior do País já se encontrava, na verdade, em fase de estudos e planejamento.

Por ora, o novo programa, que deve envolver os Ministérios da Integração Nacional, da Assistência e Promoção Social, da Educação e da Defesa, além das universidades federais, não está ainda plenamente configurado. Julgo, Sr. Presidente, que, neste momento, a experiência do Projeto Rondon deva ser detidamente examinada e avaliada, de modo a fornecer parâmetros e idéias relevantes para o programa que se pretende implantar.

Foram 350 mil universitários e 13 mil professores que se dirigiram ao interior do País, no Nordeste, no Centro-Oeste e sobretudo na Amazônia, levando sua vontade de colaborar, seus conhecimentos e seu trabalho, recebendo, em troca, uma lição inesquecível de realidade brasileira e de cidadania.

Os programas desenvolvidos abrangiam, entre outros, a assistência social, o atendimento médico e odontológico e a extensão rural. Foi a partir da prática do Projeto Rondon que começaram a se instalar campi avançados das universidades, situando-se o primeiro deles, vinculado à Universidade Federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul, na cidade de Boa Vista, no então Território de Roraima.

Explica-se o seu surgimento pelo apelo das comunidades para verem os trabalhos desenvolvidos pelo Projeto Rondon receberem o caráter de ações permanentes. Quando da desativação do projeto, eram 22 os campi avançados em funcionamento.

Mas também os estudantes e professores manifestaram, inúmeras vezes, o desejo de aprofundar aquelas experiências; de voltarem àquelas regiões distantes às quais se afeiçoaram e nas quais puderam sentir-se socialmente úteis; e, não poucas vezes, os universitários rondonistas, depois de formados, foram estabelecer-se naquelas localidades, já como profissionais, contribuindo de forma duradoura para o seu desenvolvimento.

A riqueza dessa experiência, Srªs e Srs. Senadores, o seu significado profundo de encontro de dois Brasis, o Brasil instruído e o Brasil que ainda permanece à margem do processo de desenvolvimento, mas este um Brasil profundo, rico de tradições populares e de potencialidades; essa experiência, ilustres Senadores, não pode deixar de ser aproveitada, em um momento em que devemos responder às expectativas de mudança da sociedade.

A região Norte foi, desde o início, Sr. Presidente, o alvo principal da ação do Projeto Rondon, cuja lema, como bem se lembram todos os que viveram aquela época, era "integrar para não entregar". Passados 36 anos de sua criação, percebemos que o lema rondonista não envelheceu; constatamos, hoje em dia, que o receio de perder a Amazônia, se dela não cuidarmos e se não soubermos ocupá-la, não é fruto de uma especulação disparatada ou paranóica, mas se assenta em uma análise objetiva da realidade.

Se estou convicto, Srªs e Srs. Senadores, de que isso não ocorrerá é pela certeza de que a Nação brasileira saberá enfrentar os problemas que afetam nossa Amazônia e saberá integrá-la, cada vez mais, à realidade nacional. Ao ser assumida definitivamente essa responsabilidade, restará nítida a verdade da frase que não tenho cansado de repetir: "A Amazônia não é problema para o Brasil, e sim solução."

O novo projeto Rondon, como quer que ele venha a se chamar, poderá ter relevante papel no processo de desenvolvimento e integração da Amazônia. É nesse sentido que se posiciona o artigo do jornalista Donizete César, publicado no último dia 5 de outubro no jornal paraense O Liberal.

Segundo o articulista, o projeto, que vem sendo debatido por altas autoridades do Governo Federal, já conta com disponibilidade de financiamento junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) da ordem de 400 milhões de reais, utilizáveis a fundo perdido.

De acordo com o depoimento, citado no artigo, do médico e professor Murilo Morhy, pró-reitor de Administração da Universidade Federal do Pará, que participou de encontro promovido pelo Governo Lula para delinear o programa, sua nova concepção amplia o âmbito das ações a serem desenvolvidas. Foram, assim, escolhidos como objetivos "a produção de conhecimento do ponto de vista científico e tecnológico, a formação de recursos humanos na região e a produção de benefício social às populações locais".

Não poderia deixar de haver uma ênfase maior na produção de conhecimento científico e tecnológico, em relação aos objetivos perseguidos pelo extinto Projeto Rondon, quando sabemos que é este um aspecto decisivo na desigualdade de poder entre as nações no mundo de hoje, assim como um instrumento imprescindível para promover o desenvolvimento sustentável da Amazônia. 

Entre os campos principais de pesquisa não poderiam deixar de constar a água e a biodiversidade; mas também se cogita de avaliar a questão da segurança na região, com ênfase na prática do narcotráfico. Discutiu-se, ainda, a necessidade de realização de um Censo de Pesquisa Amazônica, "a fim de tirar das prateleiras das universidades os projetos científicos já elaborados e torná-los operacionais". Segundo o Professor Murilo Morhy, tal levantamento já existe, em estágio adiantado, na Universidade Federal do Pará, indiscutivelmente "um ponto de referência na produção de conhecimento de nossa região".

Consideramos, entretanto, que o espírito do antigo Projeto Rondon deva ser resgatado e mantido em primeiro plano. Outra não foi, surpreendentemente para alguns, a posição manifestada pela entidade nacional dos estudantes universitários.

Esse espírito pode ser expresso, talvez, como o de uma solidariedade integral e efetivamente prática entre os diversos segmentos sociais que compõem nossa nação. Os jovens que tiveram o privilégio de alcançar os bancos das universidades, especialmente as da rede pública, devem despertar para sua responsabilidade social, para a realização profunda que representa ser útil para seus semelhantes e concidadãos. A idéia que se discute, hoje em dia, é, inclusive, a de não levar apenas estudantes, mas também jovens já profissionalizados com interesse em se estabelecer em localidades carentes no interior do País.

Por outro lado, sabemos, Sr. Presidente, que, com estímulos e condições favoráveis, a população de nosso interior vai não apenas se fixar em sua região nativa, mas mostrará sua capacidade efetiva de contribuir para o próprio desenvolvimento.

Programas amplos e continuados para viabilizar esses objetivos, como o fez, em sua época, o Projeto Rondon, é o que todos esperamos do Governo Federal.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/2003 - Página 33076