Discurso durante a 149ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Participação de S.Exa. na Conferência Geral da UNESCO, em Paris. Visita a lideranças do Movimento dos Sem-Terra (MST), que estão presos em cadeias no interior de São Paulo.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • Participação de S.Exa. na Conferência Geral da UNESCO, em Paris. Visita a lideranças do Movimento dos Sem-Terra (MST), que estão presos em cadeias no interior de São Paulo.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 25/10/2003 - Página 33771
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, ROBERTO AMARAL, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), CONFERENCIA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), PAIS ESTRANGEIRO, FRANÇA, DISCUSSÃO, RELAÇÃO, CONHECIMENTO, SOCIEDADE, EXCLUSÃO, POPULAÇÃO, AUSENCIA, ACESSO, EDUCAÇÃO, CIENCIAS, CULTURA, COMENTARIO, ESTATISTICA, MINORIA, USUARIO, TECNOLOGIA, AMBITO INTERNACIONAL, REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, PAIS SUBDESENVOLVIDO.
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, VISITA, LIDERANÇA, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, PRESIDIO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, ACUSAÇÃO, FORMAÇÃO, QUADRILHA, EXPECTATIVA, CONCLUSÃO, RELATORIO, INVESTIGAÇÃO.
  • CRITICA, IMPRENSA, COLABORAÇÃO, PROPRIETARIO, LATIFUNDIO, DIFAMAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, PARTICIPAÇÃO, CRIME, DEFESA, AUMENTO, ATENÇÃO, SENADO, SITUAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, COMBATE, INJUSTIÇA, CIDADÃO, APOIO, REFORMA AGRARIA.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, PRONUNCIAMENTO, AUTORIA, ROBERTO AMARAL, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), CONFERENCIA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), CRITICA, DESIGUALDADE SOCIAL, ACESSO, POPULAÇÃO, TECNOLOGIA.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, prezada Senadora Heloísa Helena, Srs. Senadores, venho hoje à tribuna prestar contas de duas missões para as quais fui designado pelo Sr. Presidente da nossa Casa, eminente Senador José Sarney.

A primeira delas ocorreu no início do mês, quando tive o privilégio e a oportunidade de, na companhia do Ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, participar da Conferência Geral da Unesco, em Paris, onde, em uma mesa redonda, foi tratado o tema Rumo à Sociedade do Conhecimento.

Muitos acreditam que a Sociedade do Conhecimento propiciará sistema internacional mais justo, funcionando no interesse público e de todos, democraticamente. Nós, que vivemos em países em desenvolvimento, comprovamos, na dura realidade do dia-a-dia, o quanto essa sociedade pode ser perversa e excludente. A apropriação do conhecimento dentro de uma lógica de concentração dos meios e do capital condena à mais completa marginalidade aqueles sem acesso à educação, ciência e cultura - justamente os temas de que se ocupa esta Organização.

Em um mundo de 5,6 bilhões de habitantes, apenas 150 milhões são usuários de PCs. Menos de 10% dos usuários de computadores pessoais no mundo têm correio eletrônico conectado à Internet. Menos de 7% têm acesso direto à rede. Menos de 5% dos lares têm PCs. Menos de 1% da população mundial tem acesso à Internet.

            Sr. Presidente, esses são trechos do discurso proferido pelo Ministro Roberto Amaral naquela conferência. Foi um discurso corajoso, audacioso, que apontou a “brecha digital”, expressão que utilizou para, comparativamente ao que ocorre no mundo econômico, mostrar o fosso existente entre as nações desenvolvidas e as subdesenvolvidas e em desenvolvimento no que diz respeito à tecnologia do computador, da Internet, do mundo virtual.

            Peço que o discurso do Ministro Roberto Amaral seja incorporado ao meu próprio discurso e transcrito, na íntegra, nos Anais desta Casa, pela sua importância, pois mostrou, na Unesco, o que consideramos injustiça e tratamento desigual na difusão e utilização dessa tecnologia.

A outra missão que recebi, Sr. Presidente, foi a de acompanhar, prazerosamente, a Senadora Heloisa Helena e o Senador João Capiberibe em visita a lideranças do Movimento dos Sem-Terra, injustamente presos em cadeias no interior de São Paulo.

Começaria a me referir a essa missão a partir do poeta Ferreira Gullar. Gostaria de citá-lo. Aquele ilustre brasileiro diz, numa de suas mais admiráveis obras, que a história humana não se desenrola apenas nos campos de batalha e nos gabinetes presidenciais. De acordo com o ilustre poeta, a História se desenrola também nos quintais, entre plantas e galinhas, nas ruas de subúrbios, nas casas de jogos, nos prostíbulos, nos colégios, nas usinas, nos namoros de esquina. É disso, da matéria humilde e humilhada, dessa vida obscura e injustiçada, a argamassa de sua poesia porque, ressalta o poeta, o canto não pode ser uma traição à vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas que não têm voz.

Nunca, Sr. Presidente, esse texto esteve tão atual e tão presente. E tomo a liberdade de fazer minhas as palavras do poeta para com elas declarar que quero fazer da mesma essência, da mesma argamassa a matéria-prima deste mandato que o povo acreano me outorgou e do que muito me orgulho. Foi em busca, portanto, de dar voz àqueles que não têm voz e de distribuir justiça aos injustiçados que, no início desta semana, tive a honra, como já disse, de acompanhar a Senadora Heloísa Helena e o Senador Capiberibe às cadeias públicas do interior de São Paulo, onde neste momento estão presos os líderes do MST José Rainha Júnior, sua esposa Diolinda e o combatente Mineirinho, uma liderança tão atuante quanto aqueles que já estão presos ou que têm prisão decretada e que por isso mesmo estão sendo perseguidos no País inteiro, tendo alguns, para fugir da prisão iminente, caído inclusive em clandestinidade.

Aquele texto do poeta maranhense faz-se presente porque, em princípio, a prisão dessas pessoas é absurda e descabida em face da pobreza da acusação que lhes é imputada. É sabido que José Rainha, Diolinda e Mineirinho, assim como outras lideranças do MST, estão presos e perseguidos acusados de formação de quadrilha.

O relatório que vai revelar as condições em que essas lideranças estão presas será apresentado noutra oportunidade, mas peço licença aos meus nobres Pares e companheiros de viagem para relatar ao Senado Federal minha impressão particular.

Percebi de José Rainha e Mineirinho que fisicamente estão bem. A prisão e a humilhação não lhes abateram a coragem e a determinação. Assim como Diolinda, que está separada do marido numa cadeia para mulheres, eles têm absoluta consciência do papel que a história do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra lhes reservou na luta por um pedaço de terra e por uma reforma agrária justa num País tão injusto para com seus filhos mais autênticos e mais legítimos. No caso de Diolinda, a injustiça é mais brutal, porque seus algozes não apenas a condenam com a segregação, como a separaram de seus filhos, inclusive de uma filha de apenas com dois anos de idade.

O que torna mais aguda a injustiça dessas prisões é a pobreza da acusação e o que está sendo engendrado por trás das infâmias. José Rainha, Diolinda e Mineirinho não são quadrilheiros, Presidente. Também não são vítimas. São pessoas conscientes de que, nesse particular, a história não vai mudar sem a luta e a união dos que efetivamente precisam de terra contra um sistema injusto que há mais de quinhentos anos concentra cada vez mais terra na mão de um grupo cada vez menor. A crueza dessa realidade torna-se ainda mais covarde quando sabemos que uma parte do Judiciário brasileiro está a serviço dos que servem aos interesses do capital com todo o denodo e quase sem nenhuma observância aos autênticos princípios de justiça.

Nada me tira da cabeça, Sr. Presidente, que esses processos e que essa sórdida campanha, inclusive na grande imprensa brasileira, são ações deliberadas e dirigidas por grupos ligados às oligarquias rurais e latifundiárias deste País, que teimam em tentar criminalizar a luta do MST e de outros movimentos sociais. É por isso que considero importante o Senado Federal abraçar a causa do MST.

Vejam que, de acordo com informações da assessoria do ilustre Senador João Capiberibe, há mais de 50 anos esta Casa não designava uma comissão com os propósitos daquela que tive a honra de integrar na visita às cadeias de São Paulo. Isso é sinal de que mesmo o vetusto Senado Federal pode mudar e estabelecer forte parceria com os legítimos movimentos sociais e populares. E aqui rendo minhas homenagens ao Presidente José Sarney, que, de pronto, acolheu o requerimento e designou a comissão que tive a honra de integrar.

O MST não é um movimento recente. Não é também um grupo de sonhadores ou de rebeldes, como tentam vender à opinião pública. É um movimento social, seguramente o movimento mais importante que já surgiu na história deste País. É justo e oportuno, assim, Sr. Presidente, que o Senado Federal procure conhecer o problema nas suas entranhas e traga os movimentos sociais para o debate nesta Casa.

Esta é a minha real intenção - creio seja também a razão dos Senadores Heloísa Helena e João Capiberibe -: fazer com que o Senado Federal dê voz àqueles que não têm voz e que, em matéria de Justiça, são humilhados e criminalizados. Creio que, assim fazendo, o Senado Federal está dando um grande passo no combate à sordidez das campanhas feitas com o intuito de transformar o MST em inimigo público. O Senado precisa cumprir o seu papel, abrindo os seus meios de comunicação - pagos, aliás, com o dinheiro da sociedade - para que o MST e outros movimentos sociais possam manifestar-se e se contrapor à orquestração de campanhas cruéis, que, nesse momento, na pompa de muitos gabinetes dos que detêm o capital e o poder de mandar prender, fazem o Brasil tornar-se um País menor, uma República repleta de injustiças.

Precisamos mudar isso. Fazer justiça ao MST é fazer justiça ao Brasil, como uma Nação que se pretende democrática, desenvolvida e honrada diante das demais nações. Do contrário, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para citar outra vez Ferreira Gullar, “ou o historiador estará mentindo ou a história não estará completa”.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Concedo, com o maior prazer, o aparte ao nobre Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Nobre Senador, V. Exª simboliza muito nesta Casa. V. Exª simboliza a justiça, aquela que ouvimos de Cristo, quando subiu as montanhas e disse: “Bem aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados”. Fui Prefeito da minha cidade e governei o Estado por dois anos. Conheço bem esse problema. Há muita terra, e esse pessoal é bom. Entendo que somos filhos de Deus, o dono do mundo, e que eles são nossos irmãos. Eles só querem um pedaço de terra para morar - e fiz reforma agrária e urbana - ou para trabalhar. Entendo que a terra é de quem nela nasce, morre e trabalha. Um dos maiores orgulhos que tenho é o fato de o meu Vice-Governador, Osmar Araújo, ter sido do Funrural e líder da Fetag. Então, convivi com esse povo e o recebi no palácio, Senador Eurípedes. Nunca me esqueço, Senadora Heloísa Helena, de uma mulher do campo que recebi quando estava numa audiência com um Prefeito do litoral. Eles entraram no palácio, deixei e fiquei conversando. Passearam por todo o palácio, e eu apresentei o Prefeito, dizendo que era um Prefeito de uma cidade praiana, pois eles nunca haviam visto o mar, eram interioranos. Essa mulher disse, então, na sua pureza, que o chão da minha sala era muito macio - e era um carpete como este! Era uma pureza de gente. Dou o meu testemunho sobre o Rainha e a grandeza do Piauí, de Rui Barbosa, que V. Exª representa. A justiça é o pão de que mais a humanidade necessita - essa frase é de Montaigne, pois eu não tinha capacidade de dar essa mensagem. Esse Rainha foi preso injustamente. V. Exª sabe que essa foi uma trama dos poderosos, dos ricos, dos maldosos e do sistema. E foi preciso que Evandro Lins e Silva - que conheci e até tentou me defender, porque também fui vítima de injustiça - provasse essa indecência e essa indignidade daqueles insaciáveis, poderosos e pecadores, que não compreendem esse problema. Quero lhe dizer que ele fica na história como Mandela, que foi preso. Senadora Heloísa Helena, estou lendo o livro Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos, e vejo que as injustiças continuam. Mas sou muito otimista. Como disse Juscelino, é melhor ser otimista, pois o otimista pode errar, mas o pessimista já nasce errado e continua errando. V. Exª revive aquele grito de justiça de Rui Barbosa, que é o patrono desta Casa.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Muito obrigado, Senador Mão Santa, pelo seu aparte. V. Exª sempre, de forma coerente, manifesta-se com muita propriedade acerca dos assuntos importantes que são tratados nesta Casa.

Obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR GERALDO MESQUITA JÚNIOR EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/10/2003 - Página 33771