Discurso durante a 147ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Contradições do governo federal no que se refere à transposição das águas do rio São Francisco.

Autor
César Borges (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: César Augusto Rabello Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Contradições do governo federal no que se refere à transposição das águas do rio São Francisco.
Aparteantes
Heloísa Helena, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 23/10/2003 - Página 33137
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • APREENSÃO, AUSENCIA, PRIORIDADE, INSUFICIENCIA, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, UNIÃO FEDERAL, DESTINAÇÃO, REVIGORAÇÃO, RECUPERAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO.
  • CONTRADIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PROMESSA, ANTERIORIDADE, EXECUÇÃO, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, AGUAS FLUVIAIS, RIO SÃO FRANCISCO, FAVORECIMENTO, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ESTADO DA BAHIA (BA), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ESTADO DE ALAGOAS (AL), ESTADO DE SERGIPE (SE).

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, agradeço a atenção e a compreensão de V. Exª e também agradeço ao nobre Senador pelo Amapá, ex-Governador João Capiberibe, que teve a deferência de nos conceder a utilização deste tempo.

Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, recentemente tivemos nesta Casa - alguns dos Senadores devem se recordar com clareza - a apresentação de uma amplo e audacioso projeto de recuperação e transposição do rio São Francisco, fonte de vida e riqueza para milhões de cidadãos brasileiros, em especial os residentes nos Estados de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe; principalmente da minha querida Bahia, Estado onde o rio São Francisco tem a maior parte do seu curso. Quando dessa apresentação, lembro-me do otimismo contagiante do Vice-Presidente da República, designado pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva o condutor do projeto de transposição das águas do São Francisco. O Vice-Presidente José Alencar apresentou-nos a possibilidade de, finalmente, dar ao rio São Francisco o tratamento que ele merece, que não seria a transposição pura e unicamente. Antes de tudo, haveria a revitalização do rio, uma verdadeira salvação do Rio da Integração Nacional.

Os discursos entusiasmados daquela sessão mostraram a importância que o São Francisco tem para todo o País, especialmente para a minha região, o Nordeste brasileiro.

A revitalização seria - de acordo com o projeto que o Vice-Presidente da República apresentou aqui, no Estado da Bahia e em outros Estados nordestinos - o primeiro passo para a obra da transposição. Então, primeiro a revitalização e depois a transposição do São Francisco para os irmãos do Nordeste setentrional, em especial dos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba.

Apesar do entusiasmo e das boas intenções - não tenho dúvida disso - do homem público que é o Vice-Presidente da República, José Alencar, neste momento trago a esta Casa uma preocupante informação em relação à prioridade estabelecida pelo Governo Federal para essa obra, que não se traduziu no Orçamento apresentado pelo Governo para 2004.

Vejam, Srªs e Srs. Senadores, que o Projeto de Lei Orçamentária de 2004 prevê a destinação de apenas R$10 milhões para as obras de revitalização e recuperação do rio São Francisco, o que representa 3,5% dos R$289,5 previstos no Plano Plurianual 2004/2007 para essa ação.

Ora, se 2004 será o segundo ano de Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e serão destinados apenas 3,5%, como espera o Presidente fazer essa obra que diz que fará nem que tenha que levar, de balde, água do São Francisco para os irmãos nordestinos? Nós não queremos que o Presidente sofra o constrangimento de ter que carregar lata d’água na cabeça para cumprir sua promessa assumida com esses Estados nordestinos.

O valor previsto para 2004, Srªs. e Srs. Senadores, é 33% menor do que o estabelecido para o ano anterior. É uma obra prioritária, mas na verdade o valor é 33% inferior ao que estava no Orçamento de 2003, feito pelo Governo passado. Isso, com relação à revitalização do São Francisco. O que presenciamos e constatamos é que, em lugar de avanço, está havendo retrocesso com relação a este programa tão importante de revitalização do rio São Francisco, que está morrendo. Quanto mais o projeto futuro de transposição do rio!

Mais uma vez o Governo diz uma coisa e faz outra. O discurso oficial é completamente dissociado das ações da administração petista. O Líder do meu partido já denunciou: os programas são anunciados, o Presidente faz compromisso público, mas a prática está totalmente diferente do discurso, da teoria. A administração petista não vem honrando os compromissos assumidos com o povo brasileiro. Promete-se a recuperação do rio São Francisco, mas não há recursos no Orçamento que garantam a execução do que foi prometido.

Confesso a V. Exªs que estou perplexo, pois está claro que estamos vivendo mais um grande engodo. O Governo finge que está realizando ou que vai realizar, e alguns fingem que acreditam nas promessas do Governo. Essa é a única conclusão possível quando confrontamos as promessas do Governo e os números do Orçamento.

Na reforma tributária, por exemplo, o Governo fala da constituição de um fundo de R$6,5 bilhões para compensar os Estados pela desoneração das exportações - não são R$10 bilhões - e mais $R2 bilhões como seguro.

Sabe quanto tem no Orçamento de 2004, Senadora Heloísa Helena? Nem um centavo colocado ainda; e negociam isso com os Srs. Governadores. O Orçamento tem furos imensos, porque o Governo já considerou como receita aquilo que pretende aprovar na reforma tributária. Os gastos com a negociação da reforma tributária, com os próprios Srs. Governadores, não estão inclusos no Orçamento de 2004.

Na verdade, o Governo fala uma coisa e pratica outra, diz que tem recursos para fazer uma determinada obra ou investimento, e a Lei Orçamentária, que é função precípua do Parlamento, não contempla porque o Governo Federal não mandou para cá.

Vejam o caso da Sudene. Disse ontem aqui o Senador Tasso Jereissati, em aparte a um discurso meu, que a recriação da Sudam e da Sudene é um compromisso público do Governo. O projeto veio para o Congresso Nacional, para a Câmara dos Deputados, havia urgência constitucional. Pois bem: o Governo pediu que fosse retirada a urgência constitucional. A Sudene não é mais prioridade, como foi anunciado com pompa e circunstância no Estado do Ceará.

Como ficará o Ministro Ciro Gomes nessa situação? S. Exª assumiu compromissos aqui nesta Casa. Por um requerimento meu, foi convocado à Comissão de Assuntos Econômicos e, naquela oportunidade, disse que até o mês de junho ou julho a Sudene estaria recriada. Já estamos no final do mês de outubro. Essa é a nossa preocupação.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Concedo um aparte à nobre Senadora Heloísa Helena.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador, V. Exª tirou o que eu ia falar hoje, mas não tem problema, estou me preparando para falar sobre outro assunto. Este é um tema extremamente importante, de alta complexidade. Eu trouxe para mostrar a V. Exªs o relatório final de uma comissão, criada na Casa, de acompanhamento do projeto de revitalização do rio São Francisco. O Senador Waldeck Ornelas, como sabe V. Exª, praticamente levou a Comissão. Claro que o Senador Antonio Carlos Valadares, a Senadora Maria do Carmo e eu participávamos, mas temos que reconhecer que ele praticamente levou sozinho o trabalho da revitalização. Tive oportunidade, quando aqui estiveram tanto o Ministro da Integração como o Vice-Presidente, de ver um filmezinho muito bonito - porque nada melhor do que alta tecnologia para encontrar água, desencontrar, suspender, elevar. No filmezinho e com computador tudo fica fácil. Spielberg existe para isso. Eu até fiz uma proposta: se o Governo quer uma grande obra, não precisa ser uma obra faraônica, não precisa ser um desses megaprojetos que podem significar futuras obras inacabadas. Como sabe V. Exª, o dinheiro que estava previsto ano passado foi destinado apenas a encher o bolso de algumas famosas consultorias. Efetivamente, não se faz aquilo que se deve fazer. Ninguém é contra mobilidade de águas, porque no mundo todo isso é feito. Todavia, o que não pode - e neste ponto tem razão V. Exª - é deixarmos de lado um projeto de revitalização, que é uma grande obra, um gigantesco desafio. O Governo tinha que parar de falar em transposição - porque empreiteira e construtor gostam muito e sempre parasitaram a máquina pública, e há um rol de obras inacabadas - e aceitar a gigantesca tarefa de fazer saneamento básico em 503 Municípios do Vale do São Francisco. Já imaginou que tarefa gigantesca?! Não apenas 97 Municípios estão à beira do rio jogando esgoto in natura, mas 503. Então, só o saneamento em 503 Municípios já é uma grande tarefa. Seria bom para o rio e para as populações locais, além de ser um excelente instrumento para a geração de emprego e dinamização da economia. A recomposição de matas ciliares, como sabe V. Exª e todos aqui que já se dedicaram ao tema, não é simples. Não consiste em colocar um matozinho aqui, um capinzinho ali. A regularização da vazão é também extremamente polêmica. Há necessidade de investimentos em outros componentes de matriz energética para que o rio possa cumprir o seu destino, a conclusão das obras de abastecimento de água e de irrigação, necessárias no Vale do São Francisco. Em Alagoas, não temos nenhum egoísmo. Nada me irrita mais do que alguém dizer que são os egoístas de Alagoas, de Sergipe, da Bahia e de Minas que não querem levar água para os irmãos nordestinos. Ora, os irmãos nordestinos do meu Estado vêem o rio e não conseguem se apropriar dele. Dizem-me: “Heloísa, tenho que descer um barranco gigantesco para, com uma latinha de água, matar a sede do meu filho e dos animais. Não consigo ter um projeto de irrigação, nem de piscicultura, absolutamente nada”. Então, antes de transpormos o rio, vamos revitalizá-lo. Vamos dar uma moratória a esse debate. Nada de trocas de balcão, de compensação com obrazinhas em outros Estados. Que efetivamente façamos a revitalização do rio São Francisco. Nobre Senador, saúdo V. Exª pelo pronunciamento.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Senadora Heloísa Helena, agradeço a V. Exª pelo aparte. V. Exª terminou fazendo parte do seu discurso no meu, mas agradeço porque concordo plenamente com suas pontuações sobre o assunto, que são as minhas também. Foi muito adequada a lembrança do Senador Waldeck Ornelas, um batalhador pelo rio São Francisco, que pontuou a sua atuação nesta Casa com um trabalho belíssimo sobre a revitalização do rio, que, infelizmente, não foi utilizado pelo Governo passado, e a situação perdura no Governo atual. Precisamos salvar o rio, revitalizá-lo, o que seria uma obra monumental para milhões de brasileiros que estão em regiões sofridas dos Estados de Sergipe, Alagoas, Minas Gerais e Bahia. Ninguém é contra a levar água para o Nordeste setentrional, mas primeiro temos que salvar o rio São Francisco. Infelizmente, trago a denúncia de que, este ano, os recursos do Orçamento para 2004 são irrisórios: R$10 milhões. Com esses recursos, não se faz o saneamento nem de uma cidade de médio porte, quanto mais de 500 cidades do Vale do São Francisco.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador César Borges, V. Exª me permite um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Com muito prazer, Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador César Borges, quero fazer um aparte mesmo. Ao menor sinal de V. Exª, interromperei as minhas considerações, que são no mesmo sentido das de V. Exª. Quero lembrar que ontem, na Comissão de Assuntos Econômicos - e lá V. Exª se encontrava -, presenciei algo fantástico. Conseguimos remeter para a Câmara dos Deputados um projeto de autoria do Senador Jefferson Péres, relatado pelo Senador Tasso Jereissati, que contou com a colaboração do Governo, por meio de várias emendas, referente a recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, a fim de que as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste deixassem de ser discriminadas e passassem a ter uma oportunidade maior de investimentos com recursos do BNDES. Estava eu feliz da vida quando ouvi o comentário de alguém, que me encantou pela sua inteligência e também pelo seu entusiasmo pelo Brasil - e percebi que conquistamos o nada -, que afirmou, com relação ao empréstimo de São Paulo, que ficou para ser votado na próxima terça-feira, que não havia dinheiro para atender algo que estava causando uma grande celeuma. Ele disse que não tem dinheiro. São Paulo vai entrar na fila. São 182 prefeituras à frente de São Paulo. Então, perguntei-lhe: “Mas se não tem Orçamento, se não tem recursos, como é que se faz?” Ele respondeu: “Eu tenho esperança de que os devedores vão pagar o BNDES e vamos ter recursos para atender as prefeituras, as regiões”. Assim se encontra V. Exª nesta tribuna, defendendo a revitalização do rio São Francisco, mas indagando com que recursos isso será feito. Oxalá tudo isso que estamos fazendo e plantando no Congresso Nacional, dando a nossa colaboração, consiga fazer a multiplicação dos pães e haja recursos para tantas obras necessárias a este País. Sinceramente, ontem saí da reunião pensando se vamos concretizar alguns projetos que existem por aí. E eu ouvi, para alegria minha - V. Exª me permite, já estou encerrando -, o Presidente do BNDES afirmar que está garantida a Transoceânica, que abrirá as portas do Brasil para o Pacífico, através de Mato Grosso do Sul, e a construção da estrada Corumbá-Santa Cruz de La Sierra. Formulo votos para que essas obras sejam realizadas. Agradeço a V. Exª pela oportunidade deste aparte.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Eu é quem agradeço a V. Exª pelo aparte. Realmente, o País vive uma situação surrealista. O Presidente tudo promete, como a estrada em direção ao Pacífico - de Corumbá para a Bolívia. Mas também foi prometido ontem - não sei se V. Exª se lembra - a Transnordestina, uma ferrovia ligando os Estados nordestinos. Mas não há recursos no Orçamento, que contempla apenas R$7 bilhões para investimentos, insuficiente para fazer qualquer uma dessas grandiosas obras prometidas. O Governo tem um discurso para cada platéia, assume compromissos, mas, com certeza, não é nada mais do que uma farsa, um engodo. Estão enganando o povo brasileiro ao imaginar que tudo será resolvido com a popularidade do Presidente Lula e com o marketing de Duda Mendonça. Não há nada que uma boa peça publicitária ou uma palavra do Presidente não resolva. Eles raciocinam assim. Será que o Governo acha que carisma e marketing substituirão para sempre as ações efetivas, os recursos que o governo deveria estar colocando em obras de infra-estrutura?

Senador Ramez Tebet, V. Exª ouviu ontem o Presidente do BNDES dizer que sem infra-estrutura não haverá a retomada do crescimento econômico. Ele disse com franqueza, respondendo a uma pergunta de um colega nosso Senador se ele acreditava que o País pudesse voltar a crescer sem investir em infra-estrutura. O Presidente Carlos Lessa disse que não acredita em desenvolvimento sem infra-estrutura, e o Governo promete uma infra-estrutura que não realiza, pois hoje todas as obras estão paralisadas.

Sr. Presidente, ainda tenho a esperança, assim como o Presidente do BNDES tem esperança, que haja recursos para atender os pleitos de tantas cidades brasileiras, de que o Governo trate a questão do São Francisco com a seriedade e a prioridade que o tema merece.

Espero que o orçamento que será aprovado pelo Congresso Nacional confirme as esperanças de todo o povo brasileiro de ver recuperado o nosso querido Velho Chico, que é fundamental para o desenvolvimento do País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/10/2003 - Página 33137